Salário utilidade. Aluguel de veículo do reclamante.
Tribunal Regional do Trabalho - TRT3ªR
Processo: 01711-2009-029-03-00-3 RO
Data de Publicação: 08/06/2010
Órgão Julgador: Setima Turma
Juiz Relator: Des. Paulo Roberto de Castro
Juiz Revisor: Des. Marcelo Lamego Pertence
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Firmado por assinatura digital em 27/05/2010 por PAULO ROBERTO DE CASTRO (Lei 11.419/2006).
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO - 3ª REGIÃO
01711-2009-029-03-00-3-RO
Recorrentes: Edgar Ferreira Martins
Sempre Editora Ltda e outro.
Recorridos: os mesmos
EMENTA: SALÁRIO UTILIDADE - ALUGUEL DE VEÍCULO DO RECLAMANTE - NÃO CONFIGURAÇÃO - O veículo do reclamante alugado pela empresa para que este desempenhe sua atividade, portanto, sem a finalidade contraprestativa, não caracteriza salário in natura, tendo em vista que seu fornecimento destina-se à execução dos serviços e não para remunerar o trabalho prestado (inteligência da Súmula 367, I do TST).
RELATÓRIO
Da decisão, f. 139/145, que julgou parcialmente procedentes os pedidos, as partes recorrem.
O autor, f. 146/153, pretende a reforma do julgado quanto a a) salário utilidade; b) majoração do valor da indenização por danos morais.
Contra-razões pela reclamada - f. 156/168.
A reclamada, adesivamente, f. 169/180, requer a exclusão da condenação do pagamento de indenização por danos morais. Do contrário, pleiteia redução do valor arbitrado para a indenização.
Custas processuais e depósito recursal - f.182/183.
Contra-razões pelo autor - f. 187/192
É o relatório.
VOTO
ADMISSIBILIDADE
Conheço de ambos os recursos, porque presentes os pressupostos de admissibilidade. Passa-se ao exame em conjunto, por tratarem de matérias comuns.
MÉRITO
RECURSO DO RECLAMANTE E RECURSO ADESIVO DA RECLAMADA
ALUGUEL DE VEÍCULO
Pretende o recorrente que o valor quitado a título de aluguel de veículo seja incorporado ao seu salário para assim repercutir nas parcelas de direito.
Alega o recebimento de salário por fora e que a ré mascarava a natureza salarial da verba intitulando como aluguel de sua motocicleta.
Requer a nulidade do contrato de aluguel de veículo firmado com a reclamada. Argumenta tratar-se de salário o valor pago, o que estaria demonstrado pela prova oral e contrato - f. 125 - ao prever o pagamento de R$0,21 por quilômetro rodado e os recibos de locação, f. 11/55, demonstrarem valor fixo.
Por fim sustenta que as despesas com gasolina e óleo não podem ser transferidas ao empregado, em razão de a motocicleta ser utilizada exclusivamente durante a jornada.
Razão não assiste ao recorrente.
A reclamada, em defesa, confirma a locação de veículo de propriedade do autor, mediante contrato específico, bem como de que referido aluguel seria para viabilizar o trabalho do reclamante, ou seja, sem natureza salarial.
O autor, em depoimento pessoal, afirmou (f.135):
"...que foi contratado como auxiliar administrativo; que além de trabalhar como auxiliar administrativo também laborava como motoboy; que como motoboy o depoente fazia entrega de jornais na bancas, cobranças e entrega de produtos promocionais..."; "... que a motocicleta era do depoente...".
Portanto, na medida em que a reclamada realiza um contrato de locação de veículo com o autor, agregando-se tal avença às condições em que o trabalho era realizado, como admitido pelo próprio autor, inexiste qualquer caráter de plus salarial da verba.
Conforme posicionamento sedimentado na Súmula 367 do C. TST, que se aplica analogicamente, o veículo fornecido pelo empregador ao empregado, quando indispensável para a realização do trabalho, não tem natureza salarial, ainda que seja utilizado pelo empregado em atividades particulares.
Por fim, cumpre salientar, que embora o autor assumisse os gastos com combustível e manutenção do veículo, não há prova de que os valores por ele recebidos a titulo de aluguel da motocicleta não eram suficientes para cobrir tais despesas, mesmo porque os termos ajustados no respectivo contrato (f.125) foram exatamente estes.
E não configura salário utilidade o único fato de os recibos referentes à locação, anexos à inicial, apontarem valores fixos. Isso porque, há que verificar, como já exposto, o critério determinante referente à natureza da parcela em comento que seria sua finalidade. Em outras palavras, mister se faz perquirir se o fornecimento tinha caráter contraprestativo e remuneratório (fornecimento "pelo" trabalho) ou se era tendente a instrumentalizar a prestação laboral (fornecimento "para" o trabalho).
Portanto, não cabe reforma no julgado de 1o grau.
Nego provimento.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
Não se conforma a reclamada com a condenação no pagamento de indenização por danos morais.
Nega ter proferido qualquer acusação contra o autor quanto a eventual desvio de mercadorias.
Aponta depoimento da testemunha Sr. Cristiano ao atestar sobre a boa conduta do autor na empresa.
Segue aduzindo ainda que a dispensa sem justa causa afasta a pretensão de indenização, porque acaso existente tal falta cometida pelo autor, a dispensa ocorreria por justa causa.
Razão não lhe assiste.
A alegação trazida na inicial, a amparar a indenização por danos morais, é de ter o autor sido vítima de acusação de furto de mercadorias, cujo fato tornou-se público, com grande repercussão.
É certo que em seara trabalhista, há margem propícia a ocorrência de danos morais, a exigir reparação. As partes envolvidas no contrato de trabalho comprometem-se reciprocamente em observar o respeito à dignidade da pessoa humana, princípio elencado tanto no Direito do Trabalho como na própria Constituição da República. Isso se dá em razão da pessoalidade e subordinação que cercam as relações entre empregado/ empregador no contrato de trabalho, assim como a relação de dependência jurídica, os deveres e responsabilidade dos envolvidos.
Pode-se afirmar que para a configuração do dano moral trabalhista é imprescindível a concomitância dos seguintes elementos: ação ou omissão do agente (ato ilícito); dolo ou culpa do agente e nexo etiológico.
E no caso específico dos autos, ao contrário do alegado, há prova robusta de ter o autor sido maculado em sua honra e imagem a ferir seu patrimônio moral.
A testemunha Jéferson da Silva declarou:
"....ficou sabendo por comentários de colegas que o reclamante teria sido dispensado sob a acusação de extravio de mercadorias feita pelo Sr. Afonso; que todos na empresa ficaram sabendo do ocorrido; que antes de ser dispensado o reclamante permaneceu uma semana sem trabalhar externamente desviado de sua função; que o reclamante havia se acidentado e logo que retornou foi acusado de extravio de mercadorias; que o reclamante ficou muito abalado com a acusação, chegando até mesmo a chorar; que o reclamante pediu provas ao Sr. Afonso e tais provas nunca foram apresentadas; que também ficou sabendo disso através dos colegas...".
A testemunha inquirida pela própria ré, Sr. Cristiano, informou:
"... que correu um boato na empresa de que o reclamante teria desviado mercadoria da empresa; que não sabe informar quem fez tal acusação; que não sabe informar se havia alguma prova no sentido de que o reclamante havia extraviado mercadorias da empresa...".
Não se discute a seriedade da conduta ímproba, representando a falta mais grave prevista no artigo 482 da CLT, uma vez que compromete não só a vida profissional do empregado, mas sua honra e dignidade.
E no presente caso, em que pese a ré negar a acusação imputada ao autor, a prova oral acima citada é convincente de que tal fato ocorreu, o que veio ao conhecimento de vários empregados da empresa, sendo motivo de comentários.
É certo que a empresa ultrapassou os limites da apuração dos fatos. Ao romper o contrato de trabalho, ainda que a recorrente entendesse existir um motivo justo, deveria ter se acautelado quanto ao sigilo acerca da causa da dispensa, mormente quando ausente a oportunidade de o autor se defender, porquanto sequer houve apuração sobre o caso.
Não se discute que o empregador, no uso de seu poder diretivo e disciplinar, encontra-se em pleno direito de apurar fatos e eventuais faltas relacionadas aos seus empregados no âmbito da prestação de serviços, bem como rescindir o contrato de trabalho se assim entender vedado, contudo, que a apuração de faltas configure qualquer excesso no sentido de afetar a honra, dignidade e moral de qualquer pessoa de bem.
E na presente demanda, cumpre notar que apenas houve boatos malferindo a imagem e conduta do empregado sem ao menos ter havido algum procedimento empresário no sentido de apurar os fatos.
Portanto, o fato de não existir dispensa com justa causa não confere ao empregador a isenção de responsabilidade diante da situação que se examina no presente caso.
Nego provimento.
VALOR DA INDENIZAÇÃO
Pretende o autor que seja majorado o valor da indenização por danos morais, entendendo ser irrisório diante da ofensa sofrida. Pugna pelo pagamento de 100 salários mínimos.
A reclamada suscita, por sua vez, por cautela, acaso mantida a condenação, que seja reduzido o valor fixado, por excessivo.
A nenhum dos recorrentes assiste razão.
A questão alusiva ao valor da indenização, à míngua de parâmetros objetivos, impõe ao Juiz mensurar um justo valor pelos danos morais sofridos.
Nesse sentido, tem-se que a indenização, de caráter pedagógico e punitivo, não deve ser mínima de forma que não surta o efeito desejado pela norma de desestímulo à prática de conduta negligente e lesiva, ao mesmo passo em que não deve levar à ruína o seu agente; não deve constituir fator de enriquecimento ilícito da vítima, mas deve ter por intuito restituir-lhe da forma mais completa possível o status quo.
Nesse contexto, deve o juiz utilizar prudente arbítrio, para não banalizar o instituto do dano moral nem superestimar constrangimentos inevitáveis, impondo descrédito, com isso, ao Poder Judiciário.
A indenização por danos morais não tem a pretensão de substituir o sofrimento, o constrangimento e a dor moral, posto que impagáveis. A quantia arbitrada deve servir como lenitivo para a dor ou compensação pela ofensa à vida ou à integridade física. À vítima deve ser proporcionada uma melhoria considerável da qualidade de vida de modo a amenizar o seu sofrimento.
Entendo que no presente caso o MM. Juiz de origem considerou o valor do trabalho, a condição sócio-econômica do reclamante, a natureza do dano, a situação vivenciada pela vítima, o porte econômico da reclamada, enfim, todos os elementos aferíveis para a fixação da reparação.
Logo, diante do caso que se analisa, o valor de R$4.000,00 mostra-se razoável e condizente a reparar a ofensa e lesão perpetrada, não ensejando, portanto, redução e tampouco majoração.
Nego provimento.
FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,
O Tribunal Regional do Trabalho da 3a Região, por sua Sétima Turma, unanimemente, conheceu de ambos os recursos. No mérito, por maioria de votos, negou-lhes provimento. Vencido o Exmo. Des. Revisor, que majorava a indenização por dano moral para R$12.000,00.
Belo Horizonte, 27 de maio de 2010.
PAULO ROBERTO DE CASTRO
Desembargador Relator
JURID - Salário utilidade. Aluguel de veículo do reclamante. [08/06/10] - Jurisprudência
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