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segunda-feira, 14 de junho de 2010

JURID - Honorários Advocatícios Obrigacionais. [14/06/10] - Jurisprudência


Honorários Advocatícios Obrigacionais.

Tribunal Regional Federal - TRF3ªR

Processo : 00091-2010-157-03-00-6 RO

Data de Publicação : 14/06/2010

Órgão Julgador : Quarta Turma

Juiz Relator : Des. Antonio Alvares da Silva

Juiz Revisor : Des. Julio Bernardo do Carmo

Ver Certidão

MM. POSTO AVANÇADO DE ITURAMA

RECORRENTES: 1) ADANIEL MUNIZ DE OLIVEIRA
2) JBS S.A.

RECORRIDOS: OS MESMOS

EMENTA: HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS OBRIGACIONAIS.

1- Os honorários, desde o Direito Romano, é uma retribuição que se paga ao advogado pelo serviço que presta a seu cliente. Nele se misturam ingredientes privados, do contrato de mandato, e públicos, em razão do exercício da advocacia diretamente ligada à Administração da justiça pela Constituição.

2- O CPC de 73, dissipando dúvidas anteriores, estabeleceu justa e equilibrada regulamentação dos honorários, determinando, no art. 20, que a sentença condenará o vencido nos honorários advocatícios e nas despesas que efetuou. Vê-se aqui sua natureza claramente ressarcitória de prejuízo suposto na condução do processo.

3- A CLT não dispôs sobre honorários advocatícios, determinando apenas que as custas serão pagas pelo vencido após o trânsito em julgado e em caso de recurso.

4- A doutrina e a jurisprudência, com base no art. 791 da CLT, que permite a empregados e empregadores reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar a reclamação até o final, fixou entendimento de que o advogado não é essencial ao processo do trabalho, mesmo depois da Constituição do 88, em razão deste jus postulandi outorgado às partes.

5- Mesmo nos casos de assistência judiciária, prevista no art. 14 da Lei 5.584/70, prestada por sindicato, os honorários são pagos ao sindicato patrocinador da demanda e vencedor na ação.

6- O Código Civil de 2002, no Capítulo I, do Título IV (inadimplemento) das obrigações), art. 389, estabeleceu que o descumprimento da obrigação importa, além de perdas e danos, nos juros de mora, atualização monetária e honorários de advogado. No art. 395, deixou claro que o devedor responde pelos prejuízos que sua mora causar, acrescida de juros e atualização monetária e, no art. 404, completou que nas obrigações em dinheiro, as perdas e danos serão pagas com atualização monetária, custas e honorários advocatícios, sem prejuízo de pena convencional.

7-Ficou claro que o Código Civil associou os honorários advocatícios, não apenas à sucumbência processual, mas também à mora e ao inadimplemento das obrigações, localizando-a nos Direito das Obrigações e dando-lhe sentido mais amplo, para ressarcimento pleno das perdas e danos. Por isto, depois do CC de 2002, a parte vencedora pode receber da parte vencida, não só os honorários sucumbenciais, como também os honorários obrigacionais, que são complementares e sucessivos e não opostos.

8- Como a mora e o inadimplemento das obrigações são institutos inerentes a todos os ramos da Ciência do Direito, incidem eles também no Direito e no Processo do Trabalho, pois o descumprimento e a mora trabalhista tem a mesma natureza do descumprimento e da mora do Direito Civil, diferenciando-se apenas pelo conteúdo e não pela essência.

9- Portanto os honorários advocatícios obrigacionais podem também ser exigidos em caso de descumprimento e mora da obrigação trabalhista, ficando livre o reclamante-empregado para contratar advogado a fim de pleitear os direitos provenientes da dissolução do contrato de trabalho, em razão da mora e do descumprimento da obrigação trabalhista não adimplida no momento apropriado. Os honorários serão pagos pelo vencido, ou seja, pelo empregador. À igual obrigação fica sujeito o empregado, que poderá requerer a assistência judiciária caso se encontre nas condições de sua concessão - art. 15 da Lei 5584/70.

10- A presunção estabelecida pela jurisprudência e pela doutrina de que não há necessidade de advogado porque o empregado pode reclamar pessoalmente - art. 791 da CLT - não existe mais, porque está superada pelos fatos e agora pelo Código Civil que previu expressamente a inclusão de honorários advocatícios na recomposição das perdas e danos em caso de descumprimento e mora de qualquer obrigação.

11- Embora o jus postulandi deva ser preservado como instituto democrático e facilitador do acesso ao Judiciário, não é esta a realidade que hoje vivemos, em que a grande maioria das ações trabalhistas são propostas por advogados. De resto, a presença obrigatória de advogado foi exigida, em decisão recente, perante o TST, o que mostra uma tendência à universalização da representação por advogado na Justiça do Trabalho.

12- Por se tratar de ius cogens e de agregado natural da sentença (Pontes de Miranda), os honorários advocatícios obrigacionais dela constarão necessariamente, independentemente de requerimento ou vontade das partes. Por isto não precisam estar expressamente requeridos, pois a lei já os tem como subentendidos na sentença.

13- Se o cidadão comum pode contratar advogado, independentemente de estar sujeito à lei 1090/50 e ressarcir-se da despesa na forma da lei civil, com igual ou maior razão há de poder também o empregado, cujo advogado será pago pela parte vencida, preservando-se de prejuízo o crédito alimentar obtido na demanda.

14- Os honorários advocatícios obrigacionais são uma justa e necessária recomposição das perdas e danos em razão da mora do crédito trabalhista, de natureza alimentar e necessário à sobrevivência digna do trabalhador -art. 1º, III, da Constituição. A jurisdição do trabalho deve tomar todas as providências legais e interpretativas para que a mora e o descumprimento do crédito trabalhista, não pago no momento previsto pelo legislador, não seja causa de agravamento da situação do trabalhador dispensado que, correndo o risco do desemprego crônico, ainda tem seu pequeno patrimônio diminuído por ter que pagar advogado para recebê-lo.

EXECUÇÃO PROVISÓRIA.

1- O artigo 475-0, § 2º, I, com redação dada pela lei 11.232/95, significou grande evolução no Direito Processual, porque permitiu a prática de atos alienatórios e o levantamento de depósito em dinheiro sem caução, quando se tratar de crédito natureza alimentar ou proveniente de ato ilícito, até o limite de 60 salários mínimos.

2- Esta medida, que significa grande evolução do processo em geral é plenamente compatível com o Processo do Trabalho, que não pode se excluir das conquistas da Ciência do Direito, simplesmente por ser especial.

3- Por isto, é plena a compatibilidade do art. 475-0, § 2º, I, com o processo do trabalho, pois facilita e agiliza a execução do crédito trabalhista, de natureza tipicamente alimentar, fruto do trabalho humano, que a Constituição da República colocou como fundamento da República e base da ordem econômica e social- artigos 1º, IV, 170 e 193.

4- Ao garantir a tempestividade da prestação jurisdicional em tempo razoável bem como os meios de efetivar sua rápida tramitação- art. 5º, LXXVIII, a Constituição emitiu preceito que se destina não só ao legislador, para criar os meios e revolver os obstáculos à duração razoável dos processos, mas também ao juiz, para concretizar, em qualquer ramo do processo, dispositivos que favoreçam e possibilitem a realização do desejo constitucional, que a aplicador da lei da lei não pode negar nem obstar.

5- Sendo o Processo do Trabalho o meio por excelência de efetivação dos créditos alimentares, que resultam do trabalho humano, bem constitucional repetidamente prezado nos artigos já citados, é dever do intérprete dotá-lo de todas as conquistas que o moderno direito processual criou para garantir ao cidadão a efetividade de seus direitos, sob pena de ferir o espírito da Constituição e impedir a eficácia de seus preceitos.

GARANTIA DE EXECUÇÃO - HIPOTECA JUDICIÁRIA.

O art. 466 do CPC determina que " A sentença que condenar o réu no pagamento de uma prestação, consistente em dinheiro ou coisa, valerá como título constitutivo de hipoteca judiciária, cuja inscrição será ordenada pelo juiz na forma prescrita na Lei de Registros Públicos. Parágrafo único: A condenação produz a hipoteca judiciária I-embora a condenação seja genérica II- pendente arresto de bens do devedor. III- Ainda quando o credor possa promover a execução provisória da sentença. Portanto, havendo condenação em prestação de dinheiro ou coisa, automaticamente se constitui o título da hipoteca judiciária, que incidirá sobre os bens do devedor, correspondentes ao valor da condenação, gerando o direito real de seqüela, até seu pagamento. A hipoteca judiciária é de ordem pública, independe de requerimento da parte e visa garantir o cumprimento das decisões judiciais, impedindo o desbaratamento dos bens do réu, em prejuízo da futura execução. Ao juiz cabe envidar esforços para que as decisões sejam cumpridas, pois a realização concreta dos comandos judiciais é uma das principais tarefas do Estado Democrático de Direito, cabendo ao juiz de qualquer grau determiná-la, em nome do princípio da legalidade. Para o cumprimento da determinação legal o juiz oficiará os cartórios de registro de imóveis. Onde se encontrarem imóveis registrados em nome da reclamada, sobre eles incidirá, até o valor da execução, a hipoteca judiciária.

MULTAS ADMINISTRATIVAS - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO.

A Justiça do Trabalho, na forma do art. 114 da C.F., é competente para aplicar multas da alçada da autoridade administrativa, quando a violação de norma trabalhista estiver provada nos autos.

Nos dissídios entre empregados e empregadores compreende-se também a competência para aplicação de multas (CLT, art. 652, "d").

Se é da competência da Justiça do Trabalho decidir sobre o direito trabalhista, é claro que é ela também competente, por natural ilação, para aplicar a multa que derive do direito reconhecido em sua sentença, pois se trata de um dissídio típico entre empregado e empregador, derivado da relação de trabalho. Apenas se diferencia do dissídio comumente decidido num aspecto: em vez de ter uma função ressarcitória, a multa possui finalidade punitiva.

Esta função é na prática tão importante quanto a condenação patrimonial, para a garantia do ordenamento trabalhista. Como os mecanismos ressarcitórios são insuficientes, a multa reforça a condenação e ajuda no estabelecimento de um quadro desfavorável ao demandismo, pois a protelação passa a ser um ônus e não uma vantagem para o devedor.

Só assim se extinguirá esta litigiosidade absurda que hoje se cultiva na Justiça do Trabalho, sem dúvida, a maior e a mais cara do mundo. Além do mais, se garantirá o efeito educativo da lei, com a reversão da expectativa que hoje reina no fórum trabalhista: é melhor cumpri-la e pagar o débito, do que empurrá-lo anos afora, pelo caminho tortuoso e demorado dos recursos trabalhistas. Os juros reais e as multas desestimularão o negócio que hoje se pratica, em nome da controvérsia trabalhista e à custa do crédito do trabalhador.

1- RELATÓRIO

Ao de fls. 341/342, acrescento que o Exmo. Juiz Alexandre Chibante Martins, no MM. Posto Avançado de Iturama julgou procedentes em parte, os pedidos, para condenar o reclamado à satisfação dos direitos elencados na conclusão de fls. 395/398.

As partes interpuseram recursos ordinários; o autor, pugnando por ampliação da base de cálculo do adicional de insalubridade e requerendo que a contribuição previdenciária seja suportada apenas pelo réu; o reclamado, insurgindo-se contra a condenação; tudo nos termos das razões de fls. 402/424 e 426/471 e conforme análise que se fará nos fundamentos.

Mandatos regulares.

Preparo realizado.

Contra-razões oferecidas.

É o relatório.

2- FUNDAMENTOS

2.1- Recurso Do Reclamante

2.1.1- Admissibilidade

Conheço do recurso porque atendidos os pressupostos legais.

2.1.2- Mérito

2.1.2.1- Base De Cálculo Do Adicional De Insalubridade

Na inicial, o autor requereu adicional de insalubridade sobre a remuneração efetivamente recebida, e foi atendido em parte pelo Juízo, que a deferiu sobre o salário básico; o autor não se conforma, requerendo a base de cálculo conforme postulada na exordial.

Assiste-lhe razão, data venia da brilhante motivação expendida a respeito no r. julgado.

Com efeito, sempre defendi que ao dispor a Constituição da República, no art. 7º, inciso XXIII, o termo "remuneração" em vez de "salário" para qualificar o adicional que deve ser pago pelo trabalho prestado em condições penosas, insalubres ou perigosas, o legislador constituinte teve clara intenção de aumentar a base sobre a qual incide o trabalho realizado em condições adversas, revogando assim o art. 192 da CLT. Esta interpretação está autorizada, não só pela clara distinção entre remuneração e salário, assentada pelo próprio legislador consolidado no art. 457, da CLT, como também pelo espírito do legislador constituinte ao prometer, no inciso XXII do art. 7º, "redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança". Qualquer outra interpretação colocaria a Constituição em contradição consigo própria pois, enquanto promete a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, facilita sua prestação, permitindo que o empregador pague menos pelo trabalho exercido em condições desfavoráveis. Jamais se preservará o trabalho, valor repetidamente estimado pela Constituição Brasileira (art. 1º, item IV, art. 170 e 193) sem se preservar o trabalhador que é a fonte única dos bens e serviços de que carece toda e qualquer coletividade organizada.

Portanto, a base de cálculo do adicional de insalubridade, assim como o de periculosidade (que nos termos constitucionais também deve ser sobre a remuneração), insere-se seguramente no que estabelece o artigo 7o, inciso XXIII/CR, independentemente da suspensão provisória, pelo C. STF, da Súmula 228/TST em sua nova redação. Inclusive por ser inconcebível o entendimento no sentido de que a súmula não seria vinculante apenas para o fim trabalhista. Destaque-se que o C. TST mantém a Súmula 228, na atual redação. A propósito, ao rejeitar a vinculação ao salário mínimo, para acolher o salário base para remunerar o adicional focalizado, com grande propriedade, assim esclareceu a r. sentença:

"O Art. 4º da Lei 11.417, de 19 de dezembro de 2006 (que regulamenta o art. 103-a da Constituição Federal de altera a Lei no 9.784, de 29 de janeiro de 1999, disciplinando a edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal, e dá outras providências) dispõe que: "(...) A súmula com efeito vinculante tem eficácia imediata, mas o Supremo Tribunal Federal, por decisão de 2/3 (dois terços) dos seus membros, poderá restringir os efeitos vinculantes ou decidir que só tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse público.".

Como ainda não há restrição aos efeitos da Súmula Vinculante no 04 e sequer decisão quanto a outro momento de sua eficácia, as diferenças do adicional de insalubridade pago pelo reclamado deverá estar baseado no salário base do reclamante [aqui substituído pela remuneração do reclamante, pelo mesmo motivo]..." - fls. 363/364.

Provejo, fixando a base de cálculo do adicional em tela pela efetiva remuneração do autor, que inclui o adicional noturno habitualmente pago (cf. recibos salariais) e as horas extras, que, acrescendo-se as pagas às deferidas, são indubitavelmente habituais, tal como reconhece o r. julgado (v. f. 347, esp. últimas linhas).

2.1.2.2- Contribuições Previdenciárias

O autor requer que todo o encargo previdenciário decorrente do feito seja suportado pelo réu; invoca o art. 33, parágrafo 5º da Lei 8212/91 e colaciona jurisprudência.

Não lhe assiste razão.

Além da inicial não apresentar pedido neste sentido, de qualquer forma o autor não poderia ser atendido porque a invocada norma, conforme emana dos seus claros termos, diz respeito às hipóteses em que o empregador, na vigência do pacto, não deduz ou simplesmente não recolhe a contribuição previdenciária de direito do INSS, incidente sobre os valores pagos aos empregados.

No caso, temos direitos que ainda não foram pagos, frutos de controvérsia dirimida através da r. sentença, razão pela qual corretamente se aplicou o Provimento 01/99 do TRT-3ª Região e Súmula 368/TST.

Nada a prover.

2.2- Recurso Do Reclamado

2.2.1- Admissibilidade

Atendidos os pressupostos legais conheço do recurso e o recebo no efeito devolutivo (art. 899 da CLT), facultando ao reclamante a execução provisória até a penhora.

O art.475-O do CPC, com redação dada pela Lei 11.232/05, diz, no § 2º, que "A caução a que se refere o inciso III do caput deste artigo poderá ser dispensada:

I - quando, nos casos de crédito de natureza alimentar ...até sessenta vezes o valor do salário-mínimo, o exeqüente demonstrar situação de necessidade".

O crédito trabalhista, conforme reconhecimento expresso da Constituição brasileira, art. 100, § 1º, tem natureza alimentar, pois envolve salário ou parcelas a ele conexas, mesmo quando são impropriamente designadas de "verbas indenizatórias".

A situação de necessidade do empregado é presumida no Direito do Trabalho, que existe, como ramo da Ciência do Direito, exatamente para supri-la, dotando o trabalhador de vantagens jurídicas para compensar a superioridade econômica do empregador. Tutela jurídica para compensar a desigualdade social foi sempre na História a finalidade do Direito do Trabalho.

O artigo 475-O do CPC tem plena compatibilidade com o processo do trabalho e contribui efetivamente para dinamizar a execução trabalhista, dotando-a de maior rapidez, eficiência e dinamismo.

A aplicação analógica do art.455-O (art. 769 da CLT), além de modernizar a execução trabalhista, compatibiliza-a com o mandamento constitucional do art. 5º, LXXVIII, que diz "A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação". Tem total pertinência o art. 769 da CLT.

Se, por razões de solidariedade social, o próprio Processo Civil permitiu a dispensa de caução para levantamento de depósito, com muito mais razão se deve aplicar o mesmo princípio no âmbito da execução trabalhista, que trata da realização de crédito tipicamente alimentar, resultado de trabalho humano, que a Constituição brasileira colocou como fundamento da República (art. 1º, IV da CF), bem como da ordem econômica, que se funda "na valorização do trabalho humano e da livre iniciativa" ( art. 170) e da ordem social, "que tem como base o primado do trabalho e como objetivo o bem estar social".

É dever do intérprete aplicar tais princípios de forma que sejam uma realidade da vida e não apenas um programa constitucional.

Com base em tais considerações, faculto ao reclamante levantar, do depósito que existe nos autos, quantia até 60 salários mínimos.

Caso haja recurso de revista, fica-lhe facultado requerer carta de sentença para cumprir o presente despacho na instância inferior. Se não houver a interposição de recurso, poderá efetivar o levantamento, que ora se defere perante o juiz do primeiro grau imediatamente após o retorno dos autos.

2.2.2- Mérito

2.2.2.1- Diferenças De Horas Extras - Reflexos

A reclamada não se conforma com as horas extras deferidas ao reclamante; diz que as normas para compensação de jornada que contêm os ACT são válidas (essencialmente as relativas aos ACT de fls. 207/231, porque seriam fruto da vontade da maioria, em assembléias), benéficas ao reclamante e que assim não se aplicaria a Súmula 85/TST, adotada pelo Juízo de origem; assevera que não ter havido habitualidade conforme cartões de ponto de fls. 118/200, e que a demonstração que o autor apresentou não considerou a compensação de jornada, sendo, por isso, equivocada; requer, por cautela, que a base de cálculo da condenação observe a evolução salarial do autor.

Sempre defendi o entendimento de que as convenções e os acordos coletivos devem ser respeitados, porque assim estabelece a Constituição da República -artigo 7º, inciso XXVI.

São frutos da negociação coletiva, onde são sempre representadas as categorias, profissional e econômica, por suas respectivas entidades sindicais.

O Estado afastou-se da organização sindical. Garantiu sua liberdade a Constituição da República promulgada em 1988 que, além da autonomia, também lhe conferiu grande importância, elevando os seus entes à condição e qualidade de defensores, por excelência, dos direitos e interesses da categoria.

Assim, e considerado o princípio do conglobamento, não será o Poder Judiciário quem deixará de conferir validade às negociações coletivas.

Logo, o que estipularem as normas autônomas no regramento da jornada, deverá ser devidamente acatado. Conforme a jurisprudência, há exceção quanto ao intervalo intrajornada, por adoção do entendimento preconizado pelo C. TST, na OJ 342/SDI-1/TST, que se justifica pela inserção do intervalo em norma de ordem pública, visando à saúde e higiene mental do trabalhador.

No caso, ocorre fato semelhante. Dentre as demais razões que levaram o Juízo de origem a não considerar válido o banco de horas acordado, acresço fato essencial: o autor trabalhava em condições insalubres e, apenas por essa razão, não poderia prorrogar sua jornada (ainda que posteriormente compensada), senão mediante inspeção e aprovação da autoridade competente, ou de autorização específica, explícita, indene de dúvida, em acordo coletivo ou convenção coletiva, do que não se tem notícia nos autos. Confira-se a Súmula 349/TST:

Súmula Nº 349 do TSTACORDO DE COMPENSAÇÃO DE HORÁRIO EM ATIVIDADE INSALUBRE, CELEBRADO POR ACORDO COLETIVO. VALIDADE (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

A validade de acordo coletivo ou convenção coletiva de compensação de jornada de trabalho em atividade insalubre prescinde da inspeção prévia da autoridade competente em matéria de higiene do trabalho (art. 7º, XIII, da CF/1988; art. 60 da CLT).

Assim, a Súmula 349 e o artigo 60 da CLT, este, dispondo em relação às "atividades insalubres", serem vedadas quaisquer prorrogações, a não ser que sejam "acordadas mediante licença prévia das autoridades competentes em matéria de higiene do trabalho, as quais, para esse efeito, procederão aos necessários exames locais e à verificação dos métodos e processos de trabalho, quer diretamente, quer por intermédio de autoridades sanitárias federais, estaduais e muncipais, com quem entrarão em entendimento para tal fim.".

No mais, acresço os substanciais motivos expressos no r. julgado, a exemplo de demonstrações específicas (v. f. 347), utilizando os cartões de ponto (acolhidos como verdadeiros) e recibos salariais, de que havia habitualidade na prestação da jornada extraordinária, e assim corretamente aplicando ao caso a Súmula 85, IV/TST, preconizando:

"A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Nesta hipótese, as horas que ultrapassarem a jornada semanal normal deverão ser pagas como horas extraordinárias e, quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago a mais apenas o adicional por trabalho extraordinário."

A pré-contratação de horas extras é vedada porque representa afronta os limites legais diários, sendo de oito horas o estabelecido na Constituição da República. E trabalhando o autor em atividade insalubre, a referida pré-contratação deve ser sumariamente refutada. Assim, destaco ainda a não validade do acordo individual para prorrogação da jornada, que é nos seguintes termos: "a) A duração do trabalho diário será prorrogada por mais (02:00) horas, sendo consideradas extraordinárias, e pagas com acréscimo, as horas que excederem as do horário normal de trabalho (quarenta e quatro semanais)." - f. 79.

Como bem diz a r. sentença à f. 350, nos exemplos citados pelo reclamante à fl. 236, temos que ele normalmente trabalhava mais de oito horas diárias, chegando à média de mais de dez horas diárias, sendo que em vários dias de trabalho gozou menos de uma hora de intervalo descanso/refeição (isto, de acordo com os cartões de ponto acostados aos autos). Portanto, correto o Juízo de origem ao concluir:

"Penso que a idéia de um banco de horas não poderia, ao ser implementado, criar uma jornada média de dez horas (ou até superior a dez horas diárias). Um dia ou outro, além da 8ª hora, é admissível. Mas uma jornada que, quase diariamente, ultrapassa as oito horas diárias, é fazer letra morta do citado inc. XIII do art. 7º da Carta Magna de 1988." -f. 351, último parágrafo.

Logo, irrelevante o argumento de que o banco de horas foi observado, e que na demonstração dele, o autor não teria considerado tal fato.

Por todo o exposto, e lembrando, ainda uma vez, que o autor trabalhava em condições insalubres, nego provimento, ressalvando-se, apenas, o pedido de que, quando da liquidação e na apuração do quantum devido ao título, seja observada a evolução salarial do autor, que obviamente, inclui o adicional de insalubridade deferido.

2.2.2.2- "Da Base De Cálculo

Do Adicional De Insalubridade"

Sob o título em epígrafe, o réu se volta contra a base de cálculo acolhida na r. decisão. Todavia, o inconformismo e respectivas razões recursais têm seu exame prejudicado em face do provimento que, em relação ao tema, deu-se ao recurso do autor. Tudo conforme fundamentos expendidos no item 2.1.2.1, supra, que, inclusive, superam a argumentação expendida no apelo do réu, quanto ao particular.

Logo, nada a prover.

2.2.2.3- Do "Dumping Social"

Quanto à condenação ao título de "dumping social", o reclamado se insurge contra ela tecendo considerações a respeito da expressão em sua origem. Discorre, ainda, sobre o significado que, no entendimento dela, se encontraria no conceito, o que assim resume: "Em suma, o "dumping social", seria a pratica abusiva de mão-de-obra barata e superexplorada, praticada na produção de produtos que tornariam os seus preços mais competitivos para o mercado, em busca de "burlar" a lei trabalhista, o que in casu não ocorreu; e, por cautela, requer a redução do valor fixado ao título.

Não lhe assiste razão.

Como bem expõe o r. julgado, são centenas de reclamações trabalhistas contra o réu, veiculando jornada excessiva com horas extras inadimplidas que, no caso, é de gravidade ímpar pelo trabalho em condições insalubres, sem que houvesse a autorização na forma legal.

As considerações apresentadas pela reclamada não são hábeis a refutar tais concretos fatos; ao contrário, pois por um lado as ações trabalhistas evidenciam a precarização das relações de trabalho com os empregados dela e, por outro, ela mesma informa ser a maior empresa do ramo no mundo, com cerca de 60.000 trabalhadores.

Quanto ao entendimento a respeito do tema, doutrinário e jurisprudencial, o que expressa o d. Juízo originário é abalizado por diversos juristas, professores e magistrados, todos devidamente mencionados na r. sentença, assim como suas obras e julgados.

Os juízes do trabalho já se posicionaram sobre a questão em face da Justiça do Trabalho, conforme Enunciado n. 4, da 1ª Jornada de Direito Material e Processual da Justiça do Trabalho, organizada pela Anamatra e realizada nos dias 21 a 23 de novembro de 2007, no Tribunal Superior do Trabalho, em Brasília, nos seguintes termos: "DUMPING" SOCIAL. DANO À SOCIEDADE. INDENIZAÇÃO SUPLEMENTAR. As agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas geram um dano à sociedade, pois com tal prática desconsidera- se, propositalmente, a estrutura do Estado social e do próprio modelo capitalista com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência. A prática, portanto, reflete o conhecido 'dumping social', motivando a necessária reação do Judiciário trabalhista para corrigi-la. O dano à sociedade configura ato ilícito, por exercício abusivo do direito, já que extrapola limites econômicos e sociais, nos exatos termos dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil. Encontra-se no art. 404, parágrafo único, do código Civil, o fundamento de ordem positiva para impingir ao agressor contumaz uma indenização suplementar, como, aliás, já previam os arts. 652, 'd' e 832, § 1º, da CLT."

Se o "dumping social" teve seu conceito advindo da transferência de empresas de regiões de mão de obra "cara", para regiões do planeta onde o trabalho era remunerado de forma ínfima, quase análoga à condição do escravo, não se deve engessá-lo, mas, sim, atualizá-lo, segundo as experiências que vão surgindo e sem nos olvidarmos das conquistas sociais anteriores, de forma a não se incentivar os retrocessos sociais. Assim, a substancial e moderna análise que, quanto ao particular, forma os fundamentos da r. sentença, por completa e absolutamente pertinente, além de essencialmente jurídico-legal, não carece de acréscimos, e por isso é mantida, por seus próprios e jurídicos fundamentos, inclusive quanto ao valor fixado (R$2.000,00), condizentes com os critérios abalizadores da indenização. Para não sermos prolixos, não os transcrevo à íntegra; todavia, destaco os seguintes trechos:

"(...) Neste aspecto, ademais, as grandes empresas em vez de ficarem, nos processos trabalhistas, opondo-se, sem qualquer razão jurídica ou mesmo de ordem econômica, com teses jurídicas, extraídas de um formalismo arcaico, apenas para negar sua responsabilidade perante as agressões aos direitos humanos (e, por certo, o Direito do Trabalho é a feição principal dos direitos humanos na sua dimensão social) dos que trabalharam em estabelecimento que ostentava as suas marcas ou cujo trabalho serviu para o desenvolvimento da (sic) suas atividades econômicas, deveriam fazer valer, em concreto, o compromisso que assumem, publicamente, de respeitar os direitos humanos. (...)Ora, a responsabilidade social assumida pelas empresas implica, no mínimo, que não se neguem a pagar os direitos trabalhistas daqueles cujo trabalho lhes serviu, ainda que indiretamente. Por uma falta de visão realmente ética e mesmo do alcance da noção jurídica da responsabilidade trabalhista as grandes empresas, muitas delas, impõem sacrifícios aos trabalhadores, empunhando teses jurídicas que lhes excluem de qualquer responsabilidade. (...)Importa compreender que os direitos sociais são o fruto do compromisso firmado pela humanidade para que se pudesse produzir, concretamente, justiça social dentro de uma sociedade capitalista. Esse compromisso em torno da eficácia dos Direitos Sociais se institucionalizou em diversos documentos internacionais nos períodos pós-guerra, representando também, portanto, um pacto para a preservação da paz mundial. Sem justiça social não há paz, preconiza o preâmbulo da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Quebrar esse pacto significa, por conseguinte, um erro histórico, uma traição a nosso antepassados e também assumir uma atitude de descompromisso com relação às gerações futuras. (...)O desrespeito aos direitos trabalhistas representa, conseqüentemente, uma crime contra a ordem econômica, conforme definido no art. 20, inciso I, da Lei n. 8.884/94, punível na forma do art. 23, inciso I, da mesma lei. Nos termos da lei em questão, "Serão solidariamente responsáveis as empresas ou entidades integrantes de grupo econômico, de fato ou de direito, que praticarem infração da ordem econômica" (art. 17), o que elimina, aliás, qualquer possibilidade de discussão quanto à responsabilidade de todas as empresas (tomadoras, prestadoras etc.) que, de algum modo, se beneficiam economicamente da exploração do trabalho humano sem respeito ao retorno social necessariamente conseqüente. O art. 170 da Constituição brasileira é claro ao estipular que "a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social", observados, dentre outros, os princípios da função social da propriedade (inciso III) e da busca do pleno emprego (inciso VIII). O próprio Código Civil não passou em branco a respeito, fixando a função social do contrato (art. 421 e § 1º do art. 1.228). (...) A eficácia das normas de natureza social depende, certamente, dos profissionais do direito (advogados, juízes, procuradores, professores, juristas em geral), mas também de um sentido ético desenvolvido em termos concorrenciais, para que reprimendas sejam difundidas publicamente aos agressores da ordem jurídica social a fim de que a sociedade tenha ciência da situação, desenvolvendo-se uma necessária reação até mesmo em termos de um consumo socialmente responsável, com favorecimento às empresas que têm no efetivo respeito aos direitos sociais o seu sentido ético. (...) Nunca é demais recordar que descumprir, deliberada e reincidentemente, a legislação trabalhista, ou mesmo pôr em risco sua efetividade, representa um descomprometimento histórico com a humanidade, haja vista que a formação do Direito do Trabalho está ligada diretamente com o advento dos direitos humanos que foram consagrados, fora do âmbito da perspectiva meramente liberal do século XIX, a partir do final da 2ª Guerra Mundial, pelo reconhecimento de que a concorrência desregrada entre as potências econômicas conduziu os países à conflagração.(...) Como critério para apuração da repercussão social das agressões ao Direito do trabalho, pode-se valer da noção jurídica da reincidência,trazida, expressamente, no art. 59 da Lei n. 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) e que, no Direito Penal, constitui circunstância agravante da pena (art. 61, I, CP) e impede a concessão d fiança (art. 323, III, CP). Outro critério é o da avaliação quanto a ter uma atitude deliberada e assumida de desrespeito à ordem jurídica, como, por exemplo, a contratação sem anotação da Carteira de Trabalho ou a utilização de mecanismos para fraudar a aplicação da ordem jurídica trabalhista, valendo lembrar que o ato voluntário e inescusável é, igualmente, uma valor com representação jurídica, haja visto o disposto no inciso LXVII do art. 5º da CF. (...)Portanto, nas reclamações trabalhistas em que tais condutas forem constatadas (agressões reincidentes ou ação deliberada, consciente e economicamente inescusável de não respeitar a ordem jurídica trabalhista), tais como: salários em atraso; pagamento de salários "por fora"; trabalho em horas extras de forma habitual, sem anotação em cartão de ponto de forma fidedigna e o pagamento do adicional correspondente; não recolhimento do FGTS; não pagamento das verbas rescisórias; ausência de anotação da CTPS (muitas vezes com utilização fraudulenta de terceirização, cooperativas de trabalho, estagiários, temporários etc.); não concessão de férias; não concessão de intervalo para refeição e descanso; trabalho em condições insalubres e perigosas, sem eliminação concreta dos riscos à saúde etc., deve-se proferir condenação que vise à reparação específica pertinente ao dano social perpetrado, fixada ex officio (destaque e grifos meus) pelo Juiz da causa, pois a perspectiva não é a da mera proteção do patrimônio individual. Da mesma forma, a atitude deliberada, consciente e economicamente inescusável de se agredir a ordem jurídica, com utilização de tática. (...) À esta necessária ação do juiz, em defesa da autoridade da ordem jurídica, sequer se poderia opor com o argumento de que não há lei que o permita agir desse modo, pois seria o mesmo que dizer que o direito se nega a si mesmo, na medida em que o juiz, responsável pela sua defesa, não tem poderes para fazê-lo. Os poderes do juiz, neste sentido, portanto, são o pressuposto da razão de sua própria existência. De todo modo, essa objeção traz consigo o germe de sua própria destruição na medida em que o ordenamento jurídico pátrio, em diversas passagens, atribui esse poder ao juiz. Como fundamentos positivistas da reparação do dano social é possível citar, por exemplo, o art. 404, parágrafo (sic) único, do Código Civil e os arts. 832, § 1º, e 652, "d", da CLT, todos inseridos, aliás, no âmbito das contendas individuais. (...)Além disso, o art. 84 do mesmo Código (Código de Defesa do Consumidor, adendo meu) garante ao juiz a possibilidade de proferir decisão alheia ao pedido formulado, visando a assegurar o resultado equivalente ao adimplemento(...). Como se vê, a possibilidade de o juiz agir de ofício para preservar a autoridade do ordenamento jurídico foi agasalhada pelo direito processual, e no que se refere ao respeito à regulamentação do Direito do Trabalho constitui até mesmo um dever, pois o não cumprimento convicto e inescusável dos preceitos trabalhistas fere o próprio pacto que se estabeleceu na formação do nosso Estado Democrático de Direito Social, para fins de desenvolvimento do modelo capitalista em bases sustentáveis e com verdadeira responsabilidade social. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não foi alheia ao fenômeno, atribuindo ao juiz amplos poderes instrutórios (art. 765) e liberdade para solução justa do caso na perspectiva da eqüidade, conforme previsão dos arts. 8º e 766, não se esquecendo da perspectiva dos efeitos sociais, conforme regra do já citado art. 652, "d". Diante de tudo isso, o que se espera do Judiciário é que se faça valer todo o aparato jurídico para manter a autoridade do ordenamento jurídico no aspecto da eficácia das normas do Direito Social, não fazendo vistas grossas para a realidade, não fingindo que desconhece a realidade em que vive, e não permitindo que as fraudes à legislação trabalhista tenham êxito. Sobretudo, exige-se do Judiciário que reconheça ser sua a obrigação de tentar mudar a realidade quando em desacordo com o Direito. (...) O que se exige do juiz é que, diante de fato demonstrado, que repercute no interesse social penalize o agressor para desestimulá-lo na repetição da prática e para compensar o benefício econômico já obtido. A medida corretiva, assim, vai desde a condenação ao pagamento de uma indenização adicional (ou suplementar), destinada ao autor da ação individual, em virtude da facilidade e implementação da medida, até a determinação de obrigação de fazer, voltadas a práticas de atos em benefício da comunidade. (...)O que não se pode, de jeito algum, é deixar que o dano social, reconhecido perante um ou vários processos judiciais, reste impune. (...)a fixação de uma pena pecuniária ao agressor contumaz e convicto da ordem jurídica trabalhista, com destinação para o autor da ação individual, parece-me o modo mais adequado de reparar o dano social, por ser uma decisão mais facilmente executável. (...)

O labor em jornada extraordinária além da 10ª hora diária, em uma empresa com alto risco de acidentes implica em um ganho por trabalhador além do razoável. Afinal, o trabalhador pode acidentar-se e a existência de um banco de horas impele o trabalhador, que busca sempre uma melhor condição de vida sócio-econômica, a laborar além de seu limite. Ganha-se com a idéia de que o banco de horas é favorável. Com todo o respeito aos defensores de tal idéia, o banco de horas, na forma como posto aqui, não é, de forma alguma, favorável ao trabalhador, pois a compensação,se acontecesse e fosse admitida, deveria levar em consideração o fato de que a hora extra tem um adicional de 55% (no caso em tela,adicional convencional). Assim, a compensação deveria ser de uma hora de trabalho para uma hora e 33min (tendo-se me vista o percentual de 55% aplicado à 60min) de descanso. Quando se compensa uma hora por uma hora deixa-se de levar em consideração que a hora extraordinária tem um valor superior à hora normal.

Importa destacar também que o não respeito ao intervalo inter jornada (ou normas de segurança e medicina do trabalho) além de prejudicar a saúde e o convívio familiar do trabalhador, também implicou no não respeito à clausula convencional, pois não se verifica nos recibos de pagamento o destaque do pagamento de parcela referente às horas extras com adicional de 100% referentes ao intervalo inter jornada não usufruído na integralidade.

Tal diferença de valores, quando multiplicada pelo número de empregados de apenas uma unidade do reclamado (e o reclamado possui várias unidades no Brasil...) acaba por gerar um valor significativo à empresa, redundando em uma redução do custo do produto e um lucro maior na venda. Muitos trabalhadores sequer reclamam seus direitos quando dispensados, outros tantos fazem acordos por valores inferiores ao efetivamente devido e apenas uma pequena parcela dos trabalhadores insiste na demanda até o fim, o que faz com que as empresas acabem por lucrar com o tempo do processo (recorre-se sem peias, buscando muitas vezes a longevidade, de todo indesejável, do processo)... . Eis, aí, uma forma de "dumping" social....

(...)

O valor da indenização a título de responsabilidade social - dumping social - será fixado tendo em vista os seguintes parâmetros já adotados pela doutrina e jurisprudência pátrias: extensão do dano; culpa do agente; potencial econômico do ofensor; observação do caráter pedagógico da sanção (punição com intuito de evitar-se a reincidência na prática lesiva e surgimento de novos casos, para que ocorra a adequação do ofensor ao comportamento estabelecido no ordenamento jurídico pátrio);uso da equidade; indenização com o objetivo de servir de compensação ao reclamante, sem que haja enriquecimento sem causa deste, levando-se em consideração o caso em tela e a gravidade do dano e a repercussão pessoal e social.

Por outro lado, foram protocolizadas, nos últimos 05 (cinco) anos, mais de 600 (seiscentas) demandas em face do reclamado, versando sobre pagamento de horas extras, intervalo intrajornada e adicional de insalubridade, números aferíveis pelos sistemas deste Egrégio TRT da 3ª Região. Veja-se, também, a relação indicada pelo reclamante às fls. 14/16, indicando processos onde o reclamado encontra-se no pólo passivo.

Pelo acima exposto, e pelo que dos autos constam (jornada extraordinária além da 10ª hora diária em empresa enquadrada no risco três - INSS - em termos de riscos ergonômicos para os trabalhadores e o risco de acidentes), fixo uma sanção pecuniária, a favor do reclamante, a ser paga pelo reclamado, no importe de R$2.000,00 (dois mil reais), em parcela única, com espeque nos arts. 186, 187, Parágrafo único do art. 404, 927 e 1553 todos do Código Civil; arts. 8º 'caput'; 652, 'd', 769 e 832, § 1º todos da CLT.

Juros contados a partir de 03/agosto/04 - período não prescrito.

Correção monetária a partir da data da publicação desta decisão, no pertinente à indenização por 'dumping' social" - fls. 366/376.

Por todo o exposto, nego provimento.

2.2.2.4- Honorários Advocatícios Obrigacionais

O pedido de honorários advocatícios foi julgado procedente, com o que não se conforma o réu.

Não lhe assiste razão.

1- REPRESENTAÇÃO E DIREITO

A representação é uma constante na história da humanidade.

O ser humano, a partir do momento em que vive em sociedade, não pode agir apenas por si próprio. Delega necessariamente atividades a outras pessoas e delas recebe também delegações, para a satisfação de interesses que, em sua grande maioria, precisam do concurso alheio na complexa rede de atividades humanas.

A sociedade humana é um fazer conjunto, em que um consórcio de pessoas trabalha reciprocamente para prover necessidades comuns.

Esta criatividade permanente não tem limites e está em constante atuação, pois as necessidades humanas variam de povo para povo e de época para época.

Por não poder ser onipresente, o homem se faz representar para multiplicar a presença e atender a carências que a pessoa individualmente não pode realizar. Todo o esforço da humanidade se concentra na criação de meios para suprir as distâncias entre pessoas e nações: o telefone, o avião, a Internet são aspectos desta tendência que substitui os meios lentos e tradicionais do transporte por terra ou por mar.

A comunicação fez o homem espalhar-se pelo mundo, num intercâmbio de raças, culturas, comércio de bens e experiências. Praticar atos em nome de outrem é um aspecto desta ampla cadeia que transformou o mundo numa realidade única em que os meios modernos exercitam o fantástico papel da integração econômica e social dos povos.

"O que está acontecendo?" pergunta Thomas L. Friedman. E ele mesmo responde: "Trata-se de um processo denominado insourcing - internacionalização, uma nova forma de colaboração e criação horizontal de valor, que é possibilitada pelo achatamento do mundo e ao mesmo tempo contribui ainda mais para o seu nivelamento". (Friedman, Thomas L. O mundo é plano uma breve história do século XXI. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005, p.168.)

Expansão é sinônimo de representação, pois cada indivíduo, grupo, empresa e país se expandem numa sucessão de negócios em cadeia, através de representações sucessivas, que constituem hoje a força geratriz da integração econômica do mundo em todas as direções.

Como a mão individual não pode fazer tudo, nem ao homem é facultado estar presente em todas as atividades, que ele mesmo cria, surge a necessidade da representação, pela qual uma pessoa age em função de outra, para que a sociedade opere em termos plenamente satisfativos das múltiplas necessidades que se vão criando no fluir da história, através dos tempos. Exatamente para que o mundo se torne "plano" e "achatado", no dizer de Friedman.

Tudo começou em função de interesses imediatos através do Direito Privado, para a satisfação de necessidades imediatas e próximas, que podiam transcender a pessoa, mas não iam além do círculo em que atuava.

A estrutura obrigacional, vinculativa das pessoas para o fim designado no contrato, permitiu que uma agissse em função de outra para a realização de interesses pessoais e econômicos.

Nasceu assim a figura do contrato, já no fim da República romana, para estabelecer combinação ou entendimento entre pessoas, indicando um aperfeiçoamento da vida social em que os homens já se mostravam capazes de praticar entendimentos recíprocos para a realização de fins comuns, mesmo não estando em contato direto uns com os outros.

O termo foi usado seguido de um complemento nominal: contractus stipulacionis - contrato para uma celebração; contractus emptionis, etc. Antes, em fase anterior e menos desenvolvida, guardou fidelidade com a etimologia contractus, de contrahere, que provém de trahere, puxar, arrastar, pressionar uma coisa com outra. Foi empregado por Varrão em sua De Re Rustica como uva compactada.

Daí evoluiu e refinou o sentido, como acontece normalmente na linguagem humana, passando a designar relações abstratas, ou seja, contrair não apenas um objeto físico, mas uma combinação ou acordo (Schuz, Fritz. Derecho romano clássico. Barcelona: Bosh, 1960, p.446.).

A obrigação embutida no mandato determinada pelo mandator ao mandatarius era gratuita e correspondia à concepção ética republicana de que um amigo deveria ajudar o outro e fazer por ele algo útil e necessário.

Quando Cícero foi desterrado e sua família caiu em dificuldades, escreveu (Ad fam. 14.1.5): si erunt in officio amici, pecunia non deerit. Enquanto estiverem sob o encargo (a proteção) dos amigos, o dinheiro não faltará (Schuz, Fritz. Op.cit., p. 531.).

O mandatum, na sua fase romana, era gratuito. Mas, com a evolução das relações sociais, passou-se a admitir a concessão de honorários, principalmente quando se delegava a alguém a defesa de interesses em juízo e também em casos de intermediação para realização de contratos de compra e venda (Maynes, Charles. Cours de droit romain. Bruxelles: T. 2º, sem ed., 1891, p. 255.).

Com o aumento da complexidade da vida social, o mandato passou a ser oneroso e assumiu o conteúdo econômico das obrigações em geral, figurando, nesta condição, em todos os códigos modernos de Direito Civil do mundo atual.

2- A REPRESENTAÇÃO JUDICIAL EM ROMA

Considerando o Direito Romano a gratuidade do mandato uma regra e o pagamento de honorários uma exceção, não era comum a delegação da prática de atos judiciais por outra pessoa. Tratava-se de uma categoria intuitu personae e o próprio interessado praticava os atos necessários à defesa de seu interesse.

Numa sociedade pouco complexa, cuja plena cidadania se limitava à cidade de Roma, a pessoalidade ainda era a regra de tudo. Embora, mesmo durante a República, já houvesse ampla expansão do império romano, a relação jurídica nas províncias e possessões era instável e improvisada, baseando-se muito na autoridade dos governadores e chefes militares do que propriamente na lei (Rostovtzeff, MJ. História de Roma. Rio de Janeiro: Zahar, 1967, p.229. Gibbon, Edward. Declínio e queda do império romano. São Paulo: Cia das letras, 1989, p.74 fala em lugares-tenentes do imperador que assumiam em nome dele o poder.).

Para facilitar e tornar possível a realização do mandato como meio de realização de negócios, que se limitava à mera intermediação de um nuntius, ou seja, um anunciador ou facilitador, criou-se a figura da procuratio in rem suam, pela qual o titular de uma ação ou atividade renunciava por complemento à sua prática, delegando poderes plenos a um procurator para realizá-la em seu nome.

Em matéria judicial, esta delegação significava que o mandatarius poderia demandar em favor do mandator, mas em nome próprio, assumindo todas as conseqüências do resultado.

Para ressalvar as atitudes de má-fé e de sua possível malversação do patrimônio do mandator, o mandatarius prestava uma cautio de rato, que consistia na única garantia do mandator.

Posteriormente, criou-se ainda a figura do cognitor que era indicado solenemente para este propósito, ficando exonerado de qualquer caução e assumindo a plena representação do mandator.

Talvez seja este o primeiro exemplo na história do que chamamos de substituição processual, ou seja, a defesa de interesse alheio em nome próprio.

Ao lado destas duas figuras tipicamente judiciárias, havia outras que se limitavam ao aconselhamento e esclarecimento das partes, do pretor e do árbitro. Eram os patroni e, mais tarde, os advocati que exerciam o papel de juristas e aconselhadores.

Discutiam com as partes sobre o direito em si, com o pretor, sobre a fórmula mais adequada e com os arbitri sobre o julgamento do mérito. Mas não participavam diretamente do julgamento. Esta função era do procurator e do cognitor.

Estes tinham uma função retórica de usar a palavra em defesa de quem representava, para convencer os arbitri no julgamento. Era uma atividade tipicamente forense. A dos advocati e dos patroni se limitava ao esclarecimento.

Por isto salienta Humberto Cuenca que os procuratores e cognitores eram oradores e os advocati eram juristas. Os primeiros usavam da dialética para ganhar a causa; os segundos, dos conhecimentos jurídicos para esclarecer a questão.

No fim da República, a fase per formulas já cedia lugar à cognitio extraordinaria, graças à expansão de Roma para todo o mundo civilizado. As ações não se desenvolviam mais diretamente entre o pretor (que dava a fórmula) e o árbitro que julgava.

Dos locais distantes do domínio romano, recorria-se ao imperador em Roma e seus prepostos e assessores decidiam a questão, adotando-se um sistema muito próximo ao atual que, através de recursos, submete o processo decidido no interior dos Estados aos tribunais de segundo grau sediados na capital e, para a unificação da jurisprudência e da interpretação da lei, aos de Brasília.

Os advocati não recebiam pagamento pelo serviço que prestavam. Sua função era honorífica, uma honor, ou seja, uma honraria. Não tinham poderes de representação, mas de aconselhamento e ajuda (De Robertis, Francesco M. Lavoro e lavoratori nel mondo romano. Bari: Adriatica, 1963, p.80).

Com o correr do tempo, a figura do advocatus adquire relevo e importância, pois a evolução social, econômica e política exige sempre do Direito novas fórmulas de regulamentação e controle. As normas são o reflexo da sociedade em que atuam.

A cada mudança e transformação surge uma necessidade de adaptação do ordenamento jurídico para acompanhar os tempos. Se o conteúdo envelhece, a norma perde eficácia. É preciso revigorá-la com o sangue novo das transformações sociais.

A figura do advogado foi regulada no Código Theodosiano e na legislação de Justiniano. Com o crescimento de Roma e o afluxo de pessoas das províncias dominadas, a atividade jurídica se intensifica e, com ela, a atividade dos advogados.

Por isto, o imperador Cláudio, que governou o império de 24 de janeiro de 41 D.C. até a sua morte em 54, retirou a advogacia da mera honorabilidade para permitir que seus profissionais ganhassem pelo serviço prestado. Estabeleceu um teto de 10.000 sestércios. A atividade é minunciosamente regulada quanto ao exercício, honorários, ação em favor da parte, prestação de contas, etc. (Cuenca. Proceso civil romano. Buenos Aires: Ediciones jurídicas europa-america, 1957, p.179.).

A partir de então, começa a fusão das figuras do procurator e advocatus numa única pessoa, nascendo a profissão do advogado como defensor do direito da parte, intermediando os interesses dela perante os órgãos julgadores.

Os advogados se reuniram em Collegia para melhor organizar a vida profissional e adquiriram enorme prestígio na antiguidade.

Os imperadores León e Antemio disseram numa Constituição de 469 que:

"Los abogados que aclaran las cuestiones dudosas, y que por los esfuerzos de su talento, así en los asuntos públicos como en los de los particulares, salvan a veces de una inminente ruina, y devuelven otras una fortuna perdida, no son menos útiles al género humano que los que defienden a su patria y sus hogares con las armas en la mano. No creemos por lo mismo que militen únicamente los que están armados de espada, escudo y coraza, sino también los abogados. Militan en verdad, defendiendo con su elocuencia los derechos de los que sufren, alimentan sus esperanzas y salvan las vidas de sus clientes e de sus hijos". (Cuenca, op.cit. p.181.)

Estava assim marcado na história o destino da advocacia como centro de referência de todas as carreiras jurídicas. Aclarar questões duvidosas nas disputas públicas e privadas, salvando alguns da ruína e devolvendo a outros a fortuna perdida é missão que, hoje, na linguagem depurada da Ciência do Direito, significa manter a integridade da ordem jurídica como resposta às questões sociais que envolvem toda e qualquer sociedade organizada.

Esta tarefa entregue aos juristas, não é menos importante do que aquela que praticam os soldados, defendendo a pátria pelas armas. Pelo direito e pelas armas se mantém a ordem jurídica, isto é, pela norma e pela sanção que se aplica por sua violação.

A fina sensibilidade dos romanos marcava o caminho que a humanidade seguiria e seguirá para sempre. A defesa dos direitos não se faz apenas com a força, mas com a força associada à norma, prescrevendo a conduta geral, que o Estado assume a obrigação de fazer cumprir.

3- O PROBLEMA DOS HONORÁRIOS

A questão dos honorários chegou assim a seu ponto básico que até hoje persiste: começou pela atividade pessoal e prática de atos processuais diretamente pelo interessado, aconselhado pelos juristas-advocati.

Para defendê-lo junto aos arbitri, na fase final do julgamento, já no foro romano, havia os procuratori e cognitores.

Estas duas atividades - a dos aconselhadores (jurisconsulti) e a dos defensores na lide fundiram-se numa só e o direito, que antes se realizava na tarefa do jurista ou jurisconsulto, deslocou-se para a sentença, trazendo para o Estado o que antes se realizava fora de sua influência.

Passou então o serviço forense ao advogado, como representante. A advocacia se transforma em profissão que, como toda atividade normalmente exercida por um titular, passou a ser remunerada, para garantir a vida de quem profissionalmente a escolhera.

O imperador Zenon, que demonstrou ao longo de sua vida permanente reconhecimento ao trabalho dos advogados, conforme a Constituição citada, promulgou outra Constituição para regular o pagamento dos honorários. Esta última perdeu-se, mas a ela se referem freqüentemente juristas como Cujácio e a legislação de Justiniano.

Pode-se afirmar que, na época de Justiniano, o serviço judiciário, tanto de advogados quanto de servidores públicos, era rigorosamente tabelado tanto no Código quanto nas Novelas (Cuenca. Op.cit., p.184. Note-se que passaram também a ganhar honorários todos os prestadores de serviço, tais como os médicos, geômetras, professores, preceptores, etc. A profunda ojeriza da cultura clássica ao trabalho humano, que se materializava na prestação de serviços, cede lugar a uma nova realidade, que marcaria o mundo moderno que tem no trabalho humano a construção de sua grandeza e o meio e instrumento de suas notáveis realizações.).

Qual a natureza jurídica desta parcela que se paga ao advogado pelo serviço prestado? Os autores discutem (Véscovi. Teoria general del processo. 2ª ed., Bogotá: Temis, 1999, p. 206.). Para uns, é arrendamento. Exatamente como se paga pelo uso da terra, também se remunera o trabalho contratado de uma pessoa ou sociedade, "arrendando-se" o fornecimento do serviço para aquele fim específico de conduzir o processo judicial.

Para outros, trata-se de um contrato de mandato, pelo qual uma pessoa transfere poderes a outrem para praticar atos ou administrar interesses, exatamente como está no art. 653 do CC.

Finalmente, para uma terceira corrente, trata-se de um contrato especial.

O contrato de arrendamento, por ter um fundamento histórico ligado à terra e à propriedade imóvel, não vê do instituto seu aspecto dinâmico e moderno, em que o serviço, isto é , a atividade finalística dirigida a criar bens e suprir necessidades, é seu conteúdo primordial.

Também não há razão para considerá-lo como "especial", pois nele estão caracterizados todos os ingredientes obrigacionais, ou seja, a vontade especificamente dirigida a outrem para, com sua aquiescência, constituir um vínculo que obriga ambas as vontades.

É exatamente isto que se faz quando se contrata o trabalho ou o serviço de uma pessoa, física ou jurídica, para cuidar da representação judicial.

Os honorários, como retribuição de serviço judicial de representação, tem conteúdo variado conforme a experiência de cada país.

Para alguns sistemas, adota-se a liberdade plena de contratação. Cada parte paga a seu representante o que for combinado.

Para outros, leva-se em conta o critério da sucumbência. Quem perde a demanda, no todo ou parte, paga os honorários do advogado da parte vencedora, que foi forçada a esta despesa em razão da demanda judicial. Pensa-se aqui na recomposição plena do prejuízo sofrido.

Há, ainda, tabelamentos e limites, fixando a lei o montante a ser pago. Certos códigos deixam ao alvitre das partes a fixação, mas estabelece um critério norteador: a vantagem econômica obtida pela atuação do advogado, considerando a natureza da causa.

Pode-se ainda falar numa combinação destes fatores, conjugando-se alguns de seus efeitos. E assim por diante.

Para nós, trata-se inequivocamente de um contrato de prestação de serviços, tal como definido no art. 3º, § 2º, da Lei 8.078/90, do Código de Defesa do Consumidor: serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Como, depois da EC 45/04, não mais se justifica a exceção do final do parágrafo - salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista - os honorários são hoje uma atividade sujeita às relações de consumo, têm como conteúdo uma relação de trabalho e estão desenganadamente sob a competência da Justiça do Trabalho (Sobre a competência da Justiça do Trabalho no tocante às relações de consumo, ver Álvares da Silva, Antônio. Pequeno tratado da nova competência trabalhista. São Paulo: LTr, 2005, p. 391-400, onde explano com mais detalhes a competência da Justiça do Trabalho para o serviço prestado na relação de consumo.).

4- OS HONORÁRIOS PERANTE O CÓDIGO CIVIL

E O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

O CC, no art. 692, diz que "o mandato judicial fica subordinado às normas que lhe dizem respeito, constantes da legislação processual, e, supletivamente, às estabelecidas neste Código".

Portanto o mandato judicial tem sede principal no CPC e, supletivamente, nos artigos 653 e seguintes do CC, no que diz respeito à sua dogmática geral.

O legislador adotou a correta técnica jurídica de relegar à legislação especializada a regulação do instituto do mandato judicial, sem perder sobre ele o controle de disciplina geral.

O mesmo acontece com o contrato de trabalho em relação aos contratos em geral, o processo do trabalho em relação ao processo civil, a filosofia do Direito em relação à filosofia geral, etc.

O mandato judicial é um instituto jurídico duplamente complexo: o advogado não só representa, mas também presta serviço ao mandante (Rodrigues, Sílvio. Direito civil. 30 ª ed., v. 3, São Paulo: Saraiva, 2007, p.305.).

Por outro lado, nele se vê a clara interferência entre o direito material e o processual, ficando evidente, mais uma vez, que é muito difícil estabelecer fronteiras rígidas entre um e outro, porque a forma dá essência à coisa - forma dat essentiam rei, mas também a essência muitas vezes é que determina a forma pela qual se expressa e toma conteúdo concreto no mundo exterior.

Forma e conteúdo, conteúdo e forma são conceitos entrelaçados e interpenetrantes. No processo, o direito material busca sua realização mas também o processo só tem sentido quando se implementa do conteúdo do direito material. A forma sem a essência é vazia. A essência sem a forma não tem expressão.

O CPC dispõe sobre honorários no art. 20, que diz

Art. 20. A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Esta verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria.

§ 1º O juiz, ao decidir qualquer incidente ou recurso, condenará nas despesas o vencido.

§ 2º As despesas abrangem não só as custas dos atos do processo, como também a indenização de viagem, diária de testemunha e remuneração do assistente técnico.

§ 3º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez por cento (10%) e o máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação, atendidos:

a) o grau de zelo do profissional;

b) o lugar de prestação do serviço;

c) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

§ 4º Nas causas de pequeno valor e nas de valor inestimável, bem como naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz atendidas as normas das letras a a c do parágrafo anterior.

§ 5o Nas ações de indenização por ato ilícito contra pessoa, o valor da condenação será a soma das prestações vencidas com o capital necessário a produzir a renda correspondente às prestações vincendas (art. 602), podendo estas ser pagas, também mensalmente, na forma do § 2o do referido art. 602, inclusive em consignação na folha de pagamentos do devedor.

Nosso Código assumiu atitude objetiva e equilibrada. Atribuiu ao vencido, ou seja, a quem perde a demanda, o ônus de pagar as despesas antecipadas e os honorários advocatícios da parte vencedora.

Quanto às despesas, trata-se de mera restituição. Já os honorários constituem efetiva compensação pelo que a parte teve de gastar para obter o que é seu.

O princípio inspirador do legislador foi o ressarcimento de um prejuízo forçado que o autor teve ao contratar advogado. Se ganhasse apenas a causa, seu patrimônio não estaria plenamente compensado, pois do lhe foi atribuído pela procedência da ação, gastou uma parte com o advogado.

A condenação da parte contrária em honorários tem esta finalidade: a reconstituição plena, até onde é possível, do patrimônio lesado do autor.

Diz a respeito Palacio:

Nadie mejor que Chiovenda expuso el verdadero fundamento de la condena en costas sal vencido al expresar "que la justificación de este instituto encuéntrase en que la actuación de la ley no debe representar una disminución patrimonial para la parte a favor de la cual se realiza, siendo interés del comercio jurídico que los derechos tengan un valor posiblemente puro y constante."

Para que o direito tenha um valor puro e constante é preciso que não haja prejuízo em exercê-lo, segundo a clara e objetiva lição de Palacio, apoiado em Chiovenda. Por isto se leva em conta inicialmente uma indenização de natureza processual para cobrir este primeiro gasto ou prejuízo.

Para diferenciar a indenização das despesas processuais em sentido amplo ("costas" como diz Palacio), afirma logo adiante que o fundamento do reembolso das despesas processuais é o "hecho objetivo de la derrota" não se confundindo com a culpa, como base para a indenização civil comum. E afirma:

El hecho objetivo de la derrota sitúa a la institución en el terreno estrictamente procesal y descarta la aplicación de teorías extraídas del derecho privado que, como la fundada en la presunción de culpa, no se avienen con la licitud que reviste, en principio, el ejercicio del derecho de acción, ni con el alcance de dicha condena, que se limita a los gastos directa e inmediatamente producidos por el proceso y no comprende otros daños que puedan ser consecuencia de aquél (Palacio, Lino Enrique. Manual de derecho procesal civil, 4ª ed., Buenos Aires: Abeledo Perrot, 1998, p.240.).

Fica assim assentado, com toda clareza, a diferença entre os dois tipos de indenização: o processual, que provém do exercício de ação, para fazer valer o direito, que nada tem a ver com culpa, mas tão-somente com o fato da sucumbência e os prejuízos com base em culpa, que ficam relegados ao Direito Civil.

Mas os dois institutos não se excluem. Pelo contrário, completam-se, segundo o princípio da reparação plena. No processo, a indenização tem natureza restrita às despesas pelo exercício da ação.

Porém uma reparação, muito mais ampla, se dá no terreno do direito material, cujos prejuízos, na maioria dos casos, são muito maiores do que um mero ressarcimento processual.

E o leitor nota que o objeto deste artigo é apenas o honorário obrigacional relativo ao advogado do reclamante, por ele escolhido, a fim de deixar intacto o crédito alimentar que recebe. Não se cuida de outros possíveis danos, sem dúvida existentes, provocados pela dispensa imotivada, através da qual o empregado, sem um motivo razoável, perde o emprego e o direito a uma vida digna.

Está na hora de ser pleiteada esta espécie de "dano social" da dispensa injusta. Só assim será evitada a carreira inabalável do desmonte da legislação do trabalho que começa sem dúvida pela perda do emprego, local em que se aplica a teia protetora dos direitos sociais.

Sem emprego não há trabalho. Sem trabalho não há aplicação do Direito do Trabalho. Destruindo-se o emprego destrói-se toda e qualquer possibilidade de proteção social plena.

É de se esperar que os advogados tragam ao foro trabalhista esta magna questão, para que seja juridicamente enfrentada sem mais tardar.

Não se nega o direito de dispensa mas, se por seu exercício se causa um dano (e este dano existe e sequer precisa ser provado), quem o causou tem que indenizar a parte lesada.

O trabalho, bem jurídico fundamental, é evocado repetidas vezes pela Constituição que especialmente o valorizou e prezou, colocando como fundamento da República "os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa" (art. 1º, item lV da CF), bem como da ordem econômica "fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa " - art. 170 - e na ordem social "que tem como base o primado do trabalho e como objetivo o bem-estar social" - art. 193.

É preciso perguntar ao STF se estes valores ainda estão em vigência ou se a Constituição é, em relação ao trabalho humano, apenas uma retórica sem sentido prático ou uma profissão de fé sem exemplo vivido.

Por outro caminho se chegará à proteção do emprego previsto na Convenção 158 da OIT, desastradamente denunciada no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Se o autor é vencido, terá a mesma obrigação em relação ao réu.

Ao fixar honorários em limites certos, tanto para mais quanto para menos, teve o legislador em mente a objetividade, evitando discussões intermináveis, na hora de patrimonializar o critério da vantagem trazida ao autor. Como medir esta vantagem. Quais os dados e referências analógicas que se levariam em conta?

Seria estabelecida nos autos uma controvérsia que atrasaria a solução da demanda em si mesma.

Ao limite mínimo, faz jus o advogado em qualquer situação. Ao máximo, se o juiz atender aos critérios das letras a, b e c do § 3º, do art. 20.

Nas hipóteses do § 4º, o juiz fixará os honorários segundo "apreciação eqüitativa, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior".

Ao mandar apreciar as alíneas, sem fazer referência ao caput do parágrafo, ficou em aberto a questão: neste caso o juiz estaria restrito aos limites máximo e mínimo?

A questão está em aberto, mas sobre ela ainda não se manifestou a jurisprudência. O fato é que o legislador mandou observar as alíneas, mas não o parágrafo e suas alíneas.

Pontes de Miranda (Comentários ao CPC. 5ª ed., t. 1, Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.392.) afirma que o art. 20 é ius cogens. Nele não interfere combinação entre autor-réu e seus advogados, sobre disposição diversa de honorários.

Também afirma, com razão, que a parte não precisa requerer na inicial a parcela, mas o juiz precisa condená-la. Se não o faz e a parte não embarga de declaração ou não recorre, a sentença transita em julgado sem honorários que não podem ser relegados para a execução nem requeridos em ação autônoma (Miranda, Pontes, op.cit., p. 394.).

Entendemos exagerada a segunda parte da afirmativa.

Se os honorários são agregados da sentença e dela devem constar, não precisa a parte requerer. Mas, se o juiz não condena o que estava obrigado a condenar, a parte, que não tiver embargado nem recorrido, pode requerer que a parcela seja incluída na conta final ou reivindicá-la em ação autônoma. Por que não?

O que deve constar da sentença por força de lei pode ser determinado pelo juiz a qualquer tempo, pois não se trata de direito da parte, mas sim de complemento legal.

A conclusão é que os honorários têm nítida função ressarcitória. Visam a repor o patrimônio ao estado anterior à demanda.

Aplica-se aqui o princípio de reparação plena da ilicitude: todos os membros da sociedade humana tem de abster-se de causar dano a outrem: "All members of society have a common unspoken duty to refrain from behavior that will cause harm to other people" (Burnham, William. Introduction to the law and legal system of the United States. St. Paul: West Publishing Co., 1995, p.401.). (Todo membro da sociedade tem o dever natural de abster-se de comportamento que possa causar o mal a outrem).

Se, entretanto, o dever natural não é obedecido e o mal é causado, cumpre recompensá-lo.

Neste caso, é preciso ficar claro que, na maioria das vezes, a indenização é sempre insuficiente e prejudicial. A reposição do patrimônio não é tudo. O dano moral é a prova. Mágoas internas, lesões interiores e ferimentos da alma não se lavam com dinheiro. Toda indenização, como salienta Sílvio Rodrigues, é uma "situação postiça" (Op. cit., p.186). Repara-se, mas não se repõe.

5- O PROBLEMA DOS HONORÁRIOS NA JUSTIÇA DO TRABALHO.

A sistematização atual dos honorários advocatícios teve também sua história. Reconstituí-la ajuda a entender melhor o problema.

O art. 64 do CPC de 39 dizia, no art. 64, que "Quando a ação resultar de dolo ou culpa, contratual ou extra-contratual, a sentença que a julgar procedente condenará o réu ao pagamento dos honorários do advogado da parte contrária."

Isto significava que os honorários da parte com seu advogado eram questão meramente contratual, devendo ambas as partes, mediante negociação, fixá-los.

Se, porém, houver dolo ou culpa de uma das partes a sentença condenará o réu ao pagamento da parte contrária. Mas tão-só se houver dolo ou culpa. Não havia condenação automática.

A CLT foi promulgada sob a égide do CPC de 39. Nada disse sobre honorários, surgindo então o problema da aplicação analógica do CPC e suas consequências para o processo do trabalho.

Porém, ao instituir o jus postulandi, permitindo à parte reclamar pessoalmente e acompanhar a reclamação até o final - art. 791 - o legislador trabalhista supôs que a questão dos honorários estava resolvida e a presença do advogado, definitivamente superada na Justiça do Trabalho. Sua presença era dispensável.

A evolução, entretanto, deu-se em sentido contrário ao previsto, como acontece freqüentemente nas ciências sociais, em que a previsibilidade é relativa e muitas vezes totalmente falha. Como disse Popper,

A cada passo adiante, a cada problema que resolvemos, não só descobrimos problemas novos e não solucionados, porém, também descobrimos que aonde acreditávamos pisar em solo firme e seguro, todas as coisas são, na verdade, inseguras e em estado de alteração contínua. (Popper, Karl. Lógica das ciências sociais. Rio de Janeiro: Tempo Universitário, 1978, p.13.)

Utilizando-se da faculdade de fazer-se representar, nos dissídios individuais, por advogado - art. 791, § 1º, o jus postulandi foi praticamente eliminado. Na Terceira Região, os números comprovam a afirmativa: de janeiro a 20.11.09 foram apresentadas 7.121 reclamações verbais contra 57.698 escritas. A relação é de apenas 7%.

Portanto a afirmativa de que não deve haver honorários porque a contratação de advogados é facultativa não condiz mais com a realidade dos fatos. Veja-se a afirmativa de Coqueijo Costa, hoje desatualizada pela prática: "No processo do trabalho não há o princípio puro da sucumbência. As partes têm o jus postulandi. Contratam advogado se assim o desejarem'' (Costa, Coqueijo. Direito processual do trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 1986, p. 164.). Ele seria então um "plus", acréscimo ou até mesmo um "luxo".

No mesmo sentido, Campos Batalha:

"Nas hipóteses em que indispensável ele se torna o patrocínio profissional, os honorários de advogado são devidos. Nas hipóteses, porém, em que o patrocínio profissional é facultativo, como ocorre nos feitos trabalhistas, não se justificaria a oneração do vencido com despesas que a própria lei não reputa necessárias." (Tratado de direito judiciário do trabalho. 3ª ed., v.I, São Paulo: LTr, 1995, p. 607.)

Sempre fui contra a extinção do jus postulandi (Sobre o tema, veja-se Álvares da Silva, Antônio. Cinco estudos de direito do trabalho. São Paulo: LTR, 2009, p.158, onde há um estudo com o seguinte título: Jus postulandi, um bem ou um mal? Nele o leitor terá elementos para discutir o problema sob os dois ângulos, o das vantagens e o dos defeitos.) e mantenho até hoje esta opinião. Mas a realidade não corrobora mais esta idéia. A tendência é mesmo a representação por advogado.

Se assim é, perde consistência o argumento de que o jus postulandi é uma faculdade. O empregado não entendeu desta forma. Tanto que a maioria das reclamações é feita por advogado, que ele julga, na maioria dos casos, necessário para fazer valer seus direitos.

O coro que se repete em cadeia e em uníssono é que o processo é complicado e difícil e a presença do advogado, como especialista desta imensa máquina técnica e burocrática, é indispensável.

Se é indispensável, não se torna sua escolha uma faculdade, mas uma necessidade.

De faculdade, a representação por advogado passou a regra e hoje é o cotidiano das ações trabalhistas. Portanto a possibilidade do jus postulandi não pode mais ser apontada como alternativa para excluir a representação por advogado. A presunção reverteu-se.

Como, durante a vigência do Código de 39, os honorários advocatícios pagos pela parte sucumbente à vitoriosa dependiam de dolo ou culpa, condição difícil de ser provada no processo do trabalho, a condenação em honorários permaneceu ausente.

O argumento de que a condenação em honorários seria injusta para o empregador, pois o empregado, quando condenado, não teria condições de pagar os honorários do advogado do empregador, não procede por três motivos:

a) o empregador causa ao empregado freqüentes prejuízos no processo. Basta que se lembre que há cerca de 2,5 milhões de execuções paralisadas nas Varas trabalhistas de todo o país e não aparece quem ressarça os credores. No processo, os bônus e ônus devem ser igualmente distribuídos. Estabelecer uma regra para proteger apenas uma das partes e considerar inexistente os prejuízos que ela causa é tratamento não isonômico e injusto.

b) em alguns casos, o empregado poderá pagar, principalmente quando for representado por sindicato, que tem condições econômicas para arcar com esta despesa processual.

c) o empregado ser vencido na Justiça do Trabalho é uma raridade e não se pode estabelecer regra geral com base em exceção.

Entretanto a tradição, baseada no princípio de que não há "sucumbência pura" na Justiça do Trabalho, persistiu no tempo e foi consolidada pela Súmula 11, do TST, editada antes do CPC de 73, posteriormente cancelada, mas sem mudança da situação.

SUM-11 HONORÁRIOS DE ADVOGADO (cancelada) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003.

É inaplicável na Justiça do Trabalho o disposto no art. 64 do Código de Processo Civil, sendo os honorários de advogado somente devidos nos termos do preceituado na Lei nº 1.060, de 1950.

Em 1970, foi editada a lei 5.584 que, no art. 14, regulou a assistência judiciária prevista na Lei 1.060/50, determinando que "Na Justiça do Trabalho, a assistência judiciária a que se refere a Lei nº 1,060, de fevereiro de 1950, será prestada pelo Sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador".

A lei foi um avanço, mas a assistência judiciária, prestada na forma da Lei 1060/50, dependia da indicação de advogado pelo serviço de assistência judiciária organizado pelo Estado - art. 5º, § 1º, que poderia retardar a demanda e sujeitá-la a condicionamentos burocráticos, principalmente quando se sabe que o número de defensores públicos é sempre menor do que a real necessidade.

Como ao sindicato compete a defesa dos interesses individuais e coletivos da categoria - art. 8º, III, da CF - o patrocínio da assistência judiciária é um exemplo típico desta defesa de interesses.

Mas tal propósito está longe de ser cumprido pela Lei 5.584/70. Nem todos os sindicatos organizam este tipo de assistência judiciária. O mandamento do art. 17, de que nas comarcas onde não houver Varas nem sindicato da categoria, a assistência judiciária fica delegada aos promotores e defensores públicos, é uma vã utopia.

Não se há de esperar que promotores e defensores públicos, já tão atarefados com seus pesados encargos, venham propor reclamações trabalhistas como representantes de empregados.

A situação continuava assim dúbia e insatisfatória, embora o número de empregados que tinha suas ações patrocinadas por advogados estivesse em constante crescimento.

Mesmo com a vigência do CPC de 73, que trouxe a expressa determinação de que "A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios", o problema permaneceu injustificadamente na mesma situação, embora fosse plenamente compatível com o processo do trabalho, pois em toda reclamação trabalhista, como de resto em toda ação, há um vencido e um vencedor.

Se o empregador pagaria honorários com mais freqüência do que o empregado, que talvez não os pagasse nunca, trata-se de questão de fato, não jurídica.

Também há 2,5 milhões de causas que o empregado-exequente jamais receberá, como já foi salientado.

Se as partes optam pela demanda e pelo acesso ao Judiciário, há riscos que devem ser proporcionalmente distribuídos entre elas.

A Constituição de 88, segundo a jurisprudência do TST, também não alterou a longa tradição, segundo a Súmula 329, que diz:

SUM. 329 - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 133 DA CF/1988 (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003.

Mesmo após a promulgação da CF/1988, permanece válido o entendimento consubstanciado na Súmula nº 219 do Tribunal Superior do Trabalho.

O advogado, embora considerado pela Constituição essencial à administração da Justiça, não teria presença necessária e obrigatória na ação trabalhista, em que a facultatividade da contratação continuava presumida (Esta linha interpretativa do TST é, sem dúvida, a mais correta. Ser essencial à administração da justiça não significa que o advogado tenha que estar presente em todas as ações. Sua missão é muito mais ampla do que a de um procurador de interesses de partes. Coincide com a manutenção da própria ordem jurídica, da qual é um elemento indispensável, não só requerendo, mas também aconselhando, solucionando conflitos como árbitro ou conselheiro, ensinando a lei nas faculdades, dando pareceres sobre sua interpretação e muito mais.).

Todos estes fatos, através de uma longa evolução jurisprudencial, mantiveram limitado o acesso do empregado à Justiça.

O jus postulandi praticamente não existe mais.

A assistência judiciária, prometida pela lei 5.584/70, não se realiza com plenitude. Nem se há de esperar que se realize um dia.

A Súmula 219 exige, para haver condenação em honorários, que haja assistência por sindicato da categoria profissional e comprovação da percepção de salário inferior ao dobro do mínimo ou de encontrar-se em situação que não possa demandar sem prejuízo do sustento próprio ou familiar.

Há, pois, uma permanente limitação de acesso pleno ao Judiciário. A faculdade do art. 791, § 1º, pela qual o empregado pode fazer-se representar por advogado, além de sindicato, foi praticamente excluída pois, neste caso, ele tem que arcar com as despesas dos honorários.

Veja-se um exemplo realista. Um empregado dispensado, que já perdeu o emprego e não tem chances reais de conseguir outro, não recebe salário e indenizações a que faz jus. É obrigado a recorrer a seu sindicato para ser beneficiário de assistência judiciária. A alternativa mais rápida, plausível e sensata de procurar, como qualquer cidadão, um advogado para agir em seu nome, é inviável, pois evidentemente, em razão do desemprego e de sua situação social, não pode pagar honorários.

Enquanto cidadão comum, pelo princípio da sucumbência, pode exigir do vencido o pagamento das despesas que fez. E, note-se, pode escolher o advogado que quiser.

Já o empregado não dispõe desta prerrogativa. Tem que buscar a burocracia sindical e esperar pela assistência judiciária, nem sempre solícita e funcional.

Sofre, portanto, limitação no acesso ao Judiciário, com clara violação ao art. 5º, XXXV, da CF. Fica, mais uma vez, inferiorizado em relação ao cidadão comum, por uma jurisprudência limitativa, provinda justamente da jurisdição que deveria provê-lo de efetiva proteção.

E isto tudo, sem falar na demora do processo que rola de instância em instância, protraindo o crédito alimentar e desvalorizando o trabalho humano.

6- A NOVA PERSPECTIVA DO CÓDIGO CIVIL

O novo Código Civil regulou com propriedade a responsabilidade civil e o inadimplemento das obrigações. Incorporou a moderna teoria e a recente experiência deste tema, de magna importância para as pessoas, pois estabelece critérios para que se realize com êxito "a cooperação dos que vivem em sociedade" (Betti. E. Teoria general de las obligaciones. Madrid: Revista de Derecho Privado, T.I, 1969, p.2.).

Se o Direito, como salienta Betti, regula a vida de relação entre os homens, é de se esperar de cada um uma parcela de cooperação para que se componham os interesses na infinita cadeia das relações interpessoais. Mas também se espera que esta cooperação se faça por meio de elementos efetivos de ética e responsabilidade, para que se construa, através da cooperação responsável, a harmonia possível entre os que vivem em sociedade.

Daí a importância do Direito das Obrigações que, a par das imposições imperativas do Estado, abre aos seres humanos a possibilidade de compor as relações sociais e harmonizar interesses pela manifestação da vontade criadora.

O que se quer do Direito, como regulador da cooperação responsável, é que se criem mecanismos jurídicos através dos quais a sociedade atinja um nível de perfeição em que cada um, dando de sua parte, receba de outra tudo que se faz necessário para o desenvolvimento de uma vida responsável e participativa.

Para isto é necessário que as obrigações sejam cumpridas e os deveres e direitos exercidos. Só assim, usando da confiança e não da má-fé na vida de relação, os homens estabelecerão, pela cooperação, o desenvolvimento da personalidade e da existência digna.

A eficácia das normas contratuais e legais é um dos fatores mais poderosos e convincentes da vida social harmônica. O que a lei promete, as instituições têm o dever de realizar. E os que cumprem as normas e acatam a ordem jurídica devem ser reconhecidos e premiados pela conduta positiva. E os que as descumprem devem ser sancionados pela conduta indevida.

Se há vacilação, demora e descumprimento, a cooperação se torna impossível, porque não se pode esperar do outro (aqui compreendido não só o membro da sociedade mas também o próprio Estado quando parte da relação jurídica), a conduta ajustada e convencionada no interesse daqueles que participam da relação jurídica.

A responsabilidade civil é um magnífico capítulo da evolução jurídica, que se mostra exatamente como a outra face da cooperação.

Os homens trabalham juntos, envidam esforços para constituir este imenso sistema de trocas que constitui a sociedade, não só no plano das nações mas também ampliadamente nas relações entre os Estados, que hoje se tornou intensa e cada dia mais profunda.

A conduta ilícita fere a seqüência dos atos de cooperação e cria um vão ou abertura na relação entre as pessoas. O sistema se abala. As expectativas se frustram. O ato ilícito funciona como uma pane ou curto-circuito nos fios comunicantes da vida social, através dos quais se institui o contato entre as pessoas.

Trata-se de fato juridicamente reprimível e moralmente condenável, porque coloca em jogo o rol dos interesses humanos, constituídos em função da expectativa que cada um coloca na conduta do outro, para constituir a teia social em que repousa a segurança das relações sociais.

Carlos Alberto da Mota Pinto salienta com razão que, "no núcleo da responsabilidade jurídica estará assim a idéia da responsabilidade moral" (Teoria geral do direito civil, 3ª ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1986, p.110).

Ao atribuir a alguém o ônus de responder por um dano causado, a Ciência do Direito criou um de seus mais importantes institutos, existente desde os primórdios da vida social - a responsabilidade civil.

Ao tornar cada pessoa responsável por seus atos, tanto no cumprimento das obrigações quanto no seu descumprimento, o Direito divide as vantagens e os encargos da vida social. Por isto, os sistemas jurídicos adotam três posições básicas em relação à conduta jurídica:

a) incentivando e valorizando a conduta positiva, correspondente à obrigação assumida. É o que o se chama de sanção positiva, pela qual o ordenamento jurídico oferece vantagem aos que cumprem a lei: dispensa ou rebaixamento de tributos, diminuição ou isenção de contribuições sociais, juros menores em empréstimos públicos, vantagens em financiamentos, etc. (Sobre este tema, ver Bonavides Filho, Maurício. A sanção premial no Direito. Brasília: Brasília Jurídica, 1999, com amplo estudo sobre esta nova forma de sanção.).

b) sancionando a conduta ilícita, através da obrigação de reparar, restituindo a integridade do patrimônio.

c) e, em certos casos, com a aplicação de pena se a ilicitude, além de ferir direitos individuais, constitui também uma ameaça aos interesses públicos.

Nosso Código Civil não regulou expressamente o moderno Direito Premial, que lida com sanções positivas: em vez de punir a conduta ilícita, incentivar a conduta certa. Mas regulou, com detalhes e objetivamente, o inadimplemento das obrigações no Título IV, do Livro I, artigos 386 a 420.

O Direito Premial, embora não regulado expressamente, é um campo aberto ao legislador que vale como opção futura para integrar e regular, com mais justiça ainda, o sensível campo do Direito das Obrigações.

O novo CC trouxe um dispositivo genérico para governar o princípio do inadimplemento das obrigações no art. 339: "Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado."

Esta cláusula geral foi opção do legislador brasileiro. Porém o sistema pode também construir-se sem ela e firmar-se pelas diferentes ocorrências que na vida cotidiana levam à responsabilidade. Lembra Carlos Rogel Vide a famosa frase de Carbonnier de que um direito pode viver perfeitamente sem uma elegante cláusula geral sobre responsabilidade (Vide, Carlos Rogel. La responsabilidad civil extracontractual em el derecho español. Madrid: Civitas, 1976, p.24.).

Pouco importa. Se o sistema estabelece a cláusula genérica é lógico que os inumeráveis casos da vida social, hoje extremamente variada e rica, vão dar-lhe dinamismo e realidade concreta. O método aqui será o dedutivo.

Se a opção for pelo casuísmo, a regra geral implícita estará presente em todos eles: culpa, dano, vinculação entre o dado e o agente, responsabilidade. O método aqui será o indutivo, que exercerá sua função fundamental enquanto método científico como "generalização não-dedutiva, cuja conclusão é sempre maior do que as premissas. Por exemplo, todas as esmeraldas observadas são verdes; logo todas as esmeraldas são verdes" (Branquinho, João; Murcho, Desidério; Gomes, Nélson Gonçalves. Enciclopédia de termos lógico-filosóficos. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p.415.).

Pela síntese do princípio geral, chega-se às ocorrências particulares, pode-se seguir o caminho inverso, tomar-se as ocorrências particulares, organizá-las segundo o princípio ordenador e chegar-se de novo à regra geral.

No caso da Ciência do Direito, a técnica da enumeração é fundamental, porque traz certeza e segurança sobre hipóteses que se incluem ou se excluem da previsão legal.

Por isto, o legislador ou a jurisprudência sumulada (que muito se aproxima da própria legislação) adotam, através de expressões e giros verbais, as denotações ou signos lingüísticos de exclusão e inclusão. Por exemplo: "fica incluída a hipótese tal; o dispositivo vale, mesmo depois da lei nova; etc".Ou simplesmente traz fatores novos em enumerações que ampliam as situações anteriormente reconhecidas.

Foi exatamente esta a técnica do art. 339: descumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos. Bastava o princípio. Mas, para isentá-lo de dúvida quanto aos fatores includentes, disse: "perdas e danos, mais juros e atualização monetária, segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado".

Quer dizer: os juros, a atualização monetária e os honorários de advogado integram, no direito brasileiro, o conceito de indenização.

Como princípio genérico, polivalente e holístico, vale para toda e quaisquer obrigações. A relação de trabalho, que serve de conteúdo ao contrato de trabalho, não poderia ficar de fora, como é óbvio. Principalmente levando-se em conta o conteúdo alimentar e social do crédito trabalhista que, ao retribuir o trabalho prestado, tem natureza não só econômica mas também ética e social.

As perdas e danos, compreendendo o dano emergente e o lucro cessante, serão apurados e expressos monetariamente segundo a proporção do fato praticado e o prejuízo causado.

A este resultado, somam-se mais três fatores necessariamente e por força de lei: juros, atualização monetária e honorários de advogado.

Há, portanto, um fato fundamental que se apura - o dano - ao qual se agregam os honorários advocatícios, atualização monetária e juros. Estes fatores, por provirem diretamente da lei, não precisam ser expressamente requeridos. O juiz pode fazê-los incidir diretamente, porque não dependem da vontade da parte, mas do próprio legislador.

Tais previsões de incidência na sentença por previsão legal constituem intervenção do legislador por razões de política judiciária, com o objetivo de completar a natureza do fato decidido com medidas que lhes dão maior consistência e significado em razão da importância da matéria.

Por isto, não dependem de pedido expresso. Não estão sujeitas à vontade das partes, que foi coberta e superada pela própria lei.

No caso da responsabilidade civil, além do dano, o legislador quis que incidissem juros de mora, atualização monetária e honorários advocatícios, exatamente para que se recompusesse, da melhor maneira possível, a lesão praticada ao patrimônio alheio.

7- REPERCUSSÃO DO ARTIGO 395 NO PROCESSO DO TRABALHO

Como já foi anteriormente discutido, a doutrina trabalhista, com apoio no art. 791 da CLT, inclinou-se no sentido de que, se o reclamante pode reclamar pessoalmente, a contratação de um advogado torna-se despicienda e desnecessária. Se, não obstante, o contrata, deve arcar com os ônus.

Este raciocínio foi reforçado pela assistência judiciária trabalhista, regulada pelo art. 14 da Lei 5.584/70, que deve ser prestada pelo sindicato profissional a que pertencer o trabalhador.

Excluiu-se assim, mais uma vez, a presença do advogado diretamente escolhido pelo reclamante.

Este raciocínio hoje não se sustenta mais. Embora contra minha opinião pessoal, o jus postulandi perde terreno a cada dia. Os fatos vão-no superando paulatinamente. É de se prever que, em futuro não muito distante, toda reclamação tenha a presença de um advogado. As estatísticas citadas confirmam o fato.

Recente decisão do TST aponta caminhos nesta direção, vedando naquela corte a existência do jus postulandi, em clara negação do art. 791, que foi assim "revogado" pela jurisprudência, com claros reflexos negativos no acesso ao Judiciário pelo empregado.

Suponha-se que o reclamante utilize-se do jus postulandi até o TRT e o empregador recorra de revista. O empregado terá que procurar às pressas seu sindicato, se existir, para prestar-lhe assistência judiciária.

Quem vai garantir que, no curto espaço de oito dias, superará os trâmites burocráticos e obterá a assistência? Esta impossibilidade fica mais evidente ainda, se não houver Vara ou sindicato na comarca, quando então a assistência é delegada aos promotores de justiça que, já ocupados por sua imensa carga de trabalho, dificilmente darão conta de mais esta tarefa, principalmente de afogadilho.

Fica assim ameaçada a promessa do art. 5º, XXXV da CF.

Terá que contratar forçosamente um advogado particular que então tomará conhecimento dos autos. Naturalmente, terá que lhe pagar honorários, além de correr o risco de não ser bem defendido.

O prazo de interposição do recurso é exíguo para que o profissional tome conhecimento por inteiro dos autos, o que também pode trazer ao reclamante duplo prejuízo: além dos honorários que desfalcarão o crédito alimentar, sujeita-se à possibilidade de uma prestação de serviços deficiente.

Como o art. 395 do CPC é genérico e não se liga à sucumbência, mas à responsabilidade civil, aplica-se a toda situação em que uma pessoa, para reparar um dano contratual ou não, precise do concurso de um advogado. Não só para ajuizar a ação, mas também para intermediar um acordo e entendimento entre as partes.

A atividade extrajudicial do advogado, que é o futuro da advocacia, deve também ser remunerada.

O art. 395 não revoga o art. 14 da Lei 5.584/70. Pode com ela perfeitamente conviver porque têm natureza diversa e ocupam lugares distintos no ordenamento jurídico.

Se o empregado quiser a assistência judiciária nela prevista, procurará livremente o sindicato profissional a que pertence, depositário de sua confiança, para prestar-lhe assistência judiciária. Naturalmente, sujeitar-se-á às restrições do art. 14, § 1º da Lei 5584/70: salário igual ou inferior ao dobro do salário mínimo (critério objetivo) e pobreza em sentido legal (critério subjetivo), ou seja, não poder demandar sem prejuízo do sustento próprio ou da família.

Mas, se for sua opção promover a reclamação com um advogado de sua própria escolha, poderá fazê-lo e, ao final, requerer, na forma do art. 395 do CC, os honorários advocatícios como despesas pelos prejuízos da mora do empregador, devedor de créditos trabalhistas.

Os honorários estabelecidos pelo CPC - art. 20, § 3º, e os honorários obrigacionais, provenientes de mora, previstos no art. 395 do CC, têm um ponto em comum: a sucumbência. Se a ação é procedente, não se cogita, por parte do autor, qualquer pagamento de honorários. A obrigação se transfere para quem perdeu.

Porém a natureza jurídica e a finalidade entre os dois institutos torna-os claramente distintos.

Os honorários de sucumbência, previstos no art. 18, § 3º, do CPC, têm por objeto os honorários em razão do processo. Não consideram nem levam em conta o conteúdo do direito material discutido nos autos. Pagam-se honorários em razão do princípio da sucumbência, de forma tabelada e limitada.

Já nos horários obrigacionais, a verba honorária faz parte da recomposição do patrimônio do lesado. Tem, pois, natureza restitutiva. Em virtude disto, não está mais sujeita às limitações do art. 18, § 3º.

O juiz pode arbitrá-la, inclusive em nível mais alto do que o estabelecido no CPC, se ficar provado que o autor exorbitou aquele valor com o pagamento a advogado, o que é plenamente possível na sociedade complexa em que vivemos, sempre exigente de medidas e formalidades, que a parte tem que tomar e respeitar através de seu advogado, principalmente no que diz respeito a providências fora do processo contencioso: viagens, consulta a peritos, exames, etc.

Não é justo que a parte assuma estas despesas para receber o que lhe é devido e venha a perder parte do que ganhou com o pagamento de seu advogado.

No caso específico do Direito do Trabalho, a maioria dos reclamantes opta pela contratação de advogado e relega a assistência judiciária da Lei 5584/70.

Quando for esta a hipótese, tem hoje inequivocamente direito de receber a verba gasta com advogado e, se não tiver obtido o benefício da justiça gratuita - art. 790, § 3º, da CLT - também o reembolso do que tiver gasto a título de despesas processuais.

É, pois, mais amplo o ressarcimento obrigacional do que o processual, pois o primeiro tem em mente a recomposição do patrimônio e não apenas os honorários referentes ao processo.

Também, no âmbito da Justiça do Trabalho, está superado o limite de 15% em relação à verba honorária. Se o reclamante constitui advogado e ganha a ação, o empregador estará obrigado ao ressarcimento, que o juiz fixará levando em conta a atuação do advogado e o caso concreto.

8- OBJEÇÕES DO DESEMBARGADOR JÚLIO BERNARDO DO CARMO.

O tema dos honorários obrigacionais suscitou, na Quarta Turma do TRT de Minas, vivos debates. Hoje, por maioria, é aceita sua aplicação. Fica vencido o Des. Júlio Bernardo do Carmo, cuja fundamentação vamos agora discutir.

Sua primeira afirmativa consiste no seguinte:

Na seara processual trabalhista, tendo em vista a plena regência do princípio da substanciação, a regra geral é a de que o juízo só tem a obrigação de apreciar os pedidos explicitamente lançados na inicial, não sendo de sua incumbência judicante inferir pedidos outros que, em tese, pudessem ser postulados naquela peça processual, daí porque costumeiramente (id quod plerumque accidit) julga conforme o alegado e provado pelas partes.

A afirmativa é perfeita e correta. Ninguém discute o princípio da substanciação que rege o processo e que o juiz só pode decidir de acordo com o que lhe pediram as partes. O pedido há de ser expresso. Não há pedido tácito (Miranda, Pontes. Comentários ao CPC. Rio de Janeiro: Forense, t.IV, 1974, p. 33.).

A parte tem que pedir de acordo com os fatos que alega e o juiz decidirá de acordo com os fatos provados. Se o pedido está além dos fatos ou fora dos fatos (ultra petita vel extra petita), o juiz não considerará o pedido.

Porém se os fatos estão provados e o pedido não foi integralmente ou corretamente formulado, pode o juiz conceder o direito, pois a ele cabe a obrigação de conhecer a lei - iure novit curia, bastando que a parte lhe dê os fatos para que possa fazer a subsunção - da mihi factum, dabo tibi jus. Este princípio complementa e plenifica o primeiro.

Neste caso, o juiz não cria pedidos, mas simplesmente faz adequação da norma ao que ficou provado nos autos. E esta é sua obrigação, em todos os tempos. Não se trata de pedido implícito, mas de correspondência plena da norma ao fato.

Se o cidadão procura seu juiz natural e narra-lhe um fato, está o juiz obrigado a fazer-lhe a prestação jurisdicional, ouvindo a parte contrária. As partes produzirão as provas e o juiz decidirá ao final. O juiz precisa do fato; o direito, ele já o conhece ou tem a obrigação de conhecê-lo.

Coisa diversa do pedido das partes são consequências que a lei manda incidir na sentença, porque têm conexidade com o fato a ser decidido ou porque o interesse público assim o quer.

São os agregados da sentença, que nada têm a ver com o pedido das partes, mas com a vontade da lei. Por isto, não precisam de requerimento. A lei os faz automaticamente incidir. Daí a razão da Súmula 256 do STF, dispensando pedido expresso de honorários. Pela mesma razão, há a dispensa em relação a atualização monetária e juros: onde há a mesma situação, aí se aplica a mesma norma: ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio.

O novo CC, além da reparação do dano, além do fato em si mesmo, agrega mais três elementos: atualização monetária, juros de mora e os honorários, perfazendo a tríade que, pelas mesmas razões, não precisam de ser expressamente requeridos.

Com a entrada em vigor da EC 45/94, que ampliou a competência trabalhista, duas possibilidades se abriram: ou se considera todas as relações de trabalho, créditos trabalhistas lato sensu, o que seria correto, aplicando-se a todos eles os princípios reinantes sobre honorários advocatícios, ou então se mantém a situação apenas para a relação de emprego e aplica-se o princípio da sucumbência aos demais. Esta foi a orientação da IN/27.

Embora legislando sobre processo, em flagrante inconstitucionalidade, a IN/27 admitiu que o princípio da procura de um advogado não é uma simples alternativa, mas uma necessidade às partes. No entanto, manteve, para a relação de emprego, a Súmula 219.

Porém é de se perguntar: qual a diferença entre um crédito proveniente da relação de trabalho e da relação de emprego, para efeitos de competência?

Todos os dois são créditos trabalhistas e merecem idêntico tratamento, sob pena de se tratar com mais rigor o crédito da relação de emprego, que é o padrão dos créditos trabalhistas, exigindo-se para ele a assistência judiciária da Lei 5584 e permitindo-se a livre contratação de advogado para os créditos da relação de trabalho. Ou seja, beneficia-se o crédito da relação de trabalho e limita-se com prejuízo o crédito da relação de emprego.

Por outro lado, quem trabalha numa relação de trabalho é tão carente de proteção legal quanto aqueles que trabalham numa relação de emprego. Qualquer diferenciação entre eles é anti-isonômica.

Exatamente para evitar esta duplicidade é que se prega uma visão ampliativa e integral dos honorários advocatícios na Justiça do Trabalho.

A aplicação dos honorários advocatícios obrigacionais não precisa de lei. Pode-se aplicar o princípio que convive perfeitamente com a assistência judiciária da Lei 5.584/70.

O empregado pode servir-se da assistência judiciária, inclusive para se prevenir da condenação de honorários, caso perca a demanda. Mas é seu direito, caso julgue oportuno, independentemente do valor de seu salário, procurar um advogado para patrocinar-lhe a causa e pleitear que a parte contrária, que só pagou mediante sentença o crédito trabalhista, indenize-o pelo pagamento da despesa forçada que teve.

O receio de que a aplicação do princípio da sucumbência ou dos honorários obrigacionais possa prejudicar o reclamante no caso de improcedência é apenas teórico.

Raramente a reclamação trabalhista é totalmente improcedente. E, ainda que seja, nada impede que o reclamante, na execução ou em qualquer fase do processo, requeira os benefícios da assistência judiciária.

Nos artigos 17 e seguintes da Lei 5584/70, onde o assunto é regulado, não se prescreve que o benefício deva ser concedido no começo da reclamação. Logo pode ser requerido e obtido em qualquer fase.

Não valeria aqui a argumentação de que o empregado só quer se beneficiar dos bônus e evitar os ônus da lei.

Não é preciso lembrar que o Direito do Trabalho é protecionista e, se não admitirmos esta afirma, melhor é revogar a CLT e entregar tudo ao direito comum.

Mesmo nestes casos, para que se evite gasto do empregador, cujos interesses na jurisdição do trabalho devem também ser levados em conta, basta que se preveja, quando se regular o Fundo de Indenizações Trabalhistas, criado pela EC 45/04, que, nestes casos, o empregador pode reaver do Fundo a compensação pelos honorários pagos a seu advogado, já que a possibilidade de recebê-los do empregado, desacompanhado de sindicato, é sempre remota.

Para se evitar o demandismo de certos empregados, é justo que sofram também sanções por litigância de má-fé, pois a condição de hipossuficiente não é excludente de sanções, nem muito menos de responsabilidade social, que todos devem ter, pobres ou ricos, cultos e incultos, grandes ou pequenos.

A proteção que o moderno Direito do Trabalho presta ao hipossuficiente é de natureza substancial. Procura dotá-lo de meios jurídicos para que, superando a diferença econômica e social, possa colocar-se na mesma posição do empregador, para com ele contratar, no plano individual e coletivo, da maneira mais igual possível. (É verdade que esta igualdade nunca será plenamente estabelecida. Mas a Ciência do Direito não lida com situações ideais, mas com situações possíveis. O legislador estabelece o fato padrão, a qual atribui conseqüências jurídicas para se atingir a um fim: dispensa sem justa causa, liberdade sindical, greve em atividades essenciais, dano, reparação, etc. A vida, em suas múltiplas e infindáveis ocorrências, é que vai preenchê-los com a seiva abundante da realidade concreta e só então a lei se acercará dos objetivos por ela pretendidos. Atiyah, P.S, Law and modern society. Oxford: Oxford University Press, 1995, p.119. "The law is not an independent, autonomous institution with purposes of its own; but that, on the contrary, law is merely a tool, an instrument by which policies and goals otherwise decided upon can be aimed at by those who make and enforce the law." (A lei não é uma instituição independente com propósitos próprios, mas ao contrário é meramente uma ferramenta ou instrumento, pelo qual políticas e objetivos anteriormente escolhidos possam ser objetivados por aqueles que fazem e aplicam a lei).)

A proteção deslocou-se do campo da pessoa para as instituições sociais.

Não é mais a tutela protecionista e paternalista que transforma o empregado num incapaz carente de proteção pessoal em todos os atos de que participa na relação de trabalho. O que se deseja são sindicatos fortes, conselhos de empresa atuantes, partidos políticos que defendam no campo legislativo as reivindicações individuais, coletivas e públicas dos trabalhadores.

Com esta análise das objeções, panoramicamente expostas, vê-se que não há razão para mudança dos pontos de vista sustentados.

Os honorários obrigacionais são uma conquista do Direito moderno. Ajustam-se perfeitamente à teoria atual da responsabilidade civil. Por isto vieram para ficar.

Pelo exposto, mantenho a condenação em honorários advocatícios obrigacionais.

2.2.2.5- Da Concessão Dos Benefícios

Da Justiça Gratuita

O reclamado insurge-se também contra a concessão dos benefícios da justiça gratuita, alegando não bastar a declaração de pobreza (que, no entender dele, careceria de "uma comprovação mais robusta"), e faltar, ao procurador do autor, poderes específicos para a postulação do benefício.

Não lhe assiste razão.

Os Juízes detêm a faculdade legal de concessão dos benefícios da justiça gratuita àqueles que simplesmente declarem sua hipossuficiência de recursos (artigo 790, parágrafo 3º./CLT; Lei 7115/83 e OJ 304/SDI-1/TST), o que fez a reclamante de "próprio punho", no documento de f. 39, onde requer a "gratuidade da justiça", sob as penas da lei, e a procuração de f. 40, conferindo, ao advogado dele, "amplos poderes".

Nada a prover.

2.2.2.6- Hipoteca Judiciária

O reclamado volta-se ainda contra a determinação judicial de constituição de hipoteca judiciária, no que não lhe assiste razão.

A hipoteca judiciária está expressamente prevista no art.466 do CPC, que diz :

"A sentença que condenar o réu no pagamento de uma prestação, consistente em dinheiro ou em coisa, valerá como título constitutivo de hipoteca judiciária, cuja inscrição será ordenada pelo juiz na forma prescrita na Lei de Registros Públicos. Parágrafo único. A sentença condenatória produz a hipoteca judiciária:

I- embora a condenação seja genérica

II- pendente arresto de bens do devedor.

III- ainda quando o credor possa promover a execução provisória da sentença."

A hipoteca "é o direito real constituído em favor do credor, sobre coisa imóvel do devedor ou de terceiro, tendo por fim sujeitá-la exclusivamente ao pagamento da dívida." (Loures, José Costa; Guimarães, Taís Maria Loures Dolabela. Novo código civil comentado. BH. DelRey, 2002, p.628.)

A prelação e a seqüela são seus atributos principais.

Se há sentença a uma prestação de dinheiro ou coisa, hipóteses mais comuns da sentença condenatória, ela automaticamente vale como título constitutivo para a hipoteca judiciária, ou seja, a hipoteca que de provém de condenação judicial e incide sobre bem imóvel do devedor, na amplitude do art. 1.473 do Código Civil.

O juiz ordenará a constituição da hipoteca automaticamente, independentemente até mesmo de requerimento do credor, vitorioso na ação, pois se trata de interesse público do Estado no cumprimento de suas ordens judiciais.

Nas sentenças de alto interesse social como, por exemplo, a trabalhista, a de consumo ou a de reparação por danos, a execução fica garantida porque, mesmo que se aliene o bem, a vinculação dele à dívida continuará pelo princípio da seqüela.

Entendo que a hipoteca judiciária deve ser determinada no dispositivo ou conclusão da própria sentença. Isto facilitaria enormemente sua aplicação. De dispositivo morto, se transformaria em realidade, contribuindo decisivamente para a execução da sentença e para a efetiva prestação jurisdicional.

Esta medida, ao lado do depósito da condenação e da multa, será um verdadeiro freio na recorribilidade estéril e protelatória, que hoje tomou conta de todas as jurisdições, impedindo a prestação jurisdicional eficiente e bloqueando a força imediata da sentença de primeiro grau.

Pequena nota de Direito Comparado. Nos Estados Unidos vigora o princípio da valorização do primeiro grau. O contato com as partes, a audiência direta, a coleta direta da prova, o trato imediato com as partes, tudo leva a que a decisão de primeiro grau seja mantida. Se a decisão se dá através do júri (Recorde-se que há júri, nos Estados Unidos tanto para as causas cíveis quanto criminais.), dificilmente os fatos são modificados no segundo grau.

Burham justifica esta posição com o argumento de que o juiz instrutor do primeiro grau, que de fato viu e ouviu a testemunha sobre fatos, está numa posição superior para apurar e avaliar estes fatos do que os juízes de segundo grau: " ...The fact finder on the trial level who actually saw and heard the witnesses is in a superior position to find the facts accurately." (Op. cit., p.179.O juiz instrutor que, na audiência viu e ouviu a prova testemunhal está numa posição superior ( privilegiada), para averiguar os fatos acuradamente.)

No mesmo sentido o pronunciamento de Mary Kay Kane:

"The fullest scope of review is for errors of law: appellate courts may decide such questions de novo. Rulings that are committed to the trial judge's discretion are reviewed under an abuse of discretion standard, however, which allows reversal only if the trial judge was clearly wrong. " ( O escopo da revisão completa( nas cortes superiores) faz-se em caso de erros de direito. A corte de apelação pode decidir estas questões em sua totalidade. As regras que são atribuídas à discrição do juiz da instrução somente são revistas, quando há abuso dos padrões normais e a reforma só será possível se o juiz da instrução estiver claramente em erro.). (Civil procedure.St. Paul. West Publishing , 1991, p.249.)

Vê-se, pelas citações, o senso prático do direito processual norte-americano. É plena a valorização da sentença do primeiro grau quanto aos fatos, que só podem ser reformados, quando o juiz laborou em evidente equívoco. Se o erro é menor, nem por isso a sentença será reformada, porque se pensa num bem maior que é aplicação da lei aos casos concretos, resolvendo o problema do cidadão, e no interesse público em aplicar a lei.

Entre nós, infelizmente, proliferam-se recursos. A primeira instância é apenas uma passagem. As partes podem recorrer sem ônus. O legislador praticamente supõe que o primeiro grau está errado e permite sem outras exigências o recurso. Tem uma visão meramente liberal do processo e pensa apenas no direito de defesa, sem considerar o direito à prestação jurisdicional de quem demanda e pede a reparação de seus direitos.

O resultado aí está: os tribunais superiores estão acumulados. O Judiciário tem reputação baixa perante o povo e as questões não se decidem nem a lei se aplica.

A hipoteca judiciária é, pois, uma valiosa ferramenta que a lei processual coloca nas mãos do juiz, para garantir a eficácia das decisões judiciais.

Conforme está documentado no Relatório Geral da Justiça do Trabalho, publicado pelo TST, há 1.727.000 processos em execução na Justiça do Trabalho, somando-se os casos novos aos resíduos anteriores. Um volume assustador, pois equivale a praticamente duas vezes o número de processos novos que entram anualmente.

Destes, não obstante o gasto e o esforço despendidos, poucos têm chance de serem executados.

Na maioria dos casos, a empresa desfez os bens, fechou, faliu, mudou-se para lugar ignorado. O exeqüente será prejudicado e o serviço público da Justiça, mais uma vez, terá empreendido um esforço inútil e caro que não produzirá resultado algum.

Uma contradição e um absurdo, principalmente quando se trata de crédito alimentar.

Como o legislador não exige o depósito integral da condenação (e, mesmo quando equivale ao valor total ele se torna insuficiente em razão da demora da execução), é a própria legislação a responsável por este fato intolerável e surrealista.

Até que haja mudanças mais profundas, a hipoteca judicial pode ser a solução. Incidindo sobre os bens da executada, a execução fica garantida e os bens, na quantia devida, indisponíveis.

O caminho é, pois, fácil e lógico. Basta que a jurisprudência trabalhista adote, para o crédito alimentar, uma medida que é empregada pelo legislador comum.

Temos aqui mais um exemplo de que o CPC passou à frente do Processo do Trabalho, que se atrasou no tempo e hoje é responsável pelo postergação, demora e frustração do recebimento do crédito alimentar pelo trabalhador brasileiro.

Agora, com a medida, a execução será garantida e o crédito será na certa recebido pelo reclamante-exeqüente.

Frise-se, mais uma vez, que a hipoteca judiciária é um efeito da sentença. Tem natureza pública. É medida do legislador em defesa da jurisdição, para garantir a eficácia das decisões judiciais.

Portanto independe de pedido ou requerimento das partes, pois se trata de um "agregado da sentença" na expressão de Pontes de Miranda, ou seja, um efeito que o legislador, por questões de política judiciária, a ela faz agregar em razão do interesse público, tais como custas, correção monetária, honorários de perito, descontos previdenciários e de imposto de renda.

Mais uma vez, se vê aqui retratada a situação contraditória em que se debate o Judiciário Trabalhista e, por extensão, o Judiciário em geral.

A hipoteca judiciária é prevista no CPC desde 1974. Qual o juiz cível e trabalhista que a emprega? Todos se omitem. No entanto, fazem parte do coro que pede, a todo instante, ao Congresso Nacional mais cargos, mais juízes, mais servidores, mais verbas. Sobrecarregam o orçamento nacional, em vez de usar dos meios que já têm em mãos para garantir a jurisdição e tornar eficaz a aplicação da lei.

É de se esperar que a hipoteca judiciária, instituto que dorme no papel à espera de aplicação pelos juízes, se torne uma ferramenta decisiva na garantia do cumprimento das decisões judiciais.

Não obstante as brilhantes razões do juiz Júlio Bernardo do Carmo, contra a jurisprudência desta Quarta Turma em relação à hipoteca judiciária, não vejo razão para mudar meu ponto de vista.

Analisando, um a um, os argumentos daquele ilustre juiz em voto divergente, entendo que a orientação da Turma deve manter-se pelos seguintes fundamentos. Os argumentos são os seguintes.

1- Analogia Com O Código Civil.

A hipoteca judiciária é um instituto criado pelo CPC de 73. Já a hipoteca, é instituto de Direito Privado, localizado no Livro III do Código Civil e regulada nos artigos 1473 a 1505.

Têm de comum apenas o gênero- o direito real de hipoteca- mas diferem profundamente na espécie: a hipoteca judiciária tem natureza processual, é prevista em legislação formal e tem por finalidade garantir a plena exeqüibilidade das sentenças judiciais, enquanto a hipoteca de Direito Civil é Direito Real de garantia e mira a garantia de qualquer obrigação de ordem econômica. (Beviláquia, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado. SP. Francisco Alves. 1958, v.III, p.306.) Supõe a obrigação principal e, acessoriamente, a assegura para certeza do trânsito econômico.

Já a hipoteca judiciária garante a exeqüibilidade das sentenças judiciais, para que não se decida em vão, como é comum em nosso País, e para que o credor da obrigação judicialmente garantida tenha a certeza de seu cumprimento.

Ambas têm em comum a garantia, mas a hipoteca civilista apóia o direito constituído e a judiciária, a decisão dos tribunais. Na espécie, como se vê, distinguem fundamentalmente.

Se se quer fazer analogia, ela deveria ser feita com a hipoteca legal, prevista no art. 1.489 e seguintes do Código Civil, em que a hipoteca tem finalidade garantidora dos credores ali enumerados: dos filhos, sobre os imóveis do pai ou mãe que passar a outras núpcias, antes de fazer o inventário do casal; do ofendido, sobre os imóveis do delinqüente para satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das despesas judiciais; ao co-herdeiro, para garantia de seu quinhão, etc.

Este tipo de garantia tem proximidade total com a hipoteca judiciária. Portanto com ela se pode fazer aqui uma analogia com proveito e resultado. Porém continuam diferentes quanto ao objeto, pois a hipoteca legal garante bens concretos e a judicial, a exeqüibilidade da sentença.

Se o direito privado protege direitos através da ficção de uma hipoteca legal, por que não poderia também o Direito Processual proteger a sentença da mesma forma? Foi esta ilação que levou o CPC de 73 a instituir a hipoteca judiciária. E o fez em boa hora.

Portanto ela tem, sim, vida própria, independente da hipoteca civil, porque tem desta finalidade diferente. Já nos casos de hipoteca legal, os conceitos se aproximam por uma natural comunicação.

A hipoteca legal se constitui logo após a sentença de primeiro grau, exatamente para que possa cumprir seu objetivo, ou seja, garantir o que foi decidido, evitando que o réu desbarate bens e fraude a condenação.

Atribuir-lhe efeitos somente após o trânsito em julgado é o mesmo que negar sua finalidade. Que prevenção seria esta, que só vem depois acontecido o fato a que visava prevenir? Seria então uma interpretação absurda, pois retiraria do instituto jurídico o fim a que visa resguardar. Deve-se lembrar aqui a sabedoria romana : "Interpretatio facienda est, ut ne sequatur absurdum." (A interpretação deve praticar-se de modo a evitar o absurdo).

Toda interpretação existe para construir o sentido do texto, nunca para destruí-lo.

Trata-se, em conclusão, de institutos com finalidades diferentes e assim devem ser vistos pela doutrina e pela jurisprudência.

2- Modificação Da Sentença Em Instância Superior.

Esta possibilidade em nada afeta a hipoteca, que então automaticamente se desfará. Porém este fato hipotético não desautoriza seu uso.

A razão está na estatística que, baseando-se em números, não mente nem falseia: as sentenças de primeiro grau na Justiça do Trabalho, salvo pequenas alterações, são integralmente mantidas. Esta porcentagem beira, em muitas regiões, a mais de 95%. Basta que se consultem os julgamentos da própria Quarta Turma. Portanto será rara a inutilização da hipoteca.

Para uma perda de 5%, há um ganho de 95%. Evidentemente, a vantagem salta aos olhos.

Mas não é só. Se a sentença for reformada e a hipoteca desfeita, tal fato está na previsibilidade natural dos acontecimentos judiciários e não prejudicará ninguém. Toda sentença pode ser mantida ou revista.

Se deixássemos de tomar providências processuais, porque a sentença em tese pode ser reformada, também não exigiríamos custas, depósito recursal, execução provisória e outras medidas, que se tornariam inócuas. Muitos juízes até desistiriam de decidir, pois seus julgamentos poderiam ser modificados.

Não é isto, entretanto, o que acontece.

Nos processos trabalhistas, estas medidas se tornam ainda mais necessárias, em razão do alto índice de manutenção do que é decidido em primeiro grau e dos problemas que a execução enfrenta na prática: ausência dos bens que sumiram, fraudes e ocultamentos, transferências fraudulentas de propriedade, etc. Hoje, segundo o TST, há, correndo na Justiça do Trabalho de todo o Brasil, cerca de um milhão e setecentas mil execuções, com escassa possibilidade de êxito. Temos que evitar a todo custo esta deformação.

E isto acontece exatamente porque não se bloquearam os bens do executado que, livre de restrições, os malbaratou.

Finalmente, temos a lei - "legem habemus". E ela diz, no art. 466 que a sentença condenatória (note-se sentença e não somente acórdão) vale como título constitutivo da hipoteca. O que a lei determina o intérprete tem que obedecer.

Interpretar é esclarecer, mas nunca revogar a lei por raciocínios de conveniência ou opinião pessoal.

3- Bem De Família E Hipoteca Judiciária.

A possibilidade de a hipoteca se tornar inútil porque a execução esbarrou num bem de família que, pela Lei 8009/90, é impenhorável, também não tem significado algum.

Se o bem de família for o único bem que possui, a parte pode alegar este fato até mesmo antes da constituição da hipoteca judiciária

Se a penhora não pode realizar-se, perde-se a própria execução e, por via de conseqüência, todo o crédito. O prejuízo é de todo o processo e não apenas da hipoteca judiciária. Esta contingência é própria de toda execução e não será por causa de sua suposta ocorrência que se vai excluir a garantia da sentença.

Pela exceção não se deduz nenhuma regra geral.

Ao contrário, a previsibilidade é que haja bens e a sentença seja exeqüível. E, de fato, é isto que acontece na prática. Muitos casos de descumprimento se verificam, de modo total ou parcialmente, exatamente porque o juiz não tomou providências para resguardar a autoridade de seus mandamentos, ou seja, não usou da hipoteca judiciária e de outros meios para cumprir o que foi determinado.

Ante a impossibilidade da ação, cessa-se o poder do homem. Porém, se a ação se mostra possível, o Direito deve criar todos os meios de concretizá-la.

4- Hipoteca E Execução Provisória.

Não são institutos que se excluem. Pelo contrário, somam-se para garantir o mandamento judicial. O art. 466 é expresso no § único: A sentença condenatória produz a hipoteca judiciária:

III- ainda quando o credor possa promover a execução provisória da sentença.

Portanto a lei, expressamente, quis a independência dos dois institutos, exatamente para garantir de certeza e segurança a execução da sentença. Se assim foi, não cabe ao intérprete raciocínios de conveniência, que valem mais como opinião pessoal, respeitável sem dúvida, mas de "lege ferenda" e nunca de "lege lata", pois a lei não é obra do intérprete, mas sim do legislador.

5- Compatibilidade Do Artigo 466 Com A

Execução Trabalhista.

O art. 769 da CLT não obsta em nada a aplicação da hipoteca judiciária no processo do trabalho. Trata-se de um instituto de processo, que empolga todas as jurisdições, quando houver sentença que condene o réu a uma prestação.

A única exceção reside na hipótese de sentença proferida em questão de Direito Público, pois não faz sentido constituir hipoteca sobre bem alienável do Estado, já que este só pode vender ou transacionar bens em virtude de lei. Além do mais, seus bens são impenhoráveis e a execução se faz por precatório, conforme determina o art. 100 da CF.

Seria ilógico racionar que um instituto de processo que garante a execução em geral fosse excluído do processo do trabalho por incompatibilidade.

Pelo contrário, o trabalho é bem jurídico fundamental, que a Constituição especialmente valorizou e prezou , colocando como fundamento da República "os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa" art. 1º , item lV da CF, bem como da ordem econômica "fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa" - art. 170 - e na ordem social "que tem como base o primado do trabalho e como objetivo o bem-estar social" - art. 193.

Se este valor "trabalho" se transforma em relação jurídica que se controverte em juízo, nem por isso perde o significado axiológico que a Constituição lhe empresta.

O raciocínio há de ser exatamente em sentido contrário. Devem-se acolher todos os institutos jurídicos que possam dar efetividade aos direitos constitucionalmente garantidos, exatamente para que a Constituição não seja palavras, mas sim fato e realidade.
6- Pagamento De Taxas Cartorárias E Tumulto

Na Execução.

Não gera a hipoteca judiciária qualquer tumulto ou dificuldade na execução.

O art. 466 diz expressamente que "a inscrição será ordenada pelo juiz na forma prescrita na Lei de Registros Públicos". Ora, qual o tumulto que esta ordem pode trazer?

O serventuário terá que obedecê-la de pronto. Se houver taxas, serão cobradas na execução a exemplo das demais, que o executado terá de pagar.

7- Penhora On Line E Outros Modos Mais

Rápidos De Execução.

A hipoteca judicial se dá após a sentença de primeiro grau. Ainda não há penhora e muito menos penhora "on line". Por isso é que ela exerce, desde logo, seu salutar efeito para garantir-lhe a execução da sentença, impedindo que a empresa malbarate seus bens.

Se, na execução, houver penhora "on line", tal medida reforçará a execução e não será redundante com outras providências já tomadas, a exemplo do § único do art. 466, III, que não incompatibilitou a hipoteca judiciária com a execução provisória.

Além do mais, cabendo ao juiz zelar pela execução, nada o impedirá de desconstituir garantias, quando não houver risco de frustração da execução. Se a parte, por exemplo, deposita o valor total da execução, não faz mais sentido qualquer outra medida, tais como execução provisória, etc.

Estes fatos hipotéticos são incidentes da execução, que o juiz sabiamente decidirá sem prejuízo a nenhuma das partes. Não se pode perder de vista o disposto no art. 620 do CPC: "Quando, por vários meios, o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor." Porém, ao aplicá-lo, não se pode perder de vista os objetos principais da execução, que é satisfazer o exeqüente.

Basta, pois, que o juiz do trabalho escolha o modo menos gravoso para o executado e mais seguro para o exeqüente, para que a lei seja cumprida integralmente.

8- Vitória De Pirro.

O reconhecimento da possibilidade de hipoteca judiciária pelo TST, através de voto do ministro Lélio Bentes, não é vitória de Pirro, como se salientou. Mas vitória concreta do bom senso em que a instância máxima trabalhista aceitou medida certa e correta para garantir a execução do crédito alimentar trabalhista.

Nem histórica nem juridicamente se pode comparar a decisão do TST com a vitória de Pirro.

Sabe-se que Pirro, rei de Epiro, depois de tremendo esforço na guerra contra os romanos, ganhou a batalha de Heracléia, mas perdeu tantos soldados que teria dito: minha vitória foi minha derrota.

Não é este o caso da hipoteca judiciária. Não prejudicou ninguém. Pelo contrário, foi mais uma garantia da execução trabalhista. Não houve, de nossa parte, nenhum esforço. Não precisamos sequer de travar batalhas jurídicas, para que ela fosse aceita. Na primeira vez que foi ao TST já saiu vitoriosa.

Só pode ser comparada com a vitória de Pirro, se vista pelo contrário: uma vitória sem perdas e com grande significado para a execução trabalhista e para o processo do trabalho em geral.

9- Gradação Legal Do Art. 655 Do CPC.

Também aqui a analogia é imprópria e a nada serve. Hipoteca judiciária nada tem a ver com a gradação legal da penhora. Esta é a apreensão de bens do executado para satisfazer a execução. Já a hipoteca judiciária é um meio de garanti-la, quando o processo ainda está na fase de conhecimento, impedindo que o condenado a uma prestação não desbarate seus bens nem frustre a sentença condenatória.

Não se trata de penhora. Logo inaplicável o art. 655 do CPC.

Por todos estes argumentos mantenho o meu ponto de vista e ratifico a hipoteca judiciária determinada pelo Juízo de origem sobre os bens da reclamada, na quantia suficiente à garantia da execução.

2.3- Multas Administrativas - Competencia Da Justiça Do Trabalho

O reclamado, por ter sido condenado ao pagamento de adicional de insalubridade submete-se à multa prevista no artigo 201 da CLT, que lhe aplico, no importe de 100 V.R., devidamente atualizados, a favor da União.

A Justiça do Trabalho, na forma do art. 114 da C.F., é competente para aplicar multas da alçada da autoridade administrativa, quando a violação de norma trabalhista estiver provada nos autos.

Nos dissídios entre empregados e empregadores compreende-se também a competência para aplicação de multas (CLT, art. 652, "d").

Se é da competência da Justiça do Trabalho decidir sobre o direito trabalhista, é claro que é ela também competente, por natural ilação, para aplicar a multa que derive do direito reconhecido em sua sentença, pois se trata de um dissídio típico entre empregado e empregador, derivado da relação de trabalho. Apenas se diferencia do dissídio comumente decidido num aspecto: em vez de ter uma função ressarcitória, a multa possui finalidade punitiva.

Esta função é na prática tão importante quanto a condenação patrimonial, para a garantia do ordenamento trabalhista. Como os mecanismos ressarcitórios são insuficientes, a multa reforça a condenação e ajuda no estabelecimento de um quadro desfavorável ao demandismo, pois a protelação passa a ser um ônus e não uma vantagem para o devedor.

Só assim se extinguirá esta litigiosidade absurda que hoje se cultiva na Justiça do Trabalho, sem dúvida, a maior e a mais cara do mundo. Além do mais, se garantirá o efeito educativo da lei, com a reversão da expectativa que hoje reina no fórum trabalhista: é melhor cumpri-la e pagar o débito, do que empurrá-lo anos afora, pelo caminho tortuoso e demorado dos recursos trabalhistas. Os juros reais e as multas desestimularão o negócio que hoje se pratica, em nome da controvérsia trabalhista e à custa do crédito do trabalhador. A Justiça do Trabalho, na forma do art. 114 da C.F., é competente para aplicar multas da alçada da autoridade administrativa, quando a violação de norma trabalhista estiver provada nos autos.

Nos dissídios entre empregados e empregadores compreende-se também a competência para aplicação de multas (CLT, art. 652, "d").

Se é da competência da Justiça do Trabalho decidir sobre o direito trabalhista, é claro que é ela também competente, por natural ilação, para aplicar a multa que derive do direito reconhecido em sua sentença, pois se trata de um dissídio típico entre empregado e empregador, derivado da relação de trabalho. Apenas se diferencia do dissídio comumente decidido num aspecto: em vez de ter uma função ressarcitória, a multa possui finalidade punitiva.

Esta função é na prática tão importante quanto a condenação patrimonial, para a garantia do ordenamento trabalhista. Como os mecanismos ressarcitórios são insuficientes, a multa reforça a condenação e ajuda no estabelecimento de um quadro desfavorável ao demandismo, pois a protelação passa a ser um ônus e não uma vantagem para o devedor.

Só assim se extinguirá esta litigiosidade absurda que hoje se cultiva na Justiça do Trabalho, sem dúvida, a maior e a mais cara do mundo. Além do mais, se garantirá o efeito educativo da lei, com a reversão da expectativa que hoje reina no fórum trabalhista: é melhor cumpri-la e pagar o débito, do que empurrá-lo anos afora, pelo caminho tortuoso e demorado dos recursos trabalhistas. Os juros reais e as multas desestimularão o negócio que hoje se pratica, em nome da controvérsia trabalhista e à custa do crédito do trabalhador.

2.4- Multa Administrativa - Condenação Ao Pagamento De Adicional De Insalubridade

O reclamado foi condenado a pagar o adicional de insalubridade. Não basta que seja condenado apenas à reposição patrimonial do que a lei prevê. É preciso também que se ordenem medidas para a remoção da insalubridade.

A saúde, a segurança e a higiene na relação de emprego são um direito do trabalhador e um bem constitucionalmente garantido, conforme a expressa previsão do item XXII do art. 7º da CF:

" São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais.

XXII- redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. "

A saúde do trabalhador é um bem maior, porque é através dela que se garante a mão do trabalho e a energia produtora dos bens e serviços que dinamiza toda a sociedade e lhe provê as diferentes carências.

Uma sociedade sem trabalho é impensável e, sem trabalho eficiente, produtivo e criador, torna-se incapaz de satisfazer às necessidades coletivas. O trabalho é a força transformadora e adaptiva da natureza às necessidades humanas.

Por isso, o relevo e a importância, que a Constituição deu ao ambiente de trabalho, que ela quis saudável e isento de riscos ( ou, pelo menos com risco reduzido) para manterem-se íntegras a saúde, a higiene e segurança.

É verdade que a Constituição, no item XXIII, monetarizou o risco, prescrevendo um adicional de remuneração para as atividades penosas,insalubres ou perigosas.

Mas os dois dispositivos se completam: primeiro, a autoridade pública há de impor a remoção ou redução dos riscos. Quando se tornarem impossíveis de serem removidos ou diminuídos, então haverá o pagamento do adicional.

Esta interpretação é lógica e provém da própria natureza dos fatos. Não se compensa com dinheiro a perda da saúde ou da vida humana, bens maiores que garantem a existência do trabalho. O homem não é um bem natural renovável. Sua saúde e integridade corporais têm limites. Uma vez perdidas não se recompõem mais na mesma pessoa.

Um trabalhador prematuramente aposentado ou morto é uma perda irreparável para o país. É preciso, pois, preservá-lo. Só assim se garantirá o crescimento e o bem-estar coletivos.

Portanto todo o esforço do legislador e do intérprete há de ser pela extinção e redução de riscos inerentes ao trabalho. Se impossível, então haverá a compensação monetária.

O legislador infraconstitucional foi fiel ao princípio constitucional.

No art. 154 da CLT, previu expressamente a proteção através de outras fontes normativas, estaduais e municipais e também de convenção coletiva. Naturalmente, aqui se incluem até mesmo as normas protetivas de natureza contratual.

Às DRTs foi atribuído o poder de fiscalização, imposição de penalidades e providências para o cumprimento das normas do capítulo V, determinando as obras e reparos que se fizerem necessárias no local de trabalho para esta finalidade - art. 156.

Às empresas cumpre o acatamento destas normas, cumprindo-as e fazendo-as cumprir - art.157. A elas o empregado deve também prestar obediência, facilitando sua aplicação, sob pena de dispensa por justa causa. Daí a criação das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes- CIPAs, órgãos de grande significa social, que prestam reconhecido serviço à integridade do trabalhador.

Por isso, o legislador consolidado previu a penalidade do art. 201, independentemente do adicional de remuneração, pretendendo assim dar à saúde do trabalhador plena proteção, de acordo com os princípios constitucionais já referidos.

Levando em conta todos estes fatores, e vencido o problema da competência, aplico ao reclamado, conforme já exposto no item anterior destes fundamentos, a multa de 100 vezes o valor fixado no art. 201, que será atualizado na forma da legislação em vigor, incidindo-se as disposições legais substitutivas do valor de referência ali previsto.

Porém o importante não é punir a reclamada e fixar adicionais irrisórios com que se pretende pagar o alto preço da saúde do trabalhador, mas eliminar o agente provocador.

Em torno da monetarização dos adicionais, montou-se uma grandiosa empresa lucrativa de peritos, agências, intermediários e lobbies, onde se pensa em tudo, menos na preservação da saúde do trabalhador.

É hora de acabar com esta lastimável indústria e pensar no interesse público, preservando a saúde do trabalhador como bem constitucionalmente garantido.

A Constituição, no já citado art. 7º, XXII, previu a diminuição dos riscos inerentes ao trabalho.

A CLT, no art. 191 diz : " A eliminação ou a neutralização da insalubridade ocorrerá:

Com a adoção de medidas que conservam o ambiente de trabalho dentro dos limites de tolerância.

Com a utilização de equipamentos de proteção individual ao trabalhador, que diminuam a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância.

Parágrafo único. Caberá às Delegacias Regionais do Trabalho, comprovada a insalubridade, notificar as empresas, estipulando prazos para a sua eliminação ou neutralização, na forma deste artigo. "

Tendo em mira o interesse público que por definição é superior ao interesse de grupos ou pessoas, e objetivando dar concretitude ao bem constitucional maior, que é a saúde do trabalhador, determino que se dê ciência à Delegacia Regional do Trabalho, na pessoa do Delegado Regional, para que estabeleça com o reclamado um plano de extinção ou diminuição da atividade insalubre em todos os seus departamentos, informando ao juiz da execução, tão logo transite em julgado o presente processo, sobre as medidas tomadas.

3- CONCLUSÃO

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, por sua Quarta Turma, à unanimidade, conheceu do recurso do reclamante; no mérito, por maioria de votos, deu-lhe provimento parcial para fixar a base de cálculo do adicional de insalubridade na efetiva remuneração do autor, vencido parcialmente o Exmo. Juiz Convocado Fernando Luiz Gonçalves Rios Neto, unanimemente, conheceu do recurso do réu; no mérito, por maioria de votos, deu-lhe provimento parcial, apenas para acolher o pedido de que, quando da liquidação e na apuração do quantum devido ao título de horas extras, seja observada a efetiva evolução salarial do autor, vencido parcialmente o Exmo. Juiz Convocado Fernando Luiz Gonçalves Rios Neto . O reclamado é condenado ainda, de ofício, no pagamento da multa de 100 vezes o valor fixado no artigo 201 da CLT, que será atualizado na forma da legislação em vigor, incidindo-se as disposições legais substitutivas no valor de referência ali previsto, a favor da União. Faculta-se ao reclamante levantar, do depósito que existe nos autos, quantia até 60 salários mínimos, conforme exposto na fundamentação do voto. Por mais compatível com as parcelas que compõem a condenação, o valor dela é fixado em R$25.000,00, com custas processuais no importe de R$500,00, pelo acionado, dedutível o que já foi pago ao título.

Belo Horizonte, 02 de junho de 2010

Antônio Álvares da Silva
Desembargador Relator




JURID - Honorários Advocatícios Obrigacionais. [14/06/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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