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quarta-feira, 2 de junho de 2010

JURID - Apelação cível. RA. responsabilidade civil. discriminação. [02/06/10] - Jurisprudência


Apelação cível. RA. responsabilidade civil. discriminação por opção sexual. Dano moral. quantum indenizatório.
MBA Direito Comercial - Centro Hermes FGV

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul - TJRS

Apelação Cível nº 70033514282

TCSD

Nº 70033514282

2009/Cível

Apelação cível. recurso adesivo. responsabilidade civil. discriminação por opção sexual. dano moral. quantum indenizatório.

Contexto probatório dos autos que evidencia ter o autor sido vítima de discriminação por sua opção sexual ao tentar efetuar a compra de uma televisão em loja de eletrodomésticos. Dano moral caracterizado. Valor da condenação fixado na origem mantido.

apelo e recurso adesivo desprovidos.

Apelação Cível- Nº 70033514282

Nona Câmara Cível - Comarca de Canoas

APELANTE/RECORRIDO ADESIVO: MANZOLI S/A COMERCIO E INDUSTRIA

RECORRENTE ADESIVO/APELADO: CARLOS UBIRAJARA FLAIN

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo e ao recurso adesivo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, as eminentes Senhoras Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira (Presidente e Revisora) e Des.ª Marilene Bonzanini Bernardi.

Porto Alegre, 12 de maio de 2010.

DES. TASSO CAUBI SOARES DELABARY,
Relator.

RELATÓRIO

Des. Tasso Caubi Soares Delabary (RELATOR)

Cuida-se de apreciar apelação e recurso adesivo interpostos por MANZOLI S/A COMÉRCIO E INDÚSTRIA e CARLOS UBIRAJARA FLAIN, respectivamente, em face da sentença de procedência lançada nos autos da ação indenizatória que o recorrente adesivo ajuizou em desfavor da apelante.

A decisão atacada, em síntese, reconheceu ter havido descriminação quanto à opção sexual do autor por parte dos prepostos da ré, loja de eletrodomésticos, fixando a recomposição material dos danos em R$ 4.650,00 (quatro mil, seiscentos e cinquenta reais). Assim dispôs a julgadora singular:

Em face do exposto, torno definitiva a liminar e julgo PROCEDENTES os pedidos para condenar a ré a pagar ao autor indenização, a título de danos morais, no valor de R$ 4.650,00 (quatro mil, seiscentos e cinquenta reais), corrigidos monetariamente pelo IGP-M, até o devido pagamento, a partir da data da sentença, e acrescido de juros legais de mora de 1% ao mês, contados da citação.

Sucumbente, arcará a demandada com o pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios da parte adversa, os quais, observados os parâmetros do § 3º do art. 20 do CPC, aplicáveis à espécie, fixo em 15% sobre o valor da condenação, atualizada pelo IGP-M desde a data da sentença.

Nas razões de apelação a requerida MANZOLI S/A COMÉRCIO E INDÚSTRIA (Lojas Manlec) sustentou não ter havido qualquer espécie de discriminação ao autor, estando distorcida a versão para os fatos trazida na inicial. Rebateu, ademais, a verossimilhança do testemunho indicado na sentença, pois não esclarecida a relação do depoente com o autor. Sucessivamente, combateu o quantum indenizatório, com o que pugnou pelo provimento do recurso com a consequente reforma da sentença.

Concomitantemente às contrarrazões, o autor CARLOS UBIRAJARA FLAIN apresentou recurso adesivo defendendo a necessidade de majoração do quantum indenizatório para, no mínimo, 50 salários mínimos.

Apresentadas contrarrazões ao recurso adesivo, vieram os autos a esta Corte e a mim distribuídos por sorteio.

É o relatório.

VOTOS

Des. Tasso Caubi Soares Delabary (RELATOR)

Ilustres Colegas.

Conheço dos recursos, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade - o adesivo dispensado do preparo em razão da gratuidade jurisdicional deferida na origem e não impugnada pela parte adversa. Em relação aos conteúdos, considerando o nexo de prejudicialidade existente entre eles, examino em primeiro momento o apelo, que devolveu amplamente a matéria debatida na origem, considerando que o adesivo tem por escopo exclusivo a majoração do quantum indenizatório.

Com efeito, a controvérsia gira em torno do tratamento dispensado ao autor no momento em que foi comprar uma televisão portátil nas Lojas Manlec, nome de fantasia da requerida/apelante. E pelo que se extrai de mais verossímil da instrução, na linha do definido pela sentença, merece acolhimento o pedido indenizatório.

A testemunha Soniamara, única a prestar compromisso durante a instrução (fls. 69vº-70vº), confirmou a versão da inicial e referendada pelo depoimento pessoal do autor a respeito da utilização de expressões com caráter preconceituoso à opção sexual do demandante. Frase do tipo: "vocês gays são muito chatos" (fl. 70) e constantes embaraços para concretizar a venda do televisor podem ser interpretados como atentado à dignidade do demandante, merecendo procedência a pretensão indenizatória, já que suficientes à caracterizar dano moral in re ipsa.

Registro que não impressionam as dúvidas levantadas pelo apelante a respeito da credibilidade das palavras da testemunha compromissada. Isto porque a "contratida" está totalmente extemporânea, pois deveria ter sido apresentada na solenidade, imediatamente após a qualificação e antes de iniciado o depoimento (art, 414, § 1º, do CPC). A este respeito veja-se:

1. Contradita: Pela qualificação da testemunha, realizada antes do início de seu depoimento, os advogados poderão contraditá-la, isto é, argüir seu impedimento, incapacidade ou suspeição para depor.

2. Momento final para arguição da contradita. A contradita deve ser levantada logo após a qualificação da testemunha, podendo ser argüida até o momento imediatamente anterior ao início de depoimento. Iniciado este, estará preclusa a faculdade de contraditar a testemunha. (1)

De outra parte, os vendedores arrolados pela requerida que presenciaram os fatos e rebateram os termos da inicial prestaram depoimento apenas na condição de informantes (fls. 71/76), de maneira que devem ter suas palavras consideradas com ressalvas.

Destarte, tomados os fatos a partir da versão trazida na inicial, confirmada por idônea prova testemunhal, tenho que os danos morais sofridos são in re ipsa e decorrem do próprio fato. A este respeito veja-se a jurisprudência:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DISCRIMINAÇÃO À CASAL HOMOSSEXUAL EM BAILE PROMOVIDO POR CLUBE SOCIAL. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. MAJORAÇÃO. 1. RESPONSABILIDADE CIVIL. A Constituição Federal, em seu artigo 3º, inciso IV, institui o combate à discriminação, seja de qual espécie for, como um dos objetivos precípuos da República Federativa do Brasil. Em vista disso, não podem eventuais peculiaridades regionais servir de excludente da responsabilidade dos demandados, em face da ocorrência de discriminação, que, no caso em tela, se dera com fundamento na opção sexual da demandante. 2. Hipótese em que a autora, conjuntamente com sua companheira, fora advertida por membro da diretoria de clube social, em plena festa promovida pelo mesmo, a que cessassem as carícias que vinham trocando. Conduta que não era costumeiramente exigida de casais heterossexuais, o que indica a efetiva prática de discriminação. (...). (Apelação Cível Nº 70017041955, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 17/09/2008)

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. DISCRIMINAÇÃO POR OPÇÃO SEXUAL. VALOR DA INDENIZAÇÃO. Comprovando a prova testemunhal que o demandante foi vítima de discriminação por ser travesti ao ser atendido em posto de saúde, sofrendo constrangimento diante de outras pessoas, impõe-se o dever de indenizar por danos morais. Indenização fixada na sentença que se mostra ajustada ao caso dos autos, considerando a capacidade econômica dos demandados. APELO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70025273111, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Romeu Marques Ribeiro Filho, Julgado em 03/09/2008)

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS E MATERIAIS. DISCRIMINAÇÃO HOMOSSEXUAL. INDENIZAÇÃO. Presente o dever do requerido em indenizar os autores, vítimas de preconceito e ofensas verbais entre vizinhos, tendo por escopo a opção sexual dos ofendidos. Danos materiais e morais comprovados. Quantum indenitário minorado, em atenção às peculiaridades do caso e aos parâmetros praticados pelo Colegiado. Ônus sucumbenciais redistribuídos. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. (Apelação Cível Nº 70014074132, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Maria Nedel Scalzilli, Julgado em 25/05/2007)

Certo o dever de indenizar, passo ao exame do quantum, fixado na origem em R$ 4.650,00 e matéria objeto de impugnação do apelo e do recurso adesivo.

Neste aspecto, à vista da inexistência de parâmetros legais, o julgador deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade(2) . Outrossim, deve atentar para a natureza jurídica da indenização(3) , que deve constituir uma pena ao causador do dano e, concomitantemente, compensação ao lesado, além de cumprir seu cunho pedagógico sem caracterizar enriquecimento ilícito.

Afora isso, no caso específico dos autos, não se pode olvidar que o fato não teve maiores repercussões além dos envolvidos (autor e prepostos da ré), de maneira que o valor fixado na origem mostra-se adequado e vai mantido.

Do exposto, o voto é no sentido de negar provimento ao apelo e ao agravo retido.

Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira (PRESIDENTE E REVISORA)

Analisei cautelosamente os autos e acompanho o voto do Eminente Relator.

Des.ª Marilene Bonzanini Bernardi - De acordo com o(a) Relator(a).

DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA - Presidente - Apelação Cível nº 70033514282, Comarca de Canoas: "NEGARAM PROVIMENTO AO APELO E AO RECURSO ADESIVO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: MARISE MOREIRA BORTOWSKI

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1 - NERY JUNIOR, Nelson e NERY. Código de processo civil comentado. 10ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 645. [Voltar]


2 - REsp 797.836/MG, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUARTA TURMA, j. 02.05.2006. [Voltar]


3 - "A reparação pecuniária do dano moral é um misto de pena e satisfação compensatória. (...). Penal, constituindo uma sanção imposta ao ofensor. (...). Satisfatória ou compensatória, (...) a reparação pecuniária visa proporcionar ao prejudicado uma satisfação que atenue a ofensa causada." (DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 16ª ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 94, V. 7)

"Segundo nosso entendimento a indenização da dor moral, sem descurar desses critérios e circunstâncias que o caso concreto exigir, há de buscar, como regra, duplo objetivo: caráter compensatório e função punitiva da sanção (prevenção e repressão), ou seja: a) condenar o agente causador do dano ao pagamento de certa importância em dinheiro, de modo a puni-lo e desestimulá-lo da prática futura de atos semelhantes; b) compensar a vítima com uma importância mais ou menos aleatória, em valor fixo e pago de uma só vez, pela perda que se mostrar irreparável, ou pela dor e humilhação impostas." (STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil, 6ª ed., São Paulo: RT,2004, p. 170.) [Voltar]




JURID - Apelação cível. RA. responsabilidade civil. discriminação. [02/06/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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