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quinta-feira, 17 de junho de 2010

JURID - Princípio da identidade física do juiz (art. 399, § 2° ). [17/06/10] - Jurisprudência


Penal e processo penal. Princípio da identidade física do juiz (art. 399, § 2° do CPP). Aplicação subsidiária.
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Tribunal Regional Federal - TRF2ªR

APELACAO CRIMINAL - 2006.51.08.000485-4

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL ABEL GOMES

APELANTE: ANTONIO DE SANTANA

ADVOGADO: MARCELO RIBEIRO CARDOSO E OUTROS

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

ORIGEM: VARA ÚNICA DE SÃO PEDRO DA ALDEIA (200651080004854)

EMENTA

PENAL E PROCESSO PENAL - PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ (ART. 399, § 2o DO CPP) - APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DAS EXCEÇÕES PREVISTAS NO ART. 132 DO CPC - PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE DA AÇÃO PENAL - PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE - CRIME AMBIENTAL - ART. 60 DA LEI Nº 9.605/98 - ATIVIDADE POTENCIALMENTE POLUIDORA - AUSÊNCIA DE LICENÇA DE ÓRGÃOS AMBIENTAIS - RECURSO NÃO PROVIDO.

I - A Lei 11.719/2008, ao introduzir o parágrafo 2º ao art. 399 do CPP, estendeu ao processo penal a regra já existente no processo civil que contempla a regra da identidade física do Juiz, materializada no art. 132 do CPC, vinculando o juiz que presidiu a instrução, ao julgamento da causa.

II - O CPP não previu os limites da regra, razão pela qual deve-se aplicar, subsidiariamente, a regra contida no artigo 132 do CPC, em relação às exceções previstas, com base no art. 3º do Estatuto Processual Penal.

III - Em que pese haver opiniões em contrário, o certo é que o Princípio da indivisibilidade da ação penal melhor se aplica à ação penal privada (art. 48 do CPP) e não à ação penal pública, já que para esta vigora o Princípio da obrigatoriedade, o que consubstancia a dispensa do primeiro princípio.

IV - O apelante foi condenado pela prática do crime previsto no art. 60 da Lei n° 9.605/98, tendo em vista a realização de obras potencialmente poluidoras, em Reserva Extrativista, sem o devido licenciamento ambiental.

V - A atividade desempenhada pelo recorrente necessita do licenciamento ambiental, nos termos do "Anexo 1" da Resolução nº 237/97-CONAMA, bem como no "Anexo VIII" da Lei nº 6.938/81.

V - Recurso não provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os presentes autos, em que são partes as acima indicadas, acordam os membros da Primeira Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por maioria, em negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator.

Rio de Janeiro, 14 de abril de 2010 (data do julgamento).

ABEL GOMES
Desembargador Federal
Relator

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta por ANTONIO DE SANTANA, à fl. 297, em face da sentença de fls. 280/292, publicada em secretaria em 16/07/2009 e proferida pelo Dr. BRUNO FABIANI MONTEIRO, Juiz Federal Substituto da Vara Federal de São Pedro da Aldeia, que o condenou pela prática do crime previsto no art. 60 da Lei n° 9.605/98 e o absolveu no que tange ao delito do art. 40 desta Lei de crimes ambientais, com fulcro no art. 386, VII do CPP. Fixou a pena-base acima do mínimo legal, em 2 (dois) meses de detenção e 30 (trinta) dias-multa, sendo o dia-multa fixado no valor de 1/3 (um terço) do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos, atento a situação financeira do acusado, que exerce o cargo de Diretor-Presidente do Estaleiro Cassinú Ltda. A pena privativa de liberdade foi substituída, nos termos do artigo 44 do CP, por uma restritiva de direitos consistente em prestação pecuniária no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), que será revertida em favor de entidade assistencial.

O Ministério Público Federal denunciou o ora recorrente, às fls. 02/02-D, pela prática das condutas tipificadas nos artigos 40 e 60 da Lei 9.605/98, em concurso material (art. 69 do CP), uma vez que fez funcionar obras potencialmente poluidoras decorrentes do fundeio e execução de reparos na Plataforma de Prospecção de Petróleo PRIDE BRASIL na Reserva Extrativista Marinha de Arraial do Cabo/RJ - ResExMar-AC, sem o devido licenciamento ambiental.

A denúncia foi recebida em 20/02/2008 (fl. 78).

Em suas razões recursais, às fls. 298/306, alegou preliminarmente, a nulidade da sentença por não ter sido proferida pela juíza que presidiu as audiências, violando, portanto, o art. 399, § 2º do CPC, com a redação conferida pela Lei 11.719/2008. Segue, pugnando pelo reconhecimento da prescrição, que teria ocorrido entre a data dos fatos e o recebimento da denúncia, considerando, para tanto, ter-se consumado o delito no dia 17/02/2006 (data que a plataforma teria ancorado na área de fundeio do Porto do Forno, em Arraial do Cabo/RJ) e pelo reconhecimento da inépcia da denúncia por não estarem no pólo passivo, incluídos a Empresa e os demais sócios do Estaleiro Cassinú Ltda., nem os proprietários e os demais sócios da plataforma que adentrou ao Porto de Arraial do Cabo. No mérito, requer sua absolvição em relação ao crime do art. 60 da Lei nº 9.605/98, enfatizando a não culpabilidade quanto ao cometimento deste delito. Requer, alternativamente, a redução da pena para o mínimo legal, por se tratar de réu primário e com bons antecedentes.

Contrarrazões ofertadas, às fls. 314/318, requerendo que seja negado provimento à apelação interposta, mantendo-se na íntegra a sentença nos exatos termos em que prolatada.

No parecer lançado às fls. 325/337, o Procurador Regional da República, Dr. PAULO FERNANDO CORRÊA, opinou pelo não provimento do apelo, devendo ser mantida in totum a sentença ora guerreada.

Ressalto, por oportuno, com fulcro no art. 251 do CPP, que a prescrição da pretensão punitiva pela pena em concreto ocorrerá em 15/07/2011.

É o relatório.

À douta Revisão.

Rio de Janeiro, 14 de janeiro de 2010.

VOTO

1. Admissibilidade

O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade, de modo que deve ser conhecido.

2. Preliminares

2.1 Da Identidade física do Juiz

A partir da entrada em vigor da Lei nº 11.719/2008, que introduziu o § 2º ao art. 399 do CPP, verifica-se importante inovação na legislação processual penal, qual seja, a de que o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença.

Registre-se que tal regra, já se encontrava materializada na esfera do processo civil, no art. 132 do CPC, vinculando o juiz que presidiu a instrução, ao julgamento da causa, sendo certo que tal vinculação comportava ressalvas, vejamos:

"Art. 132- O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor.

Parágrafo único - Em qualquer hipótese, o juiz que proferir a sentença, se entender necessário, poderá mandar repetir as provas já produzidas."(grifo nosso)

Discute-se, portanto, se tal inovação no âmbito do processo penal seria uma regra absoluta não abrigando exceções.

A identidade física do juiz não pode ser tomada de forma irascível, devendo se nortear pela incidência subsidiária do art. 132 do CPC c/c art. 3º do CPP, a fim de evitar hipóteses teratológicas como, por exemplo, os casos de réus presos cujos processos precisassem aguardar o retorno de uma convocação do juiz para o Tribunal, por exemplo, ou de uma licença por motivo de saúde mais prolongada. Não se perca de vista, ainda, o caso mais caricato, na hipótese de Juiz promovido, que como membro do Tribunal ainda estivesse a proferir sentenças de processos instruídos em primeiro grau. O abrandamento é necessário, já que nenhum desses casos encontra solução na sucinta redação do novel dispositivo.

Corroborando com esse entendimento, transcrevo julgado deste e. Tribunal Regional Federal, a saber:

"PROCESSUAL PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA ENTRE MAGISTRADOS. PRINCÍPIO OU REGRA DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. ART. 399, § 2o DO CPP. INOVAÇÃO IMPORTANTE DO PROCESSO PENAL. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DAS EXCEÇÕES PREVISTAS NO ART. 132 DO CPC. REGRA NÃO ABSOLUTA. RÉUS PRESOS. INSUBSISTÊNCIA DIANTE DA REMOÇÃO OU PERDA DE DESIGNAÇÃO PARA ATUAÇÃO NO ÓRGÃO JUDICIAL.

1. Trata-se de conflito de competência entre magistrados, tendo em vista os divergentes entendimentos quanto à aplicação do princípio ou regra da identidade física do juiz, previsto no artigo 399, § 2o do CPP, com a redação conferida pela Lei 11.719/2008.

2. A Lei 11.719/2008, ao introduzir o parágrafo 2º ao art. 399 do CPP do CPP, estendeu ao processo penal a regra já existente no processo civil que contempla a regra da identidade física do Juiz, materializada no art. 132 do CPC, vinculando o juiz que presidiu a instrução, ao julgamento da causa.

3. O CPP não previu os limites da regra, razão pela qual deve-se aplicar, subsidiariamente, a regra contida no artigo 132 do CPC, em relação às exceções previstas, com base no art. 3º do Estatuto Processual Penal.

4. A regra da identidade física é extremamente importante, especialmente para garantir que o juiz que profira a decisão seja o magistrado que colheu a prova.

5. A regra da identidade física, entretanto, não é absoluta e não pode se sobrepor, de modo desproporcional, aos demais princípios e regras constitucionais e processuais, como o do juiz natural, da duração razoável do processo, do devido legal e da competência.

6. O Direito Processual, Civil e Penal, deve buscar, no que for possível, interpretação harmônica. No caso, a regra do Código de Processo Penal, com suporte no seu art. 3º, deve buscar apoio no texto do art. 132 do Código de Processo Civil e da sua interpretação dada pela doutrina e jurisprudência.

7. A regra da identidade física do juiz, no Processo Penal, também deve ser ressalvada nas hipóteses de convocação, licença, promoção, aposentadoria ou de afastamento por qualquer motivo, considerando, inclusive, o princípio da duração razoável do processo, especialmente diante de réus presos, como no presente conflito.

8. A regra da identidade física do juiz deve se coadunar com a do juiz natural e competente, razão pela qual encontra aplicabilidade principalmente no âmbito interno do órgão judicial, não se mantendo diante de afastamentos por qualquer motivo, como expresso no art. 132 do CPC, como férias, remoção ou término da designação.." (CJ nº 041 - 2009.02.01.000069-0 - Rel. Juiz Federal Convocado ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES - 1ª Turma Especializada, data do julgamento 18/02/2009 - DJU de 03/04/2009)

No presente caso, a Drª ÉRICA FARIA ARÊAS BALLA, juíza que predidiu a instrução processual, foi removida para 5ª Vara Federal de São João de Meriti, nos termos do Ato nº 313 de 16/06/2009, emanado da Presidência desta e. Corte, publicado no Diário Oficial da União, Seção 2, em 18/06/2009, à fl. 51, não possuindo, portanto, competência para prolatar sentenças procedentes da Vara Federal de São Pedro da Aldeia. Sendo certo, contudo, que competia ao magistrado que a sucedeu prolatar a sentença sob exame.

Pertinente, portanto, parece ser o enunciado n. 05, encontrado nos debates levados a cabo no I FORECRIM (Foro Regional Criminal), realizado no âmbito da 2ª Região em outubro de 2009 para discutir a aplicação das modificações introduzidas pela Reforma do CPP de 2008/2009, e que dispõe: "O juiz que presidir todos os atos de instrução fica, necessariamente, vinculado para o julgamento, salvo em caso de afastamento da jurisdição".

Rejeito a preliminar.

2.2 Da Prescrição

O art. 60 da Lei n° 9.605/98, tipo imputado ao denunciado, comina pena de 1 (um) a 6 (seis) meses de detenção, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Ante o preconizado no art. 109, inciso VI do Código Penal, a prescrição da pretensão punitiva do crime acima descrito, se verificaria em 2 (dois) anos.

Alega o apelante que teria ocorrido a prescrição entre a data dos fatos e o recebimento da denúncia, considerando, para tanto, ter-se consumado o delito no dia 17/02/2006 (data em que a plataforma teria ancorado na área de fundeio do Porto do Forno, em Arraial do Cabo/RJ).

Não lhe assiste razão, contudo. A denúncia narra que o recorrente foi autuado pelo IBAMA em 22/02/2006, conforme se pode verificar no Auto de Infração nº 361160-D (fl. 04). Consta também, no laudo pericial de fls. 56/63, fotos digitais e vídeo datados em 24/02/2006, que se prestam a comprovar a presença da plataforma "PRIDE BRAZIL" na Reserva Extrativista Marinha de Arraial do Cabo/RJ ainda nessa data.

É sabido que o delito tipificado no art. 60 da Lei n° 9.605/98 é crime de ação múltipla ou conteúdo variado, possuindo um de seus verbos reitores "fazer funcionar", de modo que, nesta modalidade, o crime pode assumir o caráter permanente e protrair-se no tempo, alargando, assim, o prazo prescricional.

Observa-se que o recebimento da denúncia ocorreu em 20/02/2008 (fl. 78), não decorrendo, portanto, o prazo de dois anos entre as datas interruptivas da prescrição.

Assim sendo, ante as provas contidas nos autos, não se verifica a consumação da prescrição da pretensão punitiva nos termos alegados pelo recorrente.

2.3 Da Inépcia da Denúncia

O recorrente pleiteia a inépcia da denúncia por não terem sido incluídos no pólo passivo a empresa e os demais sócios do Estaleiro Cassinú Ltda., nem os proprietários e os demais sócios da plataforma que adentrou ao Porto de Arraial do Cabo, ou seja, implicitamente, fundamenta a alegada inépcia na suposta inobservância ao princípio da indivisibilidade da ação penal.

No caso dos autos, trata-se de ação penal pública, de sorte que não cabe a aplicação do princípio da indivisibilidade da ação penal. Em que pese haver opiniões em contrário, o certo é que o referido princípio melhor se aplica à ação penal privada (art. 48 do CPP) e não à ação penal pública, já que para esta vigora o princípio da obrigatoriedade, o que consubstancia a dispensa do primeiro princípio, porquanto todos os autores devem ser incluídos na peça vestibular, ressalvada, no entanto, a hipótese de aditamento à denúncia até a prolação de sentença.

Ademais, a denúncia só é imprópria ou insuficiente quando descreve fato flagrantemente atípico ou inviabiliza o exercício da ampla defesa. No caso dos autos, a inicial acusatória narra com clareza que ANTONIO SANTANA era o responsável pela entrada e fundeio da plataforma "PRIDE BRAZIL" na Reserva Extrativista, onde foram efetuados os reparos, à revelia da autoridade ambiental competente (fls. 41/42), indicando o fato típico e permitindo amplo exercício da defesa.

Nota-se, ainda, que a denúncia foi lastreada em inquérito policial, restando minimamente demonstrado o nexo entre o agente e o crime, nos termos do disposto no art. 41 e 43, a contrario sensu, (este último aplicável à época - tempus regit actum), ambos do CPP.

Destarte, rejeito a preliminar de inépcia da denúncia.

Afastadas todas as preliminares, passo ao mérito propriamente.

3.Mérito.

O tipo penal inserto no art. 60 da Lei nº 9.605/98 vem assim descrito, in verbis:

"Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente".

A materialidade e autoria, conforme bem salientado no parecer emanado pelo Procurador Regional da República, Dr. PAULO FERNANDO CORRÊA, restaram plenamente comprovadas, uma vez que "não existem quaisquer dúvidas acerca de sua comprovação, que se encontra às escâncaras no decorrer de todo o processo, tanto na prova documental, quanto testemunhal", senão vejamos:

A materialidade da conduta ficou patente, diante do documento de fl. 41, consistente em requerimento apresentado pelo acusado, em 08/02/2006, ao Chefe da Reserva Extrativista em questão, Sr. MARCUS MACHADO GOMES, solicitando autorização para fundeio da Plataforma "PRIDE BRAZIL", objetivando executar reparos navais no interior da Reserva. Ocorre que tal autorização foi negada, em 09/02/2006, consoante ofício nº 012/06 - IBAMA RESEXMAR AC, documento juntado à fl. 42.

Não obstante tal negativa, o acusado promoveu a entrada e o fundeio da Plataforma em questão, dando ensejo a lavratura pelo IBAMA do Auto de Infração de nº 361160-D, fl. 04 e 37, em 22/02/2006.

Saliente-se que a "fabricação e reparo de embarcações e estruturas flutuantes", encontra-se no rol de atividades ou empreendimentos sujeitos a licenciamento ambiental, constantes no "Anexo 1", da Resolução de nº 237/97 do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA, bem como no "Anexo VIII" da Lei nº 6.938/81 como "atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos ambientais".

Ocorre que o tipo penal do art. 60 da Lei nº 9.605/98, exige como elemento imprescindível para sua caracterização, que o estabelecimento, a obra ou serviço seja potencialmente poluidor. Vale dizer, que sejam capazes de tender ao dano, segundo o que puder ser aferido do alcance da conduta adotada. Um crime de perigo concreto, com certeza.

Portanto, não basta à execução de serviços sem a licença pertinente. É preciso que as atividades desempenhadas ali sejam potencialmente poluidoras, ou seja, que representem perigo concreto de poluição.

De fato, é inequívoca a entrada da Plataforma "PRIDE BRAZIL" na Reserva Extrativista em questão, objetivando executar reparos navais no interior da mesma. Todavia, não se pode confundir a materialidade da conduta do agente com o resultado normativo de perigo concreto que de tal conduta possa ter advindo para o bem jurídico em questão, o que enseja a "materialidade" a ser aferida por prova cabal.

Ocorre que da análise das provas contidas nos autos, tem-se que a materialidade do resultado normativo restou também comprovada. Conforme se pode verificar, nos laudos de nº 161/2007 e nº 1537/2008, proferidos pelo Departamento de Polícia Federal - Setor Técnico-Científico, às fls. 56/63 e 216/221.

Constam também, no depoimento da testemunha MARCUS MACHADO GOMES (Chefe da ResExMar AC), às fls. 199/202, e no depoimento da testemunha GILSON GOBATTO (Agente Público Federal), às fls. 181/182, declarações de que as atividades de raspagem de incrustação do casco poderiam causar risco ao ecossistema local, vejamos, respectivamente, in verbis:

"...que o reparo na plataforma envolvia a troca do sistema de propulsão, o que demandava a raspagem do local onde havia fixação do referido sistema; que a preocupação com a raspagem deve-se a eventual risco de inserir no ecossistema local espécies vivas (crustáceos, moluscos e algas) de origem exógena;"(fl.201)

"...mesmo sem a licença a plataforma adentrou a área de preservação e iria começar o procedimento de reparos. Ressalta que quando se realiza raspagem e retirada de água de lastro, recomenda-se que o procedimento seja realizado em alto mar, para evita 'contaminação' da área com animais exóticos."(fl.181)

A autoria restou evidente, uma vez que acusado em seu interrogatório (fls. 88/90) confirma que de forma consciente, permitiu que se adentrasse na Reserva Ambiental com a referida plataforma sem autorização do órgão ambiental competente, veja:

"...Que houve uma reunião em Arraial do Cabo onde estavam presentes, além do interrogado, o presidente do porto, sr. ÁTILA, líderes da associação de pescadores, o sr. MARCOS (chefe da RESEX); Que nessa reunião, segundo alega, foi concedida uma autorização para a entrada da embarcação PRIDE BRAZIL na Reserva Extrativista; Que nessa reunião foi dito ao sr. MARCOS pelo presidente do porto, sr. ÁTILA, que havia PEI (Plano de Emergência Individual), tanto do porto quanto do estaleiro-do qual o interrogando é diretor-presidente; Que o PEI do estaleiro era cópia do enviado a Brasília; Que após o sr MARCOS entrou em contato por telefone com o interrogando, quando lhe foi dito que teria ocorrido um problema de ordem superior que impedia a autorização; Que após isso, teve conhecimento de que os pescadores da região haviam localizado o sr.MARCOS, à época afastado do trabalho em razão de uma torção no joelho,tendo-lhes sido dito por este que não seria possível a autorização para a entrada da PRIDE BRASIL;Que após isso, recebeu um telefonema de um pescador líder da associação dos pescadores (não se recorda se o sr. RAIMUNDO, QUINZINHO, ou DUCA) dizendo que o sr. MARCOS, "não faria nada"; Disse ainda que, no máximo seria imposta uma multa no valor de mil e quinhentos reais dia ao Porto do Forno, sendo em relação ao interrogado nada aconteceria; Que após isso, adentrou a Reserva, onde ficou por aproximadamente dez/onze dias ..."

Assim sendo, não pairam dúvidas quanto à materialidade do crime e sua autoria, existindo provas suficientes para a condenação do ora recorrente.

4 - Da pena aplicada

Insurge-se o apelante quanto à fixação da pena-base acima do mínimo legal com base na primariedade e nos bons antecedentes.

In casu, o tipo imputado ao denunciado, comina pena de 1 (um) a 6 (seis) meses de detenção, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

Ocorre que o acusado realmente demonstrou uma exacerbada ousadia, compatível somente com uma maior premeditação e volição da conduta, o que acentual a circunstância específica da prática do crime, como uma das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, haja vista que tinha elevado conhecimento na área, inclusive com plena ciência da necessidade de licenciamento ambiental para a execução da atividade que pretendia realizar. Não a obtendo, mesmo assim, adentrou na reserva extrativista, aproveitando-se das dificuldades de fiscalização dos órgãos de proteção ambiental. Tudo isso, a meu ver, deve ser considerado como circunstância desfavorável do crime, de modo a justificar o aumento da pena-base, que se deu de maneira proporcional entre o mínimo e o máximo cominado ao delito.

Friso que o fato de ser primário e possuir bons antecedentes de maneira alguma afastam outras circunstâncias judiciais desfavoráveis, que podem determinar o aumento da pena-base, como se deu no caso em foco.

Ademais, quanto ao valor do dia-multa e da pena substitutiva da privativa de liberdade, a sentença foi muito bem fundamentada, analisando a situação econômica do acusado, que exerce cargo de maior importância e responsabilidade na empresa, ou seja, Diretor- Presidente do Estaleiro Cassinú Ltda.

Por oportuno, com fulcro no art. 50 do CP, determino o parcelamento da multa aplicada no curso de 02 (dois) anos, devendo a prestação pecuniária ser revertida em favor de entidade ambientalista, tendo em vista a natureza do crime cometido.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

É o voto.

VOTO-VENCIDO

DF MARIA HELENA: Vossa Excelência está com a lei?

(Assentimento)

Leia, por favor, o art. 40.

Exatamente. Eu quero o art. 40.

Deixe-o ler.

Então, não causou prejuízo; foi absolvido. Não vejo razão para essa multa de vinte mil.

Na realidade, foi introduzir lá a plataforma sem ter uma autorização para tanto.

Deixe-me terminar o meu raciocínio. O art. 60 fala que "não precisa ser efetivamente, mas potencialmente", mas foi provado que não houve prejuízo.

Eu daria, no caso, a prescrição.

Ficou provado que não houve o prejuízo. Então, o fato de estar lá não seria, de jeito nenhum, uma atividade contínua. O crime foi de ele não ter tido autorização para colocar a plataforma lá. É um crime formal e não um crime material.

Não sei se seria o caso de dar a prescrição, mas, de qualquer jeito, deu-se essa multa de vinte mil reais porque ele exerceu uma atividade sem autorização do IBAMA. Acho muito violenta essa multa.

Já que Vossa Excelência sabe muito mais do que eu, veja qual a melhor solução nesse caso.

Eu daria a prescrição mesmo. O que ele fez? Ele fez uma atividade sem autorização.

Exato. Então, eu daria a prescrição e, no caso, ele tem possibilidade de embargos infringentes.





JURID - Princípio da identidade física do juiz (art. 399, § 2° ). [17/06/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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