Anúncios


terça-feira, 16 de março de 2010

JURID - Responsabilidade civil. Omissão. Festa nacional do pinhão. [16/03/10] - Jurisprudência


Responsabilidade civil. Omissão. Festa nacional do pinhão. Acidente em ringue de patinação no gelo.

Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC

Apelação Cível n. 2006.047667-8, de Lages

Relatora: Desembargadora Substituta Sônia Maria Schmitz

Responsabilidade civil. Omissão. Festa NacionaL do Pinhão. ACIDENTE EM ringue de patinação no gelo. FRATURA DO COTOVELO COM PERDA DE MOBILIDADE DO MEMBRO. Ausência de INSTRUTORES.

Evidenciada a relação de causalidade entre o fato e a omissão do Ente Público, que deixou de adotar as medidas necessárias para garantir a segurança e a integridade física dos participantes da Festa Nacional do Pinhão, através da disponibilização de instrutores qualificados e assistência médica de emergência, inevitavelmente estará obrigado a suportar os prejuízos e conseqüências que sua inércia acarretou, por força do dispositivo constitucional, que contempla a teoria do risco administrativo.

CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS MORATÓRIOS.

Para a atualização das parcelas vencidas, a partir da Lei n. 10.406/2003, deverá incidir a Taxa Selic, que compreende tanto os juros como o fator de correção.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FAZENDA PÚBLICA.

A jurisprudência desta Corte se consolidou no sentido de que o percentual de 10% a título de honorários advocatícios é o mais apropriado na hipótese de ser vencida a Fazenda Pública.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2006.047667-8, da comarca de Lages (Vara da Fazenda, Ac. Trabalho e Reg. Públicos), em que é apelante Juliana Arruda Varela, e apelada Vera Cruz Vida e Previdência S.A. e outro:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Público, por votação unânime, conhecer e prover parcialmente o recurso. Custas na forma da lei.

RELATÓRIO

Juliana Arruda Varela, representada por seu pai, Ademar Dionísio Varela, ajuizou ação indenizatória por danos morais, materiais e estéticos em face da Fundação Cultural de Lages e Vera Cruz Vida e Previdência S/A, argumentando que em 22/06/2003, ao utilizar a pista de patinação no gelo, instalada nas dependências de um dos pavilhões do Parque Conta Dinheiro na Festa do Pinhão, sofreu queda, do que lhe resultou fratura no cotovelo esquerdo, com limitação e perda de função do membro. Imputou à imprudência e negligência do ente público a causa do sinistro, porquanto, deixou de oferecer a segurança necessária, a fim de evitar riscos a integridade física dos freqüentadores, bem como assistência médica, decorrendo daí o dever de indenizar. Após tecer outras considerações, arrematou postulando o acolhimento da pretensão (fls. 02-11).

Citados, os réus contestaram. A Fundação Cultural de Lages, defendeu, em síntese, a disponibilidade de atendimento médico e de instrutores no local da festividade. Disse também que os participantes do evento estavam acobertados por seguro de acidentes pessoais, sendo inverídica as alegações da autora. Por fim, afirmando não haver prova do nexo causal, instou pela improcedência do pedido (fls. 58-62). A Seguradora, por sua vez, arguiu, preliminarmente, ilegitimidade passiva ad causam. No mérito, alegou ausência de comunicação do sinistro pela co-ré, particularidade que afasta a sua obrigação em indenizar. Alertou acerca dos limites fixados no contrato de seguro, os quais incluem somente as despesas médica e eventual invalidez permanente. Por derradeiro afirmou não haver qualquer comprovação da ocorrência do sinistro (fls. 96-101).

Após a réplica (fls. 83-88 e 111-113), realizada perícia (fls. 135-144), audiência inaugural (fls. 149-150) e de instrução e julgamento (fls. 144-145), e apresentadas as alegações finais (fls. 163-168 e 169-172), o Representante do Ministério Público manifestou-se pelo acolhimento da súplica (fls. 173-181), sobrevindo a r. sentença, julgando parcialmente procedente o pleito (fls. 183-195). Irresignada, a autora apelou, repisando suas teses iniciais (fls. 201-208).

Com as contra-razões (fls. 211-225 e 226-237), ascenderam os autos a esta Corte, tendo à Procuradoria-Geral de Justiça opinado pelo conhecimento e provimento parcial do recurso (fls. 247-253). Distribuídos os autos a Terceira Câmara de Direito Civil, esta não conheceu do apelo, declinando a competência para uma das Câmaras de Direito Público (fls. 259-263).

É o relatório.

VOTO

Sobressai dos autos que no dia 22.06.2003, Juliana Arruda Varela, acompanhada de sua mãe, participavam da Festa Nacional do Pinhão, localizados nas dependências do Parque Conta Dinheiro na cidade de Lages, oportunidade em que a menor decidiu utilizar a pista de patinação no gelo que lá fora instalada, para o entretenimento dos freqüentadores.

Ocorre que, após adquirir o ingresso e iniciar os movimentos de patinação sem qualquer auxílio de instrutores, a apelante, desequilibrou-se vindo a sofrer queda sobre o cotovelo esquerdo, culminando em fratura do referido membro, ocasionando-lhe significativo prejuízo material, moral e estético.

Pois bem. De tudo que foi narrado, constata-se que o acidente restou incontroverso, resultando em graves conseqüências, comprovadas por meio do relatório médico (fl. 15), bem como do laudo judicial (fls. 135-144), que atestam com nitidez a lesão experimentada pela apelante, qual seja, "fratura de cabeça de rádio a esquerda com redução de extensão do cotovelo esquerdo em 10% e da promo supinação em grau mínimo" (fl. 135).

Constata-se ainda que, embora tenha sido da menor a iniciativa para utilização da pista, esse ato por si só não tem o condão de afastar a responsabilidade da Fundação Cultural de Lages que, como organizadora do evento, tinha o dever de garantir condições de segurança do lugar, através da disponibilização de instrutores capacitados e em quantidade suficiente ao atendimento dos patinadores, bem como proporcionar aos possíveis acidentados os primeiros socorros.

Do bem lançando Parecer que está à fl. 235, extrai-se, dada a sua pertinência:

Comprovados o nexo causal entre o acidente sofrido pela menor apelante e os danos sofridos, somente estaria a entidade estatal demandada, pela apelada, isenta de responsabilidade pela reparação dos danos causados, caso tivesse aquela agido com culpa exclusiva. Esta hipótese, entretanto, não encontra qualquer respaldo no contexto probatório documental amealhado, uma vez que destes apenas se extrai notícia da ocorrência do acidente, sem maiores detalhes a respeito das suas causas, sendo presumível afirmar, nesse contexto, que à menor demandante, ora apelante, ante sua tenra idade, não foram dispensados todos os cuidados e precauções que a atividade de patinação executada exigiam. (Procurador Francisco José Fabiano, fl. 235).

Não se descura também que:

A natureza da atividade estatal impõe aos seus agentes um dever especial de diligência, consistente em prever as conseqüências de sua conduta ativa e omissiva, adotando todas as providências necessárias para evitar a consumação de danos a terceiros.

Se o agente estatal infringir esse dever de diligência, atuando de modo displicente, descuidado, inábil, estará configurada a conduta ilícita e surgirá, se houver dano a terceiro, a responsabilidade civil. (Marçal Justen Filho. A Responsabilidade do Estado. In: Responsabilidade Civil do Estado. Freitas, Juarez (org). Malheiros, São Paulo, 2006. p. 233).

Nessa diretriz a inércia da Fundação Cultural de Lages conduz ao comando do § 6 do art. 37 da Constituição da República, que contempla a teoria do risco administrativo, pela qual o poder público tem o dever de indenizar os danos que as suas atividades e serviços causem aos particulares, bastando, para tanto, a comprovação do efetivo prejuízo e a sua relação causal com a conduta comissiva ou omissiva do Administração.

Da lição de Carvalho Filho ressalta-se:

Para configurar esse tipo de responsabilidade, bastam três pressupostos: o primeiro deles é a ocorrência do fato administrativo, assim considerado como qualquer forma de conduta, comissiva ou omissiva, legítima ou ilegítima, singular ou coletiva atribuída ao Poder Público. [...]

O segundo pressuposto é o dano. Já vimos que não há falar em responsabilidade civil sem que a conduta haja provocado um dano. Não importa a natureza do dano: tanto é indenizável o dano patrimonial como o dano moral. Logicamente, se o dito lesado não prova que a conduta estatal lhe causou prejuízo, nenhuma reparação terá a postular.

O último pressuposto é o nexo causal (ou relação de causalidade) entre o fato administrativo e o dano. Significa dizer que ao lesado cabe apenas demonstrar que o prejuízo sofrido se originou da conduta estatal, sem qualquer consideração sobre o dolo ou a culpa. (Manual de Direito Administrativo. 15 ed. Lumen Juris, Rio de Janeiro: 2006. p. 458).

Tais razões é que sustentam a responsabilização pelos danos materiais, e principalmente o moral e estético sofridos pela apelante, ainda mais porque o Ente Público não demonstrou qualquer causa elisiva da conduta que lhe é imputada, visto que "Em todos os casos em que o Estado é chamado a ressarcir prejuízos decorrentes de conduta omissiva, bem como nas comissivas, poderá ele defender-se demonstrando quaisquer das circunstâncias excludentes da responsabilidade." (João Agnaldo Donizete Gandini et al. A Responsabilidade Civil do Estado por Conduta Omissiva. Disponível em www.cjf.gov.br/rev/numero23/artigo. Acesso em 07.03.07).

A propósito:

O Estado tem o dever de ressarcir os danos a que deu causa ou deveria evitar. A responsabilidade é objetiva (CF, art. 37, § 6º) e dela somente se exonera o ente público se provar que o evento lesivo foi provocado por culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior. (AC n. 2008.024480-2, da Capital rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. em 04.07.2008).

Partindo dessa conclusão, assentada a responsabilidade, resta aquilatar o quantum indenizatório que a omissão acarretou, tendo-se que:

[...] O que se chama de 'dano moral' é, não um desfalque no patrimônio, nem mesmo a situação onde só dificilmente se poderia avaliar o desfalque, senão a situação onde não há ou não se verifica diminuição alguma. [...] dano moral é empregada com sentido traslado ou como metáfora: um estrago ou uma lesão ( este o termo jurídico genérico), na pessoa mas não no patrimônio.[...] O dinheiro pago, por sua vez, não poderia recompor a integridade física, psíquica ou moral lesada. Não há correspondência nem possível compensação de valores. Os valores ditos morais são valores de outra dimensão, irredutíveis ao patrimonial. (Walter Moraes apud Rui Stoco. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 457-458).

Em relação ao equivalente que daí decorre, tarefa das mais tormentosas para o julgador, pois ao tempo em que não pode ser considerado irrisório, a ponto de menosprezar a dor sofrida, também não pode dar margem ao enriquecimento ilícito.

Entre outros termos, o arbitramento há de levar em consideração "[...] a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do ofensor e as condições sociais do ofendido, e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes." (Sergio Cavalleri Filho. Programa de responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 81-82), a fim de que possa proporcionar a reparação mais abrangente possível.

A capacidade econômica das partes, como se percebe, constitui critério a ser observado na fixação da indenização, aspecto que merece especial distinção.

Do Superior Tribunal de Justiça, colhe-se:

Na fixação do valor da condenação por dano moral, deve o julgador atender a certos critérios, tais como nível cultural do causador do dano; condição sócio-econômica do ofensor e do ofendido; intensidade do dolo ou grau da culpa (se for o caso) do autor da ofensa; efeitos do dano no psiquismo do ofendido e as repercussões do fato na comunidade em que vive a vítima." (REsp 355392/RJ, rel. Min. Castro Filho, DJ 17.06.02).

Nessa tessitura, diante das minudências do caso, justo se afigura arbitrar o valor em R$ 10.000,00 (dez mil reais), que corresponde aos danos morais e estéticos suportados pela apelante. (AC n. 2005.021504-6, rel. Des. Francisco Oliveira Filho e AC n. 2005.021789-9, rel. Des.Luiz Cézar Medeiros.)

No mesmo sentido, são também precedentes: STJ - REsp 717425 / SP, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. em 04.03.2008; TJSC - AC n. 2007.024281-2, de Rio do Sul, rel. Des. Francisco Oliveira Filho, j. em 02.10.2007; AC n. 2007.025335-8, de Lages, rel. Des. Newton Trisotto, j. em 16.09.2008; AC n. 2008.0036065-0, de Blumenau, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. em 14.05.2008; AC n. 2006.007592-6, de Imbituba, rel. Des. Nicanor da Silveira, j. em 07.11.2006.

Relativamente aos danos emergentes, efetivamente, o apelo não merece prosperar, isso porque, como bem assentou o Magistrado, "[...] a lesão da autora já encontra-se com o tratamento terminado e sua lesão definitivamente estagnada, conforme se verifica no quesito de nº 06 e nº 32: 'Já está em tratamento há 03 anos e já recebeu alta definitiva do seu tratamento'. (Juiz Sílvio Dagoberto Orsatto, fl. 176).

No tocante a correção monetária, é cediço que, "[...] tratando-se de dano moral, como é o caso dos autos, deveria incidir a partir do arbitramento, ou seja, da presente data, entretanto, como a taxa SELIC já representa, a um só tempo, índice de correção e taxa de juros, deixa-se de determinar sua incidência, uma vez que já há a aplicação do referido índice a partir da edição do Novo Código Civil" (STJ - REsp 464552/RS, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, j. em 2.9.2008).

Em igual perspectiva decidiu esta Corte:

A partir da vigência do CC/2002, os juros e a correção monetária incidentes sobre o valor dos danos materiais e dos morais e estéticos são contabilizados pela taxa do SELIC. (AC n. 2008.020118-7, de Araranguá, Rel. Des. Jaime Ramos, j em 17.7.2008)

E ainda: AC n. 2008.017351-0, de Biguaçu, j. em 06.05.2008 e na AC n. 2007.059009-8, de São Bento do Sul, j. em 14.02.2008, rel. Des. Vanderlei Romer.

Sendo assim a solução da lide, inverte-se o ônus de sucumbência, fixando-se os honorários advocatícios devidos pelos réus em 10% (dez por cento), sobre o valor da condenação, conforme posicionamento desta Corte (AC n. 2008.048081-7, de São Lourenço do Oeste, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros e AC n. 2002.006981-2, de Balneário Camboriú, rel. Des. Nicanor da Silveira), e isenta-se o Ente Público do pagamento das custas processuais, consoante dispõe a LC n. 156/97, com redação dada pela LC n. 161/97.

Ante o exposto, vota-se pelo conhecimento e provimento parcial do recurso, para condenar a Fundação Cultura de Lages e Vera Cruz Vida e Previdência S.A. (esta no limite fixado no seguro) ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de danos morais e estéticos, corrigidos a partir daqui pela Taxa Selic, que compreende tanto os juros como o fator de correção. Por fim, fixa-se os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.

DECISÃO

Nos termos do voto da Relatora, a Terceira Câmara de Direito Público, por unanimidade, decidiu conhecer e prover parcialmente o recurso.

O julgamento, realizado no dia 19 de maio de 2009, foi presidido pelo Desembargador Pedro Manoel Abreu, com voto, e dele participou o Desembargador Luiz Cézar Medeiros.

Lavrou parecer o Procurador de Justiça Francisco José Fabiano.

Florianópolis, 03 de agosto de 2009.

Sônia Maria Schmitz
Relatora




JURID - Responsabilidade civil. Omissão. Festa nacional do pinhão. [16/03/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário