Jurisprudência Tributária
Tributário. Prescrição. IRPJ. CSLL. PIS. COFINS. Base de cálculo. Juros moratórios. Correção monetária. Repetição.
Tribunal Regional Federal - TRF4ªR
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2009.72.15.000279-6/SC
RELATORA: Juíza Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
APELANTE: ZEN S/A IND/ METALURGICA
ADVOGADO: Joao Joaquim Martinelli
APELANTE: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO: Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional
APELADO: (Os mesmos)
REMETENTE: JUÍZO SUBSTITUTO DA 01A VF E JEF DE BRUSQUE
EMENTA
TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. IRPJ. CSLL. PIS. COFINS. BASE DE CÁLCULO. JUROS MORATÓRIOS. CORREÇÃO MONETÁRIA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO.
1. Para as ações ajuizadas até a entrada em vigência do art. 3º da LC nº 118/2005 (vacatio legis de 120 dias), o prazo prescricional de 05 anos para a repetição do indébito é computado a partir da homologação expressa ou tácita do tributo.
2. As verbas auferidas a título de SELIC aplicada a depósito judicial ou a tributos pagos e que foram ou que forem reconhecidos como indevidos em ações judiciais não constituem renda, acréscimo de capital ou lucro a fazer incidir imposto ou contribuição. A correção monetária visa tão-somente a preservar o poder de compra da moeda e os juros moratórios objetivam ressarcir o contribuinte que teve a indisponibilidade de parte de seu capital temporariamente tolhida para suspender a exigibilidade de tributos que, ao final de processo judicial, foram declarados ilegítimos pelo Poder Judiciário. Precedente desta Turma.
3. O Plenário do STF entendeu inconstitucional a alteração na base de cálculo do PIS e da COFINS, levada a efeito pela Lei n.º 9.718/98 (RE nº 357.950-5).
4. Antes da sistemática estabelecida pelas Leis 10.637/02 e 10.833/03, não incidem as contribuições para o PIS e a COFINS sobre os juros moratórios e correção monetária recebidos na repetição de indébito tributário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo da União e à remessa oficial e negar provimento ao apelo da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de maio de 2010.
VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
RELATÓRIO
ZEN S/A Indústria Metalúrgica ajuizou ação de rito ordinário contra a UNIÃO objetivando a inexigibilidade de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre juros de mora e correção monetária.
Narrou ter conquistado, nos últimos anos, a restituição de diversos tributos, pagos a maior ou declarados indevidos pelo Poder Judiciário. Aduziu, ainda, ter recebido juros moratórios e correção monetária, contratual ou judicialmente fixados, em razão do pagamento extemporâneo de suas vendas. Mencionou que tais verbas estão sendo tributadas pelo Imposto de Renda, CSLL, PIS e COFINS, por entender o Fisco que se trata de receitas financeiras. Discorreu sobre o tratamento legislativo do tema e transcreveu precedentes jurisprudenciais. Ao final, pediu a procedência dos pedidos para: (a) determinar a inexigibilidade do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre as quantias recebidas a título de restituição de tributos declarados indevidos, especialmente quanto à correção monetária e juros moratórios incidentes nestas restituições; (b) determinar a inexigibilidade do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre as quantias recebidas a título de correção monetária e juros moratórios incidentes sobre os pagamentos extemporâneos das vendas de mercadorias/serviços; (c) condenar a União a restituir os valores recolhidos, via compensação, atualizados monetariamente e acrescidos de juros, nos últimos dez anos; de forma alternativa à compensação, pediu a repetição do indébito; e (d) condenar a União ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Instruiu a inicial com procuração e documentos.
A União (Fazenda Nacional) apresentou contestação na qual levantou prejudicial de prescrição das parcelas recolhidas antes de 15.04.2004. No mérito, aduziu que a correção monetária e os juros moratórios configuram receitas financeiras, ensejando acréscimo patrimonial, razão pela qual devem sofrer a incidência do Imposto de Renda e da CSLL. Aduziu que, na condição de acessórios, tais acréscimos guardam a mesma natureza das verbas principais a que se referem. Quanto ao PIS e à COFINS, mencionou que a inclusão dos juros de mora e correção monetária nas respectivas bases de cálculo encontra sustentáculo na Lei 9.718/98. Pediu a improcedência da pretensão e a condenação da parte autora ao pagamento dos ônus da sucumbência (fls. 70-77).
O MM. Juízo, sentenciando, julgou procedente EM PARTE o pedido, nos seguintes termos:
"Ante o exposto, rejeito a prejudicial de prescrição, resolvo o mérito da lide (CPC, art. 269, inc. I) e JULGO PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados na inicial, nos termos da fundamentação, para:
a) DECLARAR a inexigibilidade do IRPJ e da CSLL sobre as quantias recebidas a título de restituição de tributos declarados indevidos, especialmente quanto à correção monetária e juros moratórios incidentes nestas restituições, assim como sobre os recebimentos extemporâneos das vendas de mercadorias/serviços;
b) DECLARAR a inexigibilidade do PIS e da COFINS sobre as quantias recebidas a título de restituição de tributos declarados indevidos, especialmente quanto à correção monetária e juros moratórios incidentes nestas restituições, assim como sobre os recebimentos extemporâneos das vendas de mercadorias/serviço, na vigência da Lei 9.718/98;
c) CONDENAR a União a restituir à parte autora os valores recolhidos indevidamente, nos termos desta sentença, via compensação, atualizados monetariamente, desde cada pagamento indevido, pela incidência da taxa SELIC, indevidos juros moratórios, na forma da Lei 9.250/95.
Diante da sucumbência recíproca, mas em menor proporção pela parte autora, condeno a União (Fazenda Nacional) ao ressarcimento das custas adiantadas pela autora e ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do valor atribuído à causa, atualizado pelo IPCA-E, a partir do ajuizamento (STJ, Súmula 14), nos termos do art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC."
Inconformada, apelou a União, suscitando a prescrição quinquenal e defendendo a tributação dos juros de mora e correção monetária, porque compõem o faturamento da empresa, bem como são considerados "riqueza nova" para fins de IRPJ e CSLL.
A parte autora, por sua vez, apelou requerendo a declaração de inexigibilidade da COFINS e do PIS para além da vigência das Leis 10.637/02 e 10.833/03.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte. É o relatório.
VOTO
Prescrição
Para as demandas ajuizadas até 08.06.2005, o prazo prescricional de cinco anos para postular a restituição/compensação de créditos tributários começa a fluir somente após a extinção definitiva do respectivo crédito (art. 168, I, do CTN) que, nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, se dá pela homologação fiscal - expressa ou tácita - do recolhimento antecipado pelo contribuinte. Se não houver manifestação expressa, presume-se tacitamente homologado o pagamento (e, portanto, extinto o crédito tributário) após cinco anos "a contar da ocorrência do fato gerador" (art. 150, § 4º, CTN). Assim, o contribuinte que recolheu exação indevidamente, ou a maior, tem dez anos para repetir o indébito, contados do fato gerador se a homologação for tácita. Se esta for expressa, terá cinco anos contados da homologação do lançamento.
Para as ações ajuizadas após 08.06.2005 - porquanto a Seção de Direito Público do STJ, no RE n.º 327.043/DF, DJ de 10.10.2005, afastou a aplicação do art. 3º da LC 118/2005 às ações ajuizadas até o término da vacatio legis de 120 dias - embora o prazo prescricional de cinco anos continue a fluir da extinção do crédito tributário, esta, por força do referido art. 3º da LC 118/2005, ocorre no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1º do art. 150 do CTN. A propósito, EREsp 462.446/MA, STJ, Primeira Seção, Rel. Min. José Delgado, DJ de 24.10.2005.
É de ser observado, também, que a Corte Especial deste Tribunal declarou a inconstitucionalidade da expressão "observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, I, da Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966-Código Tributário Nacional", constante do art. 4º, segunda parte, da LC 118/2005 (II n.º 2004.72.05.003494-7, Rel. Des. Federal Antônio Albino Ramos de Oliveira, unânime, julgada em 16-11-2006).
Raciocínio análogo deve ser aplicado nos casos em que houve pedido administrativo de restituição/compensação, porquanto nesta data o credor manifestou seu interesse de satisfação do crédito, não havendo cogitar de inércia. Assim, para os pedidos protocolados até 08.05.2005 deve ser aplicada a regra dos "cinco mais cinco", estando prescritos somente os recolhimentos indevidos efetuados antes dos 10 anos contados retroativamente à data do pedido.
No caso dos autos, a ação foi ajuizada em 17.06.2009, restando prescritas, portanto, as parcelas relativas às competências anteriores a 17.06.2004.
Reformo a sentença no ponto.
Sobre a incidência do IRPJ e da CSLL
Cinge-se a controvérsia quanto a incidência do IRPJ e da CSLL sobre valores referentes à SELIC aplicada sobre depósitos judiciais e/ou indébitos tributários.
Para solver a lide, faz-se necessário delimitar os fatos geradores do IRPJ e da CSLL e, após, examinar a natureza da taxa SELIC para fins de tributação.
Em julgamento recente, no qual restei vencida, esta Turma firmou posicionamento sobre a questão, conforme a seguinte ementa:
IRPJ. CSLL. INCIDÊNCIA. VARIAÇÃO MONETÁRIA DE DEPÓSITO JUDICIAL. SELIC. IMPOSSIBILIDADE.
As verbas auferidas a título de SELIC aplicada a depósito judicial ou a tributos pagos e que foram ou que forem reconhecidos como indevidos em ações judiciais não constituem renda, acréscimo de capital ou lucro a fazer incidir imposto ou contribuição. A correção monetária visa tão-somente a preservar o poder de compra da moeda e os juros moratórios objetivam ressarcir o contribuinte que teve a indisponibilidade de parte de seu capital temporariamente tolhida para suspender a exigibilidade de tributos que, ao final de processo judicial, foram declarados ilegítimos pelo Poder Judiciário.
(APELAÇÃO CÍVEL Nº 2009.71.10.000466-7/RS, Rel. Juíza Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Rel. Acórdão Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA, D.E. Publicado em 19/11/2009)
No voto-condutor, de lavra do eminente Des. Federal. Otávio Roberto Pamplona, a fundamentação lançada foi a seguinte, verbis:
Com a vênia da eminente Relatora, divirjo, porquanto, em linha de princípio, tenho que não seja o caso de tributação. Com efeito, as verbas auferidas a título de SELIC aplicada a depósito judicial não constituem renda, acréscimo de capital ou lucro a fazer incidir imposto ou tributação.
Nesse sentido, reporto-me ao seguinte julgado proferido pela 1ª Turma deste Tribunal:
IRPJ. CSLL. INCIDÊNCIA. VARIAÇÃO MONETÁRIA DE DEPÓSITO JUDICIAL. SELIC. IMPOSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. LC Nº 118/2005.
O disposto no artigo 3º da LC nº 118/2005 se aplica tão-somente às ações ajuizadas a partir de 09 de junho de 2005, já que não pode ser considerado interpretativo, mas, ao contrário, vai de encontro à construção jurisprudencial pacífica sobre o tema da prescrição havida até a publicação desse normativo. Tendo a ação sido ajuizada em 30/10/08, posteriormente à entrada em vigor da Lei Complementar nº 118/2005, restam prescritas as parcelas anteriores a 30/10/03.
As verbas auferidas a título de SELIC aplicada a depósito judicial ou a tributos pagos e que foram ou que forem reconhecidos como indevidos em ações judiciais não constituem renda, acréscimo de capital ou lucro a fazer incidir imposto ou contribuição. A correção monetária visa tão-somente a preservar o poder de compra da moeda e os juros moratórios objetivam ressarcir o contribuinte que teve a indisponibilidade de parte de seu capital temporariamente tolhida para suspender a exigibilidade de tributos que, ao final de processo judicial, foram declarados ilegítimos pelo Poder Judiciário.
(AC nº 2008.70.00.023456-5/PR, rel. Des. Vilson Darós, D.E. 08.7.2009)
Do voto-condutor, cujos fundamentos acolho com razões de decidir, transcrevo o seguinte excerto:
Conforme é cediço, a taxa SELIC, aplicada no presente caso, engloba, além da correção monetária, os juros moratórios devidos pelo contribuinte inadimplente ou pela Fazenda Pública quando pago tributo a maior, indevidamente ou haja hipótese de indisponibilidade momentânea de valores depositados pelo contribuinte que se viu obrigado a suspender a exigibilidade de exação impugnada judicialmente.
As verbas auferidas a título de SELIC aplicada a depósito judicial não constitui renda, acréscimo de capital ou lucro a fazer incidir imposto ou contribuição. A correção monetária visa tão-somente preservar o poder de compra da moeda e os juros moratórios objetivam ressarcir o contribuinte que teve a indisponibilidade de parte de seu capital temporariamente tolhida para suspender a exigibilidade de tributos que, ao final de processo judicial, foram declarados ilegítimos pelo Poder Judiciário.
O fato gerador do Imposto de Renda, nitidamente, não comporta a incidência dessas verbas que ora se quer onerar - art. 43 do CTN:
"Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
..."
Da mesma forma, no regulamento do Imposto, ao disciplinar a incidência sobre as variações monetárias ativas, não se extrai previsão legal para tanto:
"Subseção II
Variações Monetárias
Variações Ativas
Art. 375. Na determinação do lucro operacional deverão ser incluídas, de acordo com o regime de competência, as contrapartidas das variações monetárias, em função da taxa de câmbio ou de índices ou coeficientes aplicáveis, por disposição legal ou contratual, dos direitos de crédito do contribuinte, assim como os ganhos cambiais e monetários realizados no pagamento de obrigações (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 18, Lei nº 9.249, de 1995, art. 8º).
Parágrafo único. As variações monetárias de que trata este artigo serão consideradas, para efeito da legislação do imposto, como receitas ou despesas financeiras, conforme o caso (Lei nº 9.718, de 1998, art. 9º).
..."
Com efeito, não há equiparar a correção monetária e os juros moratórios (SELIC) incidentes sobre depósito judicial a direito de crédito, ganho de capital ou ganho por variação positiva no câmbio quando da conversão de moeda para pagamento de obrigação.
Da mesma forma, o fato gerador da CSLL onera o lucro da pessoa jurídica e pode ser nas modalidades de arrecadação pelo lucro presumido ou real, devendo seguir a opção feita pela empresa para o recolhimento do Imposto de Renda. A base de cálculo da contribuição é o valor do resultado do exercício, antes da provisão para o Imposto de Renda (art. 2º da Lei nº 7.689/88), portanto, outrossim, em relação a ela não se encontra fundamento legal para a tributação ora combatida.
Registro haver precedente desta Turma nesse sentido:
IRPJ. CSLL. INCIDÊNCIA. VARIAÇÃO MONETÁRIA DE DEPÓSITO JUDICIAL. SELIC. IMPOSSIBILIDADE.
As verbas auferidas a título de SELIC aplicada a depósito judicial não constitui renda, acréscimo de capital ou lucro a fazer incidir imposto ou contribuição. A correção monetária visa tão-somente a preservar o poder de compra da moeda e os juros moratórios objetivam ressarcir o contribuinte que teve a indisponibilidade de parte de seu capital temporariamente tolhida para suspender a exigibilidade de tributos que, ao final de processo judicial, foram declarados ilegítimos pelo Poder Judiciário.
(TRF4, PRIMEIRA TURMA, APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 2006.70.00.013637-6/PR, RELATOR: Des. Federal VILSON DARÓS, POR UNANIMIDADE, D.E. Publicado em 26/03/2008)
Trago, ainda, precedente do Superior Tribunal de Justiça que, em situação análoga, quanto ao IOF, assentou pela não tributação da correção monetária decorrente de depósitos judiciais:
"TRIBUTÁRIO. IOF. DEPÓSITOS JUDICIAIS. INCIDÊNCIA. INTELIGÊNCIA DA LEI 8.033/90. INSTRUÇÃO NORMATIVA DA RECEITA FEDERAL N. 62, DE 1990. ILEGALIDADE.
Ao definir novas hipóteses de incidência do IOF, a Lei 8.033, de 1990, não contemplou os depósitos judiciais para garantia de instância e depósitos judiciais; ao incluir tais operações entre os fatos geradores do tributo, a instrução normativa da Receita Federal n. 62/90 desbordou do conteúdo da referida lei autorizativa.
Recurso desprovido, indiscrepantemente."
(STJ, REsp 82523/RS, Rel. Ministro Demócrito Reinaldo, DJ 01.07.96 p 24000)
Desse modo, merece provimento o apelo da impetrante para reconhecer o direito a excluir da base de cálculo do IRPJ e da CSLL os valores recebidos a título de SELIC aplicada em depósitos judiciais ou nas restituições de valores referentes a tributos recolhidos e que posteriormente venham a ser reconhecidos como inexigíveis na via judicial.
Assim, mantenho a sentença no ponto.
Sobre a incidência do PIS e da COFINS
Da inconstitucionalidade do art. 3º, § 1º, da Lei 9.718/98
De acordo com a sua redação original, a Constituição Federal outorgou competência à União para instituição de contribuições sociais, por via de lei ordinária, a serem suportadas pelos empregadores, cuja incidência estava limitada à folha de salários, ao faturamento e ao lucro (art. 195, I, CF/88).
No parágrafo 4º do citado dispositivo constitucional, contudo, o constituinte previu a possibilidade de a União instituir outras fontes de custeio da seguridade social, desde que o fizesse por meio de lei complementar.
O Supremo Tribunal Federal assentou que a exigência de lei complementar dirige-se somente para a criação de outras fontes para a seguridade social, nos termos do parágrafo suso apontado. No tocante àquelas explicitadas nos incisos do art. 195, é suficiente a lei ordinária. Nessa linha, as disposições da Lei Complementar n.º 07, que criou o PIS, e da Lei Complementar n.º 70, que criou a COFINS, possuem natureza de lei ordinária e são, portanto, passíveis de modificação por norma da mesma hierarquia.
Todavia, a Lei n.º 9.718/98, alterando as Leis Complementares nºs 07 e 70, manteve o faturamento como base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS, redimensionando-o, entretanto, a fim de abranger a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica (art. 3º), além de elevar a alíquota desta última exação para 3%.
Ocorre que sobreveio a Emenda Constitucional n.º 20, que estendeu a incidência das contribuições em foco para alcançar também a receita da pessoa jurídica. Veja-se, pois, a atual redação do artigo 195 da Constituição Federal:
"A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro; [...]"
O Plenário deste Tribunal, na Argüição de Inconstitucionalidade na Apelação em Mandado de Segurança n.º 1999.04.01.080274-1 (Rel. para o acórdão a Des. Federal Virgínia Scheibe, j. 29.03.2000, DJ 31.05.2000), considerando que o texto constitucional deixou a cargo do legislador ordinário a providência de conceituar faturamento, conclui não ter havido a criação de nova fonte de custeio pela Lei n.º 9.718/98, mas somente o alargamento do espectro de abrangência do conceito, sem extravasar o permissivo constitucional. Referiu, ademais, que o conceito de faturamento adotado pelo STF foi sempre buscado na norma infraconstitucional e assimilado ao de receita bruta, não havendo sustento, pois, para a afirmativa de que a referida lei, precedida da MP n.º 1.724/98, somente tenha alcançado lastro constitucional com a promulgação da Emenda Constitucional n.º 20/98.
No entanto, em recente julgado (Recurso Extraordinário n.º 357.950-9 - de relatoria do eminente Ministro Marco Aurélio) a Corte Suprema, em controle difuso de constitucionalidade, entendeu inconstitucional a alteração na base de cálculo do PIS e da COFINS levada a efeito pelo § 1º do art. 3º da Lei n.º 9.718/98, devendo ser entendido como receita bruta ou faturamento o que decorrer da venda de mercadorias, de mercadorias e serviços ou da venda de serviços, não se considerando receita bruta de natureza diversa, inclusive as receitas financeiras denominadas juros sobre capital próprio.
No caso dos autos, cumpre analisar se a receita proveniente dos juros incidentes sobre o indébito tributário integram o conceito de faturamento, para fins de tributação.
A incidência de juros moratórios decorre do atraso no cumprimento da obrigação, e tem por finalidade compensar o credor pela falta de disponibilidade dos recursos a que faz jus pelo período correspondente ao atraso, nos termos dos precedentes retro citados.
Assim, considerando a natureza indenizatória da verba, não há como acolher a alegação da União de que os juros moratórios incidentes na devolução do indébito tributário compõem o faturamento da empresa, já que não são produto da venda de mercadorias e serviços, ou seja, não constituem receita decorrente do exercício da atividade lucrativa da empresa.
Todo o analisado até este momento trata do ocorrido antes do advento das Leis n.ºs 10.637/02 e 10.833/03, editadas sob a égide da Emenda Constitucional n.º 20, que instituíram, respectivamente, o "PIS Não-Cumulativo" e a "COFINS Não-Cumulativa", incidentes sobre a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica.
Passo a analisar a incidência dos tributos após a vigência das Leis n.ºs 10.637/02 e 10.833/03.
Já sob a égide da Emenda Constitucional 20/98, foi publicada a Lei 10.637/02, resultante da conversão da Medida Provisória 66/02, na qual restou estabelecido que a base de cálculo do PIS é o valor do faturamento mensal, "assim entendido o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil" (art. 1º, caput). Já o "total das receitas" foi definido como "a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica" (art. 1º, § 1º).
Quanto à COFINS, o regime não-cumulativo foi instituído pela Lei 10.833/03, resultante da Medida Provisória 135/03, que estabeleceu como fato gerador do tributo "o faturamento mensal, assim entendido o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil" (art. 1º, caput). O "total das receitas", a seu turno, foi tratado como "a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica" (art. 1º, § 1º).
Em consequência, a partir da entrada em vigor dos dois normativos legais citados - 01.12.2002 (PIS) e 01.02.2004 (COFINS) - a base de cálculo das contribuições em exame, apesar de continuar sendo o "faturamento mensal", equivalente à "receita bruta", passou a considerar, também, "todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica."
Assim, submetida a parte autora ao regime não-cumulativo previsto nas Leis 10.637/02 e 10.833/03, a partir da vigência dos referidos diplomas legais, os juros moratórios e a correção monetária recebidos compõem a base de cálculo do PIS e da COFINS, visto que abrangidos pela expressão "todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica."
O sistema de não-cumulatividade das contribuições não é o mesmo aplicado aos tributos indiretos, como o ICMS e o IPI. Nestes, a não-cumulatividade se traduz em um crédito, correspondente ao imposto devido pela entrada de mercadorias ou insumos no estabelecimento, a ser compensado com débitos do próprio imposto, quando da saída das mercadorias ou produtos, evitando-se, assim, a tributação em cascata.
De outra banda, a não-cumulatividade das contribuições utiliza técnica distinta, determinando o desconto da contribuição de determinados encargos, tais como energia elétrica e aluguéis de prédios, máquinas e equipamentos, que devem ser apurados com base na mesma alíquota. Assim, trata-se de crédito que deve ser deduzido da contribuição devida. Resumindo, esse regime permite uma apropriação "semidireta" das contribuições incidentes em fase anterior, por meio da admissão de créditos decorrentes de insumos utilizados na produção, os quais são deduzidos das contribuições a recolher.
Feitas tais considerações, observa-se que a impetrante busca modificar a forma de utilização dos créditos de PIS/COFINS não-cumulativa.
Todavia, a legislação de regência afasta qualquer interpretação que tenha por intuito estender indevidamente os efeitos do benefício, servindo o crédito apenas para deduzir a contribuição devida. A literalidade da lei não deixa margem para interpretações divergentes. Ressalto, por oportuno, que não se trata propriamente de aplicação do art. 111 do CTN, que prevê a interpretação literal para as hipóteses de suspensão ou exclusão do crédito tributário, outorga de isenção e dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias. Na verdade, a utilização da interpretação literal pelo operador não está limitada às hipóteses elencadas no CTN, constituindo critério passível de aplicação em outras situações que lhe forem apresentadas, tal como no presente caso.
A interpretação extensiva adotada pela impetrante subverte a lógica do sistema concebido. Ademais, se tal sistema de não-cumulatividade induz ao aumento da carga tributária, refoge ao âmbito de atuação do Poder Judiciário qualquer ingerência nos motivos levaram a adoção de tal política fiscal.
Confirma-se, portanto, a sentença.
Correção Monetária
A atualização monetária incide desde a data do pagamento indevido do tributo (Súmula 162-STJ), até a sua efetiva restituição e/ou compensação. Para os respectivos cálculos, devem ser utilizados, unicamente, os indexadores instituídos por lei para corrigir débitos e/ou créditos de natureza tributária. No caso dos autos, a taxa SELIC, instituída pelo art. 39, parágrafo quarto, da Lei n.º 9.250/95.
Honorários advocatícios
Dispõe o §3º do art. 20 do Código de Processo Civil que os honorários serão fixados entre o mínimo de dez por cento (10%) e o máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação, atendidos: a) o grau de zelo do profissional; b) o lugar de prestação do serviço; c) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para seu serviço.
Esta Turma tem se orientado no sentido de estabelecer a condenação em verba honorária advocatícia no patamar de 10% sobre o valor da condenação, sendo admissível a análise, caso a caso, quando tal valor afigura-se exorbitante ou ínfimo.
No caso em tela, considerando os parâmetros das alíneas "a", "b" e "c" do § 3º do art. 20 do CPC, os honorários de advogado fixados em 10% sobre o valor da causa não destoaram do entendimento desta Turma.
Mantenho a sentença no ponto.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo da União e à remessa oficial e negar provimento ao apelo da parte autora.
VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/04/2010
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2009.72.15.000279-6/SC
ORIGEM: SC 200972150002796
RELATOR: Juiza Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PRESIDENTE: LUCIANE AMARAL CORREA MÜNCH
PROCURADOR: Dr(a)LAFAYETE JOSUÉ PETTER
APELANTE: ZEN S/A IND/ METALURGICA
ADVOGADO: Joao Joaquim Martinelli
APELANTE: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO: Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional
APELADO: (Os mesmos)
REMETENTE: JUÍZO SUBSTITUTO DA 01A VF E JEF DE BRUSQUE
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/04/2010, na seqüência 111, disponibilizada no DE de 12/04/2010, da qual foi intimado(a) UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL), o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 2ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
RETIRADO DE PAUTA POR INDICAÇÃO DO RELATOR.
MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA
Diretora de Secretaria
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 18/05/2010
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2009.72.15.000279-6/SC
ORIGEM: SC 200972150002796
RELATOR: Juiza Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PRESIDENTE: LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
PROCURADOR: Dr(a) PITTA MARINHO
APELANTE: ZEN S/A IND/ METALURGICA
ADVOGADO: Joao Joaquim Martinelli
APELANTE: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO: Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional
APELADO: (Os mesmos)
REMETENTE: JUÍZO SUBSTITUTO DA 01A VF E JEF DE BRUSQUE
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 18/05/2010, na seqüência 179, disponibilizada no DE de 07/05/2010, da qual foi intimado(a) UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL), o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 2ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA UNIÃO E À REMESSA OFICIAL E NEGAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO: Juiza Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
VOTANTE(S): Juiza Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Des. Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA
MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA
Diretora de Secretaria
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Documento eletrônico assinado digitalmente por MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA, Diretora de Secretaria, conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, e a Resolução nº 61/2007, publicada no Diário Eletrônico da 4a Região nº 295 de 24/12/2007. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://www.trf4.gov.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3474411v1 e, se solicitado, do código CRC 2811FCD8.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARIA CECILIA DRESCH DA SILVEIRA:10657
Nº de Série do Certificado: 44363483
Data e Hora: 18/05/2010 18:46:55
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JURID - Tributário. Prescrição. IRPJ. CSLL. PIS. COFINS. Base. [17/06/10] - Jurisprudência
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