Rejeição da Denuncia. Réu acusado de causar danos diretos e indiretos a unidade de conservação de proteção integral.
Tribunal de Justiça de São Paulo - TJSP
REJEIÇÃO DA DENUNCIA - Réu acusado de causar danos diretos e indiretos a unidade de conservação de proteção integral - Rejeição com base na atipicidade de conduta - Aplicação do princípio da insignificância - Embasamentos afastados- Indícios suficientes de autoria e materialidade para embasar o acolhimento da exordial acusatória - Questão ambiental abarcada pela Carta Magna de 1988, com fins de proteger e preservar o meio ambiente - Recurso provido para o fim de receber a denúncia, prosseguindo-se o feito no juízo originário, com determinação.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Em Sentido Estrito nº 990.09.153207-0, da Comarca de Cubatão, em que é recorrente MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO sendo recorrido MARCELO TOBIAS BENEDITO.
ACORDAM, em 15ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO PARA RECEBER A DENÚNCIA OFERTADA CONTRA MARCELO TOBIAS BENEDITO COMO INCURSO NOS ARTIGOS 64, 54, PARÁGRAFO SEGUNDO, INCISO V, E 40, CAPUT E,PARÁGRAFO PRIMEIRO, TODOS DA LEI Nº 9.605/98, C.C. O ARTIGO 69, DO CÓDIGO PENAL, DETERMINANDO-SE O FORMAL PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO PENAL NO JUÍZO. COMUNIQUE-SE. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores RIBEIRO DOS SANTOS (Presidente), PEDRO GAGLIARDI E AMADO DE FARIA.
São Paulo. 29 de abril de 2010
RIBEIRO DOS SANTOS
PRESIDENTE E RELATOR
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
15ª Câmara Criminal
Recurso em Sentido Estrito nº 990.09.153207-0
Voto nº 14.800
RECORRENTE: A JUSTIÇA PÚBLICA
RECORRIDO: MARCELO TOBIAS BENEDITO
COMARCA: CUBATÃO
Trata-se de recurso em sentido estrito tirado pela JUSTIÇA PUBLICA nos autos da ação penal que é promovida contra MARCELO TOBIAS BENEDITO pela prática de danos diretos e indiretos a unidade de conservação de proteção integral - Unidade de Conservação Permanente do Parque Estadual da Serra do Mar - Bairro Água Fria - Cubatão/ SP artigos 64, 54, parágrafo segundo, inciso V, e 40, caput, e parágrafo primeiro, todos da Lei nº 9.605/98, c.c. o artigo 69, do Código Penal) que tramita na Comarca de Cubatão, irresignada contra a decisão prolatada pelo ilustre magistrado que rejeitou a denúncia, com fundamento no artigo 395, incisos II e III, do Código de Processo Penal.
Pretende a combativa promotora de justiça a reforma da decisão proferida, para que o recorrido seja denunciado, nos termos da peça acusatória, com o prosseguimento da ação penal.
Recebido, contrariado (fls. 131/133), processado nos próprios autos, manteve o magistrado o decidido (fls.136). A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo provimento do recurso interposto (fls. 140/143).
É o relatório.
Segundo relata a denúncia, o recorrido promoveu construção em solo não edificável, ou no seu entorno, assim considerado em razão de seu valor paisagístico, ecológico, artístico, turístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida, causou e vem causando poluição, pelo lançamento de resíduos sólidos e líquidos em desacordo com as exigências estabelecidas em leis e regulamentos, no ecossistema local, que pode resultar em danos à saúde humana, e causou e vem causando danos diretos e indiretos a unidade de conservação de proteção integral.
Consta que policiais militares realizavam operação ambiental quando constataram que, no local dos fatos, o denunciado construiu um imóvel de alvenaria em área de preservação permanente de aproximadamente 12,0m x 12,0m, onde vem causando danos diretos e indiretos ao meio ambiente.
Apurou-se, ainda, que, com a ocupação do local o denunciado causou e vem causando poluição, consistente no lançamento de resíduos sólidos (em especial o lixo doméstico) e líquidos (esgoto) no ecossistema local contaminando o manancial, o lençol freático e o próprio curso d'água, podendo gerar danos à saúde humana, além de provocar risco à saúde da fauna ictiológica e da fauna terrestre que dela depende, pois a deposição de efluentes e esgoto doméstico é feito através de tubulações até ser despejado no rio.
Em que pesem as razões expendidas pelo douto juiz de primeiro grau em seu r. decisum, razão assiste ao órgão ministerial.
Como é cediço, reza o artigo 41 do Código de Processo Penal: "A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas ".
Desta feita, havendo indícios de autoria e materialidade do delito imputado, o recebimento da inicial acusatória com a conseqüente instauração da ação penal é a medida que se impõe.
Neste sentido, já se posicionou o Pretório Excelso: "Ação penal -Denúncia - artigo 41 do Código de Processo Penal - Contando a denúncia com a exposição do fato criminoso, das circunstâncias bem como da qualificação do acusado, da classificação do crime e do rol das testemunhas, descabe glosá-la " (HC 84841/RS - Relator Ministro Marco Aurélio).
No mesmo sentido é a orientação do Colendo Superior Tribunal de Justiça: "Merece recebimento a exordial que contém a exposição dos fatos criminosos, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado, a classificação do crime e farta prova documental, estando formalmente apta para instaurar o processo-crime contra o recorrido. Recurso conhecido e provido" (Recurso Especial 698289/MT - Ministro José Arnaldo da Fonseca).
No caso em tela, verificam-se claros indícios de que o denunciado agiu em desacordo com a norma legal, uma vez que, construiu sua casa em área de preservação ambiental, causando danos a natureza e a fauna, contaminando e poluindo o manancial da área protegida. Portanto, não há que se falar em atipicidade de conduta, como consignou o juiz a quo.
Por sua vez, o Laudo Técnico Ambiental acostado às fls. 67/108, dá conta da proteção legal da área atingida e aponta os danos causados pela ocupação irregular.
Assim, impossível a aplicação do princípio da insignificância no caso sob análise, porquanto como bem colocou o d. Procurador de Justiça: "O denunciado está atingindo bem jurídico dos mais importantes, não importando seja apenas mais um a fazê-lo. Um crime grave, apenado com reclusão, não se torna "insignificante" porque outros o cometem diariamente Dezenas de homicídios são cometidos neste Estado, diariamente. Latrocínios ocorrem todo dia. Nem por isso tais delitos se tornaram insignificantes. Na questão ambiental a tendência mundial é a da 'tolerância zero'. A omissão da Administração Pública, em todos os níveis, é uma verdade, mas não tornou atípica a conduta em questão, tampouco retirou dela sua relevância para o bem estar da humanidade.''
Por fim, cabe realçar, que o legislador na Constituição Federal de 1988 cuidou de direcionar um capítulo especificamente a política ambiental. Assim, diz o artigo 225: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações ".
Nestes moldes, para assegurar um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado dispôs o parágrafo terceiro, do artigo 225: As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
Portanto, sem adentrar ao cerne da questão, mas verificada a existência de justa causa para a instauração da ação penal na forma aduzida na inicial, o recebimento da exordial acusatória em todos os seus termos é de rigor.
Isto posto, dá-se provimento ao recurso para receber a denúncia ofertada contra MARCELO TOBIAS BENEDITO como incurso nos artigos 64, 54, parágrafo segundo, inciso V, e 40, caput e, parágrafo primeiro, todos da Lei nº 9.605/98, c.c. o artigo 69, do Código Penal, determinando-se o formal prosseguimento da ação penal no juízo. Comunique-se.
RIBEIRO DOS SANTOS
Relator
JURID - Rejeição com base na atipicidade de conduta. [28/06/10] - Jurisprudência
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