Pretensão à indenização. Indicação de títulos a protesto. Pessoa jurídica. Sustação do protesto. Ofensa à honra.
Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG
Número do processo: 1.0461.07.043306-9/001(1) Númeração Única: 0433069-52.2007.8.13.0461
Relator: FERNANDO CALDEIRA BRANT
Relator do Acórdão: FERNANDO CALDEIRA BRANT
Data do Julgamento: 14/04/2010
Data da Publicação: 03/05/2010
Inteiro Teor:
EMENTA: PRETENSÃO À INDENIZAÇÃO - INDICAÇÃO DE TÍTULOS A PROTESTO - PESSOA JURÍDICA - SUSTAÇÃO DO PROTESTO - OFENSA À HONRA - ABALO DO CRÉDITO - NÃO-COMPROVAÇÃO - VOTO VENCIDO. À pessoa jurídica assiste o direito de reparação moral, em circunstâncias especiais, que embora não tendo capacidade de sentir emoção e dor, estando desprovida de honra subjetiva e imune à injúria, porém pode padecer de ataque à honra objetiva, pois goza de reputação junto a terceiros, passível de ficar abalada por atos que afetam o seu bom nome no mundo cível ou comercial, protegido pela Constituição. Para que seja passível de reparação, advinda da responsabilidade civil por ato danoso, mister se faz a demonstração dos seus elementos fundamentais: a culpa do agente causador do ato e o nexo de causalidade entre o dano e o efetivo comportamento censurável do agente. Ausente nos autos a prova do abalo do crédito da pessoa jurídica perante terceiros, não há que se falar em indenização por danos morais. V.v.: O simples apontamento do título para protesto, independentemente de sua concretização, configura dano moral indenizável. A quantificação do dano moral obedece ao critério do arbitramento judicial, que, norteado pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, fixará o valor, levando-se em conta o caráter compensatório para a vítima e o punitivo para o ofensor.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0461.07.043306-9/001 - COMARCA DE OURO PRETO - APELANTE(S): VIA BELLA SAUDE BELEZA LTDA - APELADO(A)(S): HEBE GONZAGA DE OLIVEIRA ME (MICROEMPRESA) - RELATOR: EXMO. SR. DES. FERNANDO CALDEIRA BRANT
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 11ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador FERNANDO CALDEIRA BRANT , na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM DAR PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO O VOGAL.
Belo Horizonte, 14 de abril de 2010.
DES. FERNANDO CALDEIRA BRANT - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. FERNANDO CALDEIRA BRANT:
VOTO
Trata-se de apelação interposta contra a r. sentença de f. 76/79, proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Ouro Preto, nos autos da ação com pretensão anulatória c/c indenização por danos materiais e morais, proposta por HEBE GONZAGA DE OLIVEIRA - ME em face de VIA BELLA SAÚDE E BELEZA LTDA, que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, para condenar a requerida ao pagamento de indenização, a título de danos morais, no valor de R$ 4.650,00 (quatro mil, seiscentos e cinqüenta reais), acrescido de correção monetária de acordo com os índices da Corregedoria de Justiça, mais juros de 1% ao mês a partir da sentença. Em face da sucumbência recíproca, condenou ambas as partes ao pagamento dos ônus de sucumbência, suspensa a cobrança em relação à parte autora, em face da justiça gratuita concedida.
Através do presente feito, pretendeu a empresa autora fosse declarada a nulidade dos títulos apontados na inicial, bem como ver-se ressarcida pelos danos materiais e morais que alega ter sofrido em razão da conduta da ré.
Acolhidos parcialmente os pedidos iniciais, recorreu a requerida, pretendendo o reexame da questão por este Tribunal.
No recurso de apelação interposto, com razões às f. 91/99, insurge-se a ré contra a sentença proferida, alegando que o protesto do título não foi efetivado em razão da sua sustação nos autos da medida cautelar em apenso. Defende a inexistência de dano à apelada, uma vez que o protesto do título não ocorreu, sendo indevida indenização por meros transtornos. Colaciona jurisprudências. Por fim, argumenta ser excessivo o valor da condenação fixada. Ao final, pede a reforma integral da sentença, pelas razões supra.
Preparo às f. 100, sendo a apelação recebida às f. 104.
Contra-razões às f. 106/109.
Conheço do recurso, visto que presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.
Sem preliminares argüidas, passo de pronto ao exame do mérito.
Mérito
Conforme relatado, a apelante, alega, em suma, que o protesto do título não foi efetivado em razão da sua sustação nos autos da medida cautelar em apenso. Defende a inexistência de dano à apelada, uma vez que o protesto do título não ocorreu, sendo indevida indenização por meros transtornos.
Tenho que assiste razão à recorrente.
Embora sabido que a pessoa jurídica, criação de ordem legal, não tem capacidade de sentir emoção e dor, estando desprovida de honra subjetiva e imune à injúria, pode, entretanto, padecer de ataque à honra objetiva, pois goza de reputação junto a terceiros, passível de ficar abalada por atos que afetam o seu bom nome no mundo cível ou comercial onde atua.
Assim, resta consagrado pela jurisprudência pátria que ofensa praticada contra pessoa jurídica pode causar-lhe tanto dano material, quanto dano de efeito moral. No entanto, só haverá dano se a ofensa atingir a credibilidade da empresa perante terceiros, o que, por si só, gera a obrigação de indenizar.
Ensina a jurisprudência acerca do dano moral reclamado por pessoa jurídica:
"DANO MORAL - HONRA - CONCEITO - INDENIZAÇÃO RECLAMADA POR PESSOA JURÍDICA.
1- Entende-se como honra também os valores morais, relacionados com a reputação, o bom nome ou o crédito, valores estes inteiramente aplicáveis às pessoas jurídicas; não apenas aqueles que afetam a alma e o sentimento do indivíduo, valores próprios do ser humano.
2 - A ofensa à empresa tanto pode causar-lhe prejuízo de ordem material quanto de ordem apenas moral, devendo recompor-se o seu patrimônio dessa natureza atingido. Irrelevante que o reflexo não seja íntimo, psíquico ou espiritual, pois que a tanto não se limita o conceito a extrair-se do vocábulo "honra". ...
A pessoa jurídica pode reclamar indenização por dano moral, desde que violados quaisquer dos direitos pela mesma titulados e previstos no inciso X, do art. 5º, da Constituição Federal, porquanto o legislador não a distinguiu, para esses efeitos, da pessoa física." (TJDF - EI AC 31.941 - DF - Reg. Ac. 78.369 - 2º C. - rel. Des. Valter Xavier - DJU 06/09/95).
O dever de indenizar decorre do preceito insculpido no art. 5º da Carta Magna bem como dos artigos 186 e 927 do Código Civil, in verbis:
"Art. 5º - (...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".
"Art. 186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito."
"Art. 927 Aquele que, por ato ilícito causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo".
Portanto para que a responsabilidade fique caracterizada, bem como o dever de indenizar, devem ser observados como pressupostos básicos elementos fundamentais, quais sejam, a culpa, nos casos que assim o exige a lei, de forma que só o fato lesivo intencional ou imputável ao agente por omissão de dever autoriza a reparação; o dano, como lesão provocada ao patrimônio ou à honra da vítima, e o nexo de causalidade entre o dano e o efetivo comportamento censurável do agente.
Corolário lógico e necessário da prática do ato ilícito é, portanto, o dever de reparar o dano causado, nos dizeres de Zamprogna Matiello (Cód.Civil Comentado).
Não se afastando as hipóteses em que a própria lei civil estabelece a obrigação de reparar o dano independentemente de culpa, e ainda, das decorrentes do exercício de atividade que por sua natureza geram risco para os direitos de outrem.
Pois bem.
Narra a empresa autora na inicial que a mesma foi surpreendida com a notificação do Cartório de Protestos de Letras e Títulos de Ouro Preto, acerca da indicação para protesto de títulos emitidos pela apelante em seu desfavor, títulos esses já quitados, conforme comprovado nos autos da medida cautelar de sustação de protesto em apenso.
A recorrente, por sua vez, não nega o fato de que os títulos indicados a protesto já haviam sido quitados.
Todavia, não obstante entender ser indevida a indicação dos referidos títulos a protesto, visto que já quitados, conforme se observa dos autos medida cautelar em apenso, o protesto não chegou a ser efetivado, visto que foi deferida liminarmente pelo Magistrado a sua sustação. É o que se infere das f. 26 e 31.
Nesse contexto, a despeito da responsabilidade da apelante, que figura como cedente dos títulos objeto da lide, pela indicação dos referidos títulos a protesto, apesar de já quitados, mister reconhecer que não logrou êxito a apelada em demonstrar nos autos os danos morais alegados.
Em que pese o entendimento esposado em julgados anteriores que versavam sobre a presente matéria, me reposicionei, por entender que o abalo de crédito causado pelo protesto indevido, por si só, comprova o dano moral sofrido pela pessoa jurídica.
Contudo, no caso em julgamento, conforme dito alhures, não restou provado que o protesto tenha se efetivado, não se podendo presumir eventual dano sofrido pela empresa recorrida perante terceiros pelo simples apontamento de títulos a protesto que restou sustado a tempo.
Ante tais premissas, ausente nos autos a prova dos danos morais alegados, deve sofrer reforma a decisão proferida em primeiro grau.
Por todo o exposto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO, para reformar a decisão recorrida, a fim de julgar improcedentes os pedidos iniciais.
Em face da improcedência dos pedidos iniciais, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais, inclusive recursais e honorários de advogado ao patrono da apelada, no importe de R$2.000,00 (dois mil reais), suspensa a cobrança, em face da justiça gratuita concedida.
O SR. DES. MARCELO RODRIGUES:
VOTO
O mero apontamento não gera dano moral indenizável apenas do protesto lavrado e registrado.
Assim, acompanho o voto do eminente Relator.
O SR. DES. MARCOS LINCOLN:
VOTO
Trata-se de Apelação interposta por VIA BELLA SAÚDE E BELEZA LTDA. contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Ouro Preto, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, condenando a ré ao pagamento de indenização por dano moral, no valor de R$ 4.650,00, corrigido monetariamente e acrescido de juros de 1% ao mês, a contar da fixação.
Em seu voto, o eminente Relator, Desembargador Fernando Caldeira Brant, deu provimento ao recurso, para reformar a sentença e julgar improcedentes os pedidos iniciais.
Data venia, ouso divergir de Sua Excelência.
Isso porque, no caso dos autos, é incontroverso que os títulos objeto da ação foram devidamente quitados antes de serem enviados para protesto, o qual somente não foi concretizado, em razão da presteza e diligência judicial promovida pela autora/apelada.
Em que pesem os fundamentos adotados pelo i. Relator, a meu ver, o fato de os protestos não terem sido lavrados em decorrência da sustação deferida na cautelar em apenso (processo nº 0461.07.043011-5), não exclui a responsabilidade da empresa apelante, que foi negligente ao não impedir que os títulos fossem levados a protesto.
Sobre o tema, vejamos o entendimento do colendo Superior Tribunal de Justiça:
"CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. APONTAMENTO INDEVIDO DE TÍTULO A PROTESTO. PESSOA JURÍDICA. DANO MORAL. CABIMENTO. SÚMULA N. 227-STJ. PROVA DO PREJUÍZO. DESNECESSIDADE. O apontamento de título para protesto, ainda que sustada a concretização do ato por força do ajuizamento de medidas cautelares pela autora, causa alguma repercussão externa e problemas administrativos internos, tais como oferecimento de bens em caução, geradores, ainda que em pequena expressão, de dano moral, que se permite, na hipótese, presumir em face de tais circunstâncias, gerando direito a ressarcimento que deve, de outro lado, ser fixado moderadamente, evitando-se enriquecimento sem causa da parte atingida pelo ato ilícito. II. "A pessoa jurídica pode sofrer dano moral" - Súmula n. 227-STJ. III. Recurso conhecido e provido." (STJ. 4ª Turma. REsp nº 254.073/SP. Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ: 19/08/02, pág. 170).
Da mesma forma vem decidindo este egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais:
"INDENIZAÇÃO. DUPLICATA MERCANTIL. APRESENTAÇÃO PARA PROTESTO. DANO MORAL. É fato gerador de dano moral o saque indevido de duplicata mercantil e a apresentação desta para protesto, ainda que este não se concretize em virtude de liminar concedida em ação cautelar." (TJMG. 12ª Câmara Cível. Apelação nº 1.0071.04.017621-7/001. Rel. Des. Saldanha da Fonseca, DJ: 15/12/07).
"AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE TÍTULO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. APONTAMENTO DE TÍTULO QUITADO A PROTESTO. DANO. OCORRÊNCIA. A reparabilidade ou ressarcibilidade do dano moral é pacífica na doutrina e na jurisprudência, mormente após o advento da CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 05.10.88 (art. 5º, incisos V e X), estando hoje sumulada sob o nº 37, pelo STJ. Na hipótese em tela, restou configurado o dano moral sofrido pelo autor em virtude do apontamento de duplicata quitada a protesto, independentemente de sua efetivação. É que o protesto somente não foi efetivado em virtude da presteza do requerente em ajuizar ação cautelar de sustação, não se revelando razoável que tivesse que esperar a concretização do ato para tomar as providências necessárias para seu afastamento. Ademais, houve publicação de edital informando o apontamento para protesto em jornal de circulação local (f. 12 da cautelar), constando o nome do autor como devedor da duplicata em comento, em 26.01.2005, embora a tivesse quitado em 21.01.2005." (TJMG. 17ª Câmara Cível. Apelação nº 1.0518.05.075676-7/001. Rel. Des. Eduardo Mariné da Cunha, DJ: 12/10/06).
Assim, patente é o dano moral sofrido pela apelada, uma vez que os aborrecimentos decorrentes da conduta da apelante excederam a normalidade, gerando, inclusive, danos de natureza material visto que teve que acionar o Poder Judiciário, contratando advogado para propor a presente ação, tudo para refutar uma cobrança indevida.
Por conseguinte, sendo inconteste o dano moral, mister analisar o quantum fixado em primeira instância.
A quantificação do dano moral permanece a cargo da doutrina e da jurisprudência, predominando no Direito Brasileiro o critério do arbitramento judicial (art. 944, CC), tendo-se em conta que a reparação do dano moral tem duplo caráter: compensatório para a vítima e punitivo para o ofensor.
Nesse sentido, vejamos os ensinamentos de CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA:
"A - de um lado, a idéia de punição ao infrator, que não pode ofender em vão a esfera jurídica alheia...;
B - de outro lado proporcionar a vítima uma compensação pelo dano suportado, pondo-lhe o ofensor nas mãos uma soma que não é pretium dolores, porém uma ensancha de reparação da afronta..." (Instituições de Direito Civil, V, II, Ed. Forense, 16ª ed., 1.998, p. 242).
A fixação deve se dar com prudente arbítrio, para que não haja enriquecimento à custa do empobrecimento alheio, mas também para que o valor não seja irrisório.
As decisões de nossos tribunais têm assentado o entendimento de que:
"A indenização por dano moral é arbitrável, mediante estimativa prudencial que leve em conta a necessidade de, com a quantia, satisfazer a dor da vítima e dissuadir, de igual e novo atentado, o autor da ofensa" (RT 706/67).
"A indenização haverá de ser suficientemente expressiva para compensar a vítima pelo sofrimento, tristeza ou vexame sofrido e penalizar o causador do dano, levando em conta ainda a intensidade da culpa e a capacidade econômica dos ofensores" (COAD, Bol. 31/94, p. 490, nº 66.291).
"Para a fixação do dano moral o julgador pode usar de certo arbítrio, devendo, porém, levar em conta as condições pessoais do ofendido e do ofensor" (RJTJRS, 127/411).
Portanto, atento ao princípio da prudência e às peculiaridades do caso sub judice, já apontadas, ausente o critério objetivo de fixação da verba indenizatória por danos morais e levando-se em conta outros julgamentos já proferidos por esta Câmara, inclusive, em processos que relatei, versando sobre a justa quantificação dos danos morais, hei por bem manter o valor arbitrado pelo MM. Juiz, qual seja R$4.650,00 (quatro mil seiscentos e cinquenta reais), quantia esta que não configura uma premiação, nem mesmo uma importância insuficiente para concretizar a pretendida reparação civil.
Mediante tais considerações, renovando venia, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo a sentença hostilizada, pelos seus próprios fundamentos.
Custas recursais, pela apelante.
SÚMULA: DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO O VOGAL.
JURID - Pretensão à indenização. Indicação de títulos a protesto. [28/05/10] - Jurisprudência
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