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sexta-feira, 21 de maio de 2010

JURID - Apelação cível. Ação civil pública. Fornecimento de alimento [21/05/10] - Jurisprudência


Apelação cível. Ação civil pública. Fornecimento de alimento nutricional e fraldas descartáveis. Responsabilidade.

Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC

Ap. Cív. n. 2010.003394-5

Publicado dia 07.05.2010

Apelação Cível n. 2010.003394-5, de São Bento do Sul

Relator: Des. Substituto Ricardo Roesler

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FORNECIMENTO DE ALIMENTO NUTRICIONAL E FRALDAS DESCARTÁVEIS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. LEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO. COMPROVAÇÃO DA NECESSIDADE DOS PRODUTOS PLEITEADOS. SENTENÇA CONFIRMADA.

"É inegável que a garantia do tratamento da saúde, que é direito de todos e dever do Estado, pela ação comum da União, dos Estados e dos Municípios, segundo a Constituição, inclui o fornecimento gratuito de medicamentos e suplementos alimentares necessários ao tratamento da saúde quem não tiver condições de adquiri-los" (TJSC, Apelação Cível n. 2007.015027-2, de Blumenau, rel. Des. Jaime Ramos, j. 28.08.07).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2010.003394-5, da comarca de São Bento do Sul (1ª Vara), em que é apelante Município de São Bento do Sul, e apelado Representante do Ministério Público:

ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Público, por votação unânime, negar provimento ao recurso. Custas na forma da lei.

1. RELATÓRIO

O Representante do Ministério Público, no interesse de E. L. B., ajuizou ação civil pública com obrigação de fazer contra o Município de São Bento do Sul, objetivando o fornecimento do leite especial "Ninho 3" e de fraldas descartáveis, tendo em vista que a interessada é portadora de mielomeningocele, de hidrocefalia, gastrite hemorrágica e pé congênito.

A liminar almejada foi deferida, determinando-se ao réu o fornecimento mensal de três latas de "Ninho 3" e duzentas unidades de fraldas (fls. 34/37).

O réu, apesar de devidamente citado, não apresentou contestação (certidão de fl. 46).

O Ministério Público apresentou alegações finais às fls. 47/57.

A ação foi julgada procedente e determinou-se ao ente municipal que forneça à interessada, de forma gratuita, mensal e ininterruptamente, seis latas de leite em pó "Ninho 3" e duzentas unidades de fraldas, confirmando, assim, a liminar então concedida (fls. 58/65).

Irresignado, o Município de São Bento do Sul interpôs recurso de apelação, alegando que os genitores da interessada possuem condições de arcarem com parte da quantidade intentada (fls. 71/75).

Contrarrazões às fls. 82/89.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Cezar Ramos de Oliveira, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 94/99).

2. VOTO

Trato de recurso de apelação interposto pelo Município de São Bento do Sul contra sentença que julgou procedentes os pedidos formulados pelo Representante do Ministério Público na ação civil pública de obrigação de fazer ajuizada contra o ente municipal, no interesse de E. L. B., cujo objetivo é o fornecimento do leite especial "Ninho 3" e de fraldas descartáveis.

Tenho que a sentença é de ser confirmada.

Primeiramente, insta esclarecer que não há dúvidas de que o direito postulado é individual homogêneo, sendo perfeitamente viável a atuação do Ministério Público como parte postulatória da presente demanda.

A Constituição Federal, em seu art. 129 e incisos, determina, entre outras, que são funções do Ministério Público promover a ação civil pública para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

Por sua vez, a Lei Complementar n. 75/93, que versa sobre a organização, as atribuições e o Estatuto do Ministério Público da União, dispõe que é de competência deste, também, promover a ação civil pública para proteger direitos constitucionais, interesses individuais indisponíveis, difusos e coletivos relacionados ao consumidor e outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos.

Nessa esteira, verifica-se que o Ministério Público agiu em prol da coletividade, ainda que na defesa de direitos individuais homogêneos, dado o caráter social da medida, sendo, por essa razão, parte legítima para atuar no polo ativo da demanda.

No caso em apreço, a responsabilidade federal, estadual e municipal é solidária, podendo a parte exigir de qualquer destas esferas a prestação constitucionalmente garantida.

É consabido que o art. 23, II, da CF determina ser da competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios "cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência".

Da mesma forma, que a Lei Federal n. 8.080/90 delegou aos Estados da Federação a administração dos recursos orçamentários e financeiros destinados à saúde, sendo
inevitável o reconhecimento da responsabilidade solidária dos entes federativos, que, quando demandados judicialmente, serão obrigados ao pagamento dos remédios ou dos itens que se fizerem necessários para a saúde do interessado, desde que comprovada a respectiva necessidade do tratamento/produto e a carência financeira do paciente.

Vale lembrar que, no que tange às leis orçamentárias que limitam a atuação e os gastos da administração pública, entendo que essas previsões normativas têm a finalidade de fiscalizar a atividade daqueles que têm a função de defender os interesses da população, e jamais suprimir ou desatender interesses da coletividade.

Pois bem. Não há dúvida de que o bem juridicamente tutelado - a saúde - é direito fundamental do cidadão, assegurado constitucionalmente, sendo inegável o dever do Estado (em todas as suas esferas) em garantir a sua proteção. A regra constitucional em voga não é meramente programática, pois visa efetivamente a efetivação dos direitos e garantias fundamentais indispensáveis à dignidade da pessoa humana, que pressupõe a proteção da vida e uma existência com qualidade.

Nesse sentido:

"'O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional' (AgRgRE nº 271.286, Min. Celso de Mello; RE nº 195.192, Min. Marco Aurélio)." (TJSC, AI nº 2008.006645-9, Rel. Des. Newton Trisotto).

Com efeito, entre proteger a inviolabilidade do direito à vida ou atender ao interesse econômico do ente público, não há dúvidas de que se deve primar pela manutenção do direito fundamental, constitucionalmente garantido.

Da análise dos autos, verifica-se estar devidamente demonstrado que a interessada (E.L.B. - hoje com quase cinco anos de idade) sofre de mielomeningocele (patologia que impede o desenvolvimento normal dos ossos e nervos da coluna - fl. 04), de hidrocefalia (o que a impossibilita de exercer qualquer controle a respeito da atividade urinária), gastrite hemorrágica e pé congênito (utiliza talas especiais para estimular a atividade das pernas) (fls. 20/28).

Depreende-se, também, que os pais da interessada não dispõem de condições financeiras para arcar com o custo das fraldas e do leite, uma vez que não possuem renda suficiente à compra daqueles, conforme documento constante à fl. 19.

Assim, comprovada a necessidade e a impossibilidade dos genitores da interessada (menor) de arcarem com a aquisição do leite necessário à saúde da criança, bem como das fraldas, é dever do Município fornecer tais produtos, nos termos do art. 196 da Constituição Federal e art. 153 da Constituição do Estado de Santa Catarina.

Diante disso, nego provimento ao recurso, mantendo a sentença por seus próprios fundamentos.

3. DECISÃO

Ante o exposto, a Câmara decidiu, por votação unânime, negar provimento ao recurso.

O julgamento, realizado no dia 27 de abril de 2010, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Cid Goulart, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador Newton Janke.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Cezar Ramos de Oliveira.

Florianópolis, 27 de abril de 2010.

Ricardo Roesler
RELATOR




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