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sexta-feira, 23 de abril de 2010

JURID - Impenhorabilidade relativa de salários. [23/04/10] - Jurisprudência


Impenhorabilidade relativa de salários.

Tribunal Regional do Trabalho - TRT3ªR

Processo: 00600-2000-109-03-00-5 AP

Data de Publicação: 15/03/2010

Órgão Julgador: Quarta Turma

Juiz Relator: Juiz Convocado Jose Eduardo de RC Junior

Juiz Revisor: Juiz Convocado Eduardo Aurelio P. Ferri

Agravante(s): Flavio de Almeida Amaral (1)Ernane Claudio Caldeira Brant (2)

Agravado(s): os mesmos e (1)ETQ Tecnologia e Qualidade Ltda. (2)Roberto Bastos da Silva Junior (3)

EMENTA: IMPENHORABILIDADE RELATIVA DE SALÁRIOS. Em atenção ao espírito da norma que dimana do inc. IV do art. 649 do CPC, insta reconhecer que há, neste dispositivo, apenas um rol exemplificativo, de verbas impenhoráveis, marcadas, contudo, por um traço comum, ou seja, terem caráter alimentar. Assim, mesmo os salários estariam abrangidos pela impenhorabilidade. Mas não se pode olvidar que a restrição à penhora cede em face de execução de prestação alimentícia que, outrossim, não pode ser considerada restritivamente, como se apenas contemplasse, pensão alimentícia, de tal forma que, também, as verbas trabalhistas possibilitam a penhora sobre salários.

Vistos os autos.

RELATÓRIO

A MMª Juíza do Trabalho Maria Stela Álvares da Silva Campos, titular da 39ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, pela r. decisão de f. 192/193, julgou improcedentes os embargos opostos por Flávio Almeida Amaral.

Agravo de petição interposto pelo executado (f. 195/205), aduzindo que a penhora recaiu sobre o salário do agravante, verba de natureza alimentar e, por isso, impenhorável. Diz que a descontituição da personalidade jurídica da empresa não pode alcançá-lo, já que é sócio minoritário, principalmente em face da ausência de má-fé.

O exequente apresenta agravo de petição adesivo, a fim de que seja determinado à Feluma o bloqueio de 25% da renda mensal do sócio executado, eis que estaria havendo descumprimento de ordem judicial neste sentido.

Contraminuta do exequente às f. 219/227 e do executado às f. 236/239.

É o relatório.

VOTO

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Presentes todos os pressupostos de admissibilidade, conheço dos agravos de petição interpostos .

JUÍZO DE MÉRITO

AGRAVO DO SÓCIO EXECUTADO

Trata-se de execução de acordo celebrado no ano de 2.000 e até esta data inadimplido.

O tema central da discussão é que o sócio agravante não se conforma em ter sido acionado para responder pelo débito exequendo e, consequentemente, pelo bloqueio de 25% de seu salário junto à Fundação Educacional Lucas Machado - Feluma.

A questão foi objeto de julgamento de Mandado de Segurança pela 1ª Seção Especializada de Dissídios Individuais deste Regional (acórdão de f. 207/210), no qual foi mantida a liminar que denegara a segurança, sob o fundamento de que é possível a penhora de salários quando se tratar de dívidas por prestação alimentícia, incluídos aí "aqueles decorrentes de salários e outros títulos trabalhistas".

Antes de mais, ressalto que o descumprimento da obrigação pela devedora principal é fato suficiente para que se inicie a execução contra os sócios, em razão da aplicação da teoria da despersonalização da pessoa jurídica, com o fim de alcançar o patrimônio dos sócios.

A despersonalização da pessoa jurídica, acolhida legalmente pelo Código Tributário Nacional (art. 135) e pelo Código de Defesa do Consumidor tem aplicação analógica na seara trabalhista (art. 8º da CLT), na eventualidade de a empresa não ter bens suficientes para garantir a execução.

De se notar que o ora agravante responde pela satisfação do crédito exequendo, já que a sua posição é de devedor tanto quanto os demais sócios, independentemente de sua quota de participação na sociedade. Além do mais, a Lei 6.830/80, aplicável à execução trabalhista por força do disposto no art. 889 da CLT, estabelece, em seu artigo 4º, § 3º, que, para se valer do benefício de ordem e furtar-se à execução, ao devedor somente é possível nomear bens livres e desembargados do devedor principal, situados na mesma comarca, suficientes à quitação da dívida. No caso dos autos, não obstante o agravante manifeste seu inconformismo, não informou ou indicou bens de propriedade da executada, que pudessem ser objeto de constrição judicial, única possibilidade e não ser alcançado pela execução.

Portanto, é legítimo para responder pelo crédito do reclamante, cuja execução já se arrasta por quase uma década!!!

Por outro lado, entendo, tal qual relatado no v. acórdão do Mandado de Segurança, que em atenção ao espírito da norma que dimana do inc. IV do art. 649 do CPC, insta reconhecer que há, neste dispositivo, apenas um rol exemplificativo, de verbas impenhoráveis, marcadas, contudo, por um traço comum, ou seja, ambas têm caráter alimentar. Assim, mesmo os salários estariam abrangidos pela impenhorabilidade. Mas não se pode olvidar que a restrição à penhora cede em face de execução de prestação alimentícia que, outrossim, não pode ser considerada restritivamente, como se apenas contemplasse, pensão alimentícia, de tal forma que, também, as verbas trabalhistas possibilitam a penhora sobre salários, sobretudo no caso dos autos, em que o sócio executado aufere significativa remuneração para os padrões brasileiros, conforme se pode verificar do documento de f. 108 (superior a R$17.000,00).

Nesse quadro, então, há duas verbas dotadas de caráter alimentar, merecendo, ambas, proteção jurídica. O próprio inciso IV do art. 649 permite a penhora, para satisfazer prestação alimentícia.

Ademais, em hipóteses tais, assume relevância a utilização de princípios, a fim de solucionar mais adequadamente o caso concreto.

Considerando que o agravante não comprovou robustamente que o bloqueio determinado pelo juízo o tenha impedido de solver suas despesas ordinárias, não se afigura razoável desconstituir a penhora, porquanto a execução, in casu, também colima a satisfação de crédito alimentar.

Provimento negado.

AGRAVO DO EXEQUENTE

Verifico, inicialmente, que a questão trazida pelo 2º agravado, embora tenha sido objeto de impugnação de f. 187/189, não foi analisada por ocasião do julgamento dos embargos pela instância de origem.

Entretanto, passo a seu exame, em face do efeito devolutivo dos recursos, estatuído pelo parágrafo 1º do art. 515 do CPC, segundo o qual incumbe ao Tribunal a apreciação e julgamento de todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro, não traduzindo tal procedimento afronta ao princípio do duplo grau de jurisdição.

In casu, a questão refere-se à alegação de descumprimento pela Feluma da ordem judicial de bloqueio de 25% sobre os rendimentos do sócio executado, tendo o juízo inferior se pronunciado às f. 110 e 146 dos autos, descabendo, pois, qualquer infringência ao disposto no art. 463 do CPC.

A apreciação de plano do mérito da demanda traduz, ainda, observância aos princípios da celeridade e economia processual.

Pois bem.

Conforme comprovado à f. 108, o sócio executado recebe mensalmente da Fundação Educacional Lucas Machado proventos no valor bruto de R$17.541,00. Tal importância, contudo, sofre incidência de descontos relativos a INSS, Imposto de Renda e, principalmente, de dois empréstimos consignados junto ao Banco Bradesco, o que resulta no valor líquido a receber de R$3.355,48, sobre o qual vem sendo bloqueado a favor da presente execução o percentual de 25%.

As razões de agravo não podem ser acolhidas, portanto, em face da clareza da decisão exequenda, no sentido de que "... eventuais bloqueios se restrinjam ao limite de 25% do valor líquido devido ao executado (Flávio de Almeida Amaral)..." (f. 110).

É de ressaltar, por oportuno, que não há provas nos autos no sentido de que os empréstimos consignados tenham sido efetuados após a ordem judicial de bloqueio, pelo que não se pode presumir a prática de fraude.

Desta forma, tem-se que a ordem judicial está sendo fielmente cumprida, nada havendo a prover no aspecto.

Por outro lado, por força da previsão do art. 765/CLT, entende-se que as disposições do artigo 475-O do CPC são plenamente aplicáveis ao presente feito. A referida norma torna eficaz e célere a tutela jurisdicional, permitindo a solução definitiva dos conflitos, independentemente do pleno exercício do direito de ação ou de defesa pela parte adversa, coibindo, assim, o uso desse direito, em muitos casos, apenas para postergar a satisfação da condenação, o que acarreta a negação da idéia de justiça e a descrença na função pacificadora do Estado. De outro lado, tratando-se de crédito de natureza alimentar decorrente da relação de emprego é presumível o estado de necessidade do reclamante, pelo que não há impedimento para a aplicação do inciso I do parágrafo 2º do artigo 475-O do CPC, podendo também ser invocada, por analogia, a disposição da primeira parte do inciso II, do mesmo parágrafo e artigo retro especificado.

Portanto, considerando a natureza alimentar do crédito trabalhista, faculto ao reclamante o levantamento do depósito que existe nos autos, até a quantia de 60 salários mínimos, nos termos do art. 475-O, parágrafo 2º, item I, do CPC e declaro, de ofício, a hipoteca judiciária sobre os bens imóveis das reclamadas, em valores suficientes à garantia de execução.

CONCLUSÃO

Isto posto, conheço dos agravos de petição interpostos e, no mérito, nego-lhes provimento. Faculto ao reclamante o levantamento do depósito que existe nos autos, até a quantia de 60 salários mínimos. Custas pelo 1º agravante, no importe de R$44,26, conforme artigo 789-A, IV, da CLT.

Fundamentos pelos quais,

O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª. Região, pela sua 4ª. Turma, à unanimidade, conheceu dos agravos de petição interpostos; no mérito, por maioria de votos, negou-lhes provimento, vencido o Exmo. Des. Júlio Bernardo do Carmo. Faculta-se ao reclamante levantar do depósito que existe nos autos, a quantia até 60 salários mínimos Custas, pelo 1º agravante, no importe de R$44,26, conforme artigo 789-A, IV, da CLT.

Belo Horizonte, 03 de fevereiro de 2010.

JUIZ JOSÉ EDUARDO DE R. CHAVES JÚNIOR
RELATOR




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