Suspensão do processo. Pendência de julgamento de outra ação. Prazo.
Tribunal Regional do Trabalho-TRT3ªR
Processo: 00015-2007-003-03-00-5 RO
Data de Publicação: 08/02/2010
Órgão Julgador: Quinta Turma
Juiz Relator: Juiz Convocado Rogerio Valle Ferreira
Juiz Revisor: Des. Jose Roberto Freire Pimenta
Juiz Redator: Des. Jose Roberto Freire Pimenta
RECORRENTE: ANDRÉ FERREIRA COSTA
RECORRIDOS: HSBC BANK BRASIL S.A. - BANCO MÚLTIPLO E OUTROS
EMENTA: SUSPENSÃO DO PROCESSO. PENDÊNCIA DE JULGAMENTO DE OUTRA AÇÃO. PRAZO. Consoante o inciso IV, alínea "a", do art. 265 do CPC, suspende-se o processo quando o seu julgamento depender do julgamento de outra causa ou da declaração da existência ou inexistência da relação jurídica, que constitua o objeto principal de outro processo pendente. Embora o § 5º também estabeleça que, neste caso, o período de suspensão não poderá exceder 1 (um) ano, deve ser reformada a r. decisão de primeiro grau que, após o seu transcurso, julgou o reclamante carecedor da presente ação, com extinção do processo sem resolução do mérito. Em primeiro lugar, não se percebe porque o simples decurso do prazo de um ano de suspensão faria, por si só, desaparecer a legitimidade ativa, o interesse de agir e a possibilidade jurídica do pedido antes presentes, quando do ajuizamento desta segunda reclamação, principalmente porque a inércia do autor poderia determinar a prescrição do direito objeto de seu novo pedido inicial, incontroversamente não formulado em sua primeira ação. Ademais, a extinção do feito sem julgamento do mérito também não dá aplicação literal ao citado § 5º do art. 265 do CPC, que determina que "findo este prazo o juiz mandará prosseguir no processo", devendo portanto proferir decisão final solucionando, incidenter tantum, a questão prejudicial de mérito objeto do primeiro processo que antes determinara a suspensão do segundo feito independentemente do que resultar do trânsito em julgado da primeira decisão. Por fim, a extinção deste segundo feito sem julgamento de mérito obrigaria o reclamante a, imediatamente, ajuizar nova e idêntica reclamação que desde logo deveria ficar suspensa, sendo perfeitamente possível que, após o decurso de mais um ano, a inexistência do trânsito em julgado da primeira decisão determinaria nova extinção do terceiro feito, e assim sucessivamente, sem qualquer razoabilidade. Para, ao revés, evitar-se o risco de duas decisões definitivas contraditórias, só restará, portanto, suspender o segundo processo pelo tempo que se fizer necessário (mesmo que por mais de um ano, prazo notoriamente insuficiente para a solução definitiva dos processos, na cada vez mais assoberbada Justiça brasileira), solução mais simples e consentânea com os princípios da razoabilidade e da economia processual. Provimento que se dá ao recurso, nestes termos.
Vistos os autos, relatado e discutido o presente Recurso Ordinário, DECIDE-SE:
RELATÓRIO
O MM. Juiz da 3ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, Dr. Charles Etienne Cury, pela sentença de fls. 96/98, cujo relatório adoto e a este incorporo, extinguiu o feito sem exame do mérito.
Recorre o reclamante, às fls.99/106, insistindo em nova suspensão do processo, até o trânsito em julgado da decisão proferida no processo nº 01552-2005-003-03-00-5.
Isenção de custas às fls.97/98.
Apresentadas contrarrazões pelas reclamadas às fls.110/113.
Não se vislumbra, no presente feito, interesse público a proteger.
É o relatório.
VOTO
ADMISSIBILIDADE
Satisfeitos os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do Recurso Ordinário e das contrarrazões, tempestivamente apresentadas.
FUNDAMENTOS
SUSPENSÃO DO PROCESSO
Insurge-se o reclamante contra a r. sentença que extinguiu o feito sem exame do mérito, porque ultrapassado o prazo previsto no §5º do art. 265 do CPC, quanto à suspensão do processo. Requer nova suspensão do presente feito até o trânsito em julgado da decisão definitiva a ser proferida nos autos de n. 01552-2005-003-03-00-5.
Examina-se.
Na inicial, o reclamante formulou pedido de pagamento de 01 hora extra diária, durante todo o pacto laboral, com o acréscimo de 50% (item "b", fl.06). Fundamentou seu pedido na r. decisão de primeiro grau, mantida pelo Eg. TRT, que declarou que a sua jornada diária de trabalho era de 08h30min as 18h30min, com fruição de apenas 30 minutos de intervalo para refeição e descanso (fl.04).
Defendendo-se, os reclamados alegaram litispendência.
O juízo monocrático determinou que as partes peticionassem nos autos o trânsito em julgado do referido processo, para a inclusão do feito em pauta e encerramento da instrução processual, adiando a audiência SINE DIE (fl.72). Em 22/10/2009, proferiu a r. sentença que, conforme art. 267, VI, do CPC, extinguiu o processo sem resolução do mérito.
Consta da fundamentação (fl.97), in verbis:
"Lado outro, inexiste previsão legal para que o feito aguarde indefinidamente pelo trânsito em julgado da decisão da qual decorreria o pedido inicial. O que prevê o inciso IV do art. 265 do CPC está subordinado ao §5º do mesmo dispositivo, que impõe o prosseguimento do feito após um ano.
Por derradeiro, não há, ao menos, de se falar em utilidade da ação para interrupção do prazo prescricional previsto no inciso XXIX do art. 7º da Constituição Federal, sequer após a extinção do pacto, de vez que a contagem do prazo prescricional, em qualquer hipótese, antes do nascimento do direito e de sua violação, a denominada actio nata, conforme prescrito no art. 189 do Código Civil Brasileiro."
Com efeito, preceitua o artigo 265, IV, "a", do CPC, verbis:
"Art. 265: Suspende-se o processo:
(...)
IV- quando a sentença de mérito:
a) depender do julgamento de outra causa, ou da declaração da existência ou inexistência da relação jurídica, que constitua objeto principal de outro processo pendente".
Conforme ensinamentos do i. processualista Humberto Teodoro Júnior:
"(...) o inciso IV do art. 265 determina a suspensão do processo sempre que a sentença de mérito estiver na dependência de solução de uma questão prejudicial que é objeto de outro processo, ou de ato processual a ser praticado fora dos autos (...). Prejudiciais são as questões de mérito que antecedem, logicamente, à solução do litígio e nela forçosamente haverão de influir. A prejudicial é interna quando submetida à apreciação do mesmo juiz que vai julgar a causa principal. É externa quando objeto de outro processo pendente. (...) Só há razão para a suspensão do processo, de que cogita o art. 265, nº IV, letra a, quando a questão prejudicial for objeto principal de outro processo pendente (questão prejudicial externa, portanto)". (Curso de Direito Processual Civil - Rio de Janeiro: Forense, 1996, Vol. I, p. 302).
No caso em apreço, foi determinada a suspensão do processo, nos termos do art. 265, "a", do CPC, eis que ainda não transitada em julgado a decisão proferida no processo n. 01552-2005-003-03-00-5, como se infere das atas de audiência de fls. 49, 72 e 94.
Compulsando os autos, verifica-se que a suspensão do feito extrapolou o prazo de um ano previsto no artigo 265, §5º, do CPC. Frise-se que referido prazo estabelece uma norma pautada pela razoabilidade, porquanto fixa um prazo máximo de suspensão, sendo que, ultrapassado esse lapso, toma curso o processo.
Por estas razões, concluiu o i. Juiz Convocado Relator que, não havendo, ainda, o trânsito em julgado da decisão em comento, da qual depende o julgamento da presente ação, e ultrapassado o prazo estabelecido no artigo 265, §5º, do CPC, o feito deveria ser extinto sem julgamento do mérito, como decidido em primeira instância, não prosperando o pedido de nova suspensão do processo até que a citada decisão se torne definitiva (fls.104/105).
Dele, porém, divergi, na qualidade de Revisor, pelas razões a seguir expostas, no que fui acompanhado pela d. maioria.
Em primeiro lugar, não se compreende, data venia, porque o reclamante seria carecedor da presente ação, somente porque ainda não transitou em julgado a decisão proferida no primeiro processo, pois estão flagrantemente presentes sua legitimidade ativa, seu interesse de agir e a possibilidade jurídica do pedido inicial que formulou neste feito (incontroversamente não formulado naquele primeiro litígio). Afinal, a tese de que ele poderia aguardar o trânsito em julgado da decisão proferida naquele primeiro processo para só depois ajuizar esta reclamação, em aplicação do princípio da actio nata, parece atribuir à primeira sentença uma natureza constitutiva (e não condenatória) que ela, a toda evidência, absolutamente não possui.
Ademais, cumpre salientar que a presente questão é jurisprudencialmente controvertida (inclusive nos Tribunais Superiores). Com efeito, uma primeira corrente pondera que a suspensão do presente feito por mais de um ano e até o trânsito em julgado da decisão proferida no primeiro processo, da qual depende a decisão de mérito a ser nestes autos proferida, feriria a literalidade do § 5º do art. 265 do CPC, acima referido. No entanto, pelas razões a seguir expostas, tenho preferido, em casos semelhantes, adotar a corrente jurisprudencial oposta que, diante da impossibilidade de dar solução ao segundo litígio antes da solução definitiva da questão prejudicial de mérito que é objeto do primeiro processo que originalmente determinou a suspensão do segundo, prefere exatamente manter o segundo processo suspenso o tempo que se fizer necessário (o que corresponde à pretensão recursal agora em exame).
De início, é preciso perceber que aqueles que extinguem o feito sem julgamento do mérito, como fez o MM. Juízo de origem, também não dão aplicação plena e literal ao que dispõe o § 5º do art. 265 do diploma processual civil em comento em sua segunda parte, in verbis:
"Art. 265. (...)
§ 5º. Nos casos enumerados nas letras a, b e c do n. IV, o período de suspensão nunca poderá exceder 1(um) ano. FINDO ESTE PRAZO O JUIZ MANDARÁ PROSSEGUIR NO PROCESSO." (grifos e destaque nossos)
Ou seja, se é para se dar aplicação ipsis litteris ao preceito em tela, o julgador de primeiro grau, decorrido o prazo de um ano ali fixado, deverá dar fim à suspensão do processo, retomar o seu curso normal e proferir decisão de mérito na qual deverá decidir, incidenter tantum, a questão prejudicial de mérito que constituiu objeto do primeiro processo ainda não transitado em julgado e que havia determinado a suspensão do segundo feito, independentemente do que porventura posteriormente venha a ser ali decidido em definitivo - gerando, portanto, o risco de duas decisões contraditórias posteriormente transitarem em julgado, justamente o que o artigo 265, IV, a quis evitar. Em outras palavras, estamos neste caso diante de dois caminhos que igualmente não aplicaram, em sua plenitude, a literalidade do artigo 265 (em seu n. IV, a combinado com seu § 5º) - trata-se, portanto, de escolher a via hermenêutica e interpretativa que se mostre mais razoável e compatível com os princípios e as garantias processuas asseguradas a todos os litigantes.
Por outro lado, não me parece, data venia das respeitáveis manifestações em contrário, que o prazo de um ano seja absoluto e peremptório. Em primeiro lugar, porque foi ele fixado pelo legislador nos já distantes idos de 1973, quando da aprovação do Código de Processo Civil - se naquela época ele poderia ser realista e razoável, diante do número muito menor de processos então em andamento, hoje ele é completamente inadequado em casos como o presente, que depende da solução definitiva a ser dada a processo que depende do julgamento de recurso pelo Colendo Tribunal Superior do Trabalho (e a ele remetido já em 2006, conforme o documento de f. 65 dos autos). Como é notório (atraindo, assim, o que estabelece o art. 334, I, do mesmo CPC), o prazo de um ano ali previsto será insuficiente para a solução definitiva de qualquer feito que dependa da apreciação e do julgamento de um recurso pelos Tribunais Superiores brasileiros que, apesar da notável capacidade de trabalho e do elevado conhecimento jurídico de seus ilustres componentes, não têm dado vazão à por todos conhecida "explosão de litigiosidade" que infelizmente tem caracterizado o dia-a-dia da Justiça brasileira. Em suma, por não ser razoável e não ser realista diante do tempo médio REAL de tramitação dos feitos no Poder Judiciário de nosso país, não se pode aplicar inflexivelmente e de forma absoluta o prazo de um ano aqui em análise.
Ademais, se, como se acabou de demonstrar, o prazo médio de tramitação dos feitos no Brasil tem ultrapassado, em muitos casos, dois ou três anos (note-se que o primeiro processo foi remetido ao Col. TST em 2006 e não há notícia, nos autos, de sua solução na presente data, já em 2010), a solução adotada pelo MM. Juízo de origem poderia facilmente levar a outro impasse: a extinção deste primeiro feito, como determinado pela decisão recorrida, obrigará o autor, para não sofrer os efeitos da prescrição parcial sobre suas pretensões iniciais, a ajuizar uma segunda reclamação, que também deverá ficar desde logo suspensa à espera da decisão definitiva no primeiro processo pendente entre as partes (cujo andamento consta do citado documento de f. 65); porém, se após mais um ano de suspensão ele ainda não houver sido decidido em definitivo, a prevalecer o entendimento de origem mais uma vez o novo processo deverá ser extinto sem solução de mérito, e assim sucessivamente até o trânsito em julgado da decisão proferida no primeiro de todos estes processos - o que, data venia, mostra-se sem qualquer razoabilidade e também contrária ao princípio da economia processual.
Se assim é, parece-me portanto preferível, por ser mais sensato, prático e razoável, adotar-se a corrente jurisprudencial oposta, que admite a suspensão neste primeiro processo, ora em exame, até o trânsito em julgado da decisão final proferida no processo que determinou a sua suspensão a segunda solução possível (que é, repita-se, a solução aqui pretendida pelo recorrente).
Diante do exposto, dá-se provimento, por maioria, ao presente recurso para tornar sem efeito a extinção do feito, sem resolução do mérito, e determinar o seu retorno dos autos ao MM. Juízo de origem e que o mesmo permaneça suspenso, nos termos do artigo 265, IV, "a", do CPC, até o trânsito em julgado da decisão proferida no processo nº 01552-2005-003-03-00-5.
CONCLUSÃO
Conheço do recurso ordinário e, no mérito, dou provimento ao presente recurso para tornar sem efeito a extinção do feito, sem resolução do mérito, e determinar que o mesmo permaneça suspenso, nos termos do artigo 265, IV, "a", do CPC, até o trânsito em julgado da decisão proferida no processo nº 01552-2005-003-03-00-5.
FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,
O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela sua Quinta Turma, à unanimidade, conheceu do recurso ordinário; no mérito, por maioria de votos, deu-lhe provimento para tornar sem efeito a extinção do feito, sem resolução do mérito e determinar que o mesmo permaneça suspenso, nos termos do art. 265, IV, "a" do CPC, até o trânsito em julgado da decisão proferida no processo no. 01552-2005-003-03-00-5, vencido o Exmo. Juiz Convocado Relator que negava provimento ao apelo.
Belo Horizonte, 26 de janeiro de 2010.
JOSÉ ROBERTO FREIRE PIMENTA
Desembargador Revisor e Redator
JRFP/H
JURID - Suspensão do processo. Pendência de julgamento de outra ação [27/04/10] - Jurisprudência
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