Civil e processual. Recurso especial. Direito autoral. Ecad. Aparelhos de tv em clínicas. Cobrança. Possibilidade.
Superior Tribunal de Justiça - STJ
RECURSO ESPECIAL Nº 742.426 - RJ (2005/0061323-8)
RELATOR: MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR
RECORRENTE: CLÍNICA PEDIÁTRICA DA BARRA LTDA
ADVOGADO: LUIZ EDUARDO CAVALCANTI CORRÊA E OUTRO(S)
RECORRIDO: ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO ECAD
ADVOGADA: KARINA HELENA CALLAI E OUTRO(S)
EMENTA
CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO AUTORAL. ECAD. APARELHOS DE TV EM CLÍNICAS. COBRANÇA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
I. Nos termos da jurisprudência do STJ, "A Lei nº 9.610/98 não autoriza que a disponibilidade de aparelhos de rádio ou de televisão nos quartos de motéis e hotéis, lugares de freqüência coletiva, escape da incidência da Súmula nº 63 da Corte" (SEGUNDA SEÇÃO, REsp 556340/MG, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, DJ 11/10/2004 p. 231).
II. A aplicação da multa prevista no artigo 109 da Lei n.° 9.610/98 demanda a existência de má-fé e intenção ilícita de usurpar os direitos autorais, aqui inocorrentes. Precedentes do STJ.
III. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, provido, para afastar a multa.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Luis Felipe Salomão e Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP) votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Fernando Gonçalves.
Brasília (DF), 18 de fevereiro de 2010 (Data do Julgamento)
MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR
Relator
RECURSO ESPECIAL Nº 742.426 - RJ (2005/0061323-8)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR: Cuida-se de recurso especial contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro - TJRJ, cuja ementa encontra-se lavrada nos seguintes termos (fl. 168):
"DIREITO AUTORAL. VIOLAÇÃO. CAPTAÇÃO DE PROGRAMAÇÕES DE VÁRIAS EMISSORAS DE TV. EXIBIÇÃO EM APARELHOS NAS DEPENDÊNCIAS INTERNAS DA CLÍNICA MÉDICA PEDIÁTRICA. OBTENÇÃO DE BENEFÍCIO INDIRETO COM A EXIBIÇÃO CONSUBSTANCIADO NO CONFORTO OFERECIDO AOS PACIENTES. TUTELA AOS DIREITOS AUTORAIS CONEXOS. LEGITIMIDADE E PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE DOS ATOS PRATICADOS PELO ECAD PARA A COBRANÇA. RECURSO PROVIDO."
A recorrente volta-se contra o referido acórdão invocando ofensa aos arts. 68, 86 e 109 da Lei 9.610/86 e dissídio pretoriano.
Sustenta, em síntese, que a mera captação de sinais de televisão enviados por emissora de TV a cabo não pode ser havida como execução pública, de modo que não há que se falar em fato gerador do dever de pagar direitos autorais.
Aduz que a empresa de TV a cabo por assinatura já recolhe percentual sobre a receita das assinaturas a título de direitos autorais, de modo que não pode haver a cobrança também em face da clínica, sob pena de bis in idem.
Alega que não deve ser onerada com a multa prevista no supramencionado art. 109 porque não promove execuções públicas de obras musicais, litero-musicais e fonogramas no âmbito de sua clínica (fls. 226/227Citam doutrina e afirmam que o crédito goza de privilégio especial, tendo preferência até mesmo sobre os créditos de natureza trabalhista, tributária e parafiscal, ao contrário do decidido pela instância ordinária.
Postula reforma do julgado.
Contra-razões apresentadas às fls. 239/255.
Houve juízo de admissibilidade negativo proferido às fls. 257/258.
Por força de decisão proferida no Agravo de Instrumento nº 625.361/RJ, na qual determinei a subida do apelo extremo.
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 742.426 - RJ (2005/0061323-8)
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR (Relator): O Tribunal local, ao solucionar a questão, assim registrou (fls. 174/175):
"(...)entendo devido o pagamento dos direitos autorais relativos à exibição de programas televisivos no contexto narrado no presente feito, pois, em que pese não haver auferição de lucro diretamente pela Clínica Apelada, há benefício indireto em sua atividade consubstanciado no conforto propiciado aos pacientes, o que valoriza os serviços oferecidos onerosamente."
Tal entendimento se alinha com o posicionamento sedimentado neste Superior Tribunal de Justiça, no sentido de serem devidos os direitos autorais decorrentes de exibição de programas televisivos em ambientes de freqüência coletiva, tais como, quartos de clínicas, hotéis, academias, bares, restaurantes, etc. Nesses termos:
"Direito civil. ECAD. Instalação de televisores dentro de apartamentos privativos em clínicas de saúde. Necessidade de remuneração pelo direitos autorais.
- A Segunda Secção deste Tribunal já decidiu serem devidos direitos autorais pela instalação de televisores dentro de quartos de hotéis ou motéis (REsp nº 556.340/MG).
- O que motivou esse julgamento foi o fato de que a Lei nº 9.610/98 não considera mais relevante aferir lucro direto ou indireto pela exibição de obra, mas tão somente a circunstância de se ter promovido sua exibição pública em loca de freqüência coletiva.
- O mesmo raciocínio, portanto, deve ser estendido a clínicas de saúde ou hospitais, já que nenhuma peculiaridade justificaria tratamento diferenciado para estas hipóteses.
Recurso especial conhecido e provido."
(REsp 791630/RJ, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, DJ 04/09/2006 p. 270)
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"Direito autoral. Aparelhos de rádio e de televisão nos quartos de motel. Comprovação da filiação. Legitimidade do ECAD. Súmula nº 63 da Corte. Lei nº 9.610, de 19/2/98.
1. A Corte já assentou não ser necessária a comprovação da filiação dos autores para que o ECAD faça a cobrança dos direitos autorais.
2. A Lei nº 9.610/98 não autoriza que a disponibilidade de aparelhos de rádio ou de televisão nos quartos de motéis e hotéis, lugares de freqüência coletiva, escape da incidência da Súmula nº 63 da Corte.
3. Recurso especial conhecido e provido."
(REsp 556340/MG, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, DJ 11/10/2004 p. 231)
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"CIVIL. DIREITO AUTORAL. COBRANÇA. ECAD. LEGITIMIDADE. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. CAPTAÇÃO DE MÚSICA COM AMBIENTAÇÃO POR MEIO DE SONORIZAÇÃO MECÂNICA. BAR/RESTAURANTE E ACADEMIA DE GINÁSTICA. LUCRO INDIRETO. SÚMULA N. 63-STJ. LEI N. 5.988/73.
I. O ECAD tem legitimidade ativa para, como substituto processual, cobrar direitos autorais em nome dos titulares das composições lítero-musicais, inexigível a prova de filiação e autorização respectivas.
II. A captação de música em rádio e a sua divulgação através de sonorização ambiental em estabelecimentos comerciais que dela se utilizam como elemento coadjuvante na atração de clientela, constitui hipótese de incidência de direitos autorais, nos termos do art. 73 da Lei n. 5.988/73.
III. "São devidos direitos autorais pela retransmissão radiofônica de músicas em estabelecimentos comerciais" - Súmula n. 63-STJ.
IV. Recurso especial conhecido e provido em parte."
(REsp 111105/PR, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR, DJ 10/02/2003 p. 211)
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"DIREITOS AUTORAIS. RÁDIO RECEPTOR E APARELHO DE TV A CABO DISPONÍVEIS AOS HÓSPEDES EM APOSENTOS DE HOTEL. EXIGIBILIDADE A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI N. 9.610, DE 19.2.1998.
- Consoante a Lei n. 9.610, de 19.1.1998, a disponibilização de aparelhos de rádio e de TV em quartos de hotel, lugares de freqüência coletiva, sujeita o estabelecimento comercial ao pagamento dos direitos autorais. Precedente da Segunda Seção: Resp n. 556.340-MG.
- Descabimento da multa prevista no art. 109 da Lei n. 9.610/98 (REsp 439.441-MG)
Recurso especial conhecido, em parte, e nessa parte, provido."
(REsp 329860/RJ, Rel. Min. BARROS MONTEIRO, DJ 01/02/2005 p. 564)
De outro lado, no que toca à aplicação da multa, a corte de origem, em sede de embargos declaratórios, decidiu nos seguintes termos (fl. 200):
"(...) tendo a Clínica apelada agido em desconformidade com a Lei reguladora dos Direitos Autorais, não observando principalmente o disposto em seu artigo 68, parágrafos 2º e 3º, conforme já exposto no acórdão embargado, não há como a mesma se isentar do pagamento da multa de vinte vezes o valor que deveria ser originariamente pago, a ser calculada em processo de liquidação de sentença."
Ocorre que este Tribunal Superior já sedimentou se posicionamento quanto à aplicação da penalidade somente nos casos em que comprovada a existência de má-fé e ação deliberada no sentido de usurpar o direito autoral. Confira-se:
"DIREITO CIVIL. AGRAVO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ECAD. INSTALAÇÃO DE TELEVISORES EM RESTAURANTE. NECESSIDADE DE REMUNERAÇÃO PELOS DIREITOS AUTORAIS. MULTA. DEMONSTRAÇÃO. MÁ-FÉ. PRECEDENTES. LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO.
- A Segunda Secção deste Tribunal já decidiu serem devidos direitos autorais pela instalação de televisores dentro de quartos de hotéis ou motéis (REsp nº 556.340/MG).
- O que motivou esse julgamento foi o fato de que a Lei nº 9.610/98 não considera mais relevante aferir lucro direto ou indireto pela exibição de obra, mas tão somente a circunstância de se ter promovido sua exibição pública em loca de freqüência coletiva.
- O mesmo raciocínio, portanto, deve ser estendido a restaurantes, já que nenhuma peculiaridade justificaria tratamento diferenciado para estas hipóteses.
- A aplicação da multa prevista no artigo 109 da Lei n.° 9.610/98 demanda a existência de má-fé e intenção ilícita de usurpar os direitos autorais.
- A divulgação ao público de obra musical, sem prévia autorização, não pode ser equiparada a uma declaração de vontade segundo a qual o exibidor aceita pagar o que o ECAD estabelece ser devido. Trata-se de ilícito extracontratual e o valor da liquidação sujeita-se a liquidação por arbitramento.
Negado provimento ao agravo no agravo de instrumento."
(AgRg nos EDcl no Ag 938715/RJ, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, DJe 23/05/2008)
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"CIVIL E PROCESSUAL. DIREITO AUTORAL. SONORIZAÇÃO MECÂNICA. ACADEMIA DE GINÁSTICA. CONDENAÇÃO. MULTA INDEVIDA. LEI N. 9.610/98, ART. 109. LICC, ART. 5º. CPC, ART. 209. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS NS. 282 E 356-STF.
I. A elevada multa prevista no art. 109 da novel Lei n. 9.610, equivalente a vinte vezes o valor devido originariamente, não é de ser aplicada a qualquer situação indistintamente, porquanto objetiva, por seu caráter punitivo e severa conseqüência, não propriamente penalizar atraso ou omissão do usuário, mas, sim, a ação de má-fé, ilícita, de usurpação do direito autoral, o que não se revela na hipótese, em que o estabelecimento comercial, modesto, utilizava a sonorização mecânica apenas como elemento coadjuvante da atividade fim, sem intenção fraudulenta direta, como se dá em casos de contrafação mediante produção de cópias desautorizadas de fitas e "CD".
II. Temperamento que se põe na aplicação da lei, sob pena de se inviabilizar a própria atividade econômica desenvolvida pelo usuário, com prejuízo geral, em contrário ao princípio insculpido no art. 5º da LICC.
III. A ausência de prequestionamento do tema referente ao art. 209 do CPC impede o seu exame no âmbito desta Corte, ao teor das Súmulas ns. 282 e 356 do C. STF.
IV. Recurso especial não conhecido."
(REsp 439441/MG, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR, DJ 10/03/2003 p. 233)
Diante do exposto, conheço em parte do recurso especial e, nessa parte, dou-lhe provimento, apenas para afastar a multa do art. 109 da Lei 9.610/98.
É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número Registro: 2005/0061323-8 REsp 742426 / RJ
Números Origem: 19882004 200401102179 200413501988 200413704592
PAUTA: 18/02/2010 JULGADO: 18/02/2010
Relator
Exmo. Sr. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. FERNANDO HENRIQUE OLIVEIRA DE MACEDO
Secretária
Bela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI
AUTUAÇÃO
RECORRENTE: CLÍNICA PEDIÁTRICA DA BARRA LTDA
ADVOGADO: LUIZ EDUARDO CAVALCANTI CORRÊA E OUTRO(S)
RECORRIDO: ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO ECAD
ADVOGADA: KARINA HELENA CALLAI E OUTRO(S)
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Coisas - Propriedade - Propriedade Intelectual / Industrial - Direito Autoral
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso especial e, nessa parte, deu-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Luis Felipe Salomão e Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Fernando Gonçalves.
Brasília, 18 de fevereiro de 2010
TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI
Secretária
Documento: 945312 Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 15/03/2010
JURID - Recurso especial. Direito autoral. Ecad. Aparelhos de tv. [27/04/10] - Jurisprudência
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