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sexta-feira, 16 de abril de 2010

JURID - Penal. Processual penal. Agrotóxicos. Importar e transportar [16/04/10] - Jurisprudência


Penal. Processual penal. Agrotóxicos. Importar e transportar. Artigo 56 da lei 9.605/98. Artigo 15 da lei 7.802/89.
MBA Direito Comercial - Centro Hermes FGV

Tribunal Regional Federal 4ªR

D.E.

Publicado em 16/04/2010

RECURSO CRIMINAL EM SENTIDO ESTRITO Nº 2009.71.20.000406-9/RS

RELATOR: Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RECORRIDO: SAUL GOMES XAVIER
PAULO OSEAS SILVA MADALENO

ADVOGADO: Defensoria Pública da União
Joao Carlos Rocha Almeida

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. AGROTÓXICOS. IMPORTAR E TRANSPORTAR. ARTIGO 56 DA LEI 9.605/98. ARTIGO 15 DA LEI 7.802/89. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. PÓS-FATO IMPUNÍVEL. NÃO-APLICAÇÃO. EMENDATIO LIBELLI. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. POSSIBILIDADE.

1. O princípio da especialidade é aplicável quando os fatos narrados assemelham-se a uma ação nuclear presente em ambos os tipos penais, geral e especial. Tratando-se de importação e transporte de agrotóxicos em descompasso com a legislação pertinente, cujo pós-fato "transportar" é impunível, impõe-se a subsunção da conduta do vocábulo "importar", que não encontra tipificação no artigo 15 da Lei 7.802/89, na regra disposta no artigo 56 da Lei 9.605/98.

2. Conquanto o enquadramento da conduta delitiva tenha lugar, em regra geral, no momento da prolação da sentença, pode ser ele antecipado para o recebimento da denúncia quando, da alteração da capitulação prevista na peça incoativa, sobrevier a possibilidade de suspensão condicional do processo.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso em sentido estrito, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 24 de março de 2010.

Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Relator

RELATÓRIO

O Ministério Público federal aviou denúncia em desfavor de SAUL GOMES XAVIER e PAULO OSEAS SILVA MADALENO, dando-os como incursos, em tese, nas sanções do artigo 15 da Lei 7.802/89. Os fatos foram assim narrados na exordial:

"Em 02 de julho de 2008, por volta de 10h, no Km 406 da RS 287, em Santiago/RS, os denunciados foram flagrados por agentes da Polícia Rodoviária Federal, transportando, em proveito próprio ou alheio, agrotóxicos em descumprimento às exigências estabelecidas na legislação pertinente, os quais haviam sido por eles importados ou introduzidos clandestinamente no País.

Na ocasião, os Policiais Deoclides de Oliveira Neto e Rafael Lander abordaram o veículo VW/Passat, placa IFF 7589, tripulado pelos acusados, no qual estavam sendo transportados os agrotóxicos importados.

Perante os agentes policiais, os denunciados assumiram a responsabilidade pela importação e transporte dos agrotóxicos e demais produtos, consoante depoimento de fls. 43. (...)" (grifei)

O Juízo a quo recebeu a denúncia (fls. 165/165-verso), contudo, por meio de emendatio libelli, alterou a capitulação proposta pelo Parquet para a constante do artigo 56 da Lei 9.605/98, por entender que melhor traduz os fatos aludidos na peça incoativa e determinou a remessa dos autos ao dono da ação penal para eventual proposta do benefício da suspensão condicional do processo aos réus.

Inconformado com a decisão, o Ministério Público Federal interpôs recurso em sentido estrito, sustentando, em síntese, que: I) para a hipótese dos autos é cabido o recurso em sentido estrito como instrumento recursal; II) o enquadramento que mais se assemelha aos fatos narrados é o previsto no artigo 15 da Lei 7.802/89.

Com contrarrazões (fls. 187/191.)

Mantida a decisão (fl. 192), subiram os autos.

O órgão ministerial, nesta instância, opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 196/197-verso).

É o relatório.

Peço dia.

Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Relator

VOTO

Inicialmente, analiso os tipos penais do artigo 56 da Lei 9.605/98 e o artigo 15 da Lei 7.802/89:

"Art. 56. Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Art. 15. Aquele que produzir, comercializar, transportar, aplicar, prestar serviço, der destinação a resíduos e embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, em descumprimento às exigências estabelecidas na legislação pertinente estará sujeito à pena de reclusão, de dois a quatro anos, além de multa."

Importante aclarar que os agrotóxicos mencionados na Lei 7.802/89 enquadram-se no conceito de substância tóxica elencado pela Lei 9.605/98, pelo que é possível depreender que a conduta dos agentes possa ser enquadrada em ambos os tipos penais.

Ainda que acertadas as razões recursais quando sustentam que o dispositivo do artigo 15 da Lei 7.802/89 é especial em relação ao preceito geral constante do artigo 56 da Lei 9.605/98, o princípio da especialidade tem sua aplicação tão-somente quando as ações nucleares da regra especial e da regra geral são coincidentes.

Nesse sentido a orientação da Turma:

"PENAL. AGROTÓXICOS. IMPORTAÇÃO E TRANSPORTE IRREGULARES. LEI Nº 9.605/98, ART. 56. LEI Nº 7.802/89, ART. 15. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. DOCUMENTO FALSO. CÓPIA REPROGRÁFICA AUTENTICADA. CONDUTA TÍPICA. 1. O art. 15 da Lei nº 7.802/89 é especial em relação ao artigo 56 da Lei nº 9.605/89 no que coincide as respectivas ações nucleares, devendo preponderar em relação a esta. Deixa, no entanto, de sê-lo no que diferem. Importar, por exemplo, não é conduta tipificada no art. 15 da lei nº 7.802/89, mas está, quanto a substâncias tóxicas proibidas ou ilegais, elencada na regra proibitiva do art. 56 da Lei nº 9.605/98. 2. O agente que, após pessoalmente importar agrotóxico em desobediência à legislação pertinente, transporta-o no interior do território brasileiro, sujeita-se às penas somente do delito previsto no artigo 56 da Lei nº 9.605/98. O transporte de substância tóxica por aquele que a importou consiste em pós-fato impunível, pois quem, por si mesmo, importa, para tanto, necessariamente transporta. Diversa é a situação em que, sem ter introduzido o agrotóxico em solo pátrio, encontra-se o agente a transportá-lo (internamente), hipótese em que estará descumprindo a regra do art. 15 da Lei nº 7.802/89. 3. A fotocópia, desde que devidamente autenticada, inclui-se no conceito de documento para fins de responsabilização penal." (ACR 20047115003222-3, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, D.E. 04-3-2009 - destaquei)

"PENAL E PROCESSUAL. ART. 56 DA LEI Nº 9.605/98 E ART. 15 DA LEI 7.802/89. IMPORTAÇÃO E TRANSPORTE DE AGROTÓXICOS. CONCURSO APARENTE DE NORMAS. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE E CONSUNÇÃO. PÓS-FATO IMPUNÍVEL. OCORRÊNCIA. INSIGNIFICÂNCIA. DESCABIMENTO. SURSIS PROCESSUAL. ART. 89 DA LEI Nº 9.099/95. REMESSA À ORIGEM.

1. Tendo em conta a natureza das mercadorias apreendidas - agrotóxicos - a conduta praticada pelo agente se amolda ao tipo penal insculpido no artigo 15 da Lei nº 7.802/89, pelo princípio da especialidade. 2. Ressaindo dos autos que foi o próprio acusado quem importou tais substâncias tóxicas e as transportou em território nacional, está-se diante da figura do pós-fato impunível, não podendo responder pela imputação (transporte) inscrita na Lei dos agrotóxicos, em face de que esta ação é mero exaurimento da conduta (importar) tipificada no art. 56 da Lei 9.605/98. 3. Incabível, nos casos deste jaez, a aplicação do princípio da insignificância jurídica, em razão do bem jurídico tutelado (meio ambiente). 4. Restando apenas a imputação relativa a delito que possui pena mínima cominada de 01 (um) ano, cabível o benefício contido no art. 89 da Lei nº 9.099/95. 2. Retorno dos autos à origem para a devida manifestação do Parquet, sobrestando-se o julgamento do mérito." (ACR 20077110005236-7, Rel. Des. Federal Élcio Pinheiro de Castro, D.E. 25-6-2009 - destaquei)

"PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE AGROTÓXICOS. IMPORTAÇÃO E TRANSPORTE IRREGULARES. AMBIENTAL. LEI N.º 7.802/89, ARTIGO 15. LEI N.º 9.605/98, ARTIGO 56. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO. PENA MÍNIMA PREVISTA EM ABSTRATO. UM ANO. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. LEI N.º 9.099/95. POSSIBILIADE.

1. O art. 15 da Lei n.º 7.802/89 é especial em relação ao art. 56 da Lei n.º 9.605/89 no que coincidem as respectivas ações nucleares, devendo preponderar em relação a este. Deixa, no entanto, de sê-lo no que diferem. Importar, por exemplo, não é conduta tipificada no art. 15 da Lei n.º 7.802/89, mas está, quanto a substâncias tóxicas proibidas ou ilegais, elencada na regra proibitiva do art. 56 da Lei n.º 9.605/98.

2. O agente que, após pessoalmente importar agrotóxico em desobediência à legislação pertinente, transporta-o no interior do território brasileiro, sujeita-se às penas somente do delito previsto no art. 56 da Lei n.º 9.605/98. O transporte de substância tóxica por aquele que a importou consiste em pós-fato impunível, pois quem, por si mesmo, importa, para tanto, necessariamente, transporta. Diversa é a situação em que, sem ter introduzido o agrotóxico em solo pátrio, encontra-se o agente a transportá-lo (internamente), hipótese em que estará descumprindo a regra do art. 15 da Lei n.º 7.802/89.

3. Se, ainda que na sentença, ocorre a desclassificação do crime delineado na denúncia para delito cuja pena máxima prevista em abstrato é igual ou inferior a um ano, afigura-se possível o oferecimento de proposta de suspensão condicional do processo." (ACR 20067116000686-2, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, D.E. 23-7-2009)

In casu, exsurge claro da narrativa da peça acusatória que os denunciados supostamente praticaram ambas as condutas - "importar" e "transportar".

Para tanto, subsidiou-se o dominus litis dos depoimentos prestados no auto de prisão em flagrante pelos Policiais Rodoviários Federais Deoclides de Oliveira Neto (fl. 47) e Rafael Lander (fl. 48), os quais evidenciaram a prática da importação e posterior transporte de agrotóxicos em descompasso com a legislação pertinente:

"(...) QUE verificaram a existência de mercadorias de procedência estrangeira sem a devida comprovação da importação legal; QUE tendo em vista a aparente destinação para venda interrogaram o passageiro e o motorista, os quais afirmaram que as mercadorias eram 'encomendas' para amigos(...)" (fl. 47)

"(...) QUE localizaram agrotóxicos em pó da marca HERBEX, no interior de uma das bagagens; QUE removendo o banco traseiro, observou-se um fundo falso contendo três pacotes repletos do referido agrotóxico; (...) QUE naquele momento disseram que toda a mercadoria ora apreendida era de propriedade de ambos, sem individualizar a propriedade; QUE naquele momento ainda, informaram terem adquirido as mercadorias em Rivera/URUGUAI com destino a São Luiz Gonzaga/RS; QUE a mercadoria destinava-se à venda, tendo afirmado que seria para 'ganhar um dinheirinho, pois a situação estava difícil';(...)" (fl. 48)

É relevante ressaltar que os documentos lavrados pelos agentes públicos, bem como suas declarações gozam de fé pública e são presumidos verdadeiros, podendo servir de amparo para a fundamentação da acusação e para o convencimento do magistrado.

Destarte, já é entendimento pacificado nesta Corte que a conduta de "transportar" agrotóxicos resta incorporada na internalização prevista no artigo 56 da Lei 9.605/98, porquanto inviável proceder à importação sem o respectivo transporte dos bens, bem como porque não tipificado, no artigo 15 da Lei 7.802/89, o verbo nuclear "importar", o que implicaria a especialização.

Ademais, ainda que o enquadramento da conduta delitiva tenha lugar, em regra geral, no momento da prolação da sentença, pode ser ele antecipado para o recebimento da denúncia quando, da alteração da capitulação prevista na peça incoativa, sobrevier a possibilidade de suspensão condicional do processo, tal como a situação posta na presente persecução penal.

Assim, em face da ocorrência do pós-fato impunível da importação (transporte), bem como em sendo inaplicável o princípio da especialidade porquanto vocábulo não previsto no artigo 15 da Lei 7.802/89, acertada a decisão a quo que, por meio de emendatio libelli, alterou a capitulação prevista na denúncia para o dispositivo do artigo 56 da Lei 9.605/98 e viabilizou ao Ministério Público Federal a eventual proposta do sursis processual.

Ante o exposto, na forma da fundamentação, voto no sentido de negar provimento ao recurso em sentido estrito.

Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Relator

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/03/2010

RECURSO CRIMINAL EM SENTIDO ESTRITO Nº 2009.71.20.000406-9/RS

ORIGEM: RS 200971200004069

RELATOR: Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

PRESIDENTE: Luiz Fernando Wowk Penteado

PROCURADOR: Dr. José Ricardo Lira Soares

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RECORRIDO: SAUL GOMES XAVIER
PAULO OSEAS SILVA MADALENO

ADVOGADO: Defensoria Pública da União
Joao Carlos Rocha Almeida

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/03/2010, na seqüência 25, disponibilizada no DE de 10/03/2010, da qual foi intimado(a) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e a DEFENSORIA PÚBLICA.

Certifico que o(a) 8ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

RELATOR ACÓRDÃO: Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

VOTANTE(S): Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Lisélia Perrot Czarnobay
Diretora de Secretaria

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Documento eletrônico assinado digitalmente por Lisélia Perrot Czarnobay, Diretora de Secretaria, conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, e a Resolução nº 61/2007, publicada no Diário Eletrônico da 4a Região nº 295 de 24/12/2007. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://www.trf4.gov.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3373807v1 e, se solicitado, do código CRC 73ABE9A0.

Informações adicionais da assinatura:

Signatário (a): LISELIA PERROT CZARNOBAY:10720

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Data e Hora: 30/03/2010 17:59:22




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