Notícias STFQuinta-feira, 29 de setembro de 2011STF inicia julgamento de denúncia contra Paulo Maluf e familiares
Foi iniciado nesta quinta-feira (29) o julgamento de denúncia (INQ 2471) em que o deputado federal Paulo Maluf (PP-SP) e mais dez pessoas, entre elas sua mulher, Sylvia, os filhos Flávio, Lígia, Lina e Otavio e outros familiares são acusados criminalmente da prática dos crimes de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, afirmou que o dinheiro lavado foi desviado de obras públicas quando Maluf foi prefeito de São Paulo (1993-1996), remetido ilegalmente ao exterior por doleiros e, por fim, "lavado" em investimentos feitos na Eucatex, empresa da família.
Segundo Gurgel, a maior parte do dinheiro foi desviada por meio da construção da Avenida Água Espraiada, na zona Sul de São Paulo. “Essa obra, concluída em 2000, teve o custo final extremamente absurdo de R$ 796 milhões, ou cerca de US$ 600 milhões”, disse. “Essa foi a fonte primordial dos recursos utilizados na lavagem (de dinheiro)”, afirmou.
Fases da lavagem de dinheiro
No crime de lavagem, o dinheiro obtido de forma ilícita (crime antecedente) retorna ao mercado como se fosse "limpo". De acordo com Gurgel, o esquema criminoso mantido pelos denunciados percorreu as três fases do processo de lavagem de dinheiro, segundo conceito do Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi).
A primeira fase é a de captação (ou ocultação) e ocorreu por meio do desvio dos recursos na gestão de Maluf como prefeito. Gurgel explicou que os crimes antecedentes à lavagem de dinheiro (crimes de corrupção passiva, formação de quadrilha e evasão de divisas) estão sendo investigados em denúncia apresentada pelo MPF em uma Ação Penal também em curso no STF.
A segunda fase é a de dissimulação (ou estratificação). Nela, afirmou o procurador-geral, os valores ilícitos foram entregues para um doleiro que realizou remessas, via dólar-cabo, para a conta Chanani, localizada no banco Safra National Bank, de Nova Iorque. Dos Estados Unidos, os valores teriam sido remetidos para contas bancárias de sete fundos de investimentos na Ilha de Jersey. Esses fundos, disse Gurgel, também teriam recebido recursos provenientes da Suíça e da Inglaterra.
Por fim, a terceira e última fase é chamada de integração. O procurador-geral afirmou que, nessa etapa, os fundos de investimento constituídos na Ilha de Jersey utilizaram recursos recebidos dos Estados Unidos para adquirir debêntures e ações da empresa Eucatex. Foi assim, disse Gurgel, que “os valores lavados voltaram ao Brasil, concluindo o ciclo criminoso”.
O procurador-geral da República acrescentou que o grupo foi denunciado por formação de quadrilha porque, pelo menos desde 1993, “associaram-se, de forma estável e permanente, com o propósito de cometer crimes de lavagem de ativos e efetivamente cometeram tais delitos consoante narrados minuciosamente na denúncia”.
Ele foi taxativo: “O que está provado nos autos, fartamente, é que integrantes da família Maluf uniram-se em torno do objetivo comum de ocultar e dissimular a origem de valores provenientes de crimes contra a Administração Pública praticados por Paulo Maluf enquanto exerceu o mandato de prefeito de São Paulo”.
Gurgel também rebateu o que classificou de “mais relevantes” argumentos dos acusados. Entre eles, está a alegação de que a Lei 9.613, de março de 1998, não poderia ser aplicada aos fatos objeto da acusação, que teriam ocorrido antes da entrada em vigor da norma.
“Na verdade, os acusados foram denunciados por fatos que ocorreram entre os anos de 1993 a 2002. Todos sabemos que a lavagem de dinheiro é definida como crime permanente, cuja consumação prolonga-se no tempo, enquanto os bens, valores e direitos estiverem dissimulados e ocultos”, afirmou.
Ele registrou que, segundo a denúncia, em 11 de janeiro de 2000, o total investido nos fundos de investimento era de mais de US$ 172 milhões. “Muito embora a abertura dos fundos de investimento seja ação instantânea, a manutenção de valores nos fundos é fato que inegavelmente prolonga-se no tempo”, ressaltou.
A defesa argumenta ainda que retificação feita pelo Ministério Público Federal em relação no quinto conjunto de fatos apresentados na denúncia (ao todo, o inquérito contém oito conjuntos de fatos) teria o somente intuito de adequar a denúncia à Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/98).
“Na verdade, a providência foi motivada pela necessidade de adequar a narrativa aos elementos dos autos, e não para abranger o início da vigência da Lei 9.613”, disse. Segundo Gurgel, o processo de integração dos valores desviados no Sistema Financeiro brasileiro não se consumou com a aquisição das debêntures e ações, mas com a conversão dessas debêntures em ações preferenciais e ordinárias da Eucatex, o que somente ocorreu em 30 de julho de 1998, quando a lei já estava em vigor.
Ele destacou ainda que, ao contrário do que afirma a defesa, o Ministério Público nunca investigou o caso diretamente. “Repito, para afastar qualquer dúvida quanto a esse tema: as provas que instruem a acusação foram obtidas em inquérito policial e por intermédio de cooperação jurídica internacional autorizada judicialmente.”
Ele concluiu afastando a alegação de inépcia da denúncia, que não descreveria adequadamente os fatos delituosos. Esse argumento é comum entre praticamente todos os acusados. “Devo dizer que, em quase 30 anos de Ministério Público, jamais vi uma denúncia à qual a defesa não atribuísse a condição de inepta, como se o Ministério Público brasileiro fosse absolutamente incapaz, em toda a sua história, de produzir uma peça acusatória apta.”
A denúncia foi originalmente oferecida pelo Ministério Público perante 2ª Vara Criminal de São Paulo e chegou ao Supremo em fevereiro de 2007, após a diplomação de Maluf como deputado federal.
RR/CG
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