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quarta-feira, 5 de maio de 2010

JURID - Responsabilidade civil. Vítima de roubo. [05/05/10] - Jurisprudência


Responsabilidade civil. Vítima de roubo que, a partir de informação de terceiro, aponta o autor como sendo suspeito.
MBA Direito Comercial - Centro Hermes FGV

Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC

Apelação Cível n. 2008.039567-3

Publicado em: 04.05.2010

Apelação Cível n. 2008.039567-3, de Camboriú

Relator: Des. Newton Janke

RESPONSABILIDADE CIVIL. VÍTIMA DE ROUBO QUE, A PARTIR DE INFORMAÇÃO DE TERCEIRO, APONTA O AUTOR COMO SENDO SUSPEITO DO CRIME. ABORDAGEM POLICIAL E CONDUÇÃO DO SUSPEITO À DELEGACIA PARA PROCEDIMENTO DE RECONHECIMENTO PESSOAL. RECONHECIMENTO FRUSTRADO. AUSÊNCIA DE DOLO OU CULPA. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL.

Age no exercício regular de direito a vítima de assalto que, levada por informação ou suspeita de testemunha do evento criminoso, comunica o fato à Polícia para que proceda a devida averiguação.

Não pode o comunicante ser responsabilizado por eventuais excessos cometidos pelos policiais na abordagem e precipitada detenção do suspeito que, em momento seguinte, não é reconhecido pela testemunha.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2008.039567-3, da Comarca de Camboriú (2ª Vara), em que são apelantes e apelados Benedito Ribeiro Pires e Leandro Forlin, e apelado o Estado de Santa Catarina:

ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Público, por unanimidade, dar provimento ao recurso do réu, prejudicado o recurso adesivo do autor. Custas legais.

1. RELATÓRIO:

Na Comarca de Camboriú, Leandro Forlin ajuizou ação ordinária de indenização por danos morais contra o Estado de Santa Catarina e Benedito Ribeiro Pires em virtude de ter sido injustamente detido, algemado e conduzido à Delegacia de Polícia por policiais militares, em face de acusação formulada pelo segundo réu de que teria praticado um assalto à sua residência.

Os réus contestaram e, ultimada a instrução, sobreveio a sentença (fls. 329-334) que julgou improcedente o pedido em relação ao Estado de Santa Catarina e procedente em face do segundo réu, condenando-o ao pagamento de uma indenização fixada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Buscando reverter este desfecho, o requerido Benedito apelou, reafirmando que não praticou nenhum ato ilícito porquanto, à base de suspeita suscitada por terceira pessoa, acionou a polícia para que esta averiguasse se o requerente podia ser a pessoa que, dois meses antes, participara de um assalto à mão armada a seu estabelecimento comercial.

Considera que atuou no exercício regular de um direito e argumenta que, de resto, não se caracterizou o alegado dano ante o fato de o autor ser pessoa afeta às praticas criminosas, eis que, por sentença transitada em julgado, foi condenado pelo cometimento de roubo duplamente circunstanciado pelo emprego de arma e concurso de agentes (art. 157, §2º, I e II, do Código Penal - fls. 271/289), sem contar a existência de uma segunda condenação pelo crime de porte ilegal de arma (art. 16, parágrafo único, inc. IV, da Lei n. 10.826/2003 - fls. 424/430), isso a revelar que se trata de pessoa desprovida de idoneidade moral que, portanto, não está legitimada a queixar-se de lesão extrapatrimonial.

Alternativamente, a ser mantido o provimento de procedência, pugna pela redução do quantum indenizatório.

De outra parte, o autor Leandro Forlin aviou recurso adesivo, buscando a elevação da indenização.

Os recursos foram regularmente processados na origem.

2. VOTO:

Segundo o Boletim de Ocorrência de fl. 300, em 02/08/2004, na cidade de Camboriú, dois soldados da Polícia Militar acompanharam o requerido Benedito Ribeiro Pires, este que, segundo suspeita de sua cunhada, indicou a pessoa de Leandro Forlin como sendo um dos autores de um assalto à mão armada perpetrado no estabelecimento comercial de Benedito, no dia 18/06/2004.

Leandro foi abordado, algemado e conduzido à Delegacia de Polícia para que ali se procedesse o seu eventual reconhecimento pela cunhada do Benedito, esta que, de fato, se deparara com os protagonistas do assalto, e que, naquele dia, observou que Leandro, antes do fato criminoso, passara em frente ao comércio de Benedito, com olhar perscrutador direcionado para interior do estabelecimento.

No entanto, a cunhada de Benedito não confirmou que Leandro fosse um dos três assaltantes e, diante disso, ele foi liberado na tarde do mesmo dia.

Brevemente resenhados os fatos, é de se anunciar, antecipadamente, o provimento do recurso do réu.

Em que pese a douta magistrada sentenciante ter justificado sua conclusão no fato de inexistir "prova ou qualquer indício de que o autor tenha participado do assalto realizado em seu estabelecimento comercial", associado à circunstância de o autor já ter "prestado serviços ao primeiro réu - pouco importando se era com ou sem carteira assinada - demonstrando que este já conhecia o autor e suas características físicas, sendo ainda mais inescusável que o tenha confundido Gabinete Des. Newton Janke com um assaltante", não há elementos a demonstrar que Benedito tenha obrado com dolo ou má-fé quando solicitou aos policias que abordassem a pessoa do autor.

Segundo se extrai dos autos, ao ensejo do aludido assalto, fora a cunhada de Benedito quem, mais de perto, esteve acossada pelos meliantes e que, antes da investida criminosa, presenciara Leandro, em comportamento aparentemente suspeito, passar defronte do estabelecimento comercial.

Ora, é natural que qualquer pessoa, seja ela vítima de um assalto, seja ela simples testemunha, leve ao conhecimento da Polícia informações destinadas a elucidar a autoria do delito.

Este tipo de informação ou suspeita, quando lastreada em algum suporte fático probatório, não traduz a denunciação caluniosa de que trata o art. 339 do Código Penal. Com efeito, conforme ensina Rui Stoco, só haverá crime e só emergirá o dever de indenizar "por parte daquele que levianamente deu causa à instauração da investigação policial ou de processo judicial contra alguém, imputando-lhe crime 'de que sabe inocente'" e reforça arrematando:"cabe advertir que a acusação deve ser objetivamente falsa, isto deve referir-se a fato inexistente ou que não foi praticado pela pessoa acusada ou deve estar em contradição com a verdade dos fatos, estando o denunciante plenamente ciente de tal condição" (in Tratado de Responsabilidade Civil. 7 ed. São Paulo: Ed. RT, 2007, p. 859).

Ora, o crime de roubo na loja do réu-apelante efetivamente ocorreu. Benedito não imputou, objetivamente, a prática do crime ao autor, limitando-se a levar a suspeita ao conhecimento da Polícia, conduta que, conforme dito, não encerra, por si só, qualquer ilicitude.

Se, no caso, alguém agiu incorretamente, foram os policiais militares.

Como não dispunham de nenhum mandado judicial e como não era caso de "prisão em flagrante delito" nada justificava a precipitada detenção do autor e sua condução coercitiva, à força de algemas, para a Delegacia de Polícia. Benedito, entretanto, não pode ser civilmente responsabilizado pelo excesso dos agentes estatais.

No julgamento de caso assemelhado, o eminente Des. Luiz Carlos Freyesleben assinalou, em palavras adequadas também para a hipótese vertente, que "para a procedência do pedido indenizatório formulado pelas autoras apelantes, era necessário que provassem que as rés tinham plena ciência de que lhe imputavam crime inexistente ou, ao menos, que procederam de forma agressiva ou ultrajante, submetendo-as a situação constrangedora e vexatória.

Mas essa prova, cujo ônus é das autoras, por ser fato constitutivo de seu direito, conforme o artigo 333, I, do Código de Processo Civil, não foi produzida. Pelo contrário, o caderno processual dá conta de que as rés apeladas conduziram a situação com discrição, mantendo o tema sigiloso até a chegada dos policiais" (TJSC, AC n. 2003.021363-5, j. em 23/11/2006).

Repita-se, mais uma vez, que quem leva ao conhecimento da Polícia uma informação ou suspeita sobre a autoria de crime de que foi vítima age, em linha de princípio, no exercício regular de direito, como se dá quando alguém formaliza uma representação criminal. Neste sentido:

"Aquele que, sem alterar a verdade dos fatos, nem cometer excessos, oferece Gabinete Des. Newton Janke representação criminal contra alguém, solicitando providências à autoridade policial para a abertura de inquérito, não pratica ato ilícito, e sim age no exercício regular de um direito reconhecido (art. 160, I [atual art. 188, I], do CC" (TJCE, Ap. Civ. 96.02238-3, Repert. IOB Jurisp. 11/98, p. 211).

Nesta linha de pensamento, cumpre prover o recurso do réu para julgar improcedente o pedido, prejudicado o recurso adesivo, arcando o autor com o pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, arbitrados em R$ 2.000,00 (dois mil reais - art. 20, §4º, do Código de Processo Civil), cuja execução, no entanto, fica suspensa sob as condições do art. 12 da Lei n. 1.050/50.

3. DECISÃO:

Nos termos do voto do relator, decidiu a Câmara, por unanimidade, dar provimento ao recurso do réu, prejudicado o recurso adesivo do autor.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Des. João Henrique Blasi e Ricardo José Roesler.

Florianópolis, 20 de abril de 2010.

Newton Janke
PRESIDENTE E RELATOR
Gabinete




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