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segunda-feira, 22 de março de 2010

JURID - JFPR determina bloqueio de bens [19/03/10] - Jurisprudência


Justiça Federal do Paraná determina bloqueio de bens de ex-prefeito de Renascença


Ação Civil Pública de Improbidade Administrativa nº 2009.70.07.002500-3/PR.

Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Réu: JOSÉ KRESTENIUK
Advogado: JOÃO ALBERTO MARCHIORI
Réus: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO e PREFEITURA MUNICIPAL DE RENASCENCA



DECISÃO (liminar/antecipação da tutela).


O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ajuizou a presente ação civil pública em face de JOSÉ KRESTENIUK, em litisconsórcio com a UNIÃO e o MUNICÍPIO DE RENASCENÇA - PR, com a qual pretende a condenação do réu ao ressarcimento de dano provocado ao erário, bem como a aplicação de outras sanções decorrentes da prática de ato de improbidade, consistente no desvio de recursos federais e municipais destinados à construção do "Mercado do Produtor", os quais foram usados em empreendimento turístico.

Sustenta que em inquérito civil público apurou-se que foi promovido, no Município de Renascença, procedimento licitatório para a construção de obra intitulada "Mercado do Produtor", com alocação de verba federal, no valor de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), e municipal, no total de R$ 29.313,81 (vinte e nove mil trezentos e treze reais e oitenta e um centavos). Relata que a obra construída, cujo atestado de conclusão foi firmado pelo réu, não atende à finalidade a que se deveria destinar, pois trata-se de empreendimento turístico, isto é, um mirante construído no denominado "Parque Yara Mãe d´Água", às margens de um lago e distante do centro municipal.

Informa que, diante da constatação, foi expedida notificação à Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Renascença, que informou não existir "Mercado do Produtor" no Município, e que a obra construída não é apropriada para a venda de produtos rurais, pois o espaço é muito pequeno para tal atividade, fato constatado in loco pelo agente ministerial. Aduz ainda que o réu se manifestou nos autos de inquérito civil público, alegando que a obra não teve destinação adequada porque foi construída no final de 2004, último ano de sua gestão, e que a administração posterior não deu andamento ao projeto inicial. Defende o autor que tal alegação não corresponde à verdade, pois a obra foi concluída em 07/05/2003 (fl. 173 do inquérito em apenso), conforme atestado pelo próprio réu, na qualidade de Prefeito Municipal.

Argumenta, por fim, que deve ser decretada liminarmente a indisponibilidade dos bens do réu, em razão do princípio da efetividade do processo, a fim de que o resultado prático da demanda não fique prejudicado por eventual dilapidação do patrimônio e/ou ocultação de bens.

Reservada a análise do pedido liminar para momento posterior à notificação do réu (fl. 16), o Ministério Público Federal interpôs agravo de instrumento (fls. 18/29), ao qual foi negado seguimento (fl. 31).

Notificado, o réu manifestou-se às fls. 35/37. Justificou o local de construção da obra às margens da rodovia e do lago a fim de atrair um maior número de interessados, tendo em vista que as experiências de montagem de feiras de produtores no centro da cidade teriam fracassado. Sustenta que optou-se por fazer a obra em dois níveis, sendo a parte inferior um pavimento de 80 metros quadrados para comercialização de produtos rurais, e a parte superior um espaço para o consumo dos produtos, com vista panorâmica para o lago.

Afirma que a obra foi feita ao final de sua gestão passada (2001/2004), e que a gestão seguinte (2005/2008) abandonou o espaço. Informa que a partir de sua nova gestão, iniciada em 2009, procurou recuperar o local, concluindo uma reforma em agosto de 2009. Alega que, na época da construção, o empreendimento não pôde ser usado como mercado para produtores rurais em razão da inexistência de associação de agricultores organizada, de sistema de inspeção municipal (SIM) para fiscalizar a venda de produtos de origem animal e vegetal, e de produção em escala comercial suficiente.

Vieram os autos conclusos para apreciação do pedido liminar.

Decido.

O pedido de decretação de indisponibilidade de bens do réu encontra respaldo legal no art. 7° da Lei n° 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), o qual dispõe:

Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.

Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito.

Cumpre indagar, pois, sobre a relevância dos fundamentos invocados, bem como sobre a probabilidade de que, na eventual procedência do pedido, o réu não cumpra com a obrigação imposta, mormente tendo em vista que a presente ação civil pública tem por objetivo principal a recomposição do patrimônio público supostamente lesado.

A análise da documentação constante dos autos revela a existência de indícios da prática de atos de improbidade pelo réu, enquadrados, em tese, nos seguintes dispositivos da Lei nº 8.429/92:

"Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente (...)

(...)

XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;" (grifo acrescentado)

Dos autos do Inquérito Civil Público MPF PRM/FB Nº 1.25.010.000018/2009-12, apensados a estes autos, observam-se os seguintes indícios de prática pelo réu de ato de improbidade:

1) o "Atestado de Conclusão da Obra" referente ao "Mercado do Produtor", firmado pelo réu em 07/05/2003, na qualidade de Prefeito, segundo o qual "o referido empreendimento encontra-se em perfeitas condições de uso e funcionamento, atendendo que justificaram sua concessão [sic]" (fl. 173);

2) as declarações da Presidente do Sindicato Municipal de Produtores Rurais de Renascença, prestadas em março e setembro de 2009, sobre a inexistência de um "Mercado do Produtor" no Município (fls. 11 e 221);

3) a existência de placas denominando o local como um "Mirante" ou "Parque", e não como um "Mercado do Produtor", como se verifica pelas fotografias juntadas às fls. 190/192 e 205/211, datadas de abril e junho de 2009;

4) a comparação entre fotografias datadas de dezembro de 2009 do "Parque Yara Mãe d'Água", de Renascença, e do "Mercado do Agricultor", de Marmeleiro, este sim claramente identificado como um mercado de produtos coloniais, e com estrutura condizente com seus fins (fls. 269/284);

5) o registro expresso no relatório da administração do réu, referente à gestão 1997/2004, no qual constam fotos da obra denominadas como "mirante" e "trapiche" (fl. 40 da revista que consta do anexo I do inquérito civil público em apenso), sendo de se observar que o mencionado relatório em momento algum faz alusão à construção de um "Mercado do Produtor"; e

6) a ausência de vocação do espaço construído com a verba destinada ao "Mercado do Produtor" para a comercialização de produtos coloniais, o que se verifica a partir da pequena área supostamente destinada a tal fim (apenas 80 metros quadrados), em contraste com a vocação turística do local.

Ressalte-se que não se discute, neste momento processual, a existência de eventuais dificuldades conjunturais para a exploração do espaço como um mercado de produtos coloniais. Isto porque, ao menos num juízo preliminar, verifica-se que a própria concepção teórica do projeto se revela muito mais afeta ao turismo que ao desenvolvimento da atividade rural, o que tem se refletido na efetiva exploração do espaço. É o que basta, ao menos por ora, para considerar presentes os indícios de desvio na aplicação das verbas públicas, liberadas para a construção do "Mercado do Produtor", sem prejuízo de que o réu, no decorrer da instrução processual, venha a produzir provas em seu favor.

Como se observa, no momento há substanciais indícios da conduta ímproba imputada ao réu, consistente na aplicação irregular de dinheiro público. Por tais razões, entendo pela necessidade da decretação da indisponibilidade de seus bens, principalmente diante do risco de que o réu venha a comprometer seu patrimônio, o que prejudicaria a obtenção de resultado útil ao final do processo.

Saliento, por oportuno, que para o deferimento da liminar requerida não é necessária a efetiva existência de prova de que o réu estaria dilapidando seu patrimônio, especialmente tendo em vista que o desvio de bens nem sempre enseja atos anteriores que demonstrem tal intento. Diante disso, para a concessão da liminar pleiteada são suficientes os indícios de que o réu tenha praticado ato de improbidade que tenha causado prejuízo ao patrimônio público. Neste sentido:

"PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. DECISÃO AGRAVADA. VIOLAÇÃO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INEXISTÊNCIA. DESVIO OU VENDA DE BENS. ATO INSTANTÂNEO. MEDIDA DE CONSTRIÇÃO NECESSÁRIA. RESPEITO AO LIMITE DO DANO IMPUTADO. AGRAVO IMPROVIDO. 1. (...). 2. O desvio ou venda é ato instantâneo, sem prévio aviso ou sinais exteriores, bem como a comprovação do elemento subjetivo (animus de dilapidar) é prova impossível. Dessa forma, demonstrada a gravidade dos fatos e a situação periclitante, o bloqueio é a medida que se impõe. 3. Hipótese em que a medida de constrição patrimonial deferida não se configurou gravosa, porquanto imposta com respeito ao limite do dano imputado 4. Agravo improvido". (TRF1 - AG 2008.01.00.046769-0 - Juíza Federal Rosimayre Gonçalves de Carvalho - 4ª Turma - e-DJF1 04/05/09)

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPENHORABILIDADE DE BENS. VALORES PENHORADOS ELETRONICAMENTE. ARGUIÇÃO PERANTE O MAGISTRADO A QUO. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. INDISPONIBILIDADE DE BENS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CABIMENTO. GARANTIA DE FUTURA E EVENTUAL EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL. RESSARCIMENTO DO ERÁRIO. PROVA DE DILAPIDAÇÃO PATRIMONIAL. DESNECESSIDADE. SUFICIÊNCIA DA PROBABILIDADE. CÁLCULO DO VALOR-LIMITE DE BENS A SEREM BLOQUEADOS. CONSIDERAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. 1. (...) 2. A decretação da indisponibilidade de bens, em sede de ação civil pública por improbidade administrativa fortemente indicada pelos elementos dos autos, é medida acautelatória, que visa a assegurar o resultado útil do processo, garantindo a liquidez patrimonial dos acusados para futura execução da sentença condenatória de ressarcimento de danos ou de restituição dos bens e valores havidos ilicitamente. 3. Justifica a medida cautelar o perigo da demora, decorrente da probabilidade - dispensada a prova efetiva - de dilapidação do patrimônio pessoal dos requeridos, com vistas a frustrar o ressarcimento do Erário, o qual merece integral reparação, a teor do disposto no art. 5º da Lei n. 8.429/92. 4. Caso fique comprovada, a responsabilidade dos demandados, em especial no que toca ao ressarcimento do Erário, é solidária, não se podendo, pois, efetuar a divisão do proveito supostamente auferido por eles para fins de cálculo da quantia-limite do bloqueio de bens, sob pena de se garantir de forma insuficiente uma eventual execução futura". (TRF4 - AG 2009.04.00.007646-9, Des.ª Fed. Marga Inge Barth Tessler - 4ª Turma - D.E. 15/06/2009)

Quanto ao valor a ser indisponibilizado, cumpre considerar o montante total do prejuízo apontado pelo órgão ministerial, da ordem de R$ 89.313,81 (oitenta e nove mil, trezentos e treze reais e oitenta e um centavos). Como este valor data de maio de 2003 (época da conclusão da obra - fl. 174 do autos do inquérito em apenso), cumpre proceder à sua atualização até o mês corrente, a fim de garantir a efetividade da medida.

Assim, atualizando-se o valor para março de 2010 pelo IPCA-E (índice oficial da Justiça Federal para ações condenatórias em geral), apura-se um total de R$ 124.478,59 (cento e vinte e quatro mil, quatrocentos e setenta e oito reais e cinquenta e nove centavos), valor a ser considerado para o bloqueio de bens, conforme extrato em anexo. (fonte:https://www3.bcb.gov.br/CALCIDADAO/publico/corrigirPorIndice.do?method=corrigirPorIndice.)

Portanto, registro que estão ausentes as hipóteses previstas no art. 17, § 8º da Lei nº 8.429/92, pois a conduta narrada, em tese, enquadra-se como ato de improbidade (Lei nº 8.429/92, art. 10, caput e inciso XI), há indícios da prática do ato e a via eleita é adequada, razão pela qual cumpre receber a petição inicial, nos termos do § 9º do dispositivo ora referido.

Ante o exposto:

a) recebo a petição inicial, nos termos do 17, § 9º da Lei nº 8.429/92;

b) concedo a liminar pleiteada para decretar a indisponibilidade de recursos financeiros e bens do réu JOSÉ KRESTENIUK até o valor de R$ 124.478,59 (cento e vinte e quatro mil, quatrocentos e setenta e oito reais e cinquenta e nove centavos). Para tanto, determino, para cumprimento em regime de urgência:

b1) a formulação imediata de solicitação de bloqueio de ativos financeiros de JOSÉ KRESTENIUK (CPF nº 284.017.789-72) até o valor acima fixado, o que será concretizado pelo sistema BACENJUD;

b2) a expedição de ofício ao Cartório do Registro de Imóveis de Renascença, para comunicar a decretação de indisponibilidade de bens acima deferida, requisitar que se abstenha de proceder a quaisquer registros de transferência de bens em nome do réu a partir desta data e até posterior ordem deste juízo, e que informe os dados referentes a bens imóveis do réu, se existentes, servindo uma via deste despacho como ofício nº 4234978 para tal fim;

b3) o bloqueio de veículos de titularidade do réu via sistema RENAJUD;

Além disso, decreto o sigilo do anexo II do inquérito que instrui o feito, tendo em vista o teor dos documentos que o compõem (declarações de renda do réu), devendo a vista de tais documentos ficar restrita às partes. Anote-se o fato no rosto dos autos.

Intime-se o Ministério Público Federal e cite-se o réu.

Em seguida, citem-se a União e o Município de Renascença, para, querendo, integrar a lide.

Na sequência, abra-se vista ao Ministério Público Federal.

Francisco Beltrão/PR, 12 de março de 2010.


FREDERICO MONTEDONIO REGO
Juiz Federal Substituto na Titularidade Plena



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