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segunda-feira, 29 de março de 2010

JURID - JF: Extinção da ação [29/03/10] - Jurisprudência


Justiça Federal de Bauru extingue ação contra AJUFE.

PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL

1ª Vara da 8ª Subseção Judiciária - Bauru - SP
Autos nº 2010.61.08.000298-0


Vistos.


O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL propôs a presente ação em face de ASSOCIAÇÃO DE JUÍZES FEDERAIS DO BRASIL-AJUFE, com o escopo de assegurar a rescisão ou a anulação de contrato de patrocínio estabelecido entre a requerida e a Caixa Econômica Federal, bem como a restituição do valor do patrocínio (R$ 7.000,00) ao patrimônio da CEF.

Em suma, alegou que a requerida celebrou contrato com a CEF para patrocínio de evento de Juízes Federais em Bauru-SP, recebendo para tanto o valor de R$ 7.000,00. Descreveu que, apesar do fim constante no instrumento do contrato de patrocínio, a verba foi utilizada em evento de inauguração de prédio da Justiça Federal.

Afirmou a ocorrência de modificação da finalidade do patrocínio concedido pela CEF, e que a requerida deixou de cumprir contrapartidas pactuadas, relacionadas com a divulgação do patrocínio, a distribuição de folhetos e a cessão de espaço para exposição de banner CAIXA.

Postulou a rescisão ou a anulação do contrato de patrocínio, por desvio de finalidade na aplicação da verba repassada, bem como a condenação da requerida à restituição do valor recebido ao patrimônio da Caixa Econômica Federal, e ao pagamento de indenização por danos morais difusos em favor do Fundo de Reconstituição dos Interesses Supraindividuais.

É o relatório.

Como cediço, ao apreciar a inicial deve o Juiz examinar a presença das condições da ação, vale dizer, a existência ou inexistência dos requisitos que legitimam o exercício do direito fundamental garantido pelo art. 5º, inciso XXXV, da Constituição. De acordo com o abalizado ensinamento de Vicente Greco Filho(1):

"Compete ao juiz velar pela regularidade procedimental, de modo que desde o início do processo deve prover para que este seja instaurado em ordem e esteja apto a alcançar o seu objetivo, que é sentença de mérito. Cabe-lhe, também, evitar que processos manifestamente inviáveis em virtude de impropriedades processuais ou técnicas fiquem se arrastando indefinidamente com ônus para as partes e para a justiça.

Esse dever deve atuar desde o primeiro ato do juiz no processo que é o de despachar a inicial. Se esta não estiver em termos, deve, desde logo, ser indeferida."


Ao cuidar do direito de ação e sobre as condições para o exercício de tal direito, Ernani Fidelis dos Santos(2) observa:

"A ação é direito que tem o particular - e o próprio Estado - de requerer tutela jurisdicional. Não é direito a uma sentença favorável, mas direito a uma decisão de mérito, à solução do litígio, da lide que se propõe.

Como direito, a ação tem, em contrapartida, uma obrigação que lhe corresponde. A ação é proposta pelo autor em face do réu, ou contra ele, mas o sujeito passivo do direito é o Estado, que lhe deve a prestação jurisdicional.

Todos os direitos previstos em lei exigem condições para seu exercício (...). Da mesma forma, a ação. Como direito, tem ela condições de exercitamento.

Toda pessoa é livre para propor ação. Mas o juiz somente cumprirá a função jurisdicional propriamente dita, isto é, solucionará o litígio denunciado, se presentes estiverem, no processo, as condições da ação. Não há obrigação do Estado no atendimento ou não da pretensão do autor, se a ele faltarem as condições exigidas do direito de ação, caso em que o juiz não julga procedente nem improcedente o pedido, mas, simplesmente, deixa de apreciá-lo, extinguindo o processo."


Após analisar a inicial e documentos que a acompanham, concluo que o presente pedido não merece prosseguimento à míngua de interesse processual, que, segundo a melhor doutrina, consiste na necessidade e utilidade das providências pleiteadas.

Ao tratar do tema relativo ao interesse de agir, Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pelegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco(3) ensinam:

"(...) Essa condição da ação assenta-se na premissa de que, tendo embora o Estado o interesse no exercício da jurisdição (função indispensável para manter a paz e a ordem na sociedade), não lhe convém acionar o aparato judiciário sem que dessa atividade se possa extrair algum resultado útil. É preciso, pois, sob esse prisma, que, em cada caso concreto, a prestação jurisdicional solicitada seja necessária e adequada.

Repousa a necessidade da tutela jurisdicional na impossibilidade de obter a satisfação do alegado direito de intercessão do Estado - ou porque a parte contrária se nega a satisfazê-lo, sendo vedado ao autor o uso da autotutela, ou porque a lei exige que determinados direitos só possam ser exercidos mediante prévia declaração judicial (são as chamadas ações constitutivas necessárias, no processo civil e a ação penal condenatória, no processo penal).

Adequação é a relação existente entre a situação lamentada pelo autor ao vir a juízo e o provimento jurisdicional concretamente solicitado. O provimento, evidentemente, deve ser apto a corrigir o mal de que o autor se queixa, sob pena de não ter razão de ser."


Na espécie, embora compreenda que a dedução do pedido foi concretizada em atenção e em efetivo respeito ao princípio da obrigatoriedade (art. 5º, caput, e §§ 1º e 3º, da Lei nº 7.347/1985), verifico que o pleito não reúne condições de prosseguimento, visto não caracterizado o interesse de agir.

Com efeito, a buscada tutela relativa à rescisão do contrato não pode ser amparada, dado que o contrato teve seus efeitos exauridos com o repasse e a utilização da verba de patrocínio, valendo destacar que seus efeitos foram cessados com o término do prazo de vigência (12.03.2009), como estabelecido na clausula segunda do instrumento juntado com a inicial (fl. 37).

No que toca à visada anulação do pactuado, entendo não evidenciada no caso a ocorrência do binômio utilidade-necessidade, dada a existência de elementos precisos no sentido de que houve comunicação por parte da requerida da alteração do fim a que verba seria utilizada, como consignado nas declarações prestadas por Selma Peres Rubira às fl. 130/133:

"(...) esclarece que a pedido de alguém da AJUFE, que fez um contato telefônico um dia antes, solicitando que as contrapartidas fossem cumpridas durante o evento de inauguração do prédio da Justiça Federal em Bauru, ao invés do evento relativo a encontro de juízes federais da região de Bauru, conforme previsto no contrato; (...) QUE não é normal este tipo de modificação, mas a depoente não viu nenhum mal em atender ao pedido de modificação; QUE a depoente não sabe se o normativo da CEF permite ou permitia que fosse autorizada a modificação pedida pela AJUFE; QUE foi só a depoente a responsável pelo acompanhamento da execução do contrato de patrocínio(...) QUE o contato de patrocínio firmado com a JUFE era um contrato padrão, cujo formato não permitia edição; QUE por esse motivo, é que a depoente entende que seria possível deixar de observar algumas das cláusulas do contrato; QUE não sabe dizer se alguém da Superintendência Regional de Bauru tentou obter autorização da matriz da CEF para alteração das cláusulas do contrato de patrocínio; QUE a avaliação de quais cláusulas podem deixar de ser observadas é uma avaliação subjetiva, de cunho negocial e gerencial e com bom senso (...) QUE a depoente avalia que o evento atingiu o objetivo esperado em termos de retorno negocial/comercial (...) QUE a depoente resolveu concordar com o pedido feito pela AJUFE, por telefone, por pessoa que não se lembra, de alteração do evento no qual seriam cumpridas as contrapartidas, por entender que o evento de inauguração da JF atingiria um público maior e portanto redundaria num retorno negocial/comercial mais favorável à CEF; (...)" (fls. 130/133)

Os documentos trazidos com a inicial revelam, também, que houve a comprovação da utilização da verba de patrocínio (fls. 46/48), como previsto no instrumento do contrato, e que ocorreu a devida divulgação do patrocínio durante o evento, conforme se infere das declarações prestadas às fls. 88, 105 e 122.

Para maior clareza, reproduzo em parte os depoimentos prestados por Lúcia Liz Amadei, José Paulo Gomes de Amorim e Odécio Aparecido Pegorer:

"(...) QUE a depoente foi informada pelos representantes da Caixa que compareceram ao evento, já citados neste depoimento, que houve citação de que o evento estava sendo patrocinado pela Caixa..." (Lúcia Liz Amadei - fl. 88)

"(...) QUE, na abertura do evento de inauguração do prédio da Justiça Federal em Bauru, naquele dia 18 de fevereiro de 2009, houve citação do nome da CEF para tal evento..." (José Paulo Gomes de Amorim - fl. 105)

"(...) QUE no dia da cerimônia de inauguração do prédio da Justiça Federal, lá esteve presente, e ouviu sim a citação do nome da CEF logo após a execução do hino nacional,..." (Odécio Aparecido Pegorer - fl. 122).

Observo que dos depoimentos constantes dos termos juntados às fls. 86/89, 121/123 e 130/133, infere-se que a requerida não cumpriu algumas das obrigações assumidas a título de contrapartida em razão do não fornecimento do material de publicidade, folhetos e banner, pela Caixa Econômica Federal.

Me parece claro que não houve prejuízo à Caixa Econômica Federal, e, ao que tudo indica, o verificado decorreu de inobservância de rotina interna por parte de preposto da entidade de crédito, relacionada com a não realização de registros da alteração da espécie de evento que seria patrocinado.

Certo é que não há qualquer sinal de ocorrência de prejuízo à empresa pública federal ou à União, e que o valor da verba de patrocínio foi utilizado em evento público cuja realização foi comunicada com antecedência pela requerida à Caixa Econômica Federal.

A embasar a inferência no sentido da inocorrência de prejuízo, são as assertivas constantes do depoimento prestado pela Gerente Regional de Governo e Judiciário da Caixa Econômica Federal em Bauru (fls. 130/133), que transcrevo:

"(...) QUE a depoente avalia que o evento atingiu o objetivo esperado em termos de retorno negocial/comercial... que o evento de inauguração do prédio da JF atingiria um público maior e portanto redundaria num retorno negocial/comercial mais favorável à CEF..." (fls. 132/133).

Sem embargo do até aqui explanado, destaco que o patrocínio consistiu no repasse do valor de R$ 7.000,00, montante esse que sequer autoriza a propositura e prosseguimento de execuções fiscais pela Fazenda Nacional (R$ 10.000,00 - art. 20 da Lei 10.522/2002), o que ao meu sentir faz despontar a inutilidade do pedido relacionado à devolução do valor repassado.

De todo aplicável à hipótese vertente o brocardo ubi idem ratio, ibi idem jus, até porque, inclusive, em razão do ditame legal antes citado, o Egrégio Supremo Tribunal Federal vem adotando como parâmetro para a caracterização da insignificância penal no crime de descaminho o valor mínimo utilizado pelo fisco para a execução das dívidas fiscais.

Com efeito, nesse sentido é o paradigma da Egrégia Suprema Corte no Habeas Corpus nº 92.428-PR, relatado pelo eminente Ministro Joaquim Barbosa, cuja ementa reproduzo:

"DESCAMINHO E PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. Por ausência de justa causa, a Turma deferiu habeas corpus para determinar o trancamento de ação penal instaurada contra acusado pela suposta prática do crime de descaminho (CP, art. 334), em decorrência do fato de haver iludido impostos devidos pela importação de mercadorias, os quais totalizariam o montante de R$ 5.118,60 (cinco mil cento e dezoito reais e sessenta centavos). No caso, o TRF da 4ª Região, por reputar a conduta do paciente materialmente típica, negara aplicação ao princípio da insignificância ao fundamento de que deveria ser mantido o parâmetro de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) para ajuizamento de execuções fiscais (Lei 10.522/2002) e não o novo limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais) instituído pela Lei 11.033/2004. Inicialmente, salientou-se o caráter vinculado do requerimento do Procurador da Fazenda para fins de arquivamento de execuções fiscais e a inexistência, no acórdão impugnado, de qualquer menção a possível continuidade delitiva ou acúmulo de débitos que conduzisse à superação do valor mínimo previsto na Lei 10.522/2002, com a redação dada pela Lei 11.033/2004 'Art. 20. Serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais). § 1o Os autos de execução a que se refere este artigo serão reativados quando os valores dos débitos ultrapassarem os limites indicados.'. Entendeu-se não ser admissível que uma conduta fosse irrelevante no âmbito administrativo e não o fosse para o Direito Penal, que só deve atuar quando extremamente necessário para a tutela do bem jurídico protegido, quando falharem os outros meios de proteção e não forem suficientes as tutelas estabelecidas nos demais ramos do Direito". (HC 92438/PR, Relator Ministro Joaquim Barbosa, 2ª Turma, julgamento realizado aos 19.8.2008, resultado publicado no DJe 29.08.2008 - grifo nosso).

E como decidiu a Colenda Segunda Turma do Egrégio Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 601356-PE (2003/0193819-0), Relator Ministro Franciulli Netto (DJ 30.06.2004, p. 322):

"- Não se pode perder de vista que o exercício da jurisdição deve sempre levar em conta a utilidade do provimento judicial em relação ao custo social de sua preparação.

- A doutrina dominante tem entendido que a utilidade prática do provimento é requisito para configurar o interesse processual. Dessa forma, o autor detentor de título executivo não pode pleitear a cobrança do crédito quando o provimento não lhe seja útil.

- O crédito motivador que a Caixa Econômica Federal apresenta para provocar a atividade jurisdicional encontra-se muito aquém do valor razoável a justificar o custo social de sua preparação, bem como afasta a utilidade do provimento judicial.

- Não necessita de reparos o acórdão recorrido, porquanto acerta quando respeita o princípio da utilidade da atividade jurisdicional, diante de ação de execução fulcrada em valor insignificante,..."


Anoto, por fim, que além da inexistência de demonstração de prejuízo material, e, por conseguinte, de dano moral coletivo, não há na inicial e tampouco nas provas que a acompanham qualquer menção ou demonstração de interesse da CEF no ressarcimento da verba de patrocínio repassada à requerida.

Por certo, tal fato decorreu em razão do alcance do fim visado com o repasse da verba de patrocínio levado a efeito, o que torna mais robusta e, portanto, forçosa a conclusão na senda da não configuração do interesse de agir, em consonância com a precisa lição de Moacir Amaral Santos(4) que segue:

"(...) o exercício do direito de ação, para ser legítimo, pressupõe um conflito de interesses, uma lide, cuja composição se solicita do Estado. Sem que ocorra a lide, o que importa numa pretensão resistida, não há lugar à invocação da atividade jurisdicional. O que move a ação é o interesse na composição da lide (interesse de agir), não o interesse em lide (interesse substancial)."

Pelo exposto, com o devido respeito, e na certeza que o ajuizamento do pedido decorreu em atenção ao disposto no art. 5º, caput, e §§ 1º e 3º, da Lei nº 7.347/1985), por entender não configuradas a necessidade e a utilidade, ausente, pois, o interesse processual, concluo pela inviabilidade de prosseguimento do presente pedido.

Dispositivo.

Ante o exposto, com fulcro nos arts. 267, inciso I, c.c. o art. 295, inciso III, ambos do Código de Processo Civil, declaro extinta a presente ação proposta pelo Ministério Público Federal em desfavor da Associação dos Juízes Federais do Brasil-AJUFE.

Custas, na forma da lei.

P.R.I.

Bauru-SP, 11 de fevereiro de 2.010.


Roberto Lemos dos Santos Filho
Juiz Federal



1 - GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1996, 11ª edição, volume 2, p. 117. [Voltar]

2 - SANTOS, Ernani Fidélis dos. Manual de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 1996, volume 1, p. 483. [Voltar]

3 - CINTRA, Antonio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pelegrini, DINAMARCO,Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 2007, 23ªedição, p. 275. [Voltar]

4 - SANTOS, Moacir Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 1995, 18ª edição, volume 1, p. 166-167. [Voltar]



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