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segunda-feira, 29 de março de 2010

JURID - Apelação. Produção e comercialização de produto viciado [29/03/10] - Jurisprudência


Apelação. Ação de reparação de danos morais e materiais. Produção e comercialização de produto viciado
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG

Número do processo: 1.0145.08.464993-1/001(1) Númeração Única: 4649931-87.2008.8.13.0145

Relator: EDUARDO MARINÉ DA CUNHA

Relator do Acórdão: EDUARDO MARINÉ DA CUNHA

Data do Julgamento: 11/02/2010

Data da Publicação: 16/03/2010

Inteiro Teor:

EMENTA: APELAÇÃO - AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS - PRODUÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTO VICIADO - FRANGO CONGELADO COM ADIÇÃO DE ÁGUA (GELO) -CONSUMIDOR - DANOS MATERIAIS - DEVOLUÇÃO DO PREÇO PAGO PELO PRODUTO - DANOS MORAIS - NÃO-CONFIGURAÇÃO -RECURSO PROVIDO EM PARTE. Restando demonstrado que o produto adquirido pelo autor apresentou vício, decorrente, ao que tudo indica, da prática fraudulenta e odiosa - mas, infelizmente, cada vez mais comum na atualidade - de se adicionar água (ou gelo) no interior das aves comercializadas congeladas, no intuito de ludibriar o consumidor e auferir maior lucro, faz ele jus a indenização por danos materiais, em valor equivalente ao preço do produto adquirido e, posteriormente, devolvido no supermercado-requerido (R$5,83, cf. documento de f. 11). Para que se condene alguém ao pagamento de indenização por dano moral, é preciso que se configurem os pressupostos ou requisitos da responsabilidade civil, que são o dano, a culpa do agente, em caso de responsabilização subjetiva, e o nexo de causalidade entre a atuação deste e o prejuízo. No presente caso, ainda que a conduta do fornecedor seja reprovável ao extremo, o simples fato de autor ter se sentido lesado ou enganado, ficando "chateado e um pouco nervoso com o acontecido", conforme atestou a prova testemunhal (f. 71), não é suficiente para afetar direitos de sua personalidade, constituindo meros transtornos ou aborrecimentos a que todos nós estamos sujeitos e que não se confundem ou se equiparam aos danos morais. Na espécie, a frustração do consumidor não é capaz de produzir, a nosso aviso, sentimento de dor ou tristeza profunda, com ofensa à honra e ou à dignidade, não sendo passível, portanto, de compensação moral.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0145.08.464993-1/001 - COMARCA DE JUIZ DE FORA - APELANTE(S): FRANGO MARAVILHAS LTDA - APELADO(A)(S): DELFIM TADEU RIBEIRO, IRMAOS BRETAS FILHOS & CIA LTDA - RELATOR: EXMO. SR. DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador EDUARDO MARINÉ DA CUNHA , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO AO RECURSO.

Belo Horizonte, 11 de fevereiro de 2010.

DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA:

VOTO

Cuida-se de ação ordinária de reparação de danos morais e materiais ajuizada por DELFIM TADEU RIBEIRO em desfavor de IRMÃOS BRETAS FILHOS E CIA. LTDA., cujo nome fantasia é "Supermercado Bretas", alegando ter adquirido do réu, no dia 17.04.2006, um frango congelado temperado, da marca "Avipal", ao preço de R$1,49 por quilo.

Disse que o frango pesava 3,910Kg, tendo pago por ele a quantia de R$5,83.

Afirmou que, ao descongelar, o frango mais parecia uma codorna, passando a pesar, apenas, R$1,900Kg. Concluiu, assim, que mais de 50% do produto, na realidade, era composto por gelo. Inconformado, retornou ao estabelecimento e devolveu o produto, ocasião em que o gerente lhe ofereceu dois frangos de marca diversa, mas se recusou a restituir o dinheiro e a arcar com o valor gasto com a passagem de ônibus para ali comparecer.

Disse ter sido vítima de publicidade enganosa e abusiva, já que o produto continha informação falsa quanto ao peso.

Argumentou ter sido tomado por intenso sentimento de revolta, por ter sido enganado e lesado, fazendo jus a indenização por danos morais, além da restituição da quantia paga pelo produto.

Formulou pedido de inversão do ônus da prova. Pleiteou, ao final, a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos materiais, equivalente ao montante desembolsado (R$5,83) e danos morais, no valor sugestivo de R$7.000,00. Requereu os benefícios da justiça gratuita. Juntou os documentos de f. 11-14.

À f. 16, o MM. juiz deferiu a gratuidade judiciária.

Às f. 19-38, o réu ofereceu contestação, arguindo preliminar de ilegitimidade passiva, sob o argumento de que a responsabilidade pelo ocorrido é exclusiva do fabricante ou produtor. Postulou a denunciação à lide da sociedade empresária FRANGO MARAVILHAS LTDA, produtora dos frangos da marca "AVICAP". No mérito, disse que, assim que foi procurado, seu gerente prontamente ofereceu a substituição do produto ou a devolução do dinheiro, o que, entretanto, não foi aceito pelo autor. Consignou que o autor, em nenhum momento, foi maltratado ou humilhado em seu estabelecimento comercial. Asseverou não estarem presentes os pressupostos necessários à configuração do dever de indenizar moralmente o autor. Pediu a improcedência dos pedidos.

O autor apresentou impugnação, às f. 43-47.

À f. 48, o MM. Juiz deferiu a denunciação à lide.

Regularmente citada, a litisdenunciada FRANGO MARAVILHAS LTDA apresentou contestação (f. 51-55), alegando, de início, que o produto supostamente viciado não lhe foi apresentado, para avaliação do ocorrido. Disse primar pela qualidade na produção e embalagem de seus produtos. Argumentou que o réu-denunciante ofereceu ao autor a substituição do produto ou a devolução do preço, tendo ele recusado, com o claro intuito de obter vantagem indevida. Discorreu sobre a chamada "indústria do dano moral", postulando a improcedência dos pedidos. Por eventualidade, requereu que a indenização fosse fixada em valor módico.

Prova testemunhal, às f. 70-71.

Em sentença proferida à f. 74-76, o douto juiz a quo rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva e julgou procedentes os pedidos, condenando o réu a restituir ao autor a quantia de R$5,83, atualizada monetariamente, de acordo com a tabela da CGJ/MG e acrescida de juros moratórios de 1% a.m., a partir da data da compra, bem como ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$3.000,00, com igual incidência de correção monetária e juros moratórios, a contar da citação. Imputou ao réu, ainda, a obrigação de arcar com o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 20% do valor da condenação. Lado outro, julgou procedente a lide secundária, condenando a litisdenunciada a ressarcir ao réu-denunciante a quantia relativa à indenização que lhe foi imposta. Condenou a denunciada, ainda, ao pagamento das custas da lide regressiva e honorários advocatícios, fixados em R$500,00.

Às f. 78-84, a litisdenunciada interpôs apelação, aduzindo não haver prova concreta do suposto vício do produto. Sustentou que, ainda que se considere ter havido a alegada irregularidade no peso do produto, esse fato, por si só, não é capaz de gerar dano moral. Argumentou não estarem presentes os pressupostos necessários à configuração do dever de indenizar. Alternativamente, bateu-se pela redução do montante indenizatório. Pediu o provimento do apelo.

O apelo foi recebido em ambos os efeitos (f. 86).

Foram apresentadas contrarrazões pelo autor (f. 8790) e pelo réu-denunciado (f. 91-95).

Conheço do recurso, eis que presentes os pressupostos legais de sua admissibilidade.

Da análise do caderno processual, verifica-se que o autor-apelado busca ser indenizado por danos materiais e morais que alega haver suportado, em razão de vício apresentado pelo produto adquirido no estabelecimento comercial do réu-denunciante - um frango congelado temperado da marca "Avipal" - produzido pela litisdenunciada-apelante, que, depois de descongelado, apresentou peso (1.900g) mais de 50% inferior ao original (3.910g).

No que se refere à alegada ausência de prova do defeito no produto adquirido pelo autor, entendo não assistir razão à apelante.

O cupom fiscal acostado à f. 11 comprova a compra do produto identificado como "FRANGO TEMP. CONG.", com peso de 3,910Kg, pelo preço de R$5,83. Por sua vez, consta do boletim de ocorrência coligido à f. 14:

"Acionados pelo COPOM comparecemos ao Supermercado Bretas, onde o envolvido "01" nos relatou que comprou um frango congelado neste supermercado e, quando chegou em casa, ele observou que o frango pesava 3.910 Kg e, após descongelá-lo, o frango passou a pesar 1.900Kg. Mediante o fato, o mesmo voltou ao Supermercado Bretas e conversou com o envolvido "02", no intuito de ser ressarcido em dinheiro. O gerente (envolvido 02) lhe ofereceu 2 frangos que pesariam o mesmo peso do frango que o autor "1" comprou, que é da marca "Avicap". Como os frangos eram de marcas diferentes, o consumidor não aceitou. Relato, ainda, que o gerente nos disse que o envolvido "1" pediu, além dos frangos, 2 vales-transporte de ressarcimento. Como não houve acordo, ambos foram orientados procurarem seus direitos."

Não se vislumbram quaisquer motivos razoáveis para que se desconsiderem tais informações, que são de grande valia, porque fornecidas por funcionário público, que goza de fé-pública e que esteve no local do fato. Não é despiciendo observar que o boletim de ocorrência goza da presunção de veracidade dos atos administrativos em geral, que apenas pode ser afastada por prova robusta em sentido contrário.

Nesse sentido, cabe gizar:

"O Boletim de Ocorrência é documento público emitido por autoridade competente, que narra os fatos trazidos pelos envolvidos no acidente. A parte que nos autos traz versão distinta de sua anterior confissão contida no B.O., deverá fazer prova de suas novas alegações em razão da presunção de veracidade do documento público e do valor absoluto da confissão" (Apelação Cível n. 1.0702.04.140406-3/001, relatora Des. Márcia De Paoli Balbino, TJMG, 17ª Câmara Cível, j. 01.11.2007).

"O Boletim de Ocorrência goza de presunção de veracidade, que só pode ser afastada por prova inconcussa, uma vez que confeccionado por agente público" (Apelação Cível n. 417564-8, relator Juiz José Amâncio, 8ª Câmara Cível, TAMG, j. 13.2.2004).

Assim, não há dúvida de que, efetivamente, o produto adquirido pelo consumidor apresentou vício, decorrente, ao que tudo indica, da prática fraudulenta e odiosa - mas, infelizmente, cada vez mais comum na atualidade - de se adicionar água (ou gelo) no interior das aves comercializadas congeladas, no intuito de ludibriar o consumidor e auferir maior lucro, constituindo flagrante enriquecimento ilícito.

Portanto, o requerente faz jus a indenização por danos materiais, em valor equivalente ao preço do produto adquirido e, posteriormente, devolvido no supermercado requerido (R$5,83, cf. documento de f. 11).

Quanto ao dano moral, a sua reparabilidade ou ressarcibilidade é pacífica na doutrina e na jurisprudência, mormente após o advento da Constituição Federal de 05.10.88 (art. 5º, incisos V e X), estando hoje sumulada sob o nº 37, pelo STJ.

Como observa Aguiar Dias, citado pelo Des. Oscar Gomes Nunes do TARS,

"a reparação do dano moral é hoje admitida em quase todos os países civilizados. A seu favor e com o prestígio de sua autoridade pronunciaram-se os irmãos Mazeaud, afirmando que não é possível, em sociedade avançada como a nossa, tolerar o contra-senso de mandar reparar o menor dano patrimonial e deixar sem reparação o dano moral." (cfr. Aguiar Dias, 'A Reparação Civil', tomo II, pág. 737).

Importante ter-se sempre em vista a impossibilidade de se atribuir equivalente pecuniário a bem jurídico da grandeza dos que integram o patrimônio moral, operação que resultaria em degradação daquilo que se visa a proteger (cf. voto do Min. Athos Carneiro, no REsp nº 1.604-SP, RSTJ 33/521).

Caio Mário, apagando da ressarcibilidade do dano moral a influência da indenização, na acepção tradicional, entende que há de preponderar

"um jogo duplo de noções: a- de um lado, a idéia de punição ao infrator, que não pode ofender em vão a esfera jurídica alheia (...); b- de outro lado, proporcionar à vítima uma compensação pelo dano suportado, pondo-lhe o ofensor nas mãos uma soma que não é o pretium doloris, porém uma ensancha de reparação da afronta..." (in Instituições de Direito Civil, vol. II, 7ª ed. Forense, Rio de Janeiro, pág. 235).

E acrescenta:

"na ausência de um padrão ou de uma contraprestação que dê o correspectivo da mágoa, o que prevalece é o critério de atribuir ao juiz o arbitramento da indenização..." (Caio Mário, ob. cit., pág. 316).

Para a caracterização do dano moral é indispensável a ocorrência de ofensa a algum dos direitos da personalidade do indivíduo. Esses direitos são aqueles inerentes à pessoa humana e caracterizam-se por serem intransmissíveis, irrenunciáveis e não sofrerem limitação voluntária, salvo restritas exceções legais (art. 11, CC/2002). A título de exemplificação, são direitos da personalidade aqueles referentes à imagem, ao nome, à honra, à integridade física e psicológica.

Ademais, é indispensável que o ato apontado como ofensivo seja suficiente para, hipoteticamente, adentrar na esfera jurídica do homem médio e causar-lhe prejuízo extrapatrimonial. De modo algum pode o julgador ter como referência, para averiguação da ocorrência de dano moral, a pessoa extremamente melindrosa ou aquela de constituição psíquica extremamente tolerante ou insensível.

Nesse sentido:

"RESPONSABILIDADE CIVIL - DANOS MORAIS - INEXISTÊNCIA - SENSIBILIDADE EXACERBADA - INCOMPATÍVEL COM A DO HOMEM MEDIANO. Deve ser negada a pretensão indenizatória de danos morais quando verificado que o aborrecimento sentido pela parte é mero fruto de uma sensibilidade exacerbada (incompatível com os sentimentos do homem mediano) e não da concreta ocorrência do dano." (AC nº 458.018-7. Rel.: Juiz Walter Pinto da Rocha. Nona Câmara Cível. TAMG. Julgado em 29.10.2004).

"DANO MORAL (...) NECESSIDADE DA PROVA DO PREJUÍZO INDENIZÁVEL. - Não é qualquer suscetibilidade ou melindre que pode ensejar indenização por dano moral, sob pena de se desvirtuar o instituto, criando fonte de enriquecimento injusto.- Improcedente deve ser o pedido de indenização fundado em responsabilidade civil por ato ilícito, na ausência de cabal prova do dano, da culpa e do nexo de causalidade, que traduzem os pressupostos do dever de indenizar: 'mero dissabor, aborrecimento, mágoa ou irritação ou sensibilidade exacerbada, fazem parte do dia a dia, não engendram dano moral' (Sérgio Cavalieri Filho). (...)" (TAMG, AC nº 437.147-3, rel. Juiz Dídimo Inocêncio de Paula, Sexta Câmara Cível, julgado em 17.6.2004).

No presente caso, a simples comercialização de frango congelado com quantidade de líquido superior à permitida, ocasionando perda de mais 50% do peso do produto, após seu descongelamento, não é, por si só, suficiente para ofender os direitos da personalidade do autor, sendo dissabor normal da vida cotidiana.

Destaco, a respeito:

"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. SEGURO-VIAGEM. DANOS MORAIS. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. INOCORRÊNCIA EM REGRA. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL NÃO CARACTERIZADA. RECURSO DESACOLHIDO. I - Como anotado em precedente (REsp 202.504-SP, DJ 1.10.2001), 'o inadimplemento do contrato, por si só, pode acarretar danos materiais e indenização por perdas e danos, mas, em regra, não dá margem ao dano moral, que pressupõe ofensa anormal à personalidade. Embora a inobservância das cláusulas contratuais por uma das partes possa trazer desconforto ao outro contratante - e normalmente o traz - trata-se, em princípio, do desconforto a que todos podem estar sujeitos, pela própria vida em sociedade'. (...)" (STJ, REsp nº 338.162/MG, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. em 20.11.2001, DJ 18.2.2002, p. 459).

"AÇÃO DE COBRANÇA - INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA - CLÁUSULAS CONTRATUAIS - INTERPRETAÇÃO - DÚVIDAS EM PROL DO CONSUMIDOR - NEGATIVA DE PAGAMENTO - DANO MORAL NÃO CONFIGURADO - JUROS DE MORA - ENTRADA EM VIGOR DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. - As dúvidas porventura existentes em contrato de seguro, relativas à interpretação de suas cláusulas, devem ser resolvidas em prol do consumidor, nos termos do artigo 47 do CDC. - A negativa da seguradora em pagar a indenização em razão de má interpretação do contrato não acarreta ao segurado danos morais susceptíveis de serem indenizados. - A partir da entrada em vigor do Código Civil de 2002, os juros de mora passaram a ser de 1% ao mês." (TAMG - APELAÇÃO CÍVEL N. 463.913-0, Rel. Juíza HELOÍSA COMBAT, j. 24.03.2005).

Ressalte-se que o autor não explicita nenhuma situação específica, oriunda da conduta do réu, que seja suficiente para lhe causar danos de ordem moral. Segundo sua narrativa, o gerente do supermercado-réu lhe atendeu prontamente, oferecendo a imediata substituição do produto viciado por outros dois frangos, com peso equivalente, o que, entretanto, foi recusado por ele, que exigia, ainda, o fornecimento de dois vales-transporte, para fazer face à sua despesa com locomoção até aquele estabelecimento comercial.

Entretanto, a negativa do fornecimento dos vales-transporte, por si só, não dá ensejo ao pagamento de indenização por danos morais, até porque a pretensão indenizatória foi baseada em causa de pedir diversa, qual seja a comercialização de produto contendo informação falsa quanto ao peso. É o que se infere dos seguintes excertos da peça de ingresso:

"II - Do Dano Moral

Trata-se de uma nítida propaganda enganosa! De produto viciado, por conter informação falsa quanto ao peso, à espera de consumidores desavisados e sempre apressados, atrasados, envolvidos em outros afazeres, que não os deixam prestar atenção nos produtos que lhes são diariamente empurrados!

Trata-se de prática mercantil com o único objetivo: lesar e causar o enriquecimento ilícito, às custas dos consumidores desatentos, que o são em sua maioria.

(...)

O que se quer deixar claro Exa., é o tamanho e extensão da lesão ocasionada em tantos outros consumidores que compareceram no supermercado e levaram para casa, quase que 2 Kg de gelo!!!

Quantas pessoas já foram enganadas!

O que busca o autor é uma nítida punição, a fim de que fatos como o por ele vivenciado, nunca mais se repitam." (f. 05-06)

"Haja vista o dano moral efetivamente experimentado pelo autor, como consequência da conduta ilícita da ré, pautada na oferta de produto viciado pelo peso irreal, a fim de ludibriar e obter lucro ilícito, tem-se como justo e requerido a título de indenização pelos danos morais ocasionados ao autor, o equivalente a R$7000,00 (sete mil reais). Caso este não seja o entendimento de V.Exa., confia o autor em vosso critério de fixação." (Destaquei) (f. 07)

Ainda que a conduta do fornecedor seja reprovável ao extremo, o simples fato de o consumidor-requerente ter se sentido lesado ou enganado, ficando "chateado e um pouco nervoso com o acontecido", conforme atestou a prova testemunhal (f. 71), não é suficiente para afetar direitos de sua personalidade, constituindo meros transtornos ou aborrecimentos a que todos nós estamos sujeitos e que não se confundem ou equiparam aos danos morais.

Na espécie, a frustração do consumidor não é capaz de produzir, a nosso aviso, sentimento de dor ou tristeza profunda, com ofensa à honra e ou à dignidade, não sendo passível, portanto, de compensação moral. Repise-se, para firmar o entendimento, que o ordenamento jurídico apenas garante a indenização do verdadeiro dano moral, isto é, protege as pessoas em face dos atos capazes de gerar sofrimento interno a qualquer ser humano médio, não conferindo proteção, porém, às suscetibilidades pessoais, ao excesso de sensibilidade.

Em situações similares à dos autos, já decidiu esta Corte:

"PUBLICIDADE ENGANOSA - MEROS DISSABORES - DANO MORAL - INOCORRÊNCIA - CUMPRIMENTO - OFERTA. (...) Caracterizada a publicidade enganosa por omissão das reais condições do financiamento, torna-se possível a coação da anunciante a cumprir a oferta, apresentação ou publicidade. Inteligência do artigo 35, inciso I da Lei n. 8.078 de 11 de novembro de 1990. Não se tratando de dano moral puro, para que se caracterize o dever de indenizar, é necessária a ocorrência do ato ilícito, do dano e do nexo de causalidade entre eles. Meros dissabores do dia-a-dia não configuram dano moral." (TJMG - AP N. 1.0525.01.006607-0/001, Relator Des. JOSÉ AMANCIO, j. 25/10/2006)

"AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - PROPAGANDA ENGANOSA - DANO MORAL - NÃO CONFIGURAÇÃO - ERRO DO ANÚNCIO (...) A mera frustração, decepção ou desconforto por não ter obtido produto anunciado não são suficientes para configurar o dano moral, principalmente quando observado que houve erro no anúncio sem qualquer intenção de enganar o consumidor." (TJMG - AP N. 2.0000.00.518161-3/000, Relator Des. ANTÔNIO SÉRVULO, J. 24/08/2005)

Assim, entendo deva ser reformada a sentença primeva, no tópico em que condenou o réu ao pagamento de indenização por danos morais, sendo tal pleito, com a devida vênia, improcedente.

Com essas razões de decidir, dou parcial provimento à apelação, para reformar parcialmente a r. sentença primeva e afastar a condenação do réu-denunciado ao pagamento de indenização por danos morais, ficando mantida, apenas, a indenização por danos materiais, no importe de R$5,83. Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, condeno ambas as partes ao pagamento de 50% das custas processuais, inclusive as recursais. Honorários advocatícios, ora fixados, nos termos do art. 20, §4º, do CPC, em R$1.000,00 (mil reais), na mesma proporção, autorizada a compensação, nos termos do art. 21, do CPC e da Súmula n. 306, do STJ. Fica suspensa a exigibilidade de tais verbas, em relação ao autor, nos termos do art. 12, da Lei nº 1.060/50.

Com relação à lide secundária, julgo-a parcialmente procedente, haja vista que, com a improcedência do pedido de indenização por danos morais, formulado na lide principal, a responsabilidade regressiva da litisdenciada ficou restrita aos danos materiais, cuja reparação foi imposta ao réu-denunciante (R$5,83). Condeno o denunciante e o denunciado ao pagamento de 50% das custas da denunciação à lide. Honorários advocatícios, tal como fixados na r. sentença (R$500,00), na mesma proporção também autorizada a compensação, nos termos do art. 21, do CPC e da Súmula n. 306, do STJ.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): IRMAR FERREIRA CAMPOS e LUCIANO PINTO.

SÚMULA: DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0145.08.464993-1/001





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