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quinta-feira, 11 de março de 2010

JURID - Tráfico de Entorpecentes. Autoria e materialidade. [11/03/10] - Jurisprudência


Tráfico de Entorpecentes. Autoria e materialidade comprovadas. Transporte de entorpecentes no interior da genitália.

Tribunal de Justiça de São Paulo - TJSP

ACÓRDÃO

Tráfico de Entorpecentes. Autoria e materialidade comprovadas. Transporte de entorpecentes no interior da genitália para dentro do presídio. Confissão da ré. Não comprovação da excludente de inexigibilidade de conduta diversa. Aumento da pena em razão da reincidência específica. Recurso ministerial acolhido para esse fim. Recurso da ré improvido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 990.09.141399-2, da Comarca de Tupi Paulista, em que é apelante/apelado CARINE APARECIDA DE OLIVEIRA sendo apelado/apelante MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em 9ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ E DERAM PROVIMENTO AO RECURSO MINISTERIAL. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores SOUZA NERY (Presidente sem voto), NUEVO CAMPOS E SÉRGIO COELHO.

São Paulo, 07 de janeiro de 2010.

FRANCISCO BRUNO - RELATOR

Apelação Criminal nº. 990.09.141399-2 -Tupi Paulista

Relator Des. Galvão Bruno

Apelantes e apelados: Ministério Público e Carine Aparecida de Oliveira

Voto nº. 2706

Acrescenta-se ao relatório da r. sentença de fls. 133/142 que a ação penal foi julgada parcialmente procedente, condenada Carine Aparecida de Oliveira à pena de cinco anos e dez meses de reclusão e 583 dias-multa, como incursa no delito capitulado no artigo 33, caput, c.c. artigo 40, da Lei nº 11.343/06.

Apela o representante do parquet, pleiteando o aumento da pena em razão da reincidência específica (fls. 183/185). A ré também apela, alegando preliminar de nulidade em razão de cerceamento de defesa e, no mérito, pede o reconhecimento da excludente de inexigibilidade de conduta diversa e a conseqüente absolvição ou a redução da pena em razão da coação moral resistível (fls. 187/191).

Os recursos foram regularmente processados, com contrarrazões (fls. 192/194 e 197/203).

A douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo improvimento do recurso da ré e pelo acolhimento do recurso ministerial (fls. 217/225).

É o relatório.

Rejeita-se a preliminar de nulidade suscitada pela ré. Na audiência, o defensor requereu a juntada de carta mencionada pela testemunha Ricardo, entendendo ser favorável à defesa da ré. Contudo, além de não ter sido juntada oportunamente pela defesa, não há de fato comprovação de sua prestabilidade, já que, conforme a testemunha Ricardo, nela Andreia teria apenas perguntado se ele havia recebido a droga (fls. 155).

No mérito, não merece melhor sorte o recurso da ré.

De acordo com a denúncia, no dia 25 de outubro de 2008, no período da manhã, na Penitenciária de Tupi Paulista, Jarlei Cruz de Andrade teria concorrido para que sua companheira Carine Aparecida de Oliveira transportasse e trouxesse consigo, no interior de seu corpo, cerca de 100 gramas de maconha. Jarlei foi absolvido por não ter sido comprovada sua participação, sem recurso ministerial.

Na delegacia, a ré confessou que estava transportando a droga em seu órgão genital, mas não declinou o destinatário, alegando que não se tratava de seu companheiro e este poderia ser morto se ela contasse que lhe entregou a droga (fls. 7). Em Juízo, a ré confirmou novamente a posse e porte da maconha, narrando que iria entregá-la para Ricardo, apelido "Paraná"; uma pessoa chamada Andreia a teria contatado dias antes pedindo-lhe este favor, ameaçando-a de morte e dizendo que conhecia pessoas ligadas ao PCC (fls. 146/147).

A policial militar Rose Laine Ribeiro Perfeito Cagliari e a agente penitenciária Ana Claudia Basso Luzia narram que em razão de denúncia anônima informando que a ré ingressaria na Penitenciária com drogas no interior de seu corpo, fizeram a abordagem e no hospital, onde seria feito o exame ginecológico e raio-X, a ré confessou e retirou a droga, na presença das testemunhas (fls. 3, 5, 150 e 151/152).

Finalmente, Ricardo Alexandre Nunes Pacheco confirmou que a droga transportada pela ré lhe era destinada, ignorando se a ré foi ameaçada por Andreia (fls. 155).

Não restam dúvidas quanto à materialidade e à autoria dos fatos. Aquela está comprovada pelo laudo químico toxicológico (fls. 79/82); esta, pelo auto de prisão em flagrante (fls. 02) e pelas declarações da policial militar e agente de segurança penitenciária, coerentes e harmônicas com o restante do conjunto probatório - inclusive a confissão policial e judicial.

As alegações da apelante centram-se no afastamento da absolvição pela inexigibilidade de conduta diversa. Esta não é expressamente prevista no sistema normativo brasileiro como causa de exclusão de culpabilidade; no entanto, a legislação pátria prevê excludentes de ilicitude que nada mais são do que situações específicas em que não seria razoável esperar do agente conduta diferente da praticada. Por exemplo, o artigo 22 do Código Penal: a ação realizada em obediência a ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico e a efetuada sob coação moral irresistível. Estas duas excludentes refletem situações em que, ainda que o agente seja imputável e pratique o ato com consciência de sua antijuricidade, não merece a punição prescrita no tipo, pois não se poderia exigir procedesse de outro modo: as conseqüências poderiam ser muito piores do que as decorrentes da conduta ilegal.

No entanto, não se pode imaginar que o legislador previu todas as causas em que conduta diversa da praticada pelo agente não seria possível, de forma que podem ocorrer - como de fato ocorrem - situações em que, mesmo que não haja previsão legal, ele não deve ser penalizado por não poder agir de outra maneira, sob pena de se institucionalizar uma injustiça. E a jurisprudência vem reconhecendo isso, de maneira crescente; v.g., recente decisão desta mesma 9.a Câmara, relatada pelo eminente Roberto Midolla (Apelação n.º 990.08.053112-3, São Paulo, voto n.º 16.138).

Obviamente, as hipóteses de aplicação são extremamente raras. É que a adoção de excludentes de ilicitude não previstas em lei é uma ameaça direta à segurança jurídica, sendo necessária extrema cautela no seu manuseio. Ademais, a alegação de inexigibilidade de conduta diversa, por si só, é demasiadamente genérica, devendo ser observada a adequação à especificidade de cada caso.

No caso dos autos, não há qualquer prova de que a ré tenha agido sob esta excludente. Ela mesmo pediu a redução da pena em razão da coação moral RESISTÍVEL. Ora, não há nos autos qualquer indício de que nenhuma outra conduta poderia se exigir da ré em defesa de sua vida, dos filhos ou do companheiro. A testemunha Ricardo confirmou que a droga lhe era destinada, não teria nada a perder dizendo que ela foi obrigada ou coagida a transportá-la. Além disso, a mulher que a teria coagido, "Andreia de tal", não foi identificada nem localizada para ser ouvida em Juízo.

Por fim, deve ser analisada a dosagem da pena e, neste tópico, há de ser acolhido o recurso ministerial.

A pena-base foi fixada no patamar mínimo; depois foi aumentada de 1/6 por ter sido o fato praticado nas imediações de estabelecimento penal. Mesmo reconhecida a reincidência específica (fls. 32), não foi aplicado o aumento de 1/6, o que se faz neste momento. Logo, a pena final resulta em seis anos, nove meses e vinte dias de reclusão e 680 dias-multa, piso mínimo, regime inicial fechado.

Pelo exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso da ré e dou provimento ao recurso ministerial.

GALVÃO BRUNO - Relator




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