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quarta-feira, 3 de março de 2010

JURID - Repasse do PIS e da COFINS na fatura telefônica. [03/03/10] - Jurisprudência

Jurisprudência Tributária
Repetição de Indébito. Repasse do PIS e da COFINS na fatura telefônica. Direito Tributário.

Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG

Número do processo: 1.0223.09.285100-3/001(1)

Númeração Única: 2851003-85.2009.8.13.0223

Relator: GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES

Relator do Acórdão: GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES

Data do Julgamento: 02/02/2010

Data da Publicação: 03/03/2010

Inteiro Teor:

EMENTA: REPETIÇÃO DE INDÉBITO - REPASSE DO PIS E DA COFINS NA FATURA TELEFÔNICA - DIREITO TRIBUTÁRIO - AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL - CDC - PRÁTICA ABUSIVA CONFIGURADA - RESTITUIÇÃO DE PARCELAS - ART. 206, § 3º, DO CCB. 1. Analisando-se o fato gerador e a base de cálculo do PIS e da COFINS, vê-se que estes não guardam correspondência com o repasse promovido pela concessionária para a conta do cliente, eis que tais contribuições não são devidas no momento da prestação dos serviços, nem têm como base de cálculo os valores desses serviços. 2. O indevido repasse do PIS e da COFINS para a conta telefônica do cliente, não modifica a obrigação tributária da empresa de telefonia, mas transforma o usuário em contribuinte de fato dos tributos, ensejando-lhe pleitear a devolução do que lhe foi cobrado indevidamente. 3. No caso de prestações sucessivas, havendo pedido de repetição de indébito - o que implica em presunção de enriquecimento sem causa - aplica-se a regra prevista no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil de 2002. 4. A não discriminação de todas as cobranças efetuadas na fatura telefônica ofende diversos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, como, por exemplo, o art. 6º, incisos III e IV.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0223.09.285100-3/001 - COMARCA DE DIVINÓPOLIS - APELANTE(S): RAIMUNDO EXPEDITO DE OLIVEIRA - APELADO(A)(S): TELEMAR NORTE LESTE S/A - RELATOR: EXMO. SR. DES. GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 18ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO AO RECURSO.

Belo Horizonte, 02 de fevereiro de 2010.

DES. GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES:

VOTO

Trata-se de ação ordinária ajuizada por Raimundo Expedito de Oliveira contra a Telemar Norte Leste S/A, objetivando o autor obstar a cobrança dos valores referentes ao repasse do PIS (Programa de Integração Social) e COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) em sua conta de telefone, bem como a condenação da ré à restituição dos valores que afirma terem sido indevidamente cobrados.

O autor alega, em suma, que os referidos tributos, por possuírem "natureza direta", deveriam ser integralmente suportados pela requerida, incidindo tão somente sobre o faturamento da empresa.

Citada, a requerida ofereceu contestação, alegando, preliminarmente, a carência da ação por falta de interesse processual. No mérito, sustentou, em resumo, a regularidade da repercussão econômica da incidência do PIS e COFINS no preço dos serviços de telecomunicações por ela prestados.

O feito obedeceu a sua regular tramitação e culminou com a sentença de f. 52-57, que julgou improcedente o pedido, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$750,00 (setecentos cinquenta reais), mas suspensa a exigibilidade da cobrança, nos termos do art. 12 da Lei nº 1.060/50.

Inconformado, o autor interpôs a apelação de f. 59-66, aduzindo, resumidamente, que o contribuinte do PIS e da COFINS é o fornecedor, não o consumidor; que o fato gerador dos tributos é o faturamento da concessionária, não a prestação do serviço; que a base de cálculo deve ser o faturamento da concessionária; que o único tributo que pode ser repassado diretamente ao contribuinte é o ICMS, por expressa previsão legal; que o repasse dos valores referentes ao PIS e a COFINS praticado pela requerida não pode subsistir, pois ausente previsão legal acerca da incidência direta de referidas alíquotas sobre o preço dos serviços de telefonia.

A apelada, através das contrarrazões de f. 70-87, por sua vez, afirma ser regular a repercussão econômica do PIS e da COFINS na formação do preço dos serviços de telecomunicação.

Recurso dispensado de preparo, pois ao recorrente foi deferido o benefício da Justiça Gratuita (f. 22).

Conheço do recurso, posto que próprio, tempestivo e dispensado de preparo.

Verifica-se que a discussão travada na lide diz respeito à legalidade da prática adotada pelas concessionárias do serviço público de telefonia, que repassam ao consumidor o ônus financeiro do PIS e da COFINS na fatura mensal.

Dúvida não há sobre essa cobrança, bastando a verificação do valor da anunciada tarifa do minuto pela operadora (f. 15) e o valor constante na fatura, após o cálculo do ICMS.

Ou seja, após o cálculo do valor da chamada tarifa líquida, são acrescidos ao preço do serviço o percentual do ICMS, o valor do PIS e da COFINS.

Inicialmente, importa registrar que, a tarifa do serviço público será estabelecida com base no preço da proposta vencedora da licitação, observando-se, quanto à revisão, as regras previstas em lei, no edital e no contrato.

Estabelece o art. 9º da Lei nº 8.987/95 que:

"A tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão previstas nesta Lei, no edital e no contrato."

Segundo o parágrafo 3º do aludido artigo, a alteração de tributos, com exceção do imposto sobre a renda, ou encargos legais, autoriza a revisão da tarifa, in verbis:

"§ 3º Ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa, para mais ou para menos, conforme o caso."

No caso dos autos, discute-se a legalidade da prática adotada pela requerida, concessionária de serviço público de telefonia, de repassar ao consumidor o ônus referente ao PIS e a COFINS.

Quanto ao contribuinte dos tributos, ao contrário do que afirma o apelante, o fato de o encargo financeiro das contribuições ser incluído na fixação da tarifa não altera o sujeito passivo da obrigação tributária, que continua sendo a concessionária do serviço público.

E, data venia, está equivocado o entendimento do douto Juiz a quo, quando afirma se tratar de mera transferência econômica do custo do serviço, que estaria compreendida na possibilidade de revisão da tarifa, estabelecida pelo § 3º do art. 9º da Lei nº 8.987/95, acima citado.

É que a revisão da tarifa só acontecerá, para mais ou para menos, quando houver criação, alteração ou extinção de qualquer tributo ou encargo legal, o que não é o caso, pois o PIS e a COFINS já existem há muitos anos, bem antes de a Telemar, a seu talante, inserir tais encargos na conta do consumidor.

Ademais, revisão de tarifa não significa a transferência do encargo de seu pagamento ao consumidor.

Não é necessário esforço de raciocínio para se concluir que o sujeito passivo das obrigações, nos termos do art. 121 do CTN, é a empresa de telefonia, não o consumidor do serviço, o qual não tem qualquer relação pessoal ou direta com o fato gerador.

A questão é saber se o sujeito passivo das contribuições (PIS e COFINS) pode transferir o ônus financeiro para o consumidor do serviço de telefonia, já que não compõem o custo da tarifa anunciada pela concessionária.

Embora o repasse do PIS e da COFINS na fatura não tenha o condão de modificar a sujeição passiva tributária, assim como ocorre no caso do ICMS, o usuário passa a ser o contribuinte de fato dos tributos, permanecendo a concessionária apenas como intermediária, embora a relação jurídico-tributária deva ser somente entre a concessionária e a União.

No caso do ICMS, todavia, o repasse é admitido por expressa disposição legal, o que não ocorre com o PIS e a COFINS.

Por outro lado, analisando-se o fato gerador e a base de cálculo do PIS e da COFINS, vê-se que estes não guardam correspondência com o repasse promovido pela concessionária, eis que tais contribuições não são devidas no momento da prestação dos serviços, nem têm como base de cálculo os valores desses serviços.

O fato gerador da contribuição para o PIS/PASEP é o faturamento mensal, conforme dispõe o art. 1°, da Lei n. 10.637/2002, in verbis:

"Art. 1º A contribuição para o PIS/Pasep tem como fato gerador o faturamento mensal, assim entendido o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil". (DESTAQUEI).

De igual forma, a contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS tem como fato gerador o faturamento mensal (Lei n. 10.833/2003, art. 1º).

"Art. 1º A Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS, com a incidência não-cumulativa, tem como fato gerador o faturamento mensal, assim entendido o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil". (DESTAQUEI).

Como se vê, o usuário não deve pagar, propriamente, o PIS e a COFINS devidos sobre determinada operação, porque esses tributos não incidem diretamente sobre a prestação do serviço de telefonia.

A requerida, por sua vez, afirma que, a despeito de serem as contribuições para o PIS e a COFINS exceções que não ensejam repercussão jurídica, a repercussão econômica sem dúvida ocorre, uma vez que os tributos diretos sabidamente integram os custos.

Contudo, razão não lhe assiste.

A alegada "repercussão econômica" depende de expressa previsão legal, o que não ocorre no caso dos tributos em questão.

Também a alegação da requerida de que o repasse dos referidos tributos teria respaldo da Anatel ("reconhecendo que em tal valor não se incluem os custos da concessionária referentes ao PIS e a COFINS") não merece prosperar, haja vista a impossibilidade de se regular o tema por meio de ato administrativo.

Examinando a questão ora debatida, assim se pronunciou o em. Min. Herman Benjamin, na qualidade de relator do Recurso Especial nº 1.053.778 - RS, em julgamento ocorrido recente, ocorrido no dia 09.09.2009, na 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça:

"O que o usuário paga, na verdade, é uma prestação que visa a fazer frente aos ônus financeiros que serão suportados pela concessionária com o pagamento de tributos relacionados, de forma apenas mediata, à prestação do serviço. Nessa linha, têm-se que os valores recebidos pela concessionária constituem preço pelo serviço. Como tal, devem ser considerados remuneração da concessionária (receita que comporá seu faturamento e, desse modo, a base de cálculo do PIS e da COFINS por ela devidos).

Deve-se perquirir, portanto, se é legítimo o repasse de tais valores aos usuários, adicionando-os à tarifa legal e contratualmente estabelecida. É o que o Tribunal de origem chamou de 'repasse jurídico ou incidência direta'.

Como afirma a própria Brasil Telecom 'não há como se negar que todos os tributos constituem custo que serão levados em consideração na composição do preço final, com exceção do ICMS e do IPI que serão suportados diretamente pelo consumidor final, sendo simplesmente transferidos no preço'.

De fato, o consumidor arca indiretamente com os ônus decorrentes, p.ex., do IPTU pago pela concessionária sobre os imóveis de sua propriedade ou da Contribuição Previdenciária relativa a seus empregados. Contudo, esses tributos (exceção ao ICMS) não são cobrados na fatura telefônica como acréscimos, pelo que a "repercussão econômica" se reflete na composição da própria tarifa estipulada para o serviço.

Resta, então, examinar se há previsão legal para que o PIS e a COFINS sejam acrescidos ao valor da tarifa. Aí estamos no terreno do Direito Administrativo, já que a questão diz respeito à política tarifária.

(...)

Não pode prosperar o argumento de que a tarifa homologada pela ANATEL é "líquida", pelo que excluiria os impostos e contribuições sociais "incidentes na operação". A uma porque, repise-se, a recorrente não apontou norma legal capaz de fundamentar sua pretensão. A duas porque, ainda que houvesse autorização da ANATEL nesse sentido, o PIS e a COFINS não incidem sobre cada operação individualizada!

Assim, a agência reguladora não poderia, por simples ato administrativo, alterar a sistemática de cálculo e cobrança desses tributos, fixada por lei. Os poderes da ANATEL são muitos, variados e necessários - todos a ela atribuídos pelo legislador de 1997 com o único desiderato de bem proteger a concorrência leal e o consumidor -, mas não a capacitam para mudar a natureza dos tributos existentes no Brasil, nem para retorcer sua base de incidência ou forma de cobrança.

O fato de as receitas obtidas com a prestação do serviço integrarem a base de cálculo dessas contribuições (= faturamento mensal) não pode ser confundido com a incidência desses tributos sobre cada uma das operações individuais realizadas pela recorrente. Ora, esses valores também integram a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, já que, após as deduções legais, constituirão o lucro da empresa. Nem por isso a Brasil Telecom defende que a parcela de Imposto de Renda e de Contribuição Social Sobre o Lucro relativa a uma prestação determinada de serviço seja adicionada ao valor da tarifa.

Como ressaltado pela própria concessionária, somente o ICMS, por expressa disposição legal, deve ser objeto de destaque e cobrança na fatura, repassando-se diretamente o ônus ao assinante.

Parece-me, portanto, que estamos diante de outro argumento inafastável contra o repasse do PIS e da COFINS na conta telefônica: a ausência - e, mais relevante, a impossibilidade - de previsão regulamentar, pela via de ato administrativo da ANATEL".

Dessa forma, tem-se que, diante da inexistência de regulamentação específica que permita expressamente o repasse do PIS e da COFINS, tal como ocorre com o ICMS, bem como da impossibilidade de regulamentação por parte da Anatel, deve ser considerada ilegal a cobrança dos referidos tributos no âmbito da conta de telefone do autor.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, seguindo o entendimento lançado pelo mencionado voto do em Min. Herman Benjamin, firmou posição no seguinte sentido:

"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - COBRANÇA DO PIS E DA COFINS NA FATURA TELEFÔNICA - AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL - PRÁTICA ABUSIVA CONFIGURADA - PRECEDENTE DA SEGUNDA TURMA - CONTRADIÇÃO QUANTO À COBRANÇA DO ICMS - ILEGALIDADE DO REPASSE DO PIS E DA COFINS NA FATURA TELEFÔNICA - AUSÊNCIA DE QUALQUER UM DOS VÍCIOS ELENCADOS NO ART. 535 DO CPC - IMPOSSIBILIDADE DE EFEITOS INFRINGENTES - IMPOSSIBILIDADE DE PREVALÊNCIA DE ORIENTAÇÃO FIRMADA MONOCRATICAMENTE.1. A Segunda Turma desta Corte, na assentada de 9.9.2008, ao apreciar o tema, na ocasião do julgamento do REsp 1053778/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, considerou ser indevido o repasse do PIS e da COFINS na fatura telefônica, por ausência de expressa e inequívoca previsão na lei, e que referidos tributos não incidem sobre a operação individualizada de cada consumidor, mas sobre o faturamento global da empresa. 2. No precedente da Segunda Turma, no qual se pautou o acórdão embargado, reconheceu-se que 'somente o ICMS, por expressa disposição legal, deve ser objeto de destaque e cobrança na fatura, repassando-se diretamente o ônus ao assinante', e é esta a orientação que deve prevalecer". (...) (EDcl nos EDcl nos EDcl no REsp 625.767/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/05/2009, DJe 09/06/2009) (DESTAQUEI);

"PROCESSUAL CIVIL, ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO - VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CARACTERIZADA - PIS/COFINS - REPASSE AO CONSUMIDOR NA FATURA TELEFÔNICA - ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA ANATEL - TESE ACERCA DA INEXISTÊNCIA DE ERRO NO PAGAMENTO: AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO - ABUSIVIDADE DA COBRANÇA RECONHECIDA POR ESTA CORTE - DEVOLUÇÃO EM DOBRO - POSSIBILIDADE. 1. Não ocorre ofensa ao art. 535, II, do CPC, se o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, as questões essenciais ao julgamento da lide. 2. Prevalece no STJ o entendimento de que a ANATEL não tem legitimidade passiva para responder pela cobrança indevida de valores levada a efeito pelas empresas de telefonia na conta telefônica. 3. É inadmissível o recurso especial quanto a questão não decidida pelo Tribunal de origem, dada a ausência de prequestionamento. 4. A Segunda Turma desta Corte firmou entendimento no sentido da ilegalidade do repasse do PIS e da COFINS na fatura telefônica, bem como acerca da má-fé das empresas de telefonia e, por consequência, da abusividade dessa conduta. 5. Direito à devolução em dobro reconhecido com base no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. 6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, não provido". (REsp 910.784/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/06/2009, DJe 23/06/2009) (DESTAQUEI).

Por outro lado, deve-se observar que, as contas telefônicas emitidas pela apelada, com exceção do ICMS, não informam ao consumidor quais os tributos que estariam sendo repassados.

Dispondo sobre a organização dos serviços de telecomunicações, estabelece a Lei Federal nº 9.472, de 17 de julho de 1997, em seu art. 5º, in verbis:

"Art. 5º Na disciplina das relações econômicas no setor de telecomunicações observar-se-ão, em especial, os princípios constitucionais da soberania nacional, função social da propriedade, liberdade de iniciativa, livre concorrência, defesa do consumidor, redução das desigualdades regionais e sociais, repressão ao abuso do poder econômico e continuidade do serviço prestado no regime público".

Como se vê, o legislador pátrio foi expresso ao definir que, nas relações entre a prestadora e o usuário de serviços de telecomunicações, devem prevalecer as normas de defesa do consumidor.

Em que pesem os doutos argumentos da apelada, não é isso que tem ocorrido na sua prestação de serviços ao apelante, que se viu obrigado a buscar o amparo do Poder Judiciário para fazer corrigir o abuso praticado por aquela que se dispôs a explorar o serviço público de telefonia.

A não discriminação de todas as cobranças efetuadas pela apelada ofende diversos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, como por exemplo o art. 6, incisos III e IV:

"Art. 6º. São direitos do consumidor:

(...)

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

(...)

IV - a proteção contra publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas impostas no fornecimento de produtos e serviços;"

Também o art. 31:

"Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, dentre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores".

O mesmo se diga em relação ao art. 3º, da Lei nº 9.472/97:

"Art. 3º. O usuário do serviço de telecomunicações tem direito:

(...)

IV - à informação adequada sobre as condições de prestação dos serviços, suas tarifas e preços;".

Também o ponto de vista do direito do consumidor a questão foi objeto de analise pelo em. Min. Herman Benjamin:

"Se é certo que toda empresa embute em seu preço o repasse econômico dos custos com o pagamento de tributos, não é menos certo que, no caso do serviço público de telefonia, o preço cobrado do consumidor não é fixado pela empresa, a seu alvedrio. Com efeito, a fixação, o reajuste e a revisão das tarifas dependem de expressa e inequívoca autorização da ANATEL, que estabelece a estrutura tarifária lastreada no corpo e espírito da Lei 9.472/1997 (art. 103), bem como no sistema tributário em vigor.

Ademais, a adoção da prática comercial de englobar no valor da tarifa o repasse do PIS e da COFINS viola o disposto no art. 3º, IV, da LGT, que consagra o direito do usuário à informação adequada:

(...)

Com efeito, a concessionária, segundo suas próprias palavras, nem sequer discrimina na conta telefônica esse verdadeiro adicional à tarifa legalmente estabelecida, impedindo, assim, que o assinante tenha acesso à relevante informação: a de que está diretamente suportando (sem previsão legal) o ônus financeiro do PIS e da COFINS devidos pela prestadora.

Essa prática das concessionárias é abusiva (art. 39, caput, do Código de Defesa do Consumidor) na mais ampla extensão possível do termo: viola de uma só vez os microssistemas da legislação tributária, administrativa, de telecomunicações e de proteção do consumidor. Sem falar que, em operações massificadas desta natureza, especialmente no trato com os chamados sujeitos-profanos - na hipótese, milhões de consumidores não 'iniciados' em complexas transações e operações técnicas, comerciais, financeiras ou tributárias -, o fornecedor é sempre tentado (embora muitos, imbuídos de responsabilidade social, resistam) a utilizar a filosofia do 'se colar, colou', valendo-se exatamente da 'fraqueza ou ignorância do consumidor' (art. 39, IV, do CDC). Realmente, quantos consumidores se dão conta de uma diferença de poucos reais em sua conta telefônica? Ou, entre aqueles que chegam a descobrir a ilegalidade, quantos se dispõem a levar avante um processo judicial como este, considerando-se todos os óbices formais e informais ao acesso à justiça no Brasil?

A técnica do 'se colar, colou' é a antítese dos princípios da boa-fé objetiva e da transparência, que integram a linha de frente do Direito do Consumidor. Pior ainda quando tal técnica perversa se manifesta na composição ou preço, não de produtos e serviços de consumo valiosos, que são mais propensos a controle atento e efetivo pelo consumidor, mas de microoperações multiplicadas por milhões de vezes, individualmente irrelevantes ou insignificantes (pelo prisma da vítima), mas, quando agregadas, extraordinariamente importantes e lucrativas (na ótica do fornecedor).

Por tudo isso, também no campo do Direito do Consumidor, conclui-se que é indevida a cobrança do PIS e da COFINS na fatura telefônica". (REsp 1053778/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/09/2008, DJe 30/09/2008).

Com base nesses elementos, a conclusão possível é a de que o autor, ora recorrente, não foi suficiente e adequadamente informado a respeito do repasse dos tributos lançados em sua conta de telefone.

Conforme visto, o repasse do PIS e da COFINS afronta diversas normas de natureza mais abrangente do que qualquer decreto ou resolução que possa ser invocado, jogando por terra a premissa de ausência de norma apta nortear a questão em análise.

Também estou a entender que em se tratando de relação de consumo, cabe à ré apresentar as cópias das contas pagas pelo autor, pois, somente assim será possível a futura liquidação de sentença, inclusive evitando-se o eventual ajuizamento de ação incidental.

Por fim, é de se considerar que a ré, em sede contestação, invocou em seu favor o instituto da prescrição.

Conquanto referida prejudicial não tenha sido renovada em sede de contrarrazões, ao caso é possível o pronunciamento da prescrição de ofício, nos exatos termos do art. 219, § 5º, do CPC.

E nesse ponto razão lhe assiste, posto que, em se tratando de ação almejando obstar a cobrança do tributo e, ainda, a repetição de indébito, o prazo prescricional da pretensão de reembolso dos valores pagos indevidamente é o previsto no art. 206, § 3º, inciso IV, do CCB/2002.

Isso porque a propositura da ação ordinária visando fazer cessar a cobrança dos tributos não se extingue pelo decurso do tempo, não sendo possível afastar do controle judicial a eliminação de dúvida sobre a legitimidade ou não de determinada exigência financeira, no caso repasse de tributo, fundado em relação contratual entre consumidor e concessionário de serviço de telefonia.

Outra situação, agora, sim, prescritível, diz respeito às consequências geradas pelo negócio jurídico eventualmente nulo, que não podem e não devem se convalidar com o decurso do tempo, sob pena de insegurança jurídica do sistema.

Essas realidades são bem demonstradas nos seguintes excertos doutrinários, retratados pelo em. Des. Elpídio Donizetti no voto condutor da Ap. Cível nº 2.0000.00.502814-2/000:

"(...) se a ação ajuizada for, do ponto de vista técnico, simplesmente declaratória, sua finalidade será apenas a de certificar uma situação jurídica da qual pende dúvida, o que jamais poderia ser objeto de prescrição.

Todavia, se a ação declaratória de nulidade for cumulada com pretensões condenatórias, como acontece na maioria dos casos de restituição dos efeitos pecuniários ou indenização correspondente, admitir-se a imprescritibilidade seria atentar contra a segurança das relações sociais. Neste caso, entendemos que prescreve sim a pretensão condenatória, uma vez que não é possível retornar ao estado de coisas anteriores. (...)

Em síntese: a imprescritibilidade dirige-se, apenas, à declaração de nulidade absoluta do ato, não atingindo as eventuais pretensões condenatórias correspondentes." (Pablo Gagliano Stolze e Rodolfo Pamplona Filho, in "Novo Curso de Direito Civil". Parte geral, vol. 1, 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 403-404);

Nessa mesma linha ensina Humberto Theodoro Júnior:

"(...) Para as declaratórias não há prazo extintivo, simplesmente porque se destinam a eliminar incerteza jurídica, e a incerteza não desaparece só pelo decurso do tempo.

Mas se é certo que a nulidade, em si, não pode se sujeitar aos efeitos da prescrição, das situações que o negócio jurídico inválido cria podem perfeitamente decorrer pretensões que hão de sofrer os efeitos naturais da prescrição (exemplo: restituição de bens ou preço, indenização de prejuízos, etc., as quais terão de submeter-se aos efeitos da prescrição).

Correta nesta ordem de idéias, a observação de FRANCISCO AMARAL de que o direito de propor a ação de nulidade é imprescritível, ou seja, não se extingue pelo decurso do tempo, embora se reconheça que a situação criada pelo negócio jurídico nulo se possa convalidar pelo tempo decorrido, no prazo e na forma da lei." (Humberto Theodoro Júnior, in "Comentários ao Novo Código Civil". Vol. III, Tomo I, Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 527 e 528)."

Cumpre perquirir, então, qual é o prazo de prescrição aplicável à pretensão de repetição de indébito.

A relação jurídica estabelecida entre as partes rege-se pelas normas do Código de Defesa do Consumidor. Trata-se de ponto pacífico no contexto da lide.

Contudo, não há na Lei nº 8.078/90 previsão de qualquer prazo decadencial ou prescricional para pleitear a restituição de valores indevidamente pagos pelo consumidor.

A prescrição prevista no art. 27, do referido diploma legal, diz respeito à reparação de danos causados por fato do produto ou do serviço, o que não é o caso dos autos.

Portanto, devem ser aplicados ao caso os prazos prescricionais do direito comum.

Embora este Relator, em julgamentos pretéritos, tenha esposado o entendimento de que o prazo prescricional, aplicável em situações semelhantes, seria o geral, previsto no art. 205 do atual Código Civil, ou seja, de dez anos, por ausência de especificação sobre repetição de indébito, acabei por me render às lições de Caio Mário da Silva Pereira, em sua obra "Instituições de Direito Civil", 20ª ed., Forense, 2004, p. 294, para o qual o pagamento indevido, pelo qual se pede a repetição, é modalidade de enriquecimento sem causa, a demandar a aplicação do prazo prescricional previsto no art. 206, § 3º, IV, do novo Código Civil.

No mesmo sentido é a lição do Desembargador José Costa Loures e de sua filha Tais Maria Loures Dolabela, na obra conjunta "Novo Código Civil Comentado", ed. Del Rey, 2002, p. 376-377, onde registraram que "o pagamento indevido é uma das variadas espécies de enriquecimento sem causa".

Com efeito, diz o art. 206, § 3º, inciso IV, do CCB:

"Art. 206. Prescreve:

(...)

§ 3º - Em 3 (três) anos:

(...)

IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa".

Portanto, o dispositivo acima mencionado há de ser aplicado ao caso dos autos, já que o autor pretende ser ressarcido por valores que diz terem sido dela cobrados indevidamente.

Diante do exposto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO para: a) julgar procedente os pedidos iniciais, condenando a ré à devolução dos valores exigidos a maior, a título de PIS e COFINS, na conta telefônica do autor, desde o início do contrato, devidamente corrigidos, a contar de cada cobrança, aplicada a tabela divulgada pela egrégia CGJTJMG, e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, contados desde a citação inicial; b) pronunciar a prescrição das parcelas vencidas no período de três anos anteriores ao ajuizamento da ação; c) determinar que a ré se abstenha de repassar os aludidos impostos (PIS e COFINS) ao consumidor e, ainda, para que exiba as cópias das contas vencidas nos 36 meses anteriores à propositura da demanda, sob pena de multa diária de R$200,00 (duzentos reais), limitada a R$5.000,00 (cinco mil reais).

Ficam invertidos os ônus de sucumbência fixados pela sentença.

Custas recursais pela apelada.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): MOTA E SILVA e ELPÍDIO DONIZETTI.

SÚMULA: DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0223.09.285100-3/001




JURID - Repasse do PIS e da COFINS na fatura telefônica. [03/03/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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