Anúncios


quarta-feira, 10 de março de 2010

JURID - Perda de Direitos Políticos [10/03/10] - Jurisprudência


Ex-Secretário de Fazenda do DF é condenado à perda de direitos políticos.

Circunscrição - BRASÍLIA
Processo: 2005.01.1.123413-6
Vara: QUARTA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DO DISTRITO FEDERAL

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

PROCESSO nº 2005.01.1.123413-6
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS - MPDFT
RÉUS: VALDIVINO JOSÉ DE OLIVEIRA e SÓ FRANGO PRODUTOS ALIMENTÍCIOS LTDA.


SENTENÇA


Vistos etc.

Cuida-se de Ação Civil Pública de responsabilidade por ato de improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - MPDFT em face de Valdivino José de Oliveira e Só Frango Produtos Alimentícios Ltda., objetivando a condenação dos réus por ato de improbidade administrativa.

O autor alegou que a Secretaria da Fazenda e do Planejamento do Distrito Federal, por intermédio do seu então secretário, o réu Valdivino José de Oliveira, teria concedido remissão de Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS à empresa-ré Só Frango Produtos Alimentícios Ltda.

Aduziu que o Convênio nº82/2001, fundamentador da Lei Distrital nº2.860/2001, a qual foi regulamentada pelo Decreto nº22.677/2002, estabeleceram, todos, a remissão do tributo informado. Com base nessas normas, a empresa-ré teria pleiteado o benefício fiscal acima, sobre o qual o Distrito Federal teria se manifestado negativamente, o que foi alterado em sede recursal administrativa, conforme o Ato Declaratório nº04/2002

Após relacionar a inconstitucionalidade da Lei nº10.826/2004, o demandante se insurgiu quanto à remissão concedida, a qual não teria atentado à estimativa do impacto orçamentário financeiro no exercício financeiro em que se iniciou sua vigência e nos dois seguintes, conforme exigiria a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Ademais, a decisão administrativa remissiva não teria observado os pressupostos do Código Tributário Nacional e que, embora já houvesse o benefício fiscal decorrente do ajuste de Termo de Acordo de Regime Especial - TARE, o perdão tributário teria sido concedido à empresa ré sob o pálio da eqüidade. Essa concessão teria sido apreciada pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal - TCDF, o qual concluira pela sua ilegalidade, ao passo que a eqüidade deveria ater-se ao território do ente tributante e não os demais entes federativos. Ainda, não teria sido demonstrado que a empresa Só Frango Produtos Alimentícios Ltda. possuiria carga tributária maior do que aquela encontrada nos demais estados, sobretudo porque a empresa-ré, por ter Regime Especial de tributação, já recolheria apenas 1% a título de ICMS nas operações com saída de mercadorias.

Prosseguiu afirmando que a empresa-ré já teria integrado os valores da remissão na venda de seu produto final, por se tratar de tributo indireto, o que teria importado em um empobrecimento de R$4.410.538,05 (quatro milhões quatrocentos e dez mil, quinhentos e trinta e oito reais e cinco centavos).

Outrossim, aduziu que a estimativa de renúncia de receita ocorreu apenas em 2001, em referência à remissão do ICMS incidente nas operações com aves abatidas, enquanto que tal medida seria imperiosa para os anos de 2002, 2003 e 2004.

Por fim, fundamentou seu pedido no art. 10, VII, X, XII, da Lei 8.429/1992, sob o argumento de que o benefício fiscal teria sido concedido sem observância da legislação pertinente, originando dolosamente prejuízo ao erário público no valor atualizado de R$6.852.267,90 (seis milhões, oitocentos e cinqüenta e dois mil, duzentos e sessenta e sete reais e noventa centavos),

Requereu a declaração de nulidade da decisão que concedeu a remissão informada, qual seja, o Ato Declaratório nº04/2002, bem como a condenação da ré Só Frango Produtos Alimentícios Ltda. ao recolhimento do ICMS objeto de remissão irregular, com base em credito tributário antes constituído. Pleiteou a condenação do Sr. Valdivino José de Oliveira, de forma solidária, ao pagamento do dano causado ao erário correspondente ao valor do tributo objeto da remissão e, ainda solidariamente, a condenação ao pagamento de multa no valor de duas vezes o dano. Intentou, por igual, a suspensão dos direitos políticos do réu Valdivino José de Oliveira e a perda da função pública que ele estiver ocupando na data da condenação, além da proibição dele contratar com o poder público ou receber incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de quatro anos.

Acompanharam a inicial os documentos de fls.33/638, juntados por linha.

De início, o feito foi distribuído ao Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT, o qual determinou a notificação prévia dos demandados.

Devidamente notificados, os réus apresentaram suas manifestações prévias.

Em sua manifestação (fls. 36/43) o réu Valdivino José de Oliveira (fls.654/705) argüiu se tratar de lide temerária, pois faltaria à inicial coerência lógico-formal, a qual teria se fundado de instrução incompleta, à medida que estaria acompanhada de documentos desconexos e incapazes de demonstrar prejuízo ao erário ou descumprimento de princípios administrativos.

Preliminarmente, alegou a ausência de pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do feito, com base em suposta inadequação da via eleita, ao passo que a ação civil pública não é a via adequada para a declaração incidental de inconstitucionalidade, além do que o Ministério Público não seria legitimado para demanda com tal desiderato.

Além disso, a Lei Distrital nº 3.388/2004 teria convalidado o ato concessório da remissão impugnada.

Em segunda preliminar, suscitou os aspectos subjetivos e orgânicos da ilegitimidade passiva, onde o demandado teria o foro privilegiado para julgamento, além do que os fatos exordiais seriam relacionados tão só à produção legislativa do Distrito Federal.

A ilegitimidade ativa do Ministério Público, o qual não teria interesse na ação, à medida que não se admitiria ação de improbidade administrativa quando houver lei resguardando a autoridade demandada. Por conseguinte, ter-se-ia a falta de interesse de agir, por inexistência de ato de improbidade decorrente da própria descrição das questões de fato e de direito, além da inadequação da ação para a solução descrita pelo autor. Acrescentou que o autor não teria legitimidade para propor ação civil pública destinada a impugnar o conteúdo de relação jurídico-tributária, o que implicaria na falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo.

Como quarta preliminar, aduziu a inepta da inicial, pois dos fatos narrados não decorreria logicamente o pedido, pois o enquadramento legal da conduta apresentada no art.10 da LIA, pressupõe prejuízo ao erário, o que não seria o caso, pois não haveria dolo/culpa do réu, o qual teria atuado sob o manto da legalidade.

Argumentou pela constitucionalidade da Lei nº 10.628/2002, competindo ao TJDFT o julgamento da demanda.

Ainda em sede preliminar, pugnou pela afronta ao artigo 1º da Lei nº 9.868/1999, reiterando a inadequação da via eleita, e pela ilegitimidade do Ministério Público, cuja conduta estaria a afrontar o art.81, CDC.

No mérito, alegou que tanto a entrada quanto a saída de insumos, relativos à avicultura, foram objetos de políticas fiscais em outros Estados, o que teria levado à adoção de Termo de Acordo de Regime em que a empresa ré passou a adotar o percentual de 1% (um por cento) sobre a receita bruta para a apuração do ICMS, o que não teria diminuído a carga tributária global recainte sobre a empresa do Distrito Federal. Em virtude disso, os Convênios do ICMS nºs 82 e 89, ambos de 2001, estariam atentos a essa realidade e previram a remissão para as operações com aves vivas e abatidas, o que teria sido convolado pela Lei Distrital nº 2.860/2001.

Com base nisso, a demandada teria obtido a remissão da quantia de R$4.410.538,05 (quatro milhões quatrocentos e dez mil, quinhentos e trinta e oito reais e cinco centavos), obtida mediante do Ato Declaratório nº04/2002, sobre a qual a apreciação do TCDF ainda não havia finalizado.

Alegou que o Convênio ICMS n.º82/2001 teria permitido a isenção de aves abatidas no período de 21.01.2001 a 21.09.2001, enquanto que a saída de aves vivas seria beneficiária apenas no mês de setembro. A atividade da demandada objeto da remissão seria aquela incidente sobre as aves abatidas.

A decisão administrativa impugnada, e fundada na eqüidade, teria amparo legal, segundo o demandado, além do que esse vetor, ao se limitar ao território do ente tributante (como dito à inicial), estaria a considerar, por via reflexa, a existência da desigualdade tributária, a qual decorreria da aplicação da lei distrital em seu próprio território.

Além disso, o Regime Tributário Especial da empresa promovida, suscitado à inicial, garantir-lhe-ia o recolhimento de 1% sobre a operação de saída do ICMS, mas ignoraria as outras incidências de ICMS suportadas pela empresa.

Quanto à repercussão do ICMS, ressaltou que a concorrência e a elasticidade do preço podem determinar que o custo não tenha sido absorvido por outro sujeito.

E, no tocante ao cumprimento das disposições da Lei de Responsabilidade Fiscal, afirmou que a remissão foi considerada no impacto orçamentário-financeiro do período no qual se iniciou a sua vigência (2001), e, haja vista que a execução da receita de 2001 integraria o cálculo para a estimativa da receita de 2002 e 2003, ter-se-ia considerado essa benesse nos dois exercícios posteriores. Além disso, o método estatístico fundamentado na base histórica da execução da receita nos anos anteriores a 2002 dispensaria tal providência, à medida que seria despiciendo incluir a receita remitida no ano de 2002 para, em seguida, excluí-la.

Acrescentou que o Distrito Federal teria superado as metas fiscais no período informado, o que demonstraria a ausência de prejuízo, pressuposto cuja efetividade seria essencial para tipificação ímproba. Refutou, por igual, a responsabilidade do demandado, ao qual não teria sido imputado dolo ou culpa, sob pena de se tratar de responsabilidade objetiva.

Ao final, formulou os seguintes pedidos: o reconhecimento da inexistência de fato típico; a ausência de negligência na arrecadação do tributo; a falta de enriquecimento ilícito de terceiro; a inexistência de nexo causal entre as ações anunciadas e o suposto resultado; existência de excludente de antijuridicidade (estrito cumprimento do dever legal); e quanto à culpabilidade, a falta de dolo ou culpa do réu, ao qual careceria potencial consciência de ilicitude (a matéria tratada seria objeto de diversas interpretações); além da inexigibilidade de conduta diversa.

Manifestação do réu Só Frango Produtos Alimentícios Ltda. (fls.940/958), onde se argüiu a ilegitimidade ativa do Ministério Público, assim como a inadequação da via eleita, diante da matéria tratada.

No mérito, entendeu que os Termos de Acordo de Regime Especial firmado por ela decorreu de sua participação no mercado, à medida que a concorrência de empresas situadas em outros estados seria agressiva, em virtude de incentivos dos seus respectivos estados.

A formalização do TARE teria sido atrasada por procedimentos da Secretaria Fazendária do Distrito Federal e esse atraso teria sido compensada pela remissão do débito tributário correspondente ao período do atraso (9 meses).

Acrescentou que a remissão teria observado todos os requisitos legais para tanto, o que orientaria a rejeição da presente lide.

O Distrito Federal não interviu no feito, por reputar inexistente justificativa para o seu ingresso na lide (fl.1070).

Decisão do Conselho Especial do TJDFT determinando a remessa dos autos à 1ª instância, diante da inconstitucionalidade do art.84, §2º, CPP, reconhecida pelo STF (fls.1072/1074).

Determinada nova notificação dos demandados, o réu Valdivino José de Oliveira repetiu a sua manifestação anterior (fls.1088/1133). A ré Só Frango Produtos Alimentícios Ltda. (fls.1380/1398), em preliminar, reiterou a ilegitimidade ativa do Ministério Público, ressaltando também a necessidade de se suspender o curso desse processo até o julgamento da Ação ordinária nº 2005.01.1096790-6, onde a própria ré propugna pela constitucionalidade e legalidade da remissão aqui versada. No mérito, alegou a observância de todos os requisitos legais para a concessão do benefício fiscal e o cumprimento, pela empresa ré, de todas as condicionantes, o que a impediria de se negar a receber o benefício fiscal.

O Distrito Federal afirmou não ter interesse no feito (fl.1423).

Decisão interlocutória (fl.1425/1426), onde se recebeu a inicial e determinou-se a citação de todos os demandados.

A ré Só Frango Produtos Alimentícios Ltda. agravou dessa decisão (fls.1428/1454 e 1456/1482), a qual foi mantida pelos seus próprios fundamentos (decisão de fl.1483).

Devidamente citado, a empresa Só Frango Produtos Alimentícios Ltda. apresentou contestação (fls.1485/1505). Em síntese, reproduziu os argumentos já lançados em suas prévias manifestações, sobretudo a de fls.1380/1398.

O réu Valdivino José de Oliveira apresentou a sua contestação (fls.1554/1608), relatando as mesmas teses defensivas já dispostas em sua manifestação prévia.

Em resposta à interposição do agravo retido, a decisão de fls. 1641/1646 negou o efeito suspensivo ao agravo de instrumento interposto pela empresa-ré.

Réplica do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - MPDFT (fls.1647/1657). Insurgiu-se às preliminares apresentadas, argumentando pela adequação da via eleita, ao passo que a demanda se restringe a impugnar ato administrativo vinculado praticado pelo demandado, ex-secretário distrital, o qual, afrontando a legislação vigente, teria beneficiado a empresa ré. Quanto à ilegitimidade ativa, reproduzindo material doutrinário e jurisprudencial, ressaltou a sua competência para a proteção do patrimônio público e social.

No mérito, alegou a violação aos princípios da legalidade e da impessoalidade, onde a conduta impugnada teria causado danos ao patrimônio público, os quais são dispensáveis para condenação almejada.

Aberta a oportunidade para a produção de provas, a empresa Só Frango Produtos Alimentícios Ltda. informou não ter outras provas a produzir (fls.1665/1666). De igual modo, peticionou o autor (fl.1662v). O réu Valdivino José de Oliveira, por sua vez, não se manifestou (fl.1667).

Eis o relatório da hipótese em estudo. Passo a decidir.


PRELIMINARES

1. Da lide temerária - falta de coerência lógico-formal à inicial.

De início, cumpre analisar a alegação defensiva de que a lide seria temerária, ao passo que a inicial teria se fundado em instrução incompleta e incoerente, onde a documentação apresentada seria insuficiente para demonstrar o prejuízo ao erário e o descumprimento de princípios administrativos.

Esse tema, no entanto, deverá ser apreciado em sede meritória, campo natural para apreciação da suficiência ou não acerca do ônus probatório imposto processualmente às partes (art.333, CPC ).

Por esse motivo, rejeito essa argüição introdutória do réu Valdivino José de Oliveira.

2. Ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do feito.

Essa alegação preliminar funda-se na suposta inadequação da via eleita, à medida que a remissão impugnada estaria acolhida por legislação pertinente, a qual não poderia ter a sua declaração incidental de inconstitucionalidade formulada por ação civil pública.

Ora, o representante ministerial não propôs efetivamente a declaração incidental de qualquer dispositivo legal, insurgindo-se especificamente quanto o Ato Declaratório nº04/2002, emitido pelo Secretário da Fazenda do Distrito Federal, o réu Valdivino José de Oliveira, alegando que a emissão desse ato administrativo teria seu fundamento viciado, além de não ter obedecido a disposições da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Não há, pois, cabimento ao pleito defensivo de inadequação da via eleita, o que prejudica a ilegitimidade ministerial, também suscitada, nesse ponto específico.

Ainda que houvesse qualquer pleito incidental nesse sentido (dispensável em face da possibilidade de seu reconhecimento de ofício ), os Tribunais pátrios já pacificaram a admissibilidade desse controle incidental, via ação civil pública, conforme julgado a seguir:

CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI DISTRITAL. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PRECEDENTES DO STF. 1 - Não há falar em carência do autor da ação civil pública ao pleitear a declaração incidental de inconstitucionalidade, porquanto pacífica a jurisprudência do excelso Supremo Tribunal Federal acerca do cabimento da ACP para o controle difuso de constitucionalidade, sem que possa falar em qualquer usurpação da competência dos órgãos jurisdicionais de controle concentrado. 2 - Apelo provido para cassar a sentença e determinar o regular processamento da ação. Maioria.(19980110203068APC, Relator CRUZ MACEDO, 4ª Turma Cível, julgado em 19/09/2005, DJ 29/11/2005 p. 428). Precedentes do TJDFT e STF.

Rejeito as preliminares de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do feito (inadequação da via eleita) e a ilegitimidade ativa do autor para a declaração incidental de inconstitucionalidade, por não haver pleito expresso nesse sentido.

3. A ilegitimidade passiva do demandado Valdivino José de Oliveira.

Embora exercesse, à época, o cargo de Secretário de Estado da Secretaria de Fazendária do Distrito Federal, essa condição não justifica o retorno do feito para o TJDFT - Corte Especial, conforme já ressaltou a decisão de fls.1072/1074, a qual se amparou na inquestionável inconstitucionalidade do art.84, §2º, CPP, já aplainada pelo Supremo Tribunal Federal.

Outrossim, a reapreciação dessa preliminar implicaria em inadmissível recurso da decisão proferida pelo TJDFT, o qual seria, sem qualquer amparo legal, revisado pelo juízo a quo, numa inversão de valores e instâncias descabidas.

Qualquer irresignação à manifestação colegiada do TJDFT deveria ter sido impugnada pelo recurso adequado e na instância pertinente.

Registre-se, ainda, que no julgamento da Reclamação nº 2.138, o STF reafirmou a sua competência apenas para o julgamento dos crimes de responsabilidade (previsto no art. 2º da Lei nº1079/1950 ), cuja regulamentação atinge tão só aquelas autoridades expressamente previstas nessa lei, às quais não se aplica a Lei nº 8.429/1992.

Embora o que tenha sido decidido com a composição pretérita daquela corte maior não atinja o réu Valdivino José de Oliveira, a própria composição atual do STF, em julgamento proferido no mesmo dia da reclamação supra, indicou, ainda que indiretamente, a aplicabilidade da Lei nº 8.429/1992 aos agentes públicos indistintamente .

Acrescenta-se que a competência disposta no art.8º, I, a, do Regimento Interno do TJDFT, coincidente com art.8, I, a, da Lei nº 11.697/2008 , não se aplica à hipótese, à medida que exige o cometimento de qualquer crime de responsabilidade (previstos nos arts. 101-A e 107, ambos do LODF ), enquanto que a demanda em apreço refere-se à responsabilização civil, a qual não restou, como já dito, afastada, quanto aos secretários de estado, pelo STF - Reclamação nº2.138 (só se afastou a aplicação da LIA aos Ministros de Estado). O contrário implicaria em inadmissível ampliação objetiva de um pontual controle incidental.

Rejeito, assim, o pedido de deslocamento do feito, quanto ao réu Valdivino José de Oliveira, para a Corte Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT.

4. A ilegitimidade ativa do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - MPDFT.

O julgamento do Agravo de Instrumento nº 2006.00.2.138741, interposto pela ré Só Frango Produtos Alimentícios Ltda. em face da decisão de recebimento da inicial (fls.1425/1426), conclui pela legitimidade ativa dessa instituição, conforme ementário coletado no sítio do TJDFT:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA POR DANOS CAUSADOS AO ERÁRIO - LEGITIMIDADE - MINISTÉRIO PÚBLICO -LEGITIMIDADE PASSIVA DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO - RECEBIMENTO DA INICIAL - INDÍCIOS DA EXISTÊNCIA DO ATO DE IMPROBIDADE. 1- O Ministério Público é legítimo para propor ação civil pública por ato de improbidade administrativa (CF 129 III e IX c/c Lei Complementar 75/93, art. 5º II "a"; 6º VII, "b" e "d" c/c Lei 8.249/92, art. 17). 2- Aplicam-se as disposições da Lei de Improbidade Administrativa, no que couber, à pessoa jurídica de direito privado, que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie, direta ou indiretamente (Lei 8.429/92, art. 3º). 3- A inicial da ação de improbidade administrativa deve ser recebida sempre que verificada a existência dos pressupostos processuais, as condições especiais da ação e indícios do ato de improbidade (Lei 8.429/92, art. 17, § 6º, 7º e 8º). 4- Negou-se provimento ao agravo (20060020138741AGI, Relator SÉRGIO ROCHA, 2ª Turma Cível, julgado em 01/08/2007, DJ 27/09/2007 p. 100).

Esse julgamento já pontuou pela legitimidade do representante do parquet, a qual emerge da proteção do patrimônio público, da higidez do Sistema Tributário Nacional , tratando-se de interesses que repousam sob a égide da ação coletiva, com cunho social e repercussão no mencionado interesse público .

Por tudo o que foi dito, rejeito a preliminar de ilegitimidade ativa do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - MPDFT, suscitada por ambos os réus.

4.1 Falta de interesse de agir (utilidade, necessidade e adequação).

Nesse tema, o demandado Valdivino José de Oliveira ressaltou a falta de interesse de agir do autor, decorrente da inadequação da ação, à medida que o ato impugnado estaria amparado por dispositivo legal.

Ora, mais uma vez, o réu alocou dentre as questões preliminares tema tipicamente meritório, pois a condição da ação correspondente ao interesse de agir manifesta-se pelo binômio necessidade-utilidade do provimento judicial. Mais que isso: acolhendo a tese de livre docência esposada pelo ilustre Candido Rangel Dinamarco , deve-se incluir um terceiro elemento ao interesse de agir, correspondente à adequação do remédio judicial ou procedimento.

No caso em tela, o resultado pretendido - a nulidade do ato declaratório nº04/2002 (e os seus efeitos decorrentes), caso seja acolhido, é capaz de propiciar ao demandante o resultado favorável pretendido (utilidade). A necessidade é visível, ao passo que a nulidade requerida pode ser resolvida pelo Judiciário (enunciado da súmula n.º 473 do STF ). Por seu turno, a adequação da via eleita é consectário lógico das disposições gerais da Lei nº 8.429/1992 (art.1º ao 8º), aplicáveis à hipótese, cujo requerimento pode ser perfeitamente formulado sob o rito da ação civil pública. Demandas dessa espécie, conforme o art.1º da Lei nº 7.347/1985 (art.1º ), admitem o pleito de anulação ou declaração de nulidade de ato lesivo ao patrimônio do Distrito Federal (art.1º da Lei nº 4.717/1965 ).

Assim, rejeito essa preliminar, pelas razões já expostas.

5. Inepta da inicial.

Dos fatos iniciais, segundo o promovido, não decorreria logicamente o pedido (art.295, I, parágrafo único, II, CPC ).

Ora, o autor alegou o descumprimento de disposições legais referentes à remissão tributária concedida à empresa Só Frango Produtos Alimentícios Ltda., pleiteando, por conseguinte, a declaração de nulidade do ato administrativo deflagrador desse benefício, assim como a restituição ao erário público do dano correspondente a esse favor tributário.

Quanto ao enquadramento legal da conduta em dispositivo da Lei de Improbidade Administrativa - LIA, a inexistência de prejuízo ao erário, bem como a ausência de dolo/culpa do demandado Valdivino José de Oliveira são alegações tipicamente meritórias, não sendo aqui o momento oportuno para apreciação, sobretudo porque o seu acatamento imporia a improcedência da lide e não a sua extinção sem resolução do mérito.

Desse cotejo, verifica-se que o pedido é decorrência lógica e inarredável dos argumentos iniciais, impondo-se, por conseguinte, a rejeição da preliminar de inepta da inicial invocada.

6. Constitucionalidade da Lei nº 10.628/2002.

Conforme razões já alocadas no item 3 - 'a ilegitimidade passiva do demandado Valdivino José de Oliveira' (acima), a inconstitucionalidade do dispositivo relativo à competência já foi pacificado pelo STF, em sede de controle abstrato de constitucionalidade, havendo, por igual, decisão do TJDFT remetendo esse feito à 1ª instância.

Por tudo o que foi dito, rejeito a alegação apresentada como preliminar pelo Sr. Valdivino José de Oliveira.

7. Afronta ao art.1º da Lei nº 9.868/199 - inadequação da via eleita.

As disposições do item 2 - 'ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do feito' (acima) são suficientemente claras, pontificando a adequação da via eleita, à medida que não há requerimento de declaração incidental de inconstitucionalidade. Mesmo que houvesse, isso é plenamente viável.

Ainda, o item 4.1 - 'a falta do interesse de agir', na subespécie adequação, dissipou minuciosamente o preenchimento da preliminar aventada.

Rejeito as preliminares de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do feito (inadequação da via eleita) e a ilegitimidade ativa do autor para a declaração incidental de inconstitucionalidade, por não haver pleito nesse sentido.

8. Ilegitimidade do Ministério Público - afronta ao art.81 do CDC .

Tudo o que já foi exposto no item 4 - 'a ilegitimidade ativa do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - MPDFT' (acima), é soberano para a rejeição da afronta ao art.81 do Código Consumeirista.

Como é cediço, o Ministério Público, ao proteger o patrimônio público e a higidez do Sistema Tributário Nacional, retrata um interesse público imediato (súmula 329 do STJ ).

Nesse sentir, o interesse difuso protegido e supostamente atingido confere a legitimação necessária, concorrente e disjuntiva, ao Ministério Público.

Rejeito, assim, a preliminar de afronta artigo 81 da Lei nº 8.078/1990, no tocante à legitimação ativa do MPDFT.

8. Reunião/Suspensão da lide até o julgamento final da Ação Ordinária nº 2005.01.1096790-6 - 5ª vara de Fazenda Pública/DF.

Em consulta ao sítio do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT , verifica-se que a demanda ordinária acima tratou dos Avisos de Lançamento nº 24/2005 e 25/2005, referentes a suposto débito tributário que abrangia a diferença entre o que foi declarado e não recolhido no período compreendido entre os meses de janeiro a setembro de 2001.

Na ação ordinária a empresa Só Frango Produtos Alimentícios Ltda. objetivou a declaração de nulidade de avisos de lançamentos correspondentes ao pedido remitido pelo Distrito Federal.

Ainda que se admita a teoria materialista, proposta por Olavo de Oliveira Neto , segundo a qual a conexão de causas ocorre quando se decide uma mesma relação jurídica material ainda que sob enfoques diversos, não se permite a suspensão do presente feito.

Primeiro, porque a situação seria, no máximo, de conexão de ações, o que, considerando já existir julgamento no processo nº 2005.01.1096790-6, não impõe o efeito da reunião dos processos, a qual se ocorresse seria nesse juízo, em face da anterioridade desta demanda (prevenção).

No mesmo sentido dispõe o enunciado da súmula nº235 do Superior Tribunal de Justiça .

Segundo, analisando os pedidos deduzidos nas duas ações, verifica-se que se houvesse uma prejudicial entre elas, essa ocorreria justamente em relação à ação civil pública, ou seja, o julgamento do processo ordinário é que seria prejudicado pela ação civil pública, à medida que esta se insurge quanto ao ato administrativo em si, enquanto que aquela demanda se limita aos efeitos decorrentes desta.

Suficientes esses esclarecimentos, rejeito o pleito suspensivo acima.


MÉRITO

Devidamente preenchidos todos demais pressupostos processuais e condições da ação, passo ao julgamento do mérito da lide.

Cuida-se de ação de improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - MPDFT, em face em face do Sr. Valdivino José de Oliveira, o qual, na condição de Secretário da Fazenda e do Planejamento do Distrito Federal, teria concedido remissão de Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS à empresa-ré Só Frango Produtos Alimentícios Ltda. (2ª ré).

Cumpre ressaltar que o artigo 330, I, do Código de Processo Civil, impõe o julgamento antecipado da lide quando a questão de mérito for unicamente de direito, não sendo necessária a produção de prova em audiência. A isso, acrescente-se a revelia do réu. Ademais, quando for o caso, "o julgamento antecipado não é uma faculdade, mas dever que a lei impõe ao julgador", em homenagem ao princípio da economia processual.

Admitido o julgamento antecipado, é preciso pontuar sobre o Ato Declaratório n.º 04/2002, o que se constituiu em instrumento remissão para os créditos tributários relativo ao ICMS e constantes no procedimento administrativo n.º 0040-000122/200.

Analisando os autos desse procedimento (volume I - junto por linha, fl.12), verificam-se os seguintes pedidos de remissão, deferidos em sede administrativa recursal:

1. Período de 01.01.2001 a 31.01.2001 (R$ 333.872,15, referentes ao ICMS gerado pelas vendas de frango abatido, congelado ou resfriado, suas partes e miudezas comestíveis).

2. Período de 01.02.2001 a 28.02.2001 (R$ 323.174,13, referentes ao ICMS gerado pelas vendas de frango abatido, congelado ou resfriado, suas partes e miudezas comestíveis).

3. Período de 01.03.2001 a 31.03.2001 (R$ 371.774,45, referentes ao ICMS gerado pelas vendas de frango abatido, congelado ou resfriado, suas partes e miudezas comestíveis).

4. Período de 01.04.2001 a 30.04.2001 (R$ 384.080,41 referentes ao ICMS gerado pelas vendas de frango abatido, congelado ou resfriado, suas partes e miudezas comestíveis).

5. Período de 01.05.2001 a 31.05.2001 (R$ 385.210,85, referentes ao ICMS gerado pelas vendas de frango abatido, congelado ou resfriado, suas partes e miudezas comestíveis).

6. Período de 01.07.2001 a 31.07.2001 (R$ 707.060,33, referentes ao ICMS gerado pelas vendas de frango abatido, congelado ou resfriado, suas partes e miudezas comestíveis).

7. Período de 01.08.2001 a 31.08.2001 (R$ 843.806,13, referentes ao ICMS gerado pelas vendas de frango abatido, congelado ou resfriado, suas partes e miudezas comestíveis).

8. Período de 01.09.2001 a 30.09.2001 (R$ 709.199,44, referentes ao ICMS gerado pelas vendas de frango abatido, congelado ou resfriado, suas partes e miudezas comestíveis).

Todos esses pedidos geraram um valor total de R$ 4.410.538,05 (quatro milhões, quatrocentos e dez mil, quinhentos e trinta e oito reais e cinco centavos).

Analisando a gênese do ato administrativo deflagrador dessa isenção - Ato Declaratório n.º04/2002, emitido pelo réu Valdivino José de Oliveira, verificam-se que os dispositivos invocados para justificar a isenção foram a Lei Distrital nº 2.860/2001 e o Convênio ICMS nº82/2001 e o Decreto n.º 22.677/2002.

Pois bem.

O art. 155, XII, g, da Constituição Federal de 1988 determina que cabe à Lei Complementar regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados, o que é repetido no artigo 135, § 5.º, VII, da Lei Orgânica do Distrito Federal .

Nesse diapasão, a Lei Complementar nº 24/1975 (art.1º ), ao estipular a realização de convênios relativos ao ICMS (reproduzido pelo art.4º da Lei Distrital n.º1.254/1996 , admitiu a realização de tratativas entre os Estados-membros e o Distrito Federal, com o fito de desonerar ou reduzir a incidência tributária pertinente à circulação de mercadorias e serviços - ICMS.

A respeito, firmou-se o Convênio ICMS n.º82/2001 , pelo qual o Distrito Federal foi autorizado a conceder a remissão dos créditos tributários do ICMS, constituídos ou não, incidentes: 1) nas operações com aves vivas destinadas ao abate efetuadas por produtor rural inclusive aquelas sujeitas à substituição tributária, ocorridas de 03.05.2001 a 30.05.2001; 2) nas operações com aves abatidas, suas partes e miudezas comestíveis efetuadas por abatedouros e frigoríficos ocorridas até 30 de setembro de 2001.

Observa-se, assim, que foram duas as hipóteses para a concessão do benefício tributário, sendo que, no caso de aves vivas, restou consignado o período de 03.05.2001 até 30.09.2001.

Todavia, interessa-nos apenas a remissão pertinente às operações com aves abatidas, suas partes e miudezas comestíveis, as quais foram praticadas pela empresa ré e foram alcançadas pela remissão ora impugnada.

Com base nesse convênio e especificamente quanto às operações com aves abatidas, suas partes e miudezas comestíveis, foi editada a Lei Distrital n.º2.860/2001, regulamentada pelo Decreto Distrital n.º22.677/2002, com os seus dispositivos repetindo os temos do Convênio acima, tratando tão só do termo ad quem (30.09.2001).

Não há qualquer referência ao termo a quo desse tópico, devendo ser observado que o anterior Convênio n.º22/2001 , ao autorizar a remissão de ICMS, limita-se a tratar das operações relacionadas com aves vivas destinadas ao abate e efetuadas por produtor rural, ocorridas de 01.01.2000 a 02.05.2001.

Assim, embora seja claro o termo final da remissão atinente às aves abatidas, suas partes e miudezas comestíveis (30.09.2001), o termo a quo está omisso.

Por conseguinte, a consideração desse termo inicial, está livre da apreciação literal exigida pelo art.111, I, do CTN , cuja incidência se limita à suspensão ou exclusão do crédito tributário. Nesse ponto, é preciso distinguir a anistia (sempre referente à multa), forma de exclusão - que impede o lançamento, evitando o nascimento do crédito, da remissão (referente à multa ou tributo), forma de extinção - a qual pressupõe o lançamento e o conseqüente nascimento do crédito tributário .

Ora, a fixação do termo a quo em data similar àquela das aves vivas (03.05.2001), implica, ao nosso sentir, em inevitável e inadmissível atuação do judiciário como legislador positivo, embora precise se reconhecer a ausência de impugnação ministerial a esse tema, apesar de previsto no seu parecer técnico (fl.551, volume III, juntado por linha).

Ademais, a impugnação desse tema já é objeto de demanda diversa, sendo desnecessária, nesta lide, a fixação do termo a quo, à medida que o autor se insurgiu especificamente quanto ao Ato Declaratório n.º04/2002, no seu aspecto meritório (a razão de decidir) e no seu aspecto financeiro-orcamentário (requisitos da Lei de Responsabilidade Fiscal), sem se descuidar dos efeitos atinentes ao caráter indireto do ICMS.

O Código Tributário Nacional - CTN estipula, nos idos do art.172 , as hipóteses pertinentes à concessão de remissão, parcial ou total do crédito tributário, quais sejam: a) decisão fundamentada; b) preenchimento de quaisquer das hipóteses previstas nos incisos do art.172, CTN.

No caso em comento, a justificativa adotada pelo réu Valdivino José de Oliveira (fl.1019) foi a mesma já disposta no parecer de fls.204/211 (volume I - junto por linha), o qual, por sua vez, pautou-se pela desigualdade da carga tributária incidente sobre os produtores do Distrito Federal se comparada àquela recainte sobre os empresários do mesmo setor nas demais unidades da Federação.

Adimplindo está, portanto, o primeiro requisito da existência de decisão fundamentada, à medida que a adoção das razões do parecer ofertado, traduz, de modo suficiente, o requisito acima, mesmo porque não é exigível que dos atos administrativos decisórios conste fundamentação própria das decisões judiciais (art. 458, III, CPC e art.93, IX, CF/88 ).

Igual entendimento é esposado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO ANULATORIA PROPOSTA CONTRA A SUNAB. DECISÃO DO DELEGADO COM BASE EM PARECER DA PROCURADORIA. -FUNDAMENTADA ESTÁ A DECISÃO DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA QUE ADOTA, COMO RAZÃO DE DECIDIR, PARECER DA PROCURADORIA DO ORGÃO. - APELO PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. DECISÃO UNANIME (TRF5 - 1ª Turma, AC 9105027810, Desembargador Federal Francisco Falcão, julgamento em 22/08/1991, DJ - Data: 16/09/1991 - Página: 22314). Precedentes do STF e TRF - 1ª Região.

Quanto ao mérito, a tese foi impugnada pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal - TCDF, para o qual a eqüidade (art.172, IV, CTN), deve ser verificada dentro do território do próprio ente tributante e não em relação às demais unidades federativas.

Ora, o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS é um tributo voltado justamente à circulação de bens e serviços, onde a saída do estabelecimento é o aspecto temporal do fato gerador (art.12, I, da LC n.º87/96 ). É ínsita à circulação a comercialização interna e interestadual, tanto é assim que a própria Constituição Federal lhe dispensa tratamento minucioso, atento, inclusive, a esse aspecto, como se deflui do art.155, §2º, I (ao tratar da não cumulatividade), VII, 'a' (ao tratar das alíquotas devidas em operações interestaduais) etc.

Dentre esses dispositivos constitucionais, merece especial destaque o art.155, §2º, XII, 'g', CF/88, onde se confere aos Estados e ao Distrito Federal a discussão conjunta de temas correlatos a isenções, incentivos e benefícios fiscais, o que, no caso em apreço, foi objeto do Convênio acima citado.

Assim, se se considera todos os membros da Federação para a fixação desses benefícios fiscais relativos ao ICMS, dada a sua importância interestadual e os seus efeitos intra-estatuais, não se pode desprezar, na mensuração da eqüidade a situação tributária verificada em outros Estados.

Portanto, a nacionalidade ínsita ao ICMS deve ser considerada na verificação da eqüidade em tela, sob pena de o preenchimento ou não desse requisito (se considerada apenas a situação local), tornar-se artificial, desprezando a situação nacional e fulminando a concorrência das empresas aqui sediadas.

Essa fundamentação não se contrapõe, como alegado à inicial, a anterior concessão de Termo de Acordo de Regime Especial, o qual teria proporcionado à empresa ré, incidência tributária específica de 1% (um por cento) sobre a receita bruta, à medida que, independente desse acordo, a carga tributária, se diferenciada em relação aos demais Estados, sem dúvida, dificulta e desestimula a atividade empresarial.

Ademais, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - MPDFT, ao relatar que a carga tributária decorrente do TARE mencionado era pequena, compara tal ônus àqueles suportados em outros Estados membros, adotando critério (comparação) que outrora fora refutado para a concessão da remissão. No entanto, essa comparação, ancorada em parecer da Inspetoria de Controle Interno do TCDF, não é corroborada pelas informações de fls.43/44 (volume I, juntado por linha).

O autor, inclusive, sequer juntou material probatório que demonstrasse a carga tributária global de 1% (um por cento), ou valor aproximado, incidente sobre a empresa ré ou os produtores dos demais estados.

O MPDFT desconsiderou, ainda, as alíquotas incidentes sobre os insumos e as suas operações interestaduais, listados às fls.197/198 (volume I, juntado por linha), no qual as condições especiais de incidência do ICMS não se aplicam, o que gera efetivamente uma incidência tributária maior do que aquela invocada pelo demandante.

Desta feita, houve sustentáculo suficiente para a concessão da remissão do ICMS com base no Código Tributário Nacional, ressaltando-se que essa benesse não produz direito adquirido, podendo ser anulada de ofício, sempre que se apure que o beneficiário não mais satisfaça, não cumpra ou deixe de cumprir os requisitos para a concessão do favor (art.172, parágrafo único, c/c art.155 , ambos do CTN).

Nesse sentir, o representante do Ministério Público, embora sob o manto da unidade institucional (art.127, §1º, CF/88 ), não se desincumbiu do seu múnus público, não sabendo esclarecer sobre a continuidade ou revogação desse ato administrativo impugnado (o que é objeto de ação cautelar nº 2005.01.1.096790-6, atualmente em tramitação no Superior Tribunal de Justiça), cujos delineamentos atinentes à suposta revogação desses atos não interferem na tipificação por ato de improbidade administrativa, ao menos quanto aos requisitos da Lei Complementar Tributária (CTN).

Portanto, sequer restou evidenciada a materialidade delitiva na concessão de benefício fiscal, obediente aos pressupostos previstos no CTN.

Noutro naipe, o segundo ato de improbidade administrativa imputado é a não observância da Lei de Responsabilidade Fiscal, cujos delineamentos do art.14 devem orientar qualquer renúncia de receita, onde se inclui a remissão tributária.

A renúncia de receita, decorrente da concessão de incentivos fiscais, é mecanismo financeiro empregado na vertente receita pública, a produzir o mesmo resultado econômico da despesa pública .

Desta feita, o benefício consistente na remissão tributária (art.14, §1º, Lei Complementar n.º101/2000), precisa ser acompanhado de estimativa do decorrente impacto orçamentário-financeiro no exercício em que se iniciou a sua vigência e nos dois seguintes, além de atender ao disposto na elaboração da lei de diretrizes orçamentárias.

Tudo isso deve ser acompanhado da demonstração de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária e não afetará as metas e os resultados fiscais (art.14, I, LRF) ou estar acompanhada de medidas de compensação, por meio do aumento de receita, nos três exercícios financeiros, onde se inclui a ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

A tese defensiva é que a remissão foi considerada no impacto orçamentário-financeiro do período no qual se iniciou a sua vigência (2001), mediante a Lei Distrital n.º 2856/2001 e que, por conseguinte, à medida que a execução da receita de 2001 integra o cálculo para a estimativa de receita de 2002 e 2003, se o valor da remissão não foi executado em 2001, não haveria de incluí-lo nas previsões de 2002 e 2003.

Além disso, o réu Valdivino José de Oliveira afirmou que o Distrito Federal teria superado as metas fiscais no período informado, o que impunha a ausência de prejuízo ao erário público.

A Lei Distrital nº 2.573/2000 dispôs sobre as diretrizes orçamentárias para o exercício de 2001, sendo alterado pela Lei Distrital nº 2.856, de 27 dezembro 2001, a qual teria incluído a remissão em epígrafe na estimativa do impacto orçamentário-financeiro do ano de 2001.

No entanto, o art.14, caput, da Lei de Responsabilidade Fiscal é claro ao exigir a prévia previsão orçamentária do impacto remissivo, à medida que a lei refere-se a 'estimativa' impactante.

No caso em comento, a lei que emendou a Lei de Diretrizes Orçamentárias para o ano de 2001 no Distrito Federal surgiu no final de 2001 (27.12.2001), donde se deflui a ausência de qualquer previsão (o que precede) ou estimativa.

De fato, o que aconteceu foi, após análise do comportamento orçamentário do Distrito Federal no ano de 2001, ao final, concedeu-se a remissão. Não houve, pois, estimativa, mas sim uma análise retrospectiva dos gastos certos já ocorridos.

Nesse diapasão, os anexos à Lei de Responsabilidade Fiscal, em matéria de LDO, são o anexo de riscos fiscais (onde se trata de despesas potenciais e outros riscos) e o anexo de metas fiscais (no qual se tratará das metas para receitas, despesas, resultados nominal primário e montante da dívida para o exercício a que se refere e para os dois seguintes); neste, inclui-se a estimativa e compensação de renúncia de receita.

A anterior previsão no anexo de metas fiscais almeja garantir a compensação, mantendo o atingimento das metas traçadas na LDO.

Outra hipótese é a previsão de estudo de impacto fiscal, onde o justificado benefício concedido precisa ser refletido diante de medidas de retorno da remissão, ou seja, o empobrecimento estatal precisa ser momentâneo, sob pena de se instituir a intervenção do Estado no setor econômico com vistas a atentar apenas o interesse imediato do particular e um suposto e mediato interesse coletivo.

O descumprimento dessa anterior previsão, ainda que fosse refutada pela inaceitável e posterior Lei Distrital n.º2.856/2001, não atendeu à necessária previsão legal no ano que se iniciou a sua vigência (2001) e nos dois exercícios posteriores (2002 e 2003).

Nesse ínterim, a alegação defensiva é de que a execução da receita do ano de 2001 integra o cálculo de estimativa da receita dos anos de 2002 e 2003 e que o método estatístico fundado na base histórica da execução da receita, dispensaria a providencia legal, pois essa medida se limitaria a incluir a receita remitida no ano 2002 para, em seguida, excluí-la.

Essa tese, embora sedutora, não se sustenta diante da atual e inovadora Lei de Responsabilidade Fiscal, cujo escopo primário é a fixação de metas, transformando o foco do administrador, acostumado em olhar para trás, no futuro e na fixação de diretrizes para tanto.

Assim, a adoção do modelo histórico, como propugnado, implicaria em revogação do art.14, caput, LRF, única saída para se desprezar o impacto orçamentário-financeiro no biênio seguinte à remissão.

Isso, no entanto, não é sustentável, repise-se, pois a improvisação dos orçamentos foi evitada justamente pela LRF. Do contrário, as previsões da LDO seriam propositalmente supervaloradas e a sobra decorrente desse vício seria um apanágio para favores fiscais retroativos e anteriores, numa improvisação qualificada e maquiavélica.

Acrescente-se que a alegação de que a receita futura não deveria ser incluída em orçamentos posteriores ao ano da remissão (2001) é incabível, pois é justamente por se tratar de receita futura que a sua inexistência deve ser prevista, estimada e compensada.

Caso não se aplicasse a LRF às receitas futuras, as proteções às previsões da LDO seriam inócuas, pois só se poderia tratar de receitas pretéritas, certas, donde a previsão orçamentária transmutar-se-ia em uma inarredável 'receita de bolo', mais uma vez, com os olhos voltados para o passado.

Nesse sentir, a infrigência às exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal é clara e irrefutável, donde deixo de aplicar a Lei Distrital nº 2.856/2001, por considerá-la inconstitucional no que se refere à remissão de ICMS incidente nas operações com aves vivas destinadas ao abate efetuadas por produtor rural e nas operações de com aves abatidas, suas partes e miudezas comestíveis, efetuadas por abatedouros e frigoríficos (referência ao Convênio ICMS n.º82/2001), como medida antecedente à nulificação do Ato declaratório n.º04/2002 .

O afastamento do dispositivo distrital acima elencado é reconhecido de ofício, com supedâneo nos ensinamentos de Gilmar Ferreira Mendes e alicerçado no modelo hibrido de controle de constitucionalidade pátrio.

Outrossim, a Lei Distrital n.º3.388/2004 seria igualmente inócua para convalidar o ato remissivo, ao passo que a sua posteridade e o reiterado descumprimento das condições relativas à responsabilidade fiscal a torna ineficiente.

Prosseguindo, a conduta imprudente do administrador Valdivino José de Oliveira, ao conceder a remissão à empresa Só Frango Produtos Alimentícios Ltda. causou indubitável prejuízo ao erário, decorrente da perda patrimonial sofrida pelo Distrito Federal.

Nos termos da Lei de Improbidade Administrativa, constitui ato de improbidade que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação malbaratamento ou dilapidação de bens ou haveres de órgãos da administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual (art.10, LIA ).

Esse enquadramento exige, como pressuposto, a ocorrência de dano ao patrimônio das pessoas referidas no art.1º da Lei nº 8.429/1992 , enquanto que o enriquecimento ilícito é pressuposto dispensável .

A perda patrimonial do erário público é evidente e quantificada nos pedidos remissivos acima alocados, os quais produziram um valor total de R$ 4.410,538, 05 (quatro milhões, quatrocentos e dez mil, quinhentos e trinta e oito reais e cinco centavos), à época dos fatos.

Esse prejuízo sofrido pelo Distrito Federal corresponde e é consectário lógico da remissão concedida, a qual se fundou em legislação que não atendeu a Lei de Responsabilidade Fiscal, implicando num enriquecimento indevido da empresa ré.

Por conseguinte, a remissão, ao se referir a período pretérito em tributo tipicamente indireto (ICMS) - onde a confusão entre o contribuinte de direito e de fato é manifesta, independe da análise da concorrência empresarial ou da elasticidade do preço do produto, o qual, ainda que tenha diluído o valor correspondente à remissão, decorreu de ônus empresarial assumido pela empresa-ré, desinfluente para a demanda.

Quanto ao animus motivador dessa ação ímproba, como já dito, é suficiente a culpa dos envolvidos, pois o desiderato do legislador foi justamente punir condutas culposas dos agentes que causem danos ao erário.

Sobre o tema, trago à baila recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, confirmando a suficiência da culpa:

AÇÃO CIVIL. IMPROBIDADE. CULPA. Na espécie, foi imputada ao procurador do Estado a prática de ato de improbidade administrativa previsto no art. 11, II, da Lei n. 8.429/1992. Mas a Turma deu provimento ao recurso, por entender que a configuração de qualquer ato de improbidade administrativa exige a presença do elemento subjetivo na conduta do agente público, pois não é admitida a responsabilidade objetiva em face do atual sistema jurídico brasileiro, principalmente considerando a gravidade das sanções contidas na Lei de Improbidade Administrativa (LIA). Assim, é indispensável a presença de conduta dolosa ou culposa do agente público ao praticar tal ato, especialmente pelo tipo previsto no art. 11 da Lei n. 8.429/1992, especificamente por lesão aos princípios da Administração Pública, que admite manifesta amplitude em sua aplicação. Por outro lado, é importante ressaltar que a forma culposa somente é admitida no ato de improbidade administrativa relacionado à lesão do erário (art. 10 da LIA), não sendo aplicável aos demais tipos (arts. 9º e 11 da LIA). No caso concreto, o Tribunal de origem qualificou equivocadamente a conduta do agente público, pois a desídia e a negligência, expressamente reconhecidas, no caso, não configuram dolo, tampouco dolo eventual, mas modalidade de culpa. Tal consideração afasta a configuração de ato de improbidade administrativa por violação de princípios da administração pública. Precedentes citados: REsp 734.984-SP, DJe 16/6/2008; REsp 658.415-RS, DJ 3/8/2006; REsp 604.151-RS, DJ 8/6/2006, e REsp 626 (STJ - 1ª Turma, Informativo Nº: 0395, de 18 a 22 de maio de 2009). Precedente do TJDFT.

Por conseguinte, a conduta do réu Valdivino José de Oliveira foi pautada por uma negligência incompatível com o trato da coisa pública, cuja gravidade equipara-se, inclusive, à imprudência administrativa. Isso ocorreu, pois o citado réu não de atentou para o descumprimento dos dispositivos da LRF já tratados, concedendo excepcional renúncia de receita sem os correspondentes e necessários encargos.

A culpabilidade, satisfeita pela negligência, não pode se compensada ou esquecida por uma alegada tese que o Distrito Federal tenha crescido a sua receita nos anos seguintes. Esse pensamento tornaria a LRF um instrumento de controle finalístico apenas, enquanto que o seu escopo maior é a fixação de metas e a previsibilidade orçamentária, num típico controle prévio e concomitante.

Nesse ponto, a excludente de antijuridicidade invocada pelo Sr. Valdivino José de Oliveira, consistente no estrito cumprimento do dever legal, não possui ressonância. Foi justamente em virtude do descumprimento da LRF (descumprimento de dever legal necessário à remissão) que o réu incorreu no enquadramento em apreço.

Outrossim, a potencial consciência de ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa são temas afetos à seara penal e, ainda que trazidos para o campo civilista, não são alegações defensáveis. A clareza da LRF, cujo preenchimento é essencial para a remissão prevista, corporifica cristalina e inescusável exigência. Ademais, o Convênio n.º82/2001 (e a Lei Distrital n.º2.856/2001), o qual poderia servir de escudo à atuação do réu, não lhe impõe um dever de agir, mas uma faculdade, cujo exercício não implica no esquecimento ou na infrigência das demais disposições legais aplicáveis e exigíveis à espécie (onde se inclui a LRF).

Resta, ainda, o enquadramento da conduta do réu Valdivino José de Oliveira, o qual concedeu benefício fiscal (remissão de ICMS) sem observância de formalidades legais dispostas na LRF (art.10, VII, LIA), o que, como consectário lógico, implicou em negligente atuação quanto à arrecadação do aludido imposto (art.10, X, LIA).

Não bastasse isso, dessas condutas listadas, é inegável o enriquecimento ilícito da empresa Só Frangos Produtos Alimentícios Ltda. (art.10, XII, LIA).

A violação ao princípio da impessoalidade, como requerido em réplica ministerial, não procede, pois o favorecimento de certa empresa não é incompatível com o instituto tributário da remissão, o qual admite a modalidade geral e a específica (previsto no CTN, donde a violação à legalidade stricto sensu não ocorreu), como aconteceu.

A violação à Lei de Responsabilidade Fiscal (art.14), por sua vez, é visível, sob o pálio da prática de ato que visou fim claramente proibido nessa legislação (art.11, I, da LIA ).

No entanto, além da tipificação delituosa, o enquadramento da conduta no art. 11 da LIA exige dolo, elemento subjetivo que não foi comprovado, à medida que o deliberado propósito de prejudicar o erário público não pode ser presumido (ele seria satisfeito se houve qualquer prova, por exemplo, de relacionamento pessoal ou econômico entre o réu e a empresa-ré, com o retorno para aquele de parcela dos valores remitidos, o que não restou nem alegado nem comprovado).

Todavia, a declaração de nulidade do Ato de Declaratório n.º04/2002, por si só, já é suficiente para alcançar a retidão administrativa, cabendo ao Distrito Federal constituir o crédito tributário correspondente nos termos da legislação tributário, sob pena de transformar-se a Ação Civil Pública em executivo fiscal desacompanhado de Certidão de Dívida Ativa (CDA).

Acrescente-se que a disposição de sentença condenatória exige um pronunciamento certo (art.460, parágrafo único, CPC ), diversamente do pleito final do autor (fls.1712/1713), onde, desconhecendo a manutenção ou revogação do ato administrativo atacado, almejou a condenação dos demandados, cuja pena pecuniária ficaria condicionada a não ter havido anterior restituição dos valores almejados, o que não é possível.

Deste modo, entendo que o ato praticado pelo réu Valdivino José de Oliveira estava eivado de improbidade, razão pela qual o condeno nas penas cabíveis por tal conduta.

Quanto à empresa Só Frangos Produtos Alimentícios Ltda., embora se admita a sua inclusão no pólo ativo para a oportuna análise de sua concorrência ativa no ato impugnado , como efetivamente aconteceu (art. 3º da Lei nº 8.429/1992 ), não houve a especificação nem a comprovação de qualquer conduta concorrente e enquadrável em quaisquer dos dispositivos da Lei de Improbidade Administrativa, razão pela a condenação dessa empresa nas penas impostas nessa normatização não é cabível, ressalvando-se as vias ordinárias e compatíveis com o tributo tratado para o Distrito Federal pleitear o crédito tributário correspondente.


DISPOSITIVO

Diante desse cenário, julgo parcialmente procedente os pedidos formulados pelo autor na inicial para: 1) deixar de aplicar a Lei Distrital nº 2.856/2001, por considerá-la inconstitucional no que se refere à remissão de ICMS incidente nas operações com aves vivas destinadas ao abate efetuadas por produtor rural e nas operações de com aves abatidas, suas partes e miudezas comestíveis, efetuadas por abatedouros e frigoríficos; 2) por conseguinte, declaro a nulidade do Ato Declaratório n.º04, de 08.04.2002, o qual concedeu remissão de ICMS à empresa Só Frango Produtos Alimentícios Ltda., facultando ao Distrito Federal a constituição do crédito tributário correspondente, se assim já não o fez; 3) condenar o réu Valdivino José de Oliveira como incurso nas penalidades correspondentes às condutas ímprobas definidas nos art.10, VII, X, XII, da Lei n.º8.429/1992, cuja dosimetria se segue.

Desta feita, declaro o feito resolvido, com resolução do mérito, segundo art.269, I, CPC .

Deixo de condenar o Distrito Federal, diante da sua posição de neutralidade e por se tratar da pessoa jurídica em que teve sede a prática do ato ímprobo.

Passo a dosimetria da pena do réu Valdivino José de Oliveira, atento à extensão punitiva do julgado .

Quanto às sanções aplicáveis em virtude da transgressão ao art.10, VII, X e XII, da LIA, o seu artigo 12 fixa as penalidades correspondentes.

Atento ao caso, o qual corresponde a ofensas simultâneas, onde uma só conduta ofende ao mesmo tempo mais de uma conduta do mesmo dispositivo, valho-me do princípio da subsunção, para fixar aos réus as penas que se seguem :

A violação dos regramentos legais correspondentes à remissão tributária, desfeitos com a declaração de nulidade do Ato Declaratório nº04/2002, impede o surgimento de qualquer dano diverso daquele já ínsito ao dano acima, reparável pelo lançamento tributário cabível, razão pela qual deixo de condenar o réu Valdivino José de Oliveira ao ressarcimento integral do dano, por impossibilidade lógica na espécie , conforme o art.21, I, Lei n.º 8.429/1992 .

Diversamente, condeno o réu Valdivino José de Oliveira ao pagamento de multa civil correspondente a 10 % (dez) por cento do valor remitido pelo Ato Declaratório n.º04/2002, o que corresponde a R$ 441.053,80 (quatrocentos e quarenta e um mil cinqüenta e três reais e oitenta centavos).

Esse valor sofrerá correção monetária pelo índice do INPC, a contar da data do arbitramento. Os juros moratórios, por sua vez, serão calculados no percentual de 1% a.m (um por cento ao mês), na forma do art. 406 do CC c/c art. 161, § 1º, do CTN , tendo o mesmo termo a quo disposto para a correção monetária.

Ressalte-se que tais valores deverão ser direcionados aos cofres do Distrito Federal.

Não houve bens ilicitamente acrescidos aos patrimônios dos réus. Logo, deixo de impor qualquer perda de bens ou valores, pois não há comprovação de qualquer acréscimo ilícito ao patrimônio do réu Valdivino José de Oliveira.

Ainda, condeno o réu Valdivino José de Oliveira à perda de função pública que estiver ocupando, impondo, por igual, impõe-se a suspensão dos direitos políticos pelo prazo mínimo de 5 (cinco) anos. Essas penalidades suspensivas só produzirão os seus efeitos após o trânsito em julgado da sentença, com esteio no art. 20 da LIA .

Determino que o réu Valdivino José de Oliveira fique impossibilitado de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos.

Deixo de condenar os réus ao pagamento das custas processuais, em aplicação à simetria interpretativa do art. 18 da LACP , segundo o qual o autor só seria condenado ao pagamento das custas se comprovada a sua má-fé. Ora, não demonstrada má-fé dos réus no exercício de suas defesas, impõe-se a isenção dessas custas. No mesmo sentido, julgado da 2ª turma do STJ .

Mais uma vez escudado na simetria, deixo de impor aos réus qualquer condenação em honorários advocatícios, à medida que o autor - MPDFT, quando vencido na lide, não os paga ao réu. Precedente do STJ.

Transitada em julgada, comunique-se à Corregedoria do TRE-DF, conforme o art.15, V, CF/88 , a suspensão dos direitos políticos do réu Valdivino José de Oliveira, pelo prazo de 5 (cinco) anos, com termo a quo do trânsito em julgado.

Após o trânsito, ainda, comunique-se aos órgãos administrativos dos três poderes do Distrito Federal e da União, a proibição do réu Valdivino José de Oliveira de contratar com o qualquer esfera Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, cuja proibição perdurará por 5 (cinco) anos.

Ressalte-se recente precedente do STJ, confirmando a amplitude federativa dessa condenação , a qual deve ser adotada.

E, mais uma vez após o trânsito, comunique-se ao Poder Executivo do Distrito Federal - GDF, a condenação do réu Valdivino José de Oliveira à perda de qualquer função pública que estiverem ocupando, sem prejuízo, mais uma vez, da amplitude federativa dessa condenação.

Por fim, transitada em julgado, o réu Valdivino José de Oliveira tem o prazo de 15 dias para cumprimento voluntário da condenação à pena civil imposta, sob pena de incidir na multa de 10% sobre o valor do débito (art. 475-J do CPC ), caso se desenvolva a execução do cumprimento e penhora, ficando intimados com a publicação.

Transcorrido o prazo acima e não vindo o pedido de cumprimento em 6 (seis) meses (art.475-J, §5º, CPC), dê-se baixa e arquivem-se.

Oficie-se ao Superior Tribunal de Justiça - 2ª Turma, encaminhando cópia desta sentença com vistas a integrar o autos do REsp 1125026/DF, Relator Ministro Castro Meira, o qual é alusivo ao processo originário n.º2005.01.1.096790-6.

P. R. I.

Brasília-DF, 22 de fevereiro de 2010.


RODRIGO CORDEIRO DE SOUZA RODRIGUES
Juiz Substituto, em exercício na 4ª Vara de Fazenda Pública/DF.



JURID - Perda de Direitos Políticos [10/03/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário