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quinta-feira, 4 de março de 2010

JURID - Penal. Extorsão Qualificada pelo resultado morte. [04/03/10] - Jurisprudência


Penal. Extorsão Qualificada Pelo Resultado Morte E Ocultação E Destruição De Cadáver

Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG

Número do processo: 1.0701.07.184687-0/001(1) Númeração Única: 1846870-09.2007.8.13.0701

Relator: PEDRO VERGARA

Relator do Acórdão: PEDRO VERGARA

Data do Julgamento: 02/02/2010

Data da Publicação: 01/03/2010

Inteiro Teor:

EMENTA: PENAL - EXTORSÃO QUALIFICADA PELO RESULTADO MORTE E OCULTAÇÃO E DESTRUIÇÃO DE CADÁVER - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - INEXISTÊNCIA DE COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL - DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO DE EXTORSÃO QUALIFICADA PELO RESULTADO MORTE PARA FURTO CONSUMADO - INADMISSIBILIDADE -RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. - Estando devidamente comprovadas a autoria e a materialidades dos delitos em questão, a manutenção da condenação é medida que se impõe. - Para o reconhecimento da coação moral irresistível como causa de exclusão da culpabilidade é necessário prova efetiva da sua existência. - Restando comprovado nos autos que a intenção dos agentes era auferir indevida vantagem econômica mediante constrangimento da vítima e em consequência da violência empregada adveio o óbito, não há que se falar na desclassificação para o delito de furto.

APELAÇÃO CRIMINAL N° 1.0701.07.184687-0/001 - COMARCA DE UBERABA - 1º APELANTE(S): GLEICE FABIANA DA SILVA - 2º APELANTE(S): SONIA LUCIA DAS NEVES, MILTON ANTONIO NEVES - APELADO(A)(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS - CO-RÉU: RODRIGO SILVA ARAUJO, JOSÉ RAIMUNDO SOUZA DA SILVA - RELATOR: EXMO. SR. DES. PEDRO VERGARA

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 5ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador PEDRO VERGARA , na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO AOS RECURSOS.

Belo Horizonte, 02 de fevereiro de 2010.

DES. PEDRO VERGARA - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

Proferiu sustentação, pelos segundos apelantes, o Dr. Antônio Alberto da Silva.

O SR. DES. PEDRO VERGARA:

VOTO

Cuida-se de AÇÃO PENAL PÚBLICA promovida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra MILTON ANTÔNIO NEVES, JOSÉ RAIMUNDO SOUZA DA SILVA, SÔNIA LÚCIA DAS NEVES, GLEICE FABIANA DA SILVA e RODRIGO SILVA ARAÚJO como incursos nas sanções do artigo 158 (extorsão) §1º (causa de aumento) e §2º (qualificadora pelo resultado morte) c/co artigo 211 (ocultação e destruição de cadáver) c/c o artigo 69 (concurso material de crimes) do Código Penal.

Narra a denúncia que no dia 07 de Março de 2007 na comarca de Uberaba os apelantes e os corréus agindo em conluio e com unidade de desígnios constrangeram mediante emprego de violência a vítima Wanderlino Eustáquio da Silva com o intuito de obter para si indevida vantagem econômica a informar a senha eletrônica de seu cartão bancário sendo que da violência empregada resultou a morte dela tudo como consta do anexo inquérito policial (f. 02-06).

Consta ainda da exordial que na mesma data no local denominado por margens da BR 050 próximo ao restaurante Catetinho na comarca de Uberaba os apelantes e os corréus ocultaram e destruíram o cadáver da vítima Wanderlino Eustáquio da Silva ateando fogo sobre o mesmo (idem).

Recebida a denúncia foram os apelantes e corréus citados e interrogados a exceção do corréu José Raimundo Souza da Silva que estando em local incerto e não sabido foi citado por edital decretando-se a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional em relação a ele, apresentado os demais as defesas preliminares de f. 476-478 e 480-481 e ouvidas as testemunhas arroladas pelas partes essas nada requereram em diligência (f. 382, 420-421, 424-425, 426-427, 439-440, 455-462, 463-466, 467-469, 470-474, 422-423, 444-445, 544, 475, 484, 538-543, 546, 549, 549v).

Nas alegações finais requereu o órgão ministerial a procedência parcial da inicial com a condenação dos apelantes Milton Antônio Neves, Sônia Lúcia das Neves e Gleice Fabiana da Silva nas sanções dos artigos 158 §2º e 211 c/c os artigos 29 e 69 do Código Penal e do corréu Rodrigo Silva Araújo nas sanções do artigo 211 do Código Penal com a consequente suspensão de seus direitos políticos e a absolvição do corréu Rodrigo Silva Araújo em relação ao delito previsto no artigo 158 §2º do Código Penal com fundamento no artigo 386 inciso IV do Código de Processo Penal, rogando a defesa dos apelantes Milton Antônio Neves, Sônia Lúcia das Neves e Gleice Fabiana da Silva a inépcia da denúncia ou alternativamente a absolvição por falta de provas ou a absolvição por coação moral irresistível praticada pelo corréu José Raimundo Souza da Silva e a defesa do corréu Rodrigo Silva Araújo a absolvição da imputação que lhe é atribuída (f. 551-566, 569-579 e 581-591).

Proferida a sentença foram os apelantes condenados nas sanções do artigo 158 §2º c/c o artigo 211 e artigos 29 e 69 do Código Penal, Sônia Lúcia das Neves à pena de 21 (vinte e um) anos e 06 (seis) meses de reclusão e pagamento de 22 (vinte e dois) dias-multa sobre 1/30 (trigésimo) do salário mínimo, com o cumprimento da pena privativa de liberdade de 20 (vinte) anos e 06 (seis) meses em regime inicialmente fechado e 01 (um) ano em regime aberto, Milton Antônio Neves e Gleice Fabiana da Silva à pena de 21 (vinte e um) anos de reclusão e pagamento de 22 (vinte e dois) dias-multa sobre 1/30 (trigésimo) do salário mínimo, com o cumprimento da pena privativa de liberdade de 20 (vinte) anos em regime inicialmente fechado e 01 (um) ano em regime aberto, e o corréu Rodrigo Silva Araújo absolvido da imputação referente ao crime de extorsão qualificada com fulcro no artigo 386 inciso IV do Código de Processo Penal e condenado nas sanções do artigo 211 do Código Penal à pena de 01 (um) ano de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias-multa sobre 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo substituída a pena privativa de liberdade por 02 (duas) restritivas de direitos consistentes em prestação pecuniária e prestação de serviços à comunidade (f. 597-616).

Inconformadas com a decisão recorreram a defesa de Sônia Lúcia das Neves e Milton Antônio das Neves almejando a primeira a absolvição ou a desclassificação para o delito previsto no artigo 155 do Código Penal e o segundo a absolvição por falta de provas, a defesa de Gleice Fabiana da Silva pretendendo a nulidade da sentença diante da falta de provas que incriminem a apelante com a consequente absolvição, rogando o órgão ministerial o desprovimento dos recursos, manifestando-se a douta Procuradoria Geral de Justiça pelo desprovimentos dos mesmos e que seja retificado o erro material relativo a quantidade de pena pecuniária aplicada ao apelante Júlio César Moreira Brandão (f. 643-671, 673-689, 691-705, 714-731).

É o breve relato.

I - Da admissibilidade - Conheço dos recursos já que presentes os pressupostos para sua admissão.

II - Das preliminares - Inexiste na espécie qualquer nulidade tampouco causa de extinção da punibilidade.

Saliente-se aqui que a nulidade da sentença por falta de provas suscitada pela defesa de Gleice Fabiana da Silva confunde-se com o próprio mérito, razão pela qual será sopesada oportunamente quando da análise desse.

III - Do mérito - Cuida-se de delitos de extorsão qualificada pelo resultado morte e ocultação e destruição de cadáver na forma consumada, cuja norma penal incriminadora se encontra insculpida nos artigos 158 §2º e 211 do Código Penal.

Considerando o pedido de absolvição pelos três apelantes passo ao exame conjunto dos recursos.

Resume-se a questão à análise da possibilidade de absolvição dos apelantes Sônia Lúcia das Neves, Milton Antônio das Neves e Gleice Fabiana da Silva ou alternativamente de desclassificação da conduta de Sônia Lúcia das Neves para o delito de furto simples.

A materialidade se encontra suficientemente comprovada principalmente pelo boletim de ocorrência de f. 10-12, pelos extratos bancários de f. 17-23 e 74-78, pela cópia de cheque de f. 43, pelas imagens de f. 53-63, pelo auto de reconhecimento de f. 121-123, pelo laudo de vistoria e constatação de f. 293-297, pelo laudo de vistoria em local de encontro de restos mortais de f. 298-305, pelo laudo de exame de necropsia de f. 389-390 e pela prova oral colhida.

A autoria também restou sobejamente comprovada pelo conjunto probatório colacionado nos autos.

Os apelantes negaram a autoria da prática do delito de extorsão qualificada todavia em que pese o esforço dos mesmos, existem discrepâncias entre suas versões o que denota a falta de compromisso desses com a verdade a saber:

"(...) que não confirma suas declarações prestadas às fls. 14 e verso, frutos da ameaça de seu companheiro José Raimundo que pediu-lhe para ficar com a boca calada sob pena de causar mal à sua filha e família; que, nessa oportunidade, mentiu para a autoridade policial; (...) que não é verdade que tivesse trabalhado como massagista em casa de massagens; (...) que a interrogada mostrou a ele fotos de família, enquanto estavam conversando acompanhados da acusada Gleice Fabiana, surpreendentemente o acusado José Raimundo, que a interrogada imaginava estar trabalhando, chegou em casa nervoso, e ele estava armado com um revólver 'branco'; que ele passou a xingar todo mundo, chamou a interrogada de vagabunda, a vítima, de borra-botas, e, bastante alterado, disse que se a interrogada quisesse se separar dele e ficar com a vítima, que então lhe desse sua parte, ele pretendia dinheiro; que em dado momento, com a arma em punho, ele determinou que a interrogada e Gleice saíssem do quarto e o deixasse a sós com a vítima; que quando ele saiu do quarto, ele já estava com a carteira da vítima nas mãos e apontava a arma para ela; que na sala, ele retirou da carteira, os cartões de crédito da vítima e os manteve nas mãos enquanto pedia que a vítima revelasse sua senha, e ela se recusou; que José Raimundo passou então a ameaçá-la, colocou a arma na cabeça da vítima, e exigia dela o dinheiro, e ao mesmo tempo determinava que a interrogada e Gleice ficasse (sic) quietas; que em dado momento a vítima propôs ao acusado José Raimundo que saíssem juntos apenas os dois, e ela então revelaria a ele, sua senha, só que José Raimundo não concordou com a proposta; que José Raimundo insistiu e disse que se a vítima não colaborasse, ele iria maltratar a filha da interrogada, Gabriela; que de todas as formas a vítima tentou negociar com José Raimundo, mas não teve jeito, entretanto em face da insistência e ameaças de José Raimundo a vítima terminou fornecendo a sua senha; que a interrogada, na verdade já sabia de antemão, mas não quis revelá-la a José Raimundo a fim de proteger a vítima; que a vítima havia fornecido a senha para a interrogada alguns dias antes quando tinham usado o cartão dela juntos; que no momento a interrogada não se recorda do número da senha da vítima; (...) que a vítima confidenciou a interrogada que tinha colocado como senha dos seus cartões de crédito a data de nascimento dela; (...) quando a interrogada chegou em casa, por volta de 21:00h aproximadamente, seu irmã 'desceu a compra', deixou-a no portão; que, José Raimundo, nesse momento estava calmo, e não estava com a arma na parte da frente sob sua calça; que ele cumprimentou Milton e ainda lhe presenteou com algumas mercadorias, pois sabia que Milton estava desempregado, e fazendo 'bicos'; que Milton agradeceu, colocou a mercadoria que ganhou de presente de José Raimundo, no veículo dele, se despediu e foi embora; que não chegou sequer a entrar na residência; que Milton não viu que o acusado José Raimundo mantinha uma arma de fogo em sua cintura, sob a camisa, na parte de trás de sua calça; (...)'' (grifei) (Sônia Lúcia das Neves f. 455-462)

''(...) que no dia 09 de março, dois dias depois dos fatos, o interrogado foi para Sacramento porque já tinha emprego arrumado na Panificadora Sacramento naquela cidade, acontece que enquanto esteve lá, Gleice foi muito ameaçado por José Raimundo (...) através de seus familiares, meses depois dos fatos, tomou conhecimento de que a acusada Sônia Lúcia, sua irmã, tinha um envolvimento amoroso com a vítima, inclusive ela era massagista de uma casa de massagem freqüentada pela vítima (...) que quando o interrogado deparou com José Raimundo na residência dele, na oportunidade em que foi deixar sua irmã e as mercadorias que ela havia comprado, constatou que ele tinha na cintura uma arma de fogo e que ele estava com a camisa aberta e muito agitado, muito 'bravo'; que nessa ocasião o interrogado só o cumprimentou, se despediu e foi embora; (...) que o interrogado deixou suas crianças com sua sogra, mesmo estando elas ameaçadas, porque pretendia levá-las para Luziânia tão logo tivesse condições; (...)'' (grifei) (Milton Antônio Neves f. 463-466)

''(...) em dado momento, a interrogada se retirou e foi para a sala, ver DVD e notou que a vítima e a acusada Sônia se deslocaram para o quarto, quando pode perceber que eles estava (sic) folheando álbum de fotografia; decorrido algum tempo, não sabe quanto, de repente, surgiu o acusado José Raimundo; ele estava bem 'alterado', 'transformado', e trazia algo na cintura; ele perguntou à interrogada pela acusada Sônia; a interrogada respondeu que ela estava 'lá para dentro' e ele foi atrás dela e já saiu com os dois do quarto com a arma apontada para eles; ora apontava a arma para a cabeça de um, ora apontava o revólver para a cabeça de outro e dizia 'que ela era uma vagabunda' que 'ela era uma sem vergonha', que 'ele queria dinheiro', que o 'chifre dele não ia ficar barato'; que a interrogada se assustou, se levantou para ir embora e ele determinou que não fosse e apontou a arma em sua direção; (...) José Raimundo subtraiu a carteira do bolso da vítima, retirou o dinheiro e colocou no seu bolso; retirou também o cartão de crédito que estava no bolso da vítima, da Caixa Econômica Federal, e exigiu-lhe a senha; que a vítima disse que não precisava fornecer a senha porque a acusada Sônia sabia; ela realmente confirmou que sabia a senha da vítima; (...)'' (grifei) (Gleice Fabiana da Silva f. 470-474)

Atente-se para o manuscrito da apelante Sônia Lúcia Neves à sua família, declarando o seu arrependimento:

''(...) eu cometi um erro grave e tenho que pagar por ele, não culpe o Raimundo, eu me perdi em uma relação complicada e acabou assim, envolvemos outras pessoas que também estão sofrendo (...) tenho vergonha de tudo e todos (...) eu errei e este erro nos separou (...)'' (f. 210-212v)

Com maestria José Frederico Marques leciona in verbis:

''(...) o inocente negará a imputação e poderá fazê-lo com absoluta competência, porque nenhum crime praticou. Ao culpado, a situação se apresentará mais difícil, porque a sua negativa mentirosa o obriga a rodeios e ginástica de dialética que acabarão por deixar vestígios e provas circunstanciais de real valor para o veredicto final dos órgãos jurisdicionais. (...)'' (Marques, José Frederico - Elementos de Direito Processual Penal, volume 1, Editora Bookseller: 1998, 1ª edição, página 299)

Verifica-se dessa forma diante da colisão entre as versões dos apelantes sobre o delito de extorsão qualificada praticado contra a vítima Wanderlino Eustáquio da Silva que a negativa de autoria dos mesmos restou desacreditada, revelando-se pelos depoimentos transcritos alhures a participação efetiva e necessária de todos na ação delitiva com explícita divisão de tarefas.

A propósito:

''(...) A teoria do domínio funcional do fato, adotada por um grande número de doutrinadores, resolve o problema com argumentos das teorias objetiva e subjetiva, acrescentando, ainda, um dado extremamente importante, qual seja, a chamada divisão de tarefas.

Quando nos referimos ao domínio do fato, não estamos querendo dizer que o agente deve ter o poder de evitar a prática da infração penal a qualquer custo, mas sim que, com relação à parte do plano criminoso que lhe foi atribuída, sobre esta deverá ter o domínio funcional. O domínio será, portanto, sobre as funções que lhe forem confiadas e que têm uma importância fundamental no cometimento da infração penal. (...)

Se autor é aquele que possui o domínio do fato, é o senhor de suas decisões, co-autores serão aqueles que têm o domínio funcional dos fatos, ou seja, dentro do conceito de divisão de tarefas, serão co-autores todos os que tiverem uma participação importante e necessária ao cometimento da infração, não se exigindo que todos sejam executores, isto é, que todos pratiquem a conduta descrita no núcleo do tipo. (...) Em última palavra, podemos falar em co-autoria quando houver a reunião de vários autores, cada qual com o domínio das funções que lhe foram atribuídas para a consecução final do fato, de acordo com o critério de divisão de tarefas. (...)'' (Greco, Rogério - Curso de Direito Penal, Editora Impetus: 2003, 3ª edição, páginas 479 e 481-482)

Observa-se ademais o conluio entre os ora apelantes para responsabilizar exclusivamente o corréu foragido José Raimundo Souza da Silva pela prática dos delitos de extorsão qualificada e destruição e ocultação de cadáver e se imiscuírem de culpa ao argumento da coação moral irresistível in verbis:

''(...) depois que ela forneceu a senha para José Raimundo, ele determinou que a interrogada e Gleice fossem sacar dinheiro com referidos cartões de crédito; que a interrogada o obedeceu com receio dele maltratar sua filha e até para proteger a vítima Wanderlino; (...) que conversaram a respeito do cheque acima mencionado quando José Raimundo disse que daria problema; a interrogada lhe fez alguma indagação e ele confessou que havia eliminado a vítima, mas não contou detalhes do fato; (...) não sabe quantos disparos foram efetuados contra a vítima por José Raimundo; que a interrogada estava na rua juntamente com Gleice, quando a vítima foi eliminada por José Raimundo; (...) que tem certeza de que, por duas vezes, já foragidos; José Raimundo efetuou ligação para o réu Rodrigo Silva solicitando-lhe que desaparecesse com o corpo da vítima; (...) depois que saiu de Uberaba só foi reencontrar com Gleice em Luisiânia, GO, meses depois dos fatos, quando relembraram uma à outra o que havia acontecido; (...) que não sabe por quanto tempo Milton e Gleice já estavam em Luiziânia quando ela chegou lá; que eles foram para lá por medo de José Raimundo; (...)'' (grifei) (Sônia Lúcia das Neves, f. 455-462)

''(...) Gleice foi muito ameaçado (sic) por José Raimundo, exatamente por causa do cheque de R$179,00 que Sõnia entregou ao supermercado como pagamento de compras feitas naquele estabelecimento quando estava em companhia de Gleice; (...) Gleice passou a ser ameaçada por José Raimundo; que o interrogado temeu pela vida dela e de seus filhos; (...) depois da prisão de Rodrigo Silva Araújo, quando se encontraram presos na delegacia de polícia é que ele disse ao interrogado que José Raimundo lhe confessou que havia praticado o crime e que era para ele ir lá e 'sumir com o corpo da vítima'; (...)'' (Milton Antônio Neves f. 463-466)

''(...) que a vítima disse que não precisava fornecer a senha porque a acusada Sônia sabia; ela realmente confirmou que sabia a senha da vítima; então José Raimundo determinou que ela sacasse dinheiro com o referido cartão de crédito e determinou ainda que a interrogada a acompanhasse e a levasse em sua motinha; a interrogada, sem outra alternativa, diante das ameaças de José Raimundo aos seus filhos, o obedeceu; (Gleice Fabiana da Silva f. 470-474)

A suposta coação moral irresistível sustentada pelas defesas dos apelantes não passa entretanto de mera alegação porquanto inexiste qualquer prova neste sentido.

Os ora apelantes aliás alegaram a perpetração de ameaças a si próprios e a seus filhos pelo corréu José Raimundo Souza da Silva mas estranhamente evadiram-se do distrito da culpa sem a referida prole e em momento algum requereram proteção policial.

Não se desincumbiu a defesa data venia do ônus de provar a existência da ameaça geradora da coação moral irresistível ao contrário percebe-se claramente que os apelantes agiram de forma deliberada e livre no evento delituoso revelando união de desígnios e divisão de tarefas uma vez que sendo cabível a qualquer um deles contatar a polícia para impedir a consumação dos delitos assim não procederam.

É a jurisprudência:

"Exige-se para a admissão da coação moral irresistível, como causa de exclusão da culpabilidade, prova efetiva da sua existência"(TAPR - Apelação criminal nº 0073579300 - Rel. Juiz Tufi Maron Filho - 3ª Câmara Criminal - j. 18/04/95 -)

"Para poder ser reconhecida a coação moral irresistível, perseguida pelo apelante, a mesma somente poderá ser aceita e reconhecida se calcada em prova maciça e imbatível, cabalmente demonstrada pelo denunciado no transcorrer do procedimento penal" (TAPR - Apelação Criminal nº 121199400 - Rel. Juiz Hirose Zeni - 3ª Câmara Criminal - j. 03/11/98).

Importante consignar ainda a farta prova documental a comprovar os saques indevidos perpetrados pelos apelantes como os extratos bancários da conta da vítima (f. 17-23 e 74-78) e a cópia do cheque repassado pela apelante Sônia Lúcia das Neves para complementar o valor das compras realizadas com o cartão da vítima em um supermercado (f. 43), sem falar as imagens de f. 53-63 que revelam as apelantes Sônia Lúcia das Neves e Gleice Fabiana da Silva ocultando os rostos com capacetes para a realização dos saques indevidos com o cartão da vítima em caixas eletrônicos.

Colaborando também na certeza das autorias vislumbra-se o reconhecimento dos apelantes Milton Antônio Neves e Gleice Fabiana da Silva por testemunhas em sede de auto de reconhecimento às f. 121-123, sendo a apelante Sônia Lúcia das Neves reconhecida ainda sob o crivo do contraditório pela testemunha Neide Botta (f. 540).

Infere-se lado outro a prática do delito de destruição e ocultação de cadáver pelos apelantes diante do laudo pericial que demonstrou que a terra da residência da apelante Sônia Lúcia das Neves não estava compactada (f. 293-294) e pelo testemunho de Donizete Pereira da Silva vizinho que ouviu o disparo de arma de fogo na data dos fatos e barulhos de escavação no dia seguinte ao fato assim como Sebastião Divino (f. 251-251v e 249).

Neste contexto e considerando a forma como os fatos se sucederam, afigurando-se incontestes a autoria e a materialidade dos delitos de extorsão qualificada pelo resultado morte e ocultação e destruição de cadáver não há como emergir um decreto absolutório por falta de provas ou mesmo pelo reconhecimento de coação moral irresistível.

Assinala a jurisprudência em caso análogo:

"APELAÇÃO CRIMINAL - LATROCÍNIO - PROVAS SUFICIENTES DE AUTORIA - CONDENAÇÃO - PREVISIBILIDADE DO EVENTO MAIS GRAVE - DIVISÃO DE TAREFAS EVIDENCIANDO COMPARTILHAMENTO SUBJETIVO DAS CONSEQUÊNCIAS MAIS DANOSAS - DOLO EVENTUAL - PROGRESSÃO DE REGIME - CRIME HEDIONDO - ARTIGO 2º, § 1º, DA LEI 8.072/90 - CONSTITUCIONALIDADE. Se o conjunto probatório lastreado na palavra da vítima e testemunhas presenciais comprova a autoria e a materialidade do latrocínio, a condenação é de rigor . (...)" (Apelação Criminal nº 1.0079.03.060884-2/001, Rel. Des. Alexandre Victor de Carvalho, 5ª Câmara Criminal do TJMG, DJ 27 de Março de 2007).

Inadmissível por fim o acolhimento da tese defensiva de desclassificação da conduta de Sônia Lúcia das Neves para o delito de furto simples.

Vislumbrando-se o constrangimento da vítima a fornecer a senha eletrônica de seu cartão bancário diante de grave ameaça com utilização de violência que acarretou o resultado morte restando plenamente comprovado o dolo de auferir indevida vantagem econômica deve ser mantida a capitulação dada aos fatos por configurar extorsão qualificada.

Ressalte-se que a pena foi corretamente fixada pelo MM. Juiz a quo obedecendo aos ditames do artigo 59 e 68 do Código Penal inexistindo assim qualquer alteração a ser realizada por este Tribunal.

Ante o exposto NEGO PROVIMENTO aos recursos, mantendo in totum as disposições da r. sentença.

Custas ex lege.

É como voto.

O SR. DES. ADILSON LAMOUNIER:

VOTO

De acordo.

O SR. DES. EDUARDO MACHADO:

VOTO

De acordo.

SÚMULA: NEGARAM PROVIMENTO AOS RECURSOS.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1.0701.07.184687-0/001





JURID - Penal. Extorsão Qualificada pelo resultado morte. [04/03/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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