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terça-feira, 16 de março de 2010

JURID - Penal. Estelionato. Fato não comprovado. Absolvição. [16/03/10] - Jurisprudência


Penal. Estelionato. Fato não comprovado. Absolvição.

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios - TJDFT

406947

Órgão: Segunda Turma Criminal

Classe: APR - Apelação Criminal

Nº. Processo: 2006.01.1.065021-2

Apelante: JOSÉ DE ARIMATÉIA DO NASCIMENTO OLIVEIRA

Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS

Relator Des.: CÉSAR LOYOLA

Revisor Des.: LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA

EMENTA

PENAL. ESTELIONATO. FATO NÃO COMPROVADO. ABSOLVIÇÃO. Se os elementos colhidos nos autos são insuficientes quanto a existência do fato narrado na denúncia, impõe-se absolver o réu com fulcro no artigo 386, II, do Código de Processo Penal.

Recurso provido.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores da Segunda Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, CÉSAR LOYOLA - Relator, LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA - Revisor, JOÃO TIMÓTEO - Vogal, sob a presidência do Desembargador ARNOLDO CAMANHO, em DAR PROVIMENTO. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília-DF, 17 de dezembro de 2009.

Desembargador CÉSAR LOYOLA
Relator

RELATÓRIO

O réu JOSÉ DE ARIMATÉIA DO NASCIMENTO OLIVEIRA foi denunciado como incurso nas penas do artigo 157, § 2º, II, do CP, nos seguintes termos:

"No dia 04 de julho de 2006, por volta das 02h50mim, na rodoviária do Plano Piloto, nesta capital, os denunciados, em unidade de desígnios, aproximaram-se de ADENOR SANTOS DE MATOS, e mediante o uso de violência física, subtraíram um celular.

Noticiam os autos que JOSÉ DE ARIMATÉIA e ANTÔNIO, consciente e voluntariamente, aproximaram-se da vítima, demonstrando interesse na aquisição de celular Siemens oferecido à venda por ela, porém, quando receberam aquele bem, desferiram vários chutes em ADENOR, com o intuito de garantir a detenção do celular, em proveito de ambos,e a seguir determinaram que ela corresse."

Após a instrução, o MM. Juiz a quo proferiu sentença julgando parcialmente procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia para condenar o réu pela prática do crime descrito no artigo 171, caput, do Código Penal, à pena de 1 (um) ano de reclusão, em regime aberto, e multa de 10 (dez) dias-multa à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, tendo sido a pena restritiva de liberdade substituída por uma restritiva de direitos a critério do Juízo da VEC/CEPEMA.

Inconformado, apelou o acusado. Em suas razões, busca a absolvição com base no art. 386, III, do CPP e no princípio in dubio pro reo, discorrendo sobre a impossibilidade de subsunção da conduta aos crimes previstos nos artigos 157, § 2º, II, art. 157, caput, 155, 168 e 171, todos do Código Penal. Alega, em resumo, que o que ocorreu, na realidade, é que a vítima vendeu o aparelho celular, ficando ajustado que o valor devido seria pago àquela posteriormente. Contudo, a vítima quis desfazer o negócio, mas o acusado não concordou e se recusou a devolver-lhe o bem. Assim, aduz que a questão deve ser dirimida na esfera cível, não constituindo o fato qualquer ilícito penal.

Em contra-razões, o Ministério Público aduz que o recurso deve ser conhecido apenas no que diz respeito ao crime de estelionato, não havendo interesse recursal com relação aos demais delitos citados pelo apelante, eis que não houve sucumbência nestes pontos. No mérito, opinou pela manutenção da sentença (fls. 205/213).

Parecer da Procuradoria de Justiça, no mesmo sentido, pugnando pelo parcial conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 217/220).

É o relatório.

VOTOS

O Senhor Desembargador CÉSAR LOYOLA - Relator

Em preliminar, o Ministério Público alega que o recurso deve ser parcialmente conhecido, uma vez que os argumentos apresentados pelo apelante quanto à inexistência dos crimes previstos nos artigos 157, § 2º, II, art. 157, caput, 155, 168, todos do Código Penal, foram acolhidos na sentença, não havendo, assim, interesse recursal na matéria relacionada a tais crimes.

Entretanto, entendo que o apelante, ao discorrer sobre os mencionados delitos, apenas quis ressaltar que a conduta em questão não se subsume a qualquer tipo penal, pretendendo, assim, demonstrar a atipicidade de seus atos.

Ademais, em grau de apelação, o Tribunal pode reformar a sentença para desclassificar o delito, mostrando-se, portanto, pertinentes as observações do réu para o julgamento do recurso.

Assim, conheço integralmente da apelação, vez que presentes os pressupostos de admissibilidade.

O acusado foi condenado pela prática do crime de estelionato. Entendeu o MMºJuiz a quo haver prova de que a vítima entregou o aparelho celular voluntariamente ao réu, que por sua vez, para obtê-lo, utilizou-se de fraude, consistente na manifestação de que desejava comprar o bem, quando na verdade queria obtê-lo sem pagamento.

Entretanto, com a devida vênia, tenho que tal fato não ficou devidamente evidenciado pelas provas carreadas aos autos.

Na fase policial, a vítima relatou que após entregar o bem ao apelante, a título de venda, este e o co-réu Antonio Francisco de Sousa lhe agrediram com chutes, ordenando-lhe que corresse, sob a ameaça de novas agressões (fl. 08). Contudo, a vítima não foi ouvida em Juízo para que pudesse confirmar suas declarações sob o crivo do contraditório, tampouco as agressões que diz ter sofrido restaram comprovadas.

Em Juízo, o acusado afirmou que a vítima lhe ofereceu o aparelho celular para compra, tendo aceitado e avisado que iria lhe pagar posteriormente, pois teria que pegar o dinheiro emprestado de um amigo. Mais tarde, a vítima quis desfazer o negócio, mas não aceitou e permaneceu com o bem. Logo depois, ainda na Rodoviária, os policiais o abordaram (fls. 50/51).

O co-réu Antônio Francisco de Souza disse não ter presenciado tal transação (fl. 52).

Os policiais Marcel Lara Fernandes e Jailton Alves Barreto relataram que a vítima lhes abordou noticiando que havia sido roubada e indicou o lugar onde os autores do roubo estariam. Lá chegando, conduziram o apelante ao posto policial, quando verificaram que ele estava na posse do aparelho celular da vítima (fls. 66 e 88).

As demais testemunhas ouvidas em Juízo nada esclareceram sobre o fato, eis que não o presenciaram.

Diante deste quadro, vê-se que restou comprovado apenas que o réu estava na posse do aparelho celular da vítima. Porém, não há qualquer elemento nos autos que permita esclarecer a verdade dos fatos, se ele realmente ludibriou a vítima ou mesmo a agrediu para impedi-la de reaver seu bem, eis que neste sentido tem-se somente a palavra da vítima em sede de inquérito, que, como, é cediço, não pode ser considerada isoladamente, sem espeque em qualquer outra prova, mesmo porque, não exclui a possibilidade dos fatos terem ocorrido na forma relatada pelo ora apelante.

Embora o policial Marcel Lara Fernandes tenha afirmado, em Juízo, que o bem foi encontrado dentro da cueca do apelante, tal circunstância não é apta a demonstrar que o réu tenha praticado algum crime contra a vítima, pois é possível que o acusado o tenha escondido apenas por não querer desfazer o negócio anteriormente avençado com a vítima, conforme relatou em seu interrogatório. Ademais, o mesmo policial, ao ser ouvido na fase de inquérito, não especificou o local onde o celular foi localizado e, segundo consta na Comunicação de Ocorrência Policial, o bem teria sido encontrado no bolso da calça do apelante (fl. 31).

Os elementos coligidos nos autos, portanto, são insuficientes para elucidação do fato descrito na denúncia, não demonstram nem mesmo se houve a prática de algum crime, pois não restou esclarecido como o réu obteve a posse do aparelho celular.

Impõe-se, assim, a absolvição do acusado, eis que não há prova apta a evidenciar a existência do fato considerado típico na sentença condenatória.

Diante do exposto, DOU provimento ao recurso para absolver o acusado José de Arimatéia do Nascimento Oliveira, com fulcro no art. 386, II, do CPP.

É o voto.

O Senhor Desembargador LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA - Revisor

Adoto o relatório do i. Relator.

Trata-se de recurso interposto contra sentença que condenou JOSÉ DE ARIMATÉIA DO NASCIMENTO OLIVEIRA como incurso nas penas do artigo 157, §2º, II, do Código Penal à pena de 01 (um) ano e 10 (dez) dias multa no regime aberto.

Sustenta o recorrente, que não existe prova do concurso de pessoas, tendo o co-réu sido, inclusive, absolvido. A ausência das elementares do crime de roubo, mais especificamente a violência, já que a vítima não foi encaminhada ao IML e aparentemente as testemunhas não visualizaram qualquer sinal de agressão. Negou a possibilidade de enquadramento de furto, mesmo mediante fraude, porque não houve subtração da coisa, mas mero desacerto quanto a compra e venda do aparelho telefônico, sua posse e o momento do seu pagamento. Sob a mesma alegação, rechaçou a possibilidade de ter havido a apropriação indébita ou estelionato. Por fim, invocou o princípio in dubio pro reo, para galgar a absolvição.

O Apelante foi denunciado pelo crime previsto no artigo 157, § 2º, inciso II (concurso de pessoas), porque, na Rodoviária de Plano Piloto, juntamente com ANTÔNIO FRANCISCO SOUSA, teria agido mediante violência (chutes), para subtrair o telefone celular de ADENOR SANTOS DE MATOS.

Concluída a instrução, os policiais militares MARCEL LARA FERNANDES (fl. 66), JAILTON ALVES BARRETO (fl. 88), PAULO ROBERTO RIBEIRO DA SILVA (fl. 89), responsáveis pela prisão em flagrante dos denunciados, disseram que foram acionados pela vítima, quem informou que estaria vendendo seu aparelho celular, quando os réus se aproximaram e mostraram interesse em adquiri-lo. Tão logo receberam o aparelho, agrediram a vítima com chutes, para ela fugir e ficarem com o objeto.

José Arimatéia informou que havia negociado a compra do aparelho com ADENOR e aguardava apenas a chegada de conhecido, junto a quem esperava conseguir o empréstimo para pagar o respectivo preço. Já ANTÔNIO FRANCISCO disse que nada sabia a respeito das transações envolvendo o co-réu e a vítima.

O objeto foi apreendido na posse de JOSÉ ARIMATÉA, conforme por ele admitido, o que foi corroborado pela prova testemunhal.

A vítima não foi ouvida, porque teria retornado ao seu Estado de origem, a Bahia.

O juiz entendeu que não se trata de crime de roubo, mas de estelionato, em cujo delito condenou o acusado. Segundo os fundamentos lançados, a vítima teria sido induzida a erro, mediante ardil, quando o réu a abordou dizendo que pretendia comprar seu aparelho, mas sem efetuar o pagamento, obteve a sua posse, o que caracteriza a vantagem ilícita.

Primeiramente, vê-se que a sentença padece de sério vício, que lhe fulmina de nulidade. Isto porque não respeitou o princípio da congruência, na medida em que a acusação imposta ao recorrente foi por crime de roubo, em concurso, mas sua condenação resultou em condenação por estelionato. Entendeu o juízo a quo, que o acusado teria agido mediante fraude - suposto interesse em adquirir a coisa - para obter a vantagem ilícita, a posse da coisa.

As elementares do crime de roubo são totalmente diversas daquelas que descrevem o tipo de estelionato e que resultou na condenação do denunciado.

Ainda que vigore no processo penal o princípio da livre dicção do direito (art. 383, CPP), em respeito ao princípio do devido processual legal e do contraditório, era preciso aplicar o artigo 384 do diploma processual, diante da possibilidade de nova definição jurídica do fato, em decorrência de prova de circunstância elementar não contida explícita ou implicitamente na denúncia.

Porém, deixo de proceder à anulação da sentença, em razão do princípio de que a nulidade não será pronunciada e nem repetido o ato processual, se possível o julgamento do mérito a favor da parte a quem aproveite a declaração de nulidade.

Este é o caso presente. A prova colhida não assegura um juízo seguro condenatório. As versões apresentadas pela vítima na delegacia e o autuado, que as renovou em juízo, são colidentes, não existindo outros elementos de convencimento que permitam concluir em favor de um ou outro.

Os policiais apenas procederam e testemunharam a apreensão do telefone na posse de JOSÉ ARIMATÉIA, sem que daí resulte a possibilidade de qualquer outra conclusão, ou seja, que o aparelho tenha sido arrebatado da posse da vítima, ou por ela entregue após um contrato verbal de compra e venda, seguido do arrependimento, conforme alegou o réu.

Resta uma indagação indissolúvel pelo conjunto probatório: estar-se-ia diante de um ilícito penal ou civil?

A vítima não foi ouvida, porque mudou de endereço. Os policiais não presenciaram as circunstâncias que levaram a entrega ou a retirada do aparelho da posse do seu proprietário. O aparelho foi arrebatado? Ou espontaneamente entregue?

As narrativas, quanto a esta fase do iter criminis¸ foi apenas de remissão às informações que teriam sido dirigidas pelas vítima, quando solicitou o apoio da polícia, para recuperar o telefone. São testemunhas indiretas ou "por ouvir dizer", prova esta sem qualquer valor jurídico-processual, conforme remansosa jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

COMPETÊNCIA - HABEAS CORPUS - ATO DE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Na dicção da ilustrada maioria (seis votos a favor e cinco contra), entendimento em relação ao qual guardo reservas, compete ao Supremo Tribunal Federal julgar habeas corpus impetrado contra ato de tribunal, tenha este, ou não, qualificação de superior. TRÁFICO DE ENTORPECENTES - PROVA. Toda e qualquer condenação criminal há de fazer-se alicerçada em prova robusta. Indícios e o fato de se ouvir dizer que o acusado seria um traficante de drogas não respaldam pronunciamento judicial condenatório, o mesmo devendo ser dito em relação a depoimentos colhidos na fase policial e não confirmados em juízo. A posse de pequena quantidade de droga resolve-se no sentido não do tráfico, mas do consumo de substância entorpecente pelo agente. (HC 77987 / MG).

A impossibilidade de se assegurar o exercício pleno do contraditório, apurar a fidelidade da declaração do testemunho indireto com a verdade, são fatores que repugnam a aceitação dessa prova dentro do processo, como bastante e suficiente para a condenação.

Diante desse quadro, torna-se despiciendo abordar as outras teses ventiladas pela defesa, quanto à inocorrência dos crimes de roubo, furto, apropriação indébita ou mesmo estelionato.

Ante o exposto dou provimento ao recurso para, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, julgar improcedente o pedido lançado na denúncia e ABSOLVER o Apelado da imputação de infringir o art. 157, § 2º, inciso II do Código de Processo Penal.

É como voto.

O Senhor Desembargador JOÃO TIMÓTEO - Vogal

Com Relator.

DECISÃO

Deu-se provimento. Unânime.





JURID - Penal. Estelionato. Fato não comprovado. Absolvição. [16/03/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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