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segunda-feira, 8 de março de 2010

JURID - Índios denunciados perante a justiça estadual por furto. [08/03/10] - Jurisprudência


RO em Habeas Corpus. Índios denunciados perante a justiça estadual por furto qualificado. Disputa de direitos indígenas.

Superior Tribunal de Justiça - STJ

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 24.732 - ES (2008/0233367-6)

RELATOR: MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

RECORRENTE: EMERSON CORREA PAJEHU

RECORRENTE: JULIANDERSON BENEDITO OLIVEIRA (PRESO)

RECORRENTE: ELVIS DHONY RIBEIRO MORAES SIZENANDO (PRESO)

RECORRENTE: GILCIMAR BENEDITO OLIVEIRA (PRESO)

RECORRENTE: GILSON PEREIRA DE OLIVEIRA

RECORRENTE: JAIRO SOARES GOMES (PRESO)

RECORRENTE: GUILHERME DOS SANTOS ROCHA (PRESO)

RECORRENTE: ADINATE DE JESUS NEVES (PRESO)

RECORRENTE: MARCELO DE OLIVEIRA CONCEIÇÃO (PRESO)

RECORRENTE: EDIVALDO LEMOS DA SILVA (PRESO)

RECORRENTE: ROQUE SARTE (PRESO)

RECORRENTE: LUIZ CARLOS MARCELINO DOS ANJOS (PRESO)

RECORRENTE: MARCELO PEREIRA LOPES (PRESO)

RECORRENTE: JOCIMAR BENEDITO OLIVEIRA (PRESO)

RECORRENTE: MARCOS DA SILVA OLIVEIRA (PRESO)

RECORRENTE: ELCIANO ALVES CLAUDINO (PRESO)

RECORRENTE: ANTÔNIO COELHO DE SOUZA FILHO (PRESO)

RECORRENTE: ALCEBÍADES BENEDITO DE OLIVEIRA (PRESO)

ADVOGADO: ANTÔNIO CAVALIERE GOMES

RECORRIDO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

EMENTA

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ÍNDIOS DENUNCIADOS PERANTE A JUSTIÇA ESTADUAL POR FURTO QUALIFICADO. DISPUTA DE DIREITOS INDÍGENAS. LOCAL DO FATO OBJETO DE AÇÃO POSSESSÓRIA JULGADA NA JUSTIÇA FEDERAL, QUE RECONHECEU SUA NATUREZA INDÍGENA. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. DESLOCAMENTO DOS AUTOS PARA A JUSTIÇA FEDERAL. AFASTAMENTO DA SÚMULA 140/STJ. PARECER DO MPF PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO, PARA DETERMINAR A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DO FEITO, ONDE DEVERÁ SER ANALISADA A NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA DOS RECORRENTES.

1.A definição da competência criminal para o processamento e julgamento dos crimes praticados por ou contra indígenas requer a análise do fato delituoso à luz da disciplina constitucional outorgada aos índios, notadamente em seus arts. 109, XI, 231 e 232.
2.No caso dos autos, noticia o impetrante que o local onde houve as prisões em flagrante é objeto de ações possessórias perante a Justiça Federal, as quais já foram julgadas, em que foram partes a suposta vítima, Aracruz Celulose S/A, e representantes da comunidade indígena da qual fazem parte os pacientes, devidamente representados pela FUNAI, tendo sido reconhecida sua natureza indígena.

3.Neste diapasão, e considerando a tutela constitucional dos direitos e interesses indígenas, seria de bom alvitre que o processamento e julgamento do fato delituoso em apuração fossem realizados perante a Justiça Federal, que, inclusive, terá maiores subsídios para determinar se o local onde ocorreu a suposta subtração de madeira é ou não território indígena. Afastada, portanto, a Súmula 140 deste STJ.

4.Parecer ministerial pelo desprovimento do recurso.

5.Recurso parcialmente provido, determinando-se o deslocamento dos autos do Processo 006.06.005528-9 para a Justiça Federal, Seção Judiciária do Espírito Santo, onde deverá ser analisada a necessidade de manutenção da prisão preventiva dos recorrentes, anulando-se todos os atos decisórios eventualmente produzidos, mantidos os de caráter instrutório.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Laurita Vaz e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

Brasília/DF, 04 de fevereiro de 2010 (Data do Julgamento).

NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
MINISTRO RELATOR

RELATÓRIO

1.Trata-se de Recurso Ordinário em Habeas Corpus interposto por EMERSON CORREA PAJEHU e outros, em adversidade ao acórdão proferido pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, que denegou a ordem em writ ali impetrado, com a seguinte ementa:

HABEAS CORPUS. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA APRECIAÇÃO DA MATÉRIA. CAUSA RELACIONADA COM A RAÇA INDÍGENA: INOCORRÊNCIA. AÇÃO PENAL VERSANDO SOBRE A AÇÃO DELITUOSA PRATICADA POR ÍNDIO DE FORMA INDIVIDUAL. FURTO QUALIFICADO. ORDEM DENEGADA.

1.O fato da área em que a madeira foi supostamente furtada estar sendo objeto de uma ação de reintegração de posse em curso junto à Justiça Federal onde se discute se a mesma é tradicionalmente indígena, não é causa suficiente para se deslocar a competência do feito da Justiça Estadual. O contexto fático que gerou o incidente que culminou na prisão dos pacientes não teve como circunstância uma ação a ser interpretada como disputa sobre direitos indígenas definidos no artigo 231, da Carta Magna, cuja competência, nos termos do artigo 109, inciso XI, da Constituição Federal, seria da Justiça Federal. Os atos tratados nos autos não tem nenhuma relação com a reivindicação dos indígenas pelo reconhecimento da propriedade da terra e sua decorrente demarcação. A ação somente seria legítima se a terra já estivesse legalmente reconhecida como indígena, porém, a titularidade da gleba ainda está sub judice, não sendo lógico ou jurídico vincular os atos narrados nos autos à reivindicação quanto a propriedade das terras, daí a impossibilidade da transformação de um fato delituoso comum em um conflito étnico, pois, os mesmos não possuem esta conotação. A ação dos acusados não tem qualquer ligação com a garantia constitucional dos direitos da raça, não configurando assim crime referente a causa do índio, não se falando, pois, em direitos resguardados no artigo 231 da Carta Republicana. O pretendido deslocamento da competência para a Justiça Federal, somente possui relevância quando a demanda trata das questões ligadas à cultura indígena e aos direitos sobre suas terras, ou seja, o inciso XI do artigo 109, da Constituição Federal, só tem aplicação para determinar a competência da Justiça Federal quando a controvérsia cingir-se à disputa sobre estes direitos previstos no artigo 231 da Constituição Federal, não abarcando, assim, os delitos isolados praticados sem qualquer envolvimento com a questão étnica. Matéria sumulada junto ao Superior Tribunal de Justiça, pelo verbete 140.

2.Ordem denegada (fls. 54/55).

2.Colhe-se dos autos que os pacientes foram denunciados por suposta infração à norma do art. 155, § 4o., IV e art. 288 do CPB (furto qualificado e formação de quadrilha), após serem presos em flagrante delito em 09.08.06.

3.No presente writ, alega-se a incompetência da Justiça Estadual para o processo e julgamento do referido crime, uma vez que praticado em local cuja posse é objeto de disputa pelos pacientes, indígenas, junto à suposta vítima, Aracruz Celulose S/A, o que determinaria a competência da Justiça Federal para a causa. Requer-se, ao final, o trancamento da ação penal.

4.Assevera o impetrante, em síntese, que (...) todo o imbróglio envolve questão fundiária, havendo controvérsias sobre legitimidade de propriedade privada de terras, ações possessórias e alegações defensivas de que os réus estavam, na verdade, trabalhando na própria terra indígena, a qual, por sua vez, é vizinha à área litigiosa e a terras de regular propriedade da empresa (fls. 66).

5.Em arremate, afirma-se que se o fato envolver de alguma forma direitos indígenas consagrados pela Constituição (como o direito à terra, no presente caso), a competência será da Justiça Federal (fls. 67).

6.O MPF, em parecer da lavra do ilustre Subprocurador-Geral da República JOÃO PEDRO DE SABOIA BANDEIRA DE MELLO FILHO, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 94/98).

7.É o que havia de relevante para relatar.

VOTO

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ÍNDIOS DENUNCIADOS PERANTE A JUSTIÇA ESTADUAL POR FURTO QUALIFICADO. DISPUTA DE DIREITOS INDÍGENAS. LOCAL DO FATO OBJETO DE AÇÃO POSSESSÓRIA JULGADA NA JUSTIÇA FEDERAL, QUE RECONHECEU SUA NATUREZA INDÍGENA. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. DESLOCAMENTO DOS AUTOS PARA A JUSTIÇA FEDERAL. AFASTAMENTO DA SÚMULA 140/STJ. PARECER DO MPF PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO, PARA DETERMINAR A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DO FEITO, ONDE DEVERÁ SER ANALISADA A NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA DOS RECORRENTES.

1.A definição da competência criminal para o processamento e julgamento dos crimes praticados por ou contra indígenas requer a análise do fato delituoso à luz da disciplina constitucional outorgada aos índios, notadamente em seus arts. 109, XI, 231 e 232.

2.No caso dos autos, noticia o impetrante que o local onde houve as prisões em flagrante é objeto de ações possessórias perante a Justiça Federal, as quais já foram julgadas, em que foram partes a suposta vítima, Aracruz Celulose S/A, e representantes da comunidade indígena da qual fazem parte os pacientes, devidamente representados pela FUNAI, tendo sido reconhecida sua natureza indígena.

3.Neste diapasão, e considerando a tutela constitucional dos direitos e interesses indígenas, seria de bom alvitre que o processamento e julgamento do fato delituoso em apuração fossem realizados perante a Justiça Federal, que, inclusive, terá maiores subsídios para determinar se o local onde ocorreu a suposta subtração de madeira é ou não território indígena. Afastada, portanto, a Súmula 140 deste STJ.

4.Parecer ministerial pelo desprovimento do recurso.

5.Recurso parcialmente provido, determinando-se o deslocamento dos autos do Processo 006.06.005528-9 para a Justiça Federal, Seção Judiciária do Espírito Santo, onde deverá ser analisada a necessidade de manutenção da prisão preventiva dos recorrentes, anulando-se todos os atos decisórios eventualmente produzidos, mantidos os de caráter instrutório.

1.Cuida-se de Recurso Ordinário em Habeas Corpus em que se discute a competência para o processamento e julgamento do crime de furto qualificado praticado por índios. Pretende o impetrante o deslocamento dos autos do Processo 006.06.005528-9 para a Justiça Federal, pois entende ser absolutamente incompetente a Justiça Estadual.

2.Segundo informações prestadas pelo Juízo de Direito processante:

(...) esses fatos se deram no limite entre terras indígenas já reconhecidas e terras da Aracruz Celulose S/A. O que separa as duas propriedades é uma rudimentar estrada não pavimentada. O que se apurou até aqui dá conta de que, além de supostamente retirarem madeira de terra indígena, legalmente, os pacientes também retiram, às escondidas, madeira da Aracruz Celulose S/A em área anexa, onde há muitas árvores de eucalipto derrubadas, sem que a derrubada tenha sido feita pela empresa mencionada (fls. 21).

3.A respeito da competência, é consabido que sua delimitação é realizada, primeiramente, pela Constituição da República. Embora se trate de matéria criminal, no caso dos autos, a definição do Juízo competente passa, necessariamente, pela análise do conteúdo e da teleologia presentes no art. 109, XI da Constituição da República, que apregoa a competência dos Juízes Federais para processar e julgar a disputa sobre direitos indígenas. A competência da Justiça Estadual, que é residual, somente será afirmada no caso de uma resposta negativa ao critério enunciado pelo referido artigo.

4.Em precioso estudo sobre o tema, Manoel Lauro Volkmer de Castilho acentua que:

A disputa sobre direitos ou interesses indígenas, na ausência de um conteúdo técnico-jurídico preciso, como parece intuitivo, terá de ser definida a partir do conteúdo material dos fatos a que se referir. Mostra-se no entanto razoável sustentar que a verdadeira visão dos direitos e interesses indígenas só pode ser obtida pela adequada interpretação dos artigos 231 e 232 da CF, cuja função e redação no texto fundamental revelam que foi instituído um regime jurídico constitucional próprio dos indígenas a que, por sua vez, devem obediência os textos legais de hierarquia inferior. É assim a partir da interpretação e aplicação dos princípios desses dois preceptivos que se haverão de interpretar, na seqüência, as leis e normas infraconstitucionais, sempre desprezadas a interpretação ou a jurisprudência que resultar em negação ou diminuição dos propósitos contidos no mencionado Capítulo VIII do Título VIII da Constituição de 5 de outubro de 1988.

Visto desse modo, tudo o que se tiver de sustentar a respeito dos direitos ou interesses indígenas deve ser lido, pensado e compreendido necessariamente nessa perspectiva constitucional, para daí então se extraírem as demais conseqüências decorrentes. Em outros termos, revela-se essencial a exata compreensão desse regime jurídico em toda a sua extensão, como pressuposto fundamental para a correta inteligência da norma constitucional, e para tanto é preciso primeiro entender o que estabeleceu a Constituição para depois averiguar se a lei e a jurisprudência vão no mesmo sentido (A competência nos crimes praticados por ou contra indígenas, v. 52, n. 316, Revista Jurídica 2004, p. 82/97).

5.Analisando o tema à luz da jurisprudência pátria, percebe-se que há decisões distintas no âmbito do STF e do STJ. Este último, pacificando a questão em nível infraconstitucional, editou o enunciado 140 de sua Súmula, que diz: compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime em que o indígena figure como autor ou vítima (RT 716/498).

6.Todavia, em se tratando de matéria constitucional, a última palavra será sempre do STF. Ocorre que este ainda não se posicionou de forma definitiva a respeito (v.g. HC 65.912-8/MG, DJU 24.06.88; RE 179.485/AM, RTJ 158/736; HC 71.835/MS, RTJ 161/878; RE 192.473-0/RR, DJU 29.08.97; HC 75.404-0/DF, LEX 271/313; RE 206.608/RR, RTJ 170/973, dentre outros). Nos dizeres do ilustre Desembargador do TRF da 4a. Região:

(...) os precedentes têm se orientado pelo caso concreto e pelas circunstâncias próprias do evento criminoso submetido a julgamento, sendo que a lógica das decisões tem atendido a cogitações de senso comum e esquecido a necessária aplicação do regime jurídico indígena derivado de suas tradições, crenças, costumes, organização social e direitos originários sobre suas terras que a Constituição formalmente reconheceu e protege (A competência nos crimes praticados por ou contra indígenas, op. cit.).

7.Por mais díspares que sejam os precedentes, nestes incluídos, também, os oriundos do extinto Tribunal Federal de Recursos (v.g. HC 7.292/AM, DJU 22.08.88; CC 7.895/AL, DJU 12.05.88; CC 4.122/RS, DJU 27.11.80), não se pode olvidar do imperativo contido no art. 231 da CF, que, inovando em relação às Constituições anteriores, estabeleceu serem reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

8.O eminente Subprocurador-Geral da República CLÁUDIO LEMOS FONTELES, ao meditar sobre o conteúdo da regra contida no art. 109, XI da CF, pronunciou-se nos seguintes termos:

E, no que se estuda presentemente, o preceito processual do inciso XI, do artigo 109, da Constituição Federal de 1988 operacionaliza o artigo 231, caput, que abre o tratamento constitucional dedicado aos índios preceituando claramente que, verbis:

(...).

Este preceito dá vida ao pensamento sempre lúcido do eminente jurista Vitor Nunes Leal, citado pela antropóloga Bruna Franchetto no livro de ensaios Sociedades Indígenas e o Direito, uma questão de direitos humanos, verbis:

Aqui não se trata do direito de propriedade comum: o que se reservou foi o território dos índios (...) Não está em jogo, propriamente, um conceito de posse, nem de domínio no sentido civilista dos vocabulários; trata-se do habitat de um povo. Se os índios, na data da Constituição Federal ocupavam determinado território, porque desse território tiravam seus recursos alimentícios, embora sem terem construções ou obras permanentes que testemunhassem posse de acordo com o nosso conceito, essa área, na qual e da qual viviam, era necessária à sua subsistência (...) A Constituição Federal dispôs sobre o assunto e retirou ao Estado qualquer possibilidade de reduzir a área que, na época da Constituição, era ocupada pelos índios, ocupada no sentido de utilizada por eles como seu ambiente ecológico (obra citada, p. 107, grifamos).

(...).

Ora, como dissemos antes, porque o art. 231, caput, da Constituição Federal impõe à União o dever de preservar as populações indígenas, preservando, sem ordem de preferência, mas, na realidade existencial do conjunto, sua cultura, sua terra, sua vida, e porque o inciso IX, do art. 109, da mesma Carta, que o primeiro operacionaliza, marca na Justiça Federal de 1o. grau a competência jurisdicional para as contendas sobre direitos indígenas, a Justiça estadual não mais está legitimada a conhecer das infrações penais cometidas por, ou contra índios.

Sem sobressaltos, à luz do novo texto constitucional é de se estabelecer nova orientação jurisprudencial para tais assuntos criminais (Os julgamentos de crimes cometidos contra comunidades indígenas pela Justiça Estadual. In NOVAES, Sylvia Caiuby. Os Direitos Indígenas e a Constituição. Porto Alegre: Sérgio Fabris Editor e Núcleo de Direitos Indígenas, 1993).

9.Em suma, por meio de seus arts. 231 e 232, a Constituição de 1988 estabelece um conjunto de normas específicas para tutela dos indígenas, cuja instrumentalização se reporta ao art. 109, XI de seu texto.

10.Retomando a análise dos autos, noticia o impetrante que o local onde houve as prisões em flagrante é objeto de ações possessórias em trâmite na Justiça Federal, Seção Judiciária do Espírito Santo (processos no. 2005.50.04.002602-9, 2005.50.01.009000-3 e 2005.50.01.004524-1), em que são partes a Aracruz Celulose S/A e representantes da comunidade indígena da qual fazem parte os pacientes, devidamente representados pela FUNAI.

11.Em consulta ao andamento dos referidos processos (realizada em 02.02.2010), verificou-se que todos foram julgados extintos, com resolução de mérito, pois foi homologado Termo de Ajustamento de Conduta celebrado entre o Ministério Público Federal e a Aracruz Celulose S/A. Em sua decisão, o douto Magistrado de primeiro grau esclarece que foi noticiada pelas partes litigantes a edição das Portarias 1.463/07 e 1.464/07, pelo Ministério da Justiça, nas quais se reconheceu aos índios a titularidade das terras objeto da disputa.

12.Neste diapasão, e considerando a tutela constitucional dos direitos e interesses indígenas, seria de bom alvitre que o processamento e julgamento do fato delituoso em apuração fossem realizados perante a Justiça Federal, que, inclusive, terá maiores subsídios para determinar se o local onde ocorreu a suposta subtração de madeira é ou não território indígena. Afastada, portanto, a súmula 140 deste STJ.

13.Ante o exposto, não obstante o parecer ministerial em contrário, dá-se parcial provimento ao Recurso Ordinário em Habeas Corpus, determinando-se o deslocamento dos autos do Processo 006.06.005528-9 para a Justiça Federal, Seção Judiciária do Espírito Santo, onde deverá ser analisada a necessidade de manutenção da prisão preventiva dos pacientes, anulando-se todos os atos decisórios eventualmente produzidos, mantidos os de caráter instrutório.

14.É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

QUINTA TURMA

Número Registro: 2008/0233367-6
RHC 24732 / ES

MATÉRIA CRIMINAL

Número Origem: 100060037270

EM MESA

JULGADO: 04/02/2010

Relator
Exmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. ÁUREA M. E. N. LUSTOSA PIERRE

Secretário
Bel. LAURO ROCHA REIS

AUTUAÇÃO

RECORRENTE:EMERSON CORREA PAJEHU

RECORRENTE: JULIANDERSON BENEDITO OLIVEIRA (PRESO)

RECORRENTE: ELVIS DHONY RIBEIRO MORAES SIZENANDO (PRESO)

RECORRENTE: GILCIMAR BENEDITO OLIVEIRA (PRESO)

RECORRENTE: GILSON PEREIRA DE OLIVEIRA

RECORRENTE: JAIRO SOARES GOMES (PRESO)

RECORRENTE: GUILHERME DOS SANTOS ROCHA (PRESO)

RECORRENTE: ADINATE DE JESUS NEVES (PRESO)

RECORRENTE: MARCELO DE OLIVEIRA CONCEIÇÃO (PRESO)

RECORRENTE: EDIVALDO LEMOS DA SILVA (PRESO)

RECORRENTE: ROQUE SARTE (PRESO)

RECORRENTE: LUIZ CARLOS MARCELINO DOS ANJOS (PRESO)

RECORRENTE: MARCELO PEREIRA LOPES (PRESO)

RECORRENTE: JOCIMAR BENEDITO OLIVEIRA (PRESO)

RECORRENTE: MARCOS DA SILVA OLIVEIRA (PRESO)

RECORRENTE: ELCIANO ALVES CLAUDINO (PRESO)

RECORRENTE: ANTÔNIO COELHO DE SOUZA FILHO (PRESO)

RECORRENTE: ALCEBÍADES BENEDITO DE OLIVEIRA (PRESO)

ADVOGADO: ANTÔNIO CAVALIERE GOMES

RECORRIDO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes contra o Patrimônio - Furto Qualificado

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."

Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Laurita Vaz e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

Brasília, 04 de fevereiro de 2010

LAURO ROCHA REIS
Secretário

Documento: 942316
Inteiro Teor do Acórdão
- DJ: 01/03/2010




JURID - Índios denunciados perante a justiça estadual por furto. [08/03/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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