Local de trabalho inadequado. Indenização por danos morais. Valor atribuído à indenização por danos morais.
Tribunal Regional do Trabalho - TRT3ªR
Acórdão
Processo: 00979-2009-143-03-00-2 RO
Data de Publicação: 14/04/2010
Órgão Julgador: Turma Recursal de Juiz de Fora
Juiz Relator: Des. Marcelo Lamego Pertence
Juiz Revisor: Des. Jose Miguel de Campos
Ver Certidão
Recorrente: Roney Henrique de Assis
Recorrido: Casa Bahia Comercial Ltda.
EMENTA: LOCAL DE TRABALHO INADEQUADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. VALOR ATRIBUÍDO À INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Se a empresa submete o trabalhador a condições de trabalho impróprias e degradantes corre o risco de contrair a obrigação de compensar os danos morais daí decorrentes. A fixação da indenização por danos imaterial deve obedecer aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e do não enriquecimento sem causa. O desgaste emocional causado ao autor deve ser compensado, mediante o prudente arbítrio do julgador, que deve decidir segundo a própria consciência e as regras de experiência amealhadas ao longo da vida. O valor da indenização deve levar em conta seu propósito pedagógico e atender aos reclamos compensatórios do ofendido.
Vistos os autos.
RELATÓRIO
A MM. 5ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora, através da decisão da lavra do Exmo. Juiz Luiz Olympio Brandão Vidal, às fls. 233/238, cujo relatório adoto e a este incorporo, julgou PROCEDENTES, EM PARTE, as pretensões deduzidas em juízo por Roney Henrique de Assis em face de Casa Bahia Comercial Ltda., condenando esta a pagar àquele as parcelas constantes da conclusão, devidamente corrigidas.
O autor interpôs o recurso ordinário de fls. 240/244, com o objetivo de obter a condenação da empresa ao pagamento de indenização compensatória dos danos morais que alega ter sofrido. Insiste no recebimento de indenização substitutiva do vale-transporte não fornecido. Requer seja paga a parcela denominada 14º salário em relação ao ano de 2005.
Apesar de instada, a ré deixou de ofertar suas contrarrazões, conforme certidão exarada à fl. 246.
Não vislumbrado interesse público, os autos não foram remetidos ao Ministério Público do Trabalho.
É o relatório.
JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE
Preenchidos todos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço, em parte, do recurso ordinário interposto.
Deixo de conhecê-lo no tocante ao pedido de pagamento de indenização substitutiva do vale-transporte não concedido, por absoluta falta de interesse processual do autor, tendo em vista que a pretensão sequer foi aventada na exordial e naturalmente não foi examinada pela d. instância a quo.
JUÍZO DE MÉRITO
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
Pretende o autor obter a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, ao argumento de que a prova testemunhal demonstrou o labor em local de trabalho totalmente inadequado, em meio a fezes, seringas, preservativos usados e sem água potável e sanitários.
Ao exame.
A narrativa constante da exordial para fundamentar a pretensão é a de que no início da jornada, tinha o autor de se dirigir a um local denominado "Terreirão do Samba", terreno baldio, sem muros, sem sanitários, sem água potável, nem segurança, estando exposto a intempéries, o que em sua ótica constitui ofensa à sua dignidade.
A empresa nega todas as assertivas, tendo sido produzida prova emprestada a respeito do tema, constituída das atas de audiências relativas aos processos 00993-2009-036-03-00-0 e 00966-2009-037-03-00-3 (fls. 224/229).
Como é cediço, o pagamento de indenização por danos morais exige a comprovação dos três clássicos requisitos da responsabilidade civil, considerados essenciais pela doutrina subjetivista, quais sejam, ato ilícito, nexo de causalidade e implemento do dano, pressupondo a lesão, dor física ou moral pela ofensa à bem jurídico inerente aos direitos da personalidade.
A reparação dos danos morais encontra previsão legal específica na Constituição da República em seus artigos 5º, inciso X e 7º, XXVIII e, também, nos artigos 186 e 927 do Código Civil.
Assim dispõe o art. 186 do CCB:
"Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".
MARIA HELENA DINIZ preleciona que, para a configuração do ilícito, são elementos indispensáveis:
"1º) fato lesivo voluntário, ou imputável, causado pelo agente por ação ou omissão voluntária (dolo), negligência, imprudência ou imperícia (culpa), que viole um direito subjetivo individual. É necessário, portanto, que o infrator tenha conhecimento da ilicitude de seu ato, agindo com dolo, se intencionalmente procura prejudicar outrem, ou culpa, se, consciente dos prejuízos que advêm de seu ato, assume o risco de provocar o dano, sem qualquer deliberação de violar um dever;
2º) ocorrência de um dano (...)
3º) nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente (...)." (Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais, São Paulo: Ed. Saraiva, 3º volume, 15 ed., 2000, p. 586/587).
O dano moral tem status constitucional, por força do regramento contido nos incisos V e X do art. 5º da CR/88, traduzindo como lesão sofrida por alguém no seu patrimônio de valores ideais, como a honra e a imagem pessoal. Está ligado a sofrimentos ou sensações dolorosas que afetam os valores íntimos da subjetividade humana.
O pressuposto básico do cabimento da reparação do dano moral, portanto, é a ofensa ou violação a um direito ínsito à personalidade.
O direito à privacidade e à intimidade são espécies do gênero "direitos da personalidade". Estes, por sua vez, são todos aqueles inerentes ao ser humano (vida, honra, dignidade, intimidade, privacidade, integridade física, etc.).
No caso dos presentes autos, tenho que a conduta ilícita por parte da ré foi devidamente comprovada pelo autor.
Como dito alhures, por ocasião da realização da audiência de instrução (ata de fl. 224/229), as partes requereram a adoção de prova emprestada, constituída dos depoimentos prestados nos autos dos processos 00966-2009-037-03-00-3 e 00933-2009-036-03-00-0.
No entendimento deste relator, a conduta negligente da ré em não garantir a integralidade física e moral do empregado está devidamente comprovada pelos depoimentos prestados nos autos de nº 00966-2009-037-03-00-3-RO, que agora analiso:
Disse o preposto da ré ouvido naquele processo (fl. 224), que:
"o reclamante ia à loja de manhã e em seguida se dirigia ao Terreirão do Samba [...] lá esperava até 07h30m/08h dentro do caminhão, até chegar outro caminhão, que vinha do Rio de janeiro; que esporadicamente, em virtude de pneu furado ou quebra de motor, o reclamante podia esperar até o meio-dia ou poderia ser que o caminhão não chegasse; que poderiam trancar o caminhão e tomar o café do outro lado do rio, mas não havia muro ou portão, porque o local é público; que não havia vigia ou circuito de TV no Terreirão; que pode ocorrer de a mercadoria do dia anterior ser recondicionada em outro caminhão".
As condições de trabalho do autor foram relatadas pela testemunha ouvida a convite da própria ré, Sr. Élcio Soares Freitas (fl. 225):
"se a carga tivesse com uma rua ali e outra aqui, tinha que descer alguma coisa do caminhão para reorganizar, dentro da mesma rota; [...] que ficava em média 01 hora parado no terreirão do samba esperando a arrumação do caminhão, salvo em um dia muito bagunçado; que deveriam esperar as lojas abrir para as notas chegarem e as lojas abrem depois das 9h; [...] que, quando estavam muito apertados, procuravam o comércio mais próximo para ir ao banheiro; que não havia água potável; que hoje esse movimento acontece em um estacionamento com banheiro e água; que o terreirão do samba era sujo e tinhas fezes, papel, preservativos; que quando havia circo ou parque de diversão, todo o movimento era feito na rua ao lado; que não havia proteção contra a chuva."
Peço vênia para transcrever trechos dos fundamentos adotados pelo MM. Juiz José Nilton Ferreira Pandelot, ao julgar demanda idêntica (processo 01127-2009-035-00-0), os quais demonstram que o empregador ultrapassou os limites do seu exercício normal de superior hierárquico, adotando-os como meus próprios e jurídicos fundamentos:
"A situação registrada nos autos não se confunde com as dificuldades naturais do serviço típico de carregadores de carga ou ajudantes de entrega. De fato, é forçoso admitir que tais trabalhadores enfrentam sérias dificuldades na rotina da atividade diária, sendo expostos ao clima, intempéries e aos obstáculos urbanos, os mais variados, no serviço de entregas das mercadorias.
Acontece, porém, que a tarefa denominada de "bater carga" consiste no transbordo das mercadorias de carretas ou veículos maiores, que chegam a Juiz de Fora, para outros menores, destinados às entregas na região. Além disso, há necessidade de arrumação das caixas nos baús, de modo a melhor organizar as entregas nos destinos.
Percebe-se, portanto, que a ré realizava serviços de organização e distribuição de suas mercadorias, em caráter permanente, no local conhecido como "Terreirão do Samba", espaço urbano praticamente abandonado e exposto ao relento, sujeira e riscos à saúde, como é de notório conhecimento. A ré, de fato, apropria-se deste espaço como sua central de distribuição ou subcentral regional. Neste aspecto reside a degradação das condições de trabalho, uma vez que tal atividade deveria ser executada em local dotado das instalações sanitárias, na forma da NR 24.
A proteção à dignidade da pessoa do trabalhador e a consideração do trabalho humano como valor da República, inseridos que estão na Constituição, permitem concluir pela existência do dever patronal de preservação da saúde e da honra dos empregados, ensejando o reconhecimento da ocorrência de dano moral quando tal dever é violado.
(. . .)
O não fornecimento de local apropriado para "bater carga" antes da entrega das mercadorias evidencia a radicalização de um sistema precário e irracional de condições de trabalho, degradando as condições de trabalhador pela imposição de situação penosa e vexatória ter que aguardar os caminhões em locais em que não havia sanitários e fornecimento de água potável, estando sujeito ainda a intempéries. Essa conduta patronal fere a dignidade da pessoa humana".
Ao contrário do entendimento esposado na decisão recorrida, concessa maxima venia, penso que a permanência por cerca de 02 ou 03 horas diárias no indigitado local, como admitido no próprio decisum, não deve ser tido como desprezível ou incapaz de gerar danos, ante a precária condição do terreno.
É fato incontroverso nos autos que o local em que se realizavam as operações no limiar da jornada era totalmente inadequado, despido de qualquer infra-estrutura, sem as mínimas condições de higiene.
Reforça tal constatação o fato de a empresa decidir alterar o local de descarga de suas mercadorias para um estacionamento coberto, com água potável, sanitário, como informado pelo preposto nos autos do processo 00993-2009-036-03-00-0 (fls. 226/227).
Se a ré optou por fazer as descargas de mercadorias no local denominado "Terreirão do Samba", obviamente este constituiu a extensão da empresa e nesta condição deveria prepará-lo com o mínimo necessário de infra-estrutura, de modo a proporcionar um ambiente de trabalho puro e condigno.
Importa notar que a Constituição da República, ao tutelar o meio ambiente (caput do art. 225), visa resguardar a proteção da vida humana, como valor fundamental, de sorte que, ao considerar incluído o local de trabalho no conceito de meio ambiente, estabelece, por consequência lógica, o dever do empregador em manter o ambiente de trabalho puro. É o que se extrai da interpretação sistemática de diversas normas da Lei Maior, como art. 1º, III, que consagra o princípio da dignidade da pessoa humana; o art. 5º, que garante a inviolabilidade do direito à vida, no qual se insere a saúde; o art. 7º, XXII, que garante o direito à redução dos riscos inerente ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; o art. 170, que garante a valorização do trabalho humano, observado o princípio da defesa do meio ambiente; o art. 193, que enfatiza a ordem social com base no primado do trabalho, tendo como objetivos o bem-estar e a justiça sociais.
Penso que a imposição de trabalho em meio a situações tão degradantes (fezes, material contaminado, intempéries, etc) não coadunam com o ideal de preservação da dignidade da pessoa humana de matiz constitucional.
Anoto que esta Eg. Turma analisou, em recentíssima oportunidade, idêntica questão, firmando o seguinte entendimento:
EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CULPA DO EMPREGADOR. EXISTÊNCIA. É cediço que o Código Civil prescrevendo acerca dos atos ilícitos em seu artigo 186, giza que todo aquele que violar direito ou causar prejuízo a outrem, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, tem a obrigação de reparar o dano. Logo, para a configuração do dano, necessária se faz a conjugação de três elementos, a saber: ação ou omissão do agente, a existência do dano e o nexo de causalidade entre este e aquela. Com efeito, ao descumprir norma de higiene e segurança do trabalho, a empresa sujeita seu empregado a situação degradante, impondo-lhe humilhação injusta e atingindo a dignidade psíquica e física do trabalhador, o que está em desconformidade com as normas nacionais e com a conceituação de trabalho decente (ou digno) consubstanciada em declarações e documentos da Organização Internacional do Trabalho. Portanto, provado o ato contrário ao direito e estando presente o nexo causal entre o dano e a conduta ilícita, impõe-se o dever de reparação, como previsto no artigo 186 c/c artigo 927, ambos do Código Civil. (Processo nº 01246-2009-037-03-00-5-RO - Rel. Heriberto de Castro - DEJT 09/01/2010)
Cito ainda como precedente o julgamento proferido nos autos do processo nº 00116-2009-037-03-00-2-RO. Rel. José Miguel de Campos.
Por todo exposto, entendo que o autor faz jus ao pagamento de indenização por danos morais, decorrentes da conduta ilícita da ré (artigos 186 e 927 do Código Civil).
Verificada a existência do dano e da conduta contrária ao direito, resta a fixação do valor da indenização.
Posta a questão, inicialmente registro que segundo os atuais entendimentos jurisprudenciais e doutrinários, ao fixar o valor da reparação por danos morais, deve-se levar em conta o caráter punitivo da indenização, cumprindo seu propósito pedagógico, bem como atender aos reclamos compensatórios, considerada a capacidade econômica do ofensor e da vítima.
Não ultrapassando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, tendo em mente, ainda, o do não enriquecimento sem causa, o desgaste emocional causado ao autor deve ser compensado, mediante o prudente arbítrio do julgador, que deve decidir segundo a própria consciência e as regras de experiência amealhadas ao longo da vida.
Pois bem, como é ressabido, a condenação por danos morais deve ser arbitrada pelo juiz de maneira equitativa, atendendo aos reclamos compensatório, pedagógico e preventivo, como ilustrado no Enunciado n° 51 aprovado na 1ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho:
"RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. CRITÉRIOS PARA ARBITRAMENTO. O valor da condenação por danos morais decorrentes da relação de trabalho será arbitrado pelo juiz de maneira eqüitativa, a fim de atender ao seu caráter compensatório, pedagógico e preventivo."
Deve-se ter em mente ainda o princípio da razoabilidade, acautelando-se o magistrado para que a indenização não se imponha de forma desproporcional à lesão sofrida, sem olvidar a condição econômica das partes e o caráter pedagógico da pena. Balizando todos estes parâmetros entendeu este Relator que a indenização deveria ser arbitrada no valor de R$10.000,00, o que além de atender o caráter pedagógico da pena, estaria adequada à condição financeira das partes.
Contudo, a d. maioria, partindo de perspectiva interpretativa diversa, na esteira do voto do Exmo. Desembargador Revisor, resolveu fixar o valor da indenização no patamar de R$ 3.000,00, com os seguintes fundamentos, verbis:
"Peço vênia para sugerir a fixação da indenização por dano moral em R$3.000,00, montante este compatível com o valor mantido pela maioria dos membros desta TRJF (Dr. JMC e Dr. HC) ao analisar o RO interposto pelo autor nos autos do processo n. 01116-2009-037-03-00-2 (data de publicação: 02.12.09 - vencido, naquela oportunidade, o Exmo. Des. MLP, que aumentava a indenização para R$10.000,00)".
Provimento parcial.
14º SALÁRIO DE 2005
Aduz o autor não haver prova do pagamento do 14º salário alusivo ao ano de 2005. Pretende receber metade do valor da parcela, sob a assertiva de que restou provado que teria recebido somente 50% à época.
Eis os fundamentos da decisão, verbis:
Ainda que fosse paga por liberalidade, havia habitualidade no pagamento, o que tornou a parcela " 14º gratificação" parte integrante do salário. Nesse sentido é a lição de MAURÍCIO GODINHO DELGADO (in "SALÁRIO, TEORIA E PRÁTICA", Belo Horizonte, Del Rey Editora, 1997, p. 175), para quem "a simples reiteração da parcela, tornando-a habitual, produz sua integração ao contrato e, via de conseqüência, ao salário, independentemente da intenção de liberalidade afirmada no ato contratual instituidor da gratificação."
A testemunha José Luiz Scaldini (fl. 228) depôs que "recebeu o 14º salário, discriminado no contracheque como gratificação; que correspondia a 100% do salário e depois foi reduzido pela metade, isso a partir de 2005; que antes de 2005, o pagamento não passava pelo contracheque."
Como o recibo salarial do Reclamante do mês de dezembro/2005 (fl. 122) não contém o pagamento de nenhuma gratificação, significa que a quantia foi paga, mas extrafolha, de modo integral. Rejeito o pedido de 14º salário do ano 2005.
Já o recibo salarial do mês de dezembro/2006 (fl. 135) contém o pagamento do "prêmio especial" no valor de R$ 595,00, inferior ao 13º salário. Em junho/2007 o contrato de trabalho foi rescindido, mas no TRCT não há pagamento da parcela (fl. 151).
Assim, defiro o pagamento da diferença do 14º salário equivalente a 50% do valor do 13º salário relativo ao ano 2006, bem como o 14º salário do ano 2007 proporcional a 06/12, tudo com reflexos no aviso prévio, no FGTS + 40% e nas férias + 1/3.
A prova oral produzida nos autos atesta de maneira insofismável a alteração lesiva das condições de trabalho, com a redução do valor pago por mera liberalidade, valendo desde já ressaltar que o fato de o pagamento ter sido feito em tais condições não impede a sua incorporação ao contrato de trabalho e a consequente impossibilidade de se reduzir o benefício sem malferir o disposto no art. 468 da CLT.
Como bem identificado pelo Juízo a quo, o recibo de pagamento alusivo ao mês de dezembro de 2005 (fl. 122), não contém pagamento da gratificação, pelo que presume-se seu recebimento marginal, a teor dos depoimentos colhidos.
Contudo, presumir seu recebimento integral, data maxima venia, parece-me inadequado, pois o depoimento citado na própria decisão denuncia que já a partir de 2005 a parcela foi reduzida à metade, vejamos:
"que recebeu o 14º salário, discriminado no contracheque como gratificação; que correspondia a 100% do salário e depois foi reduzido pela metade, isso a partir de 2005; que antes de 2005, o pagamento não passava pelo contracheque." (destaquei)
Como bem demonstra o depoimento, a redução da parcela à metade teria ocorrido já no ano de 2005, fazendo o autor jus ao valor remanescente, no percentual de 50% do 13º salário relativo ao ano de 2005, o que era pago a título de 14º salário.
Devo registrar que a 1ª testemunha ouvida, Sr. Carlos Alberto da Silva (fl. 224), informou que recebiam a parcela "(...) até 2005, no valor integral a um salário, mas a partir daí o valor veio caindo", tornando a matéria até certo ponto controvertida. Entrementes, não se pode deslembrar que a citada testemunha está com seu contrato de trabalho suspenso, o que pode ter comprometido seu depoimento, tendo em vista que não se tem notícia do início da suspensão.
No entanto, ainda que tomemos como consistente o depoimento, se a empresa resolveu proceder ao pagamento de forma marginal, conforme sobejamente provado nos autos, era seu o ônus de provar a integralidade do pagamento, devendo a controvérsia ser resolvida em desfavor de quem detinha o ônus de prova, in casu, a própria ré.
Logo, diante do possível embate da prova, oportuno transcrever trecho da lição de Manoel Antônio Teixeira Filho na obra "A Prova no Processo do Trabalho", 7ª edição, editora LTr, páginas 141/142:
"Convém frisar: ou se prova ou não se prova. Se em determinado caso, entretanto, as provas forem insuficientes (de ambos os lados), o resultado do provimento jurisdicional deve ser desfavorável a quem incumbia o onus probandi. Se os litigantes, ao contrário, fizerem prova satisfatória dos fatos narrados, de modo a que se possa admitir que a prova ficou dividida, deverá o julgador, autorizado pelo princípio da persuasão racional, apreciar qual a melhor prova, tendo em vista a natureza dos fatos, as circunstâncias dos autos e outros elementos de que possa se valer para indicar como motivos formadores do seu convencimento."
Não tendo a ré se desvencilhado a contento do seu ônus de prova, provejo o recurso para incluir na condenação o pagamento de 50% do valor devido a título de 14º salário, alusivo ao ano de 2005, conforme fundamentos.
CONCLUSÃO
Conhecido o recurso interposto por Roney Henrique de Assis, salvo quanto ao pedido de pagamento de indenização substitutiva do vale-transporte não concedido, por absoluta falta de interesse processual do autor. No mérito, provido parcialmente conferido para deferir ao autor indenização compensatória de danos morais no importe de R$3.000,00 e ainda para incluir na condenação o pagamento de 50% do valor devido a título de 14º salário, alusivo ao ano de 2005, vencido parcialmente o Exmo. Relator que fixava a reparação pelos danos morais em R$ 10.000,00.
Elevado o valor atribuído à condenação, nesta instância, para R$15.000,00, com custas residuais a cargo da ré, no importe de R$200,00.
Para fins do art. 832, § 3º, da CLT, declara-se que possui natureza salarial a diferença do 14º salário do ano de 2005.
FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,
O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em Sessão da Egrégia Turma Recursal de Juiz de Fora, à unanimidade, conheceu do recurso interposto, à exceção do pedido de pagamento de indenização substitutiva do vale-transporte não concedido, por absoluta falta de interesse processual do autor; no mérito, por maioria de votos, deu-lhe provimento parcial para deferir ao autor reparação compensatória pelos danos morais, no importe de R$3.000,00 (três mil reais), e, ainda, para incluir na condenação o pagamento de 50% do valor devido a título de 14º salário, alusivo ao ano de 2005; declarou a natureza salarial da diferença de 14º salário; elevou o valor atribuído à condenação para R$10.000,00, com custas no importe de R$200,00, pela ré; vencido parcialmente o Exmo. Desembargador Relator, que fixava a reparação pelos danos morais em R$10.000,00.
Juiz de Fora, 23 de março de 2010.
MARCELO LAMEGO PERTENCE
DESEMBARGADOR RELATOR
JURID - Local de trabalho inadequado. Indenização por danos morais. [14/04/10] - Jurisprudência
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