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sexta-feira, 9 de abril de 2010

JURID - Ação civil pública. Dano moral coletivo. Ilegitimidade. [09/04/10] - Jurisprudência


Ação civil pública. Dano moral coletivo. Ilegitimidade do ministério público do trabalho.

Tribunal Superior do Trabalho - TST

publicado em 30/03/2010

AIRR-90040-64.2006.5.04.0007

Acórdãos Inteiro Teor

NÚMERO ÚNICO: AIRR - 90040-64.2006.5.04.0007

PUBLICAÇÃO: DEJT - 30/03/2010

ACÓRDÃO

7ª TURMA

MDN/rc/rf

I) AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DANO MORAL COLETIVO - ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Estando os interesses em debate perfeitamente enquadrados dentro dos coletivos, goza o Ministério Público do Trabalho de legitimidade ativa para propor, perante o Judiciário Trabalhista, a presente ação coletiva, inexistindo as afrontas legais e constitucionais invocadas.

II) DANO MORAL COLETIVO - CARACTERIZAÇÃO E QUANTUM INDENIZATÓRIO.

1. A reparabilidade do dano moral coletivo não pode ter as mesmas premissas do dano moral tradicional, já que este, baseado no Código Civil, é dotado de cunho meramente patrimonialista e individualista, não enxergando, assim, os valores transindividuais de um sentimento coletivo.

2. De fato, a honra coletiva tem princípios próprios que não se confundem com os interesses pessoais, na medida em que leva em conta a carga de valores de uma comunidade como um todo, corporificando-se no momento em que se atestam os objetivos, as finalidades e a identidade de uma comunidade política.

3. Nessa senda e considerando que o Texto Constitucional afirma a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho, a livre iniciativa e o pluralismo político, como sendo fundamentos do Estado Democrático de Direito, tem-se que a Empresa Ré, por intermédio de um de seus prepostos, ao desrespeitar e submeter seus trabalhadores a condições humilhantes de trabalho, circunstância, aliás, agravada pelo fato de a diretoria, quando informada, mais do que manifestar descaso, demonstrar concordância e aprovação em relação à conduta do autor do gravame, produziu uma lesão significativa a interesses extrapatrimoniais da coletividade e, como tal, merece ser condenada na reparação do mal, em valor adequado e justo.

4. De fato, o ato da reclamada não só lesionou os princípios inerentes a dignidade da pessoa humana, comprometendo a qualidade de vida dos trabalhadores, como também violou diversos valores sociais, na medida em que a prática atingiu também, como é curial, a vida familiar, a vida comunitária e a sociedade como um todo.

5. Assim, considerando a gravidade do ato, o alto grau de culpabilidade da ré, o grande número de empregados vitimados pelo assédio moral, a resistência da ré às negociações e o descaso da direção da empresa, de se concluir que o valor indenizatório fixado, R$ 300.000,00, mostra-se razoável à situação.

6. Logo, o recurso da parte não merece trânsito pela via da alegada violação constitucional, visto que ileso o incisos V do art. 5º da Carta Republicana.

Agravo de instrumento desprovido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista nº TST-AIRR-90040-64.2006.5.04.0007, em que é Agravante RBS ZERO HORA EDITORA JORNALÍSTICA S.A. e Agravado MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO.

RELATÓRIO

O egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, mediante o r. despacho de fls. 3696/698, denegou seguimento ao recurso de revista interposto pela RBS Zero Hora Editora Jornalística S.A., por entender que as violações constitucionais e legais, bem como a divergência jurisprudencial indicadas no apelo não foram demonstradas. Asseverou-se, ainda, que o recurso de revista encontra óbice no entendimento contido na Súmula 296 do TST.

Irresignada, a Reclamada, RBS Zero Hora Editora Jornalística S.A., interpôs agravo de instrumento a fls. 02/09, sustentando que o recurso de revista merece seguimento, pois os dispositivos constitucionais e legais indicados no apelo foram contrariados pela decisão regional. Renova a divergência jurisprudencial suscitada no recurso de revista.

O Ministério Público do Trabalho ofereceu contraminuta ao agravo de instrumento a fls. 240/249 e contrarrazões ao recurso de revista a fls. 250-263.

Desnecessária a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho para emissão de parecer.

É o relatório.

VOTO

I) CONHECIMENTO

Conheço do agravo de instrumento, eis que o apelo é tempestivo e regular a representação processual. Preparo dispensado.

II) MÉRITO

1) ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PARA O AJUIZAMENTO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LESÃO A DIREITOS INDIVIDUAIS

Despacho Agravado: O Tribunal Regional da 4ª Região denegou seguimento ao recurso de revista interposto pela Reclamada, por entender que a violação dos arts. 1º da Lei nº 7.347/85, 83, III, da Lei Complementar nº75/93 e 11 a 21, do Código Civil e a divergência jurisprudencial suscitadas no recurso de revista não foram demonstradas. Asseverou, ainda, aplicável à hipótese o entendimento contido na Súmula nº 296 do TST.

Fundamento do Agravo: Insiste a Agravante na ilegitimidade do Ministério Público do Trabalho para o ajuizamento de ação civil pública em que se pretende a defesa de direitos individuais strictu sensu.

Afirma a Agravante que a hipótese dos autos revela a discussão de direitos individuais, frente à situação pessoal de cada empregado, motivo pelo qual o MPT não possui legitimidade para atuar como autora da presente ACP (fls. 05). Renova a violação dos arts. 1º da Lei nº 7.347/8 e 83, III, da Lei Complementar nº 75/93 e a divergência jurisprudencial suscitadas no recurso de revista.

Solução: O Tribunal Regional rejeitou a preliminar de ilegitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho para o ajuizamento da presente ação civil pública, por entender que o direito defendido nessa ação detém natureza coletiva, ressaltando que no presente caso, a condenação ao pagamento de dano moral coletivo tutela interesse coletivo, por ser categoria ligada à parte contrária por relação-jurídica base (a relação de emprego), o que atrai a incidência do art. 81, II, do CPC (fls. 188).

O art. 81, II, da Lei nº 8.078/91, em que são definidos os direitos e interesses coletivos para fins de ajuizamento de ação coletiva em sentido lato, dispõe que:

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum (negritei).

Conforme consignado no acórdão regional, o Ministério Público do Trabalho ajuizou a presente ação civil pública postulando, além da abstenção da prática de ato ilícito, a condenação da Reclamada ao pagamento de indenização por dano moral coletivo decorrente do assédio moral efetuado pelo Sr. Caraver, gerente do setor de classificados da empresa Reclamada, em relação aos empregados que exerciam suas atividades nesse setor.

O assédio moral praticado pelo Sr. Caraver acarretou lesão a direitos de índole coletiva, haja vista que o grupo de empregados que estava subordinado a tal preposto foi vítima da referida conduta ilícita.

Registre-se que nos interesses e direitos coletivos a indeterminabilidade dos sujeitos assume feição distinta da que se constata nos interesses e direitos difusos, pois, conforme leciona Raimundo Simão de Melo, em sua obra Ação Civil Pública na Justiça do Trabalho (2ª ed., São Paulo: LTr 2004), nos direitos coletivos embora indeterminados, os sujeitos são determináveis, uma vez que, como consta da definição, abrangem grupos, categorias ou classes, pelo que, mesmo com dificuldade, é possível determinar quem são, por exemplo, os empregados de uma determinada empresa poluidora do meio ambiente do trabalho .

Além disso, os trabalhadores lesionados em razão do referido assédio moral encontram-se ligados à Reclamada por uma mesma relação jurídica base, in casu, a relação de emprego.

Assim, tal como acolhida pelo Regional, a ação civil pública em exame alberga interesses coletivos passíveis de tutela pela via eleita. Nesse sentido, a ação civil pública em tela seguiu estritamente os cânones

Comungamos, em tese, do entendimento da Recorrente, no sentido de que não podem ser esgrimidos interesses individuais homogêneos por meio da ação civil pública. Pode-se referir em reforço da tese inclusive o seguinte julgado desta Corte:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS - MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - ILEGITIMIDADE. Conquanto irrefutável o cabimento de ação civil pública na Justiça do Trabalho, trata-se de instituto concebido eminentemente para a tutela de interesses coletivos e difusos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos. Ao órgão do Ministério Público do Trabalho não é dado manejá-la em defesa de interesses individuais homogêneos, cuja metaindividualidade exsurge apenas na forma empregada para a defesa em juízo. Embora de origem comum, trata-se de direitos materialmente divisíveis, razão pela qual a reparação decorrente da lesão sofrida pelo titular do direito subjetivo é sempre apurável individualmente. Exegese que se extrai da análise conjunta dos artigos 129, inciso III, da Constituição da República de 1988 c/c 83 da Lei Complementar nº 75/93. Embargos de que não se conhece (TST-E-RR-596.135/1999.0, Rel. Juiz Convocado Georgenor de Sousa Franco, SBDI-1, DJ de 25/10/02).

No entanto, a questão, no presente caso, é o do enquadramento dos pedidos postulados na ação civil pública entre coletivos.

Nesse sentido, considerando indiscutível que a coletividade detém interesse em ver reparado o dano moral que diz ter sofrido em virtude de conduta ilícita praticada por uma empresa, induvidosa a legitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho inexistindo as afrontas legais e constitucionais invocadas.

Nem se esgrima o art. 83, III, da LC 75/83 quanto à possibilidade de defesa de interesses difusos perante a Justiça do Trabalho, dado que a Lei Maior já os admite para todo o Parquet da União (CF, art. 129, III), não cabendo ao legislador ordinário restringir o alcance da norma constitucional.

De outra parte, os julgados trazidos a cotejo a fls. 222 desservem ao fim colimado por inespecíficos, pois nesses adota-se tese amparada no fato de que os direitos defendidos detém índole individual. Incidência da Súmula nº 296 desta Corte.

2) DANO MORAL COLETIVO

Despacho Agravado: O recurso de revista interposto pela Reclamada, RBS Zero Hora Editora Jornalística S.A., teve seguimento denegado em razão da ausência de violação de lei e da Constituição, bem como de divergência jurisprudencial.

Fundamento do Agravo: Afirma a Agravante que o recurso de revista merece seguimento por violação ao disposto no art. 5º, V, da Constituição Federal.

Solução: Quanto à alegação de ofensa ao art. 5º, V, da CF, a jurisprudência reiterada do Supremo Tribunal Federal é cristalina no sentido de que a ofensa a tais dispositivos é, em regra, reflexa, não empolgando recurso extraordinário para aquela Corte, a teor dos precedentes que se seguem:

CONSTITUCIONAL - RECURSO EXTRAORDINÁRIO: ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 5º, II, V, XXXV, XXXVI, LIV, LV, 7º, XXIX, E 93, IX. I - Alegação de ofensa à Constituição que, se ocorrente, seria indireta, reflexa, o que não autoriza a admissão do recurso extraordinário. II - Ao Judiciário cabe, no conflito de interesses, fazer valer a vontade concreta da lei, interpretando-a. Se, em tal operação, interpreta razoavelmente ou desarrazoadamente a lei, a questão fica no campo da legalidade, inocorrendo o contencioso constitucional. III - Agravo não provido (STF-AgR-RE-245.580/PR, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ de 08/03/02).

RECURSO EXTRAORDINÁRIO - ALEGADA VIOLAÇÃO AOS PRECEITOS CONSTITUCIONAIS INSCRITOS NO ART. 5º, V, XXXV, XXXVI, LIV E LV, - AUSÊNCIA DE OFENSA DIRETA À CONSTITUIÇÃO - CONTENCIOSO DE MERA LEGALIDADE - RECURSO IMPROVIDO. A situação de ofensa meramente reflexa ao texto constitucional, quando ocorrente, não basta, só por si, para viabilizar o acesso à via recursal extraordinária (STF-AgR-AI-305.641/PB, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, DJ de 29/06/01).

Por divergência, o apelo também não merece prosseguimento.

É que o Tribunal Regional manteve a condenação ao pagamento de indenização decorrente de dano moral coletivo, por entender que dúvida não há a respeito de a coletividade possuir esfera de direitos, não só patrimonial como igualmente extrapatrimonial (fls. 188).

Esta Corte Superior já pacificou entendimento no sentido de que a coletividade detém interesses de natureza extrapatrimonial, que violados, geram direito à indenização por danos morais, conforme se depreende dos seguintes julgados:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - RECURSO DE REVISTA - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DANO MORAL COLETIVO REPARAÇÃO POSSIBILIDADE - ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DOS TRABALHADORES RURAIS DA REGIÃO. Não resta dúvida quanto à proteção que deve ser garantida aos interesses transindividuais, o que encontra-se expressamente delimitado no objetivo da ação civil pública, que busca garantir à sociedade o bem jurídico que deve ser tutelado.

Trata-se de um direito coletivo, transindividual, de natureza indivisível, cujos titulares são os trabalhadores rurais da região de Minas Gerais ligados entre si com os recorrentes por uma relação jurídica base, ou seja, o dispêndio da força de trabalho em condições que aviltam a honra e a dignidade e na propriedade dos recorridos. Verificado o dano à coletividade, que tem a dignidade e a honra abalada em face do ato infrator, cabe a reparação, cujo dever é do causador do dano. O fato de ter sido constatada a melhoria da condição dos trabalhadores em nada altera o decidido, porque ao inverso da tutela inibitória que visa coibir a prática de atos futuros a indenização por danos morais visa reparar lesão ocorrida no passado, e que, de tão grave, ainda repercute no seio da coletividade. Incólumes os dispositivos de lei apontados como violados e inespecíficos os arestos é de se negar provimento ao agravo de instrumento. (AIRR-561/2004-096-03-40.2, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, DJ de 19/10/07).

RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO - DANO MORAL COLETIVO - REPARAÇÃO - POSSIBILIDADE - AÇÃO CIVIL PÚBLICA VISANDO OBRIGAÇÃO NEGATIVA - OFENSA AO VALOR SOCIAL DO TRABALHO - TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA DE MÃO DE OBRA PARA SERVIÇOS LIGADOS A ATIVIDADE FIM DA EMPRESA. A reparação por dano moral coletivo visa a inibição de conduta ilícita da empresa e atua como caráter pedagógico. A ação civil pública buscou reverter o comportamento da empresa, com o fim de coibir a contratação ilícita de mão de obra para serviços ligados a atividade-fim, por empresa interposta, no ramo da construção, para prevenir lesão a direitos fundamentais constitucionais, como a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho, que atinge a coletividade como um todo, e possibilita a aplicação de multa a ser revertida ao FAT, com o fim de coibir a prática e reparar perante a sociedade a conduta da empresa, servindo como elemento pedagógico de punição. Recurso de revista conhecido e provido, para restabelecer a r. sentença, que condenou a empresa a pagar o valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais) a título de indenização a ser revertida ao FAT (RR-572/2005-018-10-00.5, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, DJ de 08/05/09).

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DANO MORAL COLETIV O - CARACTERIZAÇÃO 1. O elemento que distingue uma ação coletiva, que visa a resguardar interesses homogêneos, da simples reunião de ações individuais é a existência de uma tese jurídica geral, referente a determinados fatos, que, se acolhida, possa beneficiar diversas pessoas. 2. Do quadro fático trazido à baila pelo acórdão regional, imutáveis neste âmbito recursal extraordinário, ante o óbice da Súmula nº 126/TST, depreende-se que os fatos narrados pelo Ministério Público viabilizam a adoção de uma tese jurídica geral, aplicável a toda uma coletividade de interessados e independente da análise da situação individual e particular de cada pessoa. 3. Com base no contexto fático-probatório, o Tribunal Regional concluiu que o ato arbitrário do empregador constituiu inadmissível ingerência na organização sindical. Verificado o dano à coletividade, que tem a dignidade e a honra abalada em face do ato infrator, cabe a reparação, cujo dever é do causador do dano. 4. Assim, cabível a indenização por dano moral coletivo, em montante revertido ao Fundo de Amparo ao Trabalhador, em atenção ao artigo 13 da Lei nº 7.347/85 e à Lei nº 7.998/90. AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CONDENAÇÃO EM CUSTAS - PRECLUSÃO

Condenada em primeira instância, não cuidou a Reclamada de devolver tal matéria ao Tribunal Regional. A insurgência encontra-se preclusa. DANOS MORAIS - QUANTUM INDENIZATÓRIO - RECURSO DESFUNDAMENTADO A Agravante não amparou seu apelo em nenhum dispositivo legal ou constitucional, tampouco indicou divergência jurisprudencial, em desatenção ao artigo 896 da CLT e à Súmula nº 221 desta Corte. Agravo de Instrumento a que se nega provimento (AIRR-169/2005-221-06-40.1, Rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 8ª Turma, DJ de 07/03/08).

Sobre a tipificação do comportamento enquadrado como caracterizados do assédio moral, releva ressaltar que a Organização Internacional do Trabalho (OIT), listou, no ano de 2002, alguns atos que se configuram assédio moral, quais sejam: medida destinada a excluir uma pessoa de uma atividade profissional; ataques persistentes e negativos ao rendimento pessoal ou profissional sem razão; a manipulação da reputação pessoal ou profissional de uma pessoa através de rumores e ridicularização; abuso de poder através do menosprezo persistente do trabalho da pessoa ou a fixação de objetivos com prazos inatingíveis ou pouco razoáveis ou a atribuição de tarefas impossíveis; e controle desmedido ou inapropriado do rendimento de uma pessoa.

De outra banda, o ilustre magistrado Cláudio Armando Couce de Menezes, em artigo publicado na Revista LTR, intitulado Assédio Moral e seus

Efeitos Jurídicos, explicita que o ato de assédio se caracteriza em submeter alguém sem trégua, a ataques repetidos, requerendo a continuidade do comportamento, que pode se constituir em insistência, repetições, procedimentos, omissões, atos, palavras, comentários, críticas e piadas, situação que se identifica perfeitamente com o caso dos autos.

Dessa forma, encontrando-se a decisão regional em consonância com os valores expressos pela OIT, com a doutrina e, mais, com iterativa, notória e atual jurisprudência desta Corte, inviável a análise da divergência jurisprudencial suscitada a fls. 223, ante o óbice contido na Súmula nº 333 do TST e no art. 896, § 4º, da CLT.

3) OBRIGAÇÃO DE NÃO-FAZER E DE FAZER. ENTREGA DE CÓPIA DA DECISÃO CONDENATÓRIA

Despacho Agravado: O recurso de revista teve o seguimento denegado com fundamento na inexistência de violação literal e direta do art. 5º, II e LIV, da Constituição Federal.

Fundamento do Agravo: A Reclamada alega que a r. decisão, no particular, afronta diretamente os princípios da reserva legal e do devido processo legal, previstos no artigo 5º, incisos II e LIV, da Constituição Federal, porquanto o v. acórdão condena a recorrente a comprometer-se com uma expressão extremamente genérica e sujeita às mais criativas elucubrações, obrigação que sequer o ordenamento jurídico vigente impõe aos jurisdicionados (fls. 08).

Solução: A Lei nº 8.952/94, que conferiu nova redação ao art. 461 do CPC, previu expressamente, possibilidade de imposição de multa diária pelo descumprimento de obrigação de fazer e/ou não fazer, cuja aplicação, em consequência, não constitui ofensa aos princípios da legalidade e do devido processo legal.

Registre-se o teor do art. 461, § 4º e § 5º do CPC, verbis:

Art. 461 - Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

§ 4º - O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.

§ 5º - Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial

As multas pecuniárias impostas à Reclamada para o caso de descumprimento das tutelas específicas de obrigação de fazer e não fazer determinadas pelo Tribunal a quo, encontram amparo legal no art. 461, §§ 4º e 5º, do CPC, aplicável subsidiariamente ao Processo do Trabalho com fundamento no art. 769 da CLT.

Dessa forma, não há falar na violação do art. 5º, II e LIV, da Constituição Federal.

4) DANO MORAL COLETIVO. QUANTUM INDENIZATÓRIO

Despacho Agravado: O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região denegou seguimento ao recurso de revista por não considerar violados os dispositivos de lei e da Constituição da República indicados pela parte.

Fundamento do Agravo: Insurge-se a Agravante contra o despacho denegatório, afirmando que o quantum arbitrado na decisão judicial desatendeu a todos os critérios recomendados para a elaboração dos mesmos, obtendo o absurdo valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), de sorte que, no seu entender estaria configurada fragrante afronta ao inciso V do art. 5º da Constituição Federal.

Solução: De afronta ao inciso V do art. 5º da Carta Republicana, também não há de se falar. Isso porque é justamente tal dispositivo constitucional que, em verdade, dá substrato à pretensão e, portanto, ao julgado.

Com efeito, tal como consignado pelo Tribunal Regional, verbis:

Resta comprovado por tais depoimentos que as ofensas e palavras de baixo calão eram proferidas a todos os funcionários da equipe de vendas, mas que também atingiam os funcionários do setor administrativo que participavam das reuniões, já que o ofensor, Sérgio Caraver, não distinguia a quem eram proferidas as ofensas.

Mais: a prova oral colhida em mais de um processo comprova que a direção da reclamada, comunicada do fato, nenhuma providência tomou, o que caracteriza anuência desta com a forma de procedimento do gerente Sérgio Caraver, implicando participação da

reclamada, como instituição, ainda que de forma omissiva, no dano moral sofrido por seus funcionários.

O descaso da ré com a situação afasta qualquer argumentação desta no sentido de que o agente do dano seria, somente, Sérgio Caraver, que gerenciava setor de pequeno porte na empresa (classificados), atingindo pequeno número de trabalhadores. É público e notório que o setor de classificados da ré não pode ser caracterizado como de pequeno porte,
assim como restou comprovado pelos depoimentos colhidos perante esta especializada, que as ofensas proferidas por dito gerente atingiam, como já dito, todo o setor de vendas, bem como o administrativo, o que não caracteriza, certamente, um pequeno número de funcionários, como sustenta a ré.

(...)

Existe uma série de fatores que justificam uma condenação elevada.

Em primeiro lugar, a reparação do dano moral coletivo tem função predominantemente sancionatória. Diferentemente das reparações normais, que como o próprio nome indica, se preocupam mais fortemente com a restituição ao status quo ante, a reparação por dano moral coletivo tem nítido caráter pedagógico, que assume prevalência até mesmo em relação à indenização propriamente do dano causado à coletividade.

Além disso, a conduta da ré evidenciou alto grau de culpabilidade, e a resistência que demonstra à conciliação do feito (recusou o Termo de Ajustamento de Conduta e não aceitou a proposta do MPT de acordo judicial) indicam a necessidade de imposição de condenação pesada, de forma a tornar desvantajosa economicamente a conivência/tolerância com comportamentos similares.

Todavia, o valor de R$ 500.000,00 é por demais elevado. Com base no princípio da razoabilidade, é de se reduzir o valor da condenação para R$ 300.000,00.

Por fim, não há que se falar em aplicação da Lei 5.250/67, eis que a mesma trata de liberdade de manifestação do pensamento, sendo que os arts. 49/54 que invoca tratam da reparação por lesão perpetrada no exercício daquela liberdade, não guardando qualquer relação com o tema aqui tratado.

5.5. Em conclusão, dá-se provimento parcial ao recurso ordinário patronal para reduzir a condenação à indenização por dano moral coletivo para R$ 300.000,00, bem como determinar a entrega apenas da decisão condenatória final.

Como se vê pela transcrição acima, o valor arbitrado à reparação foi fixado com base em critérios razoáveis e com total transparência, levando em conta a extensão da gravidade, sua repercussão social e o porte da empresa.

Ademais e, como não se desconhece, a reparabilidade do dano moral coletivo não pode ter as mesmas premissas do dano moral tradicional, já que este, baseado no Código Civil, é dotado de cunho meramente patrimonialista e individualista, não enxergando, assim, os valores transindividuais de um sentimento coletivo.

De fato, a honra coletiva tem princípios próprios que não se confundem com os interesses pessoais. Leva em conta a carga de valores de uma comunidade como um todo, corporificando-se no momento em que se atestam os objetivos, as finalidades e a identidade de uma comunidade política.

Nessa senda e considerando que o Texto Constitucional afirma a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho, a livre iniciativa e o pluralismo político, como sendo fundamentos do Estado Democrático de Direito, tem-se que a Empresa Ré, por intermédio de um de seus prepostos, ao desrespeitar e submeter seus trabalhadores a condições humilhantes de trabalho, circunstância, aliás, agravada pelo fato de a diretoria, quando informada, mais do que manifestar descaso, demonstrar concordância e aprovação em relação à conduta do autor do gravame, produziu uma lesão significativa a interesses extrapatrimoniais da coletividade e, como tal, merece ser condenada na reparação do mal, em valor adequado e justo.

De fato, o ato da reclamada não só lesionou os princípios inerentes a dignidade da pessoa humana, comprometendo a qualidade de vida dos trabalhadores, como também violou diversos valores sociais, na medida em que a prática atingiu também, como é curial, a vida familiar, a vida comunitária e a sociedade como um todo.

Assim, considerando a gravidade do ato, o alto grau de culpabilidade da ré, o grande número de empregados vitimados pelo assédio moral, a resistência da ré às negociações e o descaso da direção da empresa, de se concluir que o valor indenizatório fixado mostra-se razoável à situação.

Ileso o art. 5º, V da CF, o apelo não merece trânsito.

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Egrégia 7ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por maioria, negar provimento ao agravo de instrumento, vencido o Exmo. Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos que juntará voto divergente.

Brasília, 17 de março de 2010.

MARIA DORALICE NOVAES
Juíza Convocada Relatora

NIA: 5075283

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