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quinta-feira, 8 de abril de 2010

Informativo STF 580 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Informativo STF


Brasília, 22 a 26 de março de 2010 - Nº 580.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO

Plenário
Impedimento de Ministro e Sucessor - 1
Competência para a Execução - 2
Reclamação e Legitimidade de Ministério Público Estadual - 1
Reclamação e Legitimidade de Ministério Público Estadual - 2
Repercussão Geral
Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 1
Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 2
Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 3
Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 4
Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 5
Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 6
Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 7
Forças Armadas: Limite de Idade para Concurso de Ingresso e Art. 142, § 3º, X, da CF - 1
Forças Armadas: Limite de Idade para Concurso de Ingresso e Art. 142, § 3º, X, da CF - 2
Forças Armadas: Limite de Idade para Concurso de Ingresso e Art. 142, § 3º, X, da CF - 3
1ª Turma
Denúncia Anônima: Investigação Criminal e Quebra de Sigilo Telefônico - 1
Denúncia Anônima: Investigação Criminal e Quebra de Sigilo Telefônico - 2
Denúncia Anônima: Investigação Criminal e Quebra de Sigilo Telefônico - 3
Crimes contra a Ordem Tributária e Persecução Penal
Demora na Prestação Jurisdicional e Interesse na Decisão - 2
Interrogatório e Entrevista Reservada com Defensor
Art. 155, § 2º, do CP: Furto Qualificado e Privilégio - 3
2ª Turma
Prisão Preventiva e Falta de Fundamentação
Repercussão Geral
Transcrições
Governador do Distrito Federal - Prisão Preventiva - Admissibilidade (HC 102732/DF)
Inovações Legislativas


PLENÁRIO

Impedimento de Ministro e Sucessor - 1

Em conclusão de julgamento, o Tribunal proveu parcialmente agravo regimental interposto pela União contra decisão do Min. Marco Aurélio, então Presidente do Supremo Tribunal Federal, que julgara improcedentes os pedidos por ela formulados em embargos à execução de acórdão que julgara procedente, em parte, pedido formulado em ação cível originária. Alegava a agravante a nulidade da decisão impugnada, porque prolatada monocraticamente, ao fundamento de que os embargos opostos à execução do julgado consubstanciariam nova ação de conhecimento, a atrair a competência do Plenário, a teor do disposto nos artigos 5º, IV, e 247 a 251 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal - RISTF. Reiterava, ainda, os argumentos de nulidade da execução e excesso de execução — v. Informativo 310. Preliminarmente, o Tribunal decidiu que o Min. Dias Toffoli, sucessor do Min. Sepúlveda Pertence, impedido, poderia participar do julgamento. Considerou-se, no ponto, a natureza intuitu personae do instituto do impedimento, asseverando não haver comunicação nem do impedimento, nem da suspeição, àquele que sucede.
ACO 342 AgR - Embargos à Execução/ DF, rel. Min. Marco Aurélio, 24.3.2010. (ACO-342) Audio

Competência para a Execução - 2

Em seguida, afastou-se a alegada nulidade da decisão impugnada, por se entender ser da competência do Presidente do STF executar e fazer executar as ordens e decisões do Tribunal, ressalvadas as atribuições dos Presidentes das Turmas e dos relatores, nos termos do art. 13 do RISTF. Ressaltou-se que a União estaria a evocar dispositivos do RISTF que estariam a disciplinar não a execução, mas causas originárias da competência do Tribunal. Observou-se que, conquanto os embargos à execução consubstanciem ação, ter-se-ia que o ajuizamento revelaria incidente da execução, surgindo, então, a competência do Presidente da Corte. No mérito, concluiu-se pela existência de excesso na execução, haja vista a incidência de juros de mora desde 1985 relativamente a parcelas que teriam sido retidas pela União, indevidamente, somente nos anos de 1988 e 1989.
ACO 342 AgR - Embargos à Execução/ DF, rel. Min. Marco Aurélio, 24.3.2010. (ACO-342)

Reclamação e Legitimidade de Ministério Público Estadual - 1

O Tribunal iniciou julgamento de reclamação ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra acórdão de Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça paulista que, no julgamento de agravo de execução interposto em favor de condenado preso, dera-lhe provimento para restabelecer o direito do executado à remição dos dias trabalhados, cuja perda fora decretada em razão do cometimento de falta grave. Sustenta o reclamante violação ao Enunciado da Súmula Vinculante 9 [“O disposto no artigo 127 da Lei nº 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) foi recebido pela ordem constitucional vigente, e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do artigo 58.”]. A Min. Ellen Gracie, relatora, inicialmente, afirmou que o Ministério Público do Estado de São Paulo não possuiria legitimidade para propor originariamente reclamação perante o Supremo, haja vista incumbir ao Procurador-Geral da República exercer as funções do Ministério Público junto a esta Corte, nos termos do art. 46 da Lei Complementar 75/93. Observou, entretanto, que essa ilegitimidade teria sido corrigida pelo Procurador-Geral da República, que ratificara a petição inicial e assumira a iniciativa da demanda. Assim, deferiu a admissão do Procurador-Geral da República como autor da demanda, no que foi acompanhada pelo Min. Dias Toffoli.
Rcl 7358/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 25.3.2010. (Rcl-7358) Audio

Reclamação e Legitimidade de Ministério Público Estadual - 2

Em divergência, o Min. Marco Aurélio considerou que, como o Ministério Público Estadual atuara na 1ª e na 2ª instâncias, ao vislumbrar desrespeito ao citado verbete, seria ele parte legítima na reclamação perante o Supremo. No mesmo sentido votaram os Ministros Celso de Mello e Cezar Peluso. O Min. Celso de Mello também concluiu que o Ministério Público Estadual disporia de legitimação ativa para formular ele próprio, perante o Supremo, reclamação em situações como esta que os autos registram. Ao mencionar que o Ministério Público do Trabalho não disporia dessa legitimidade por uma singularidade, qual seja, a de integrar o Ministério Público da União, cujo chefe é o Procurador Geral da República, aduziu que, entretanto, não existiria qualquer relação de dependência entre o Ministério Público da União e o Ministério Público dos Estados-membros. Acrescentou que, muitas vezes, inclusive, os Ministérios Públicos Estaduais poderiam formular representação perante o Supremo, deduzindo pretensão com a qual não concordasse, eventualmente, a chefia do Ministério Público da União, o que obstaria o acesso do parquet local no controle do respeito e observância, por exemplo, de súmulas impregnadas de eficácia vinculante. O Min. Cezar Peluso, por sua vez, ressaltou que fazer com que o Ministério Público Estadual ficasse na dependência do que viesse a entender o Ministério Público Federal seria incompatível, dentre outros princípios, com o da paridade de armas. Disse, ademais, que se estaria retirando do Ministério Público Estadual uma legitimidade que seria essencial para o exercício das funções dele, as quais não seriam exercidas pelo Ministério Público Federal. Ponderou, ainda, que a orientação segundo a qual só o Procurador Geral da República poderia atuar perante o Supremo estaria disciplinada na Lei Complementar 75/93, em um capítulo que só cuidaria do Ministério Público da União, e que o art. 46 dessa lei, específico desse capítulo, estaria estabelecendo incumbir ao Procurador Geral da República as funções do Ministério Público Federal perante o Supremo, mas não as funções de qualquer Ministério Público. Após, pediu vista dos autos o Min. Ayres Britto.
Rcl 7358/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 25.3.2010. (Rcl-7358)

REPERCUSSÃO GERAL
Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 1

O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto pela União contra acórdão do Tribunal Superior do Trabalho - TST em que se discute a justiça competente para, após a instituição do Regime Jurídico Único dos servidores públicos federais - RJU (Lei 8.112/90), julgar os efeitos de decisão anteriormente proferida pela Justiça do Trabalho acobertada pelo trânsito em julgado. Alega a recorrente ofensa aos artigos 105, I, d, e 114, da CF, em razão da incompetência da Justiça do Trabalho em relação aos efeitos da execução depois da instituição da Lei 8.112/90, bem como aos artigos 2º, 5º, II, XXIV, XXXVI, LIV e LV, e 22, I, todos da CF, tendo em vista que a Justiça trabalhista deixara de reconhecer a invalidade de coisa julgada inconstitucional, relativa à sentença que considerara devido, aos servidores da Justiça Eleitoral do Ceará, o reajuste de 84,32% referente ao Plano Collor (março/90). Sustenta, ainda, que o título judicial seria inexigível, na forma prevista no § 5º do art. 884 da CLT (“Considera-se inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal ou em aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal.”), porque o Supremo, no julgamento do MS 21216/DF (DJU de 28.6.91), teria concluído pela inexistência de direito adquirido ao citado reajuste.
RE 590880/CE, rel. Min. Ellen Gracie, 24.3.2010. (RE-590880) Audio

Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 2

A Min. Ellen Gracie, relatora, deu provimento ao recurso para declarar a incompetência da Justiça do Trabalho em relação ao período posterior à instituição do RJU e reconhecer, em relação ao período anterior, a inexigibilidade do título executivo judicial, tal como previsto no art. 884, § 5º, da CLT. Examinou, primeiro, a apontada afronta aos artigos 105, I, d, e 114, ambos da CF. Asseverou que, para regulamentar o art. 39 da CF (“A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.”), teria sido editada a Lei 8.112/90, que instituiu o RJU dos servidores públicos federais, e que, até a criação deste, em 1º.1.91, o vínculo dos servidores, ora requeridos, era regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT. Reportou-se, em seguida, à orientação firmada no julgamento do AI 313149 AgR/DF (DJU de 3.5.2002), no sentido de que a mudança do regime celetista para o estatutário implica a efetiva extinção do contrato de trabalho anteriormente firmado entre o servidor e a União, e de diversos precedentes posteriores no mesmo sentido. Com base nisso, afirmou a impossibilidade da conjugação dos direitos originados do regime celetista com os direitos decorrentes da relação estatutária, em decorrência da inexistência de direito adquirido a regime jurídico, conforme jurisprudência pacífica da Corte.
RE 590880/CE, rel. Min. Ellen Gracie, 24.3.2010. (RE-590880)

Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 3

A relatora frisou que, tendo havido a extinção do contrato do trabalho e não sendo possível aplicar um regime híbrido, seria necessário analisar a competência dos órgãos jurisdicionais no presente caso em dois momentos distintos, quais sejam, antes e depois da instituição do RJU. No que tange às parcelas anteriores ao RJU, reputou ser da Justiça do Trabalho a competência, na linha de vários precedentes do Supremo. No que se refere ao direito a vantagens eventualmente surgidas já na vigência do regime estatutário, entendeu que a competência seria da Justiça Comum, e citou o que decidido, por exemplo, no AI 367056 AgR/RS (DJU de 18.5.2007). Constatou que, ao contrário do que decidira a Corte de origem, não estaria incluída na competência da Justiça do Trabalho, estabelecida no art. 114 da CF, apreciar os efeitos de sentença trabalhista em relação ao período posterior à edição da Lei 8.112/90. Dessa forma, acolheu, neste ponto, a alegação de violação ao art. 114 da CF.
RE 590880/CE, rel. Min. Ellen Gracie, 24.3.2010. (RE-590880)

Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 4

Em seqüência, a relatora, diante da existência de parcelas anteriores à entrada em vigor da Lei 8.112/90, passou a analisar a citada violação ao art. 5º, XXXVI, da CF. Observou que o exercício absoluto de um direito fundamental quase sempre não encontraria lugar na complexidade que emergiria da realidade, e que se reconheceria que, num Estado de Direito, mesmo os direitos mais caros e indispensáveis a uma determinada coletividade não poderiam ter seu pleno exercício garantido incondicionalmente, sob pena de nulificação de outros direitos igualmente fundamentais. Aduziu que tal reconhecimento seria fruto de amadurecimento, da evolução social e política de um povo, a demonstrar valores como o equilíbrio, a ponderação e a eqüidade. Daí, para a relatora, a utilidade do juízo de proporcionalidade ou de razoabilidade no exame das normas conformadoras de direitos fundamentais, que deveria passar pelo crivo dos critérios da adequação, da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito. Ao se referir ao § 5º do art. 884 da CLT, disse que, no caso sob exame, ter-se-ia, claramente, norma que viabilizaria a rediscussão de questão que, encerrada em sentença judicial transitada em julgado, já se encontraria submetida aos efeitos da coisa julgada. Seria, então, preciso verificar, para fins de reconhecimento da sua compatibilização com a ordem constitucional vigente, se a restrição nela contida estaria ou não autorizada pelo art. 5º, XXXVI, da CF. Registrou ser necessário considerar, nessa análise, que a restrição a direito fundamental constitucionalmente autorizada seria a estritamente indispensável para evitar o esvaziamento de outro direito fundamental. No caso, a lei criaria hipóteses nas quais a coisa julgada seria relativizada, assim como se daria com a ação rescisória, criada por lei cuja constitucionalidade teria sido reconhecida pelo Supremo.
RE 590880/CE, rel. Min. Ellen Gracie, 24.3.2010. (RE-590880)

Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 5

A Min. Ellen Gracie destacou que a harmonização dos dispositivos constitucionais seria de fundamental importância, haja vista preservar características formais próprias do Estado de Direito, assegurando a correta atuação do Poder Público, mediante prévia subordinação a certos parâmetros ou valores antecipadamente estabelecidos em lei específica e, sobretudo, a princípios inscritos na própria Constituição. Com isso, o Poder Público deveria se submeter à ordem normativa do Estado de Direito, seja possibilitando a sua atuação, garantindo o interesse coletivo, seja quando atua protegendo os direitos individuais, criando um verdadeiro obstáculo a sua atuação ilegítima. Considerou que a criação de determinadas hipóteses em que o indivíduo não pudesse invocar a existência de coisa julgada teria por fundamento o respeito a outros dispositivos igualmente constitucionais. Salientou que a nociva manutenção de decisões divergentes do entendimento firmado por esta Corte também provocaria grave insegurança jurídica, o que violaria o art. 5º, XXXVI, da CF. Ademais, a continuidade no pagamento de parcelas que foram depois consideradas inconstitucionais pelo Supremo também estaria em confronto com o princípio da isonomia e a própria competência constitucional desta Corte. A respeito da utilização de instrumentos que possibilitariam a solução da divergência de decisões que tratassem de matéria constitucional, reportou-se ao RE 328812 ED/AM (DJE de 2.5.2008), e, ainda, ao RE 198604 EDv-ED/PR (DJE de 22.5.2009), no sentido de que o Supremo deve evitar a adoção de soluções divergentes, principalmente em relação a matérias exaustivamente discutidas por seu Plenário, já que a manutenção de decisões contraditórias comprometeria a segurança jurídica, por provocar nos jurisdicionados inaceitável dúvida quanto à adequada interpretação da matéria submetida a esta Corte.
RE 590880/CE, rel. Min. Ellen Gracie, 24.3.2010. (RE-590880)

Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 6

A relatora ressaltou, além disso, que o Supremo já decidira que a instituição do regime estatutário tentara por fim às disparidades existentes entre os servidores e que, além da isonomia, a decisão recorrida desrespeitaria a própria determinação de criação de um regime jurídico único para os servidores públicos. Verificou que, por qualquer dos fundamentos apresentados, a manutenção de parcelas, incorporadas pelo servidor enquanto celetista, após a sua migração ao regime estatutário, provocaria um enfraquecimento da força normativa da própria Constituição. Enfatizou estar-se diante de execução de sentença que condenara a União a pagar a diferença de correção decorrente da edição do Plano Collor (84,32%), a partir de abril de 1990, aos servidores públicos do TRE do Estado do Ceará, reajuste este já declarado inconstitucional pelo Supremo. Mencionou que o acórdão recorrido afastara a aplicação do § 5º do art. 884 da CLT ao fundamento de que o objeto da presente ação não seria a aplicação do IPC de março de 1990, de 84,32%, para a correção dos salários, mas de extensão dos efeitos da decisão da Justiça Federal com base no princípio da isonomia, não estando em discussão a norma em relação a qual o Supremo teria declarado a inconstitucionalidade. Avaliou que, ainda que por fundamento transverso, estaria sendo efetivamente aplicada interpretação tida por inconstitucional por este Tribunal em decorrência da violação ao art. 5º, XXXVI, da CF.
RE 590880/CE, rel. Min. Ellen Gracie, 24.3.2010. (RE-590880)

Efeitos de Decisão Transitada em Julgado: Instituição do RJU e Competência - 7

Acrescentou que a própria aplicação do princípio da isonomia para extensão de vantagens concedidas a outros servidores também seria vedada pela jurisprudência deste Supremo, nos termos da Súmula 339 (“Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob fundamento de isonomia.”). Para a Ministra, o TST, desconsiderando a proporcionalidade existente na norma legal agora em estudo, teria conferido à coisa julgada um caráter quase que absoluto, deixando de aplicar o previsto no art. 884, § 5º, da CLT, o que não se coadunaria com o art. 5º, XXXVI, da CF. Além disso, com a instituição de um novo regime jurídico, a remuneração do servidor deveria ser calculada de acordo com a nova previsão legal. Tal entendimento estaria de acordo com a jurisprudência desta Corte, segundo a qual não é possível a conjugação de direitos do anterior e do novo sistema remuneratório, em razão da inexistência de direito adquirido a regime jurídico, devendo ser aplicada a mesma orientação aos efeitos de uma decisão judicial que reconhecesse o direito do servidor de receber determinada parcela remuneratória. Afirmou que, ainda que transitada em julgado, a sentença não poderia produzir efeitos após a instituição de um novo regime jurídico, sob pena de se reconhecer a existência de um regime híbrido, no qual o servidor receberia as vantagens previstas nos dois sistemas. Assim, concluiu que a decisão judicial somente poderia produzir efeitos antes da modificação de regime e que, no presente caso, estar-se-ia permitindo que uma decisão judicial que reconhecera o direito ao reajuste de março de 1990, de 84,32%, tivesse aplicação sobre todos os reajustes posteriores, indefinidamente, o que inadmissível. Após o voto da relatora, que foi acompanhada pelos Ministros Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski, dos votos dos Ministros Eros Grau, Ayres Britto e Cezar Peluso, que negavam provimento ao recurso, e do voto do Min. Marco Aurélio, que também lhe negava provimento e declarava a inconstitucionalidade do art. 884, § 5º, da CLT, pediu vista dos autos o Min. Gilmar Mendes, Presidente.
RE 590880/CE, rel. Min. Ellen Gracie, 24.3.2010. (RE-590880)

Forças Armadas: Limite de Idade para Concurso de Ingresso e Art. 142, § 3º, X, da CF - 1

O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se discute a constitucionalidade, ou não, do estabelecimento de limite de idade por edital de concurso para ingresso nas Forças Armadas. Trata-se, na espécie, de recurso interposto pela União contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que entendera que, em relação ao ingresso na carreira militar, a Constituição Federal exigiria que lei dispusesse a respeito do limite de idade (CF, art. 142, § 3º, X: “a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra.”), não se admitindo, portanto, que um ato administrativo estabelecesse a restrição, sob pena de afronta ao princípio constitucional da ampla acessibilidade aos cargos públicos. Preliminarmente, o Tribunal julgou prejudicado, por perda de objeto, o RE 572499/SC, apregoado em conjunto, em virtude de nele terem os impetrantes requerido o cancelamento da matrícula no curso de formação.
RE 572499/SC, rel. Min. Cármen Lúcia, 25.3.2010. (RE-572499) Audio
RE 600225/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, 25.3.2010. (RE-600225)

Forças Armadas: Limite de Idade para Concurso de Ingresso e Art. 142, § 3º, X, da CF - 2

A Min. Cármen Lúcia, relatora, negou provimento ao recurso por entender que, tendo a Constituição Federal determinado, em seu art. 142, § 3º, X, que os requisitos para o ingresso nas Forças Armadas são os previstos em lei, com referência expressa ao critério de idade, não caberia regulamentação por meio de outra espécie normativa. Considerou, por conseguinte, não recepcionada pela Carta Magna a expressão “e nos regulamentos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica”, contida no art. 10 da Lei 6.880/80, que dispõe sobre o Estatuto dos Militares (“Art. 10 O ingresso nas Forças Armadas é facultado mediante incorporação, matrícula ou nomeação, a todos os brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei e nos regulamentos da marinha, do exército e da aeronáutica.”.). Afirmou ser inquestionável a prerrogativa das Forças Armadas de instituir por regulamento de cada Força, e até mesmo nos editais de concursos, os procedimentos relativos a todo o certame. Aduziu que o conteúdo definido constitucionalmente como sendo objeto de cuidado a ser levado a efeito por lei haveria de ser desdobrado, de forma detalhada, nos atos administrativos, tais como os regulamentos e editais. Observou, contudo, que esses atos não poderiam inovar nos pontos em que a legislação não tivesse estatuído. Registrou, ainda, que, no item específico relativo à definição dos limites de idade, a fixação do requisito por regulamento ou edital, categoria de atos administrativos, esbarraria, inclusive, na Súmula 14 do STF (“Não é admissível, por ato administrativo, restringir, em razão da idade, inscrição em concurso para cargo público.”).
RE 572499/SC, rel. Min. Cármen Lúcia, 25.3.2010. (RE-572499)
RE 600225/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, 25.3.2010. (RE-600225)

Forças Armadas: Limite de Idade para Concurso de Ingresso e Art. 142, § 3º, X, da CF - 3

Por fim, a relatora, com base no princípio da segurança jurídica, tendo em conta que passados quase 22 anos de vigência da CF/88, nos quais vários concursos foram realizados com observância daquela regra geral, propôs que a decisão somente se aplique aos concursos para ingresso nas Forças Armadas iniciados a partir deste julgamento, preservado o direito daqueles que já tenham ajuizado ações com o mesmo objeto jurídico da que ora se examina. Ainda determinou expedição de ofício à recorrente para cumprimento de decisão proferida em primeira instância, inclusive quanto ao direito do ora recorrido de ter acesso às informações sobre a sua situação. Em divergência, o Min. Dias Toffoli deu provimento ao recurso, e reputou recepcionada pela CF/88 a Lei 6.880/80, ao fundamento de ali se tratar de questões relativas à natureza específica das corporações militares, ou seja, questões relativas a critérios de idade, de condições físicas. Asseverou, assim, que a Lei 6.880/80 teria regulamentado a matéria na forma como exige o art. 142, § 3º, X, da CF, e que o legislador ordinário poderia estabelecer critérios gerais e determinar ao regulamento que fixasse outros critérios, em razão da especificidade das Forças Armadas e das características e dos critérios necessários ao ingresso nas Armas. Após, pediu vista dos autos o Min. Ricardo Lewandowski.
RE 572499/SC, rel. Min. Cármen Lúcia, 25.3.2010. (RE-572499)
RE 600225/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, 25.3.2010. (RE-600225)

1ª parte Vídeo
2ª parte Vídeo
3ª parte Vídeo

PRIMEIRA TURMA

Denúncia Anônima: Investigação Criminal e Quebra de Sigilo Telefônico - 1

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus no qual se pleiteava o trancamento de investigação ou qualquer persecução criminal iniciada com base exclusivamente em denúncias anônimas. Tratava-se, na espécie, de procedimento investigatório — que culminara com a quebra de sigilo telefônico dos pacientes — instaurado com base em delação apócrifa para apurar os crimes de associação para o tráfico de entorpecentes (Lei 6.368/76, art. 14) e de corrupção passiva majorada (CP, art. 317, § 1º), supostamente praticados por oficiais de justiça que estariam repassando informações sobre os locais de cumprimento de mandados de busca e apreensão e de prisão. Destacou-se, de início, entendimento da Corte no sentido de que a denúncia anônima, por si só, não serviria para fundamentar a instauração de inquérito policial, mas que, a partir dela, poderia a polícia realizar diligências preliminares para apurar a veracidade das informações obtidas anonimamente e, então, instaurar o procedimento investigatório propriamente dito.
HC 95244/PE, rel. Min. Dias Toffoli, 23.3.2010. (HC-95244)

Denúncia Anônima: Investigação Criminal e Quebra de Sigilo Telefônico - 2

Salientou-se que, no caso, a partir de informações obtidas por colaboradores, e, posteriormente, somadas às mencionadas ligações anônimas, policiais — ainda sem instaurar o pertinente inquérito policial — diligenciaram no sentido de apurar as identidades dos investigados e a veracidade das respectivas ocupações funcionais, tendo eles confirmado tratar-se de oficiais de justiça, cujos nomes eram os mesmos fornecidos pelos “denunciantes”. Asseverou-se que, somente após essas explicitações, o delegado representara ao Judiciário local pela necessidade de quebra do sigilo telefônico dos investigados, considerando-se, no ponto, que os procedimentos tomados pela autoridade policial estariam em perfeita consonância com a jurisprudência do STF. Registrou-se, ademais, que o juízo monocrático, em informações prestadas, comunicara o devido recebimento da denúncia, porquanto demonstrada a existência da materialidade dos crimes imputados e indícios suficientes de autoria, não sendo o caso de rejeição sumária.
HC 95244/PE, rel. Min. Dias Toffoli, 23.3.2010. (HC-95244)

Denúncia Anônima: Investigação Criminal e Quebra de Sigilo Telefônico - 3

Vencido o Min. Marco Aurélio, que deferia o writ para trancar a ação penal em curso contra os pacientes. Afirmava estar-se diante de um ato de constrição maior, a afastar a privacidade quanto às comunicações telefônicas, que é inviolável (CF, art. 5º, XII), não se podendo ter a persecução criminal simplesmente considerada denúncia anônima. Frisava que, no caso, simplesmente se buscara saber se aqueles indicados como a beneficiarem, quanto a cumprimento de mandados, delinqüentes seriam, ou não, oficiais de justiça. Aduzia ser muito pouco para se chegar a este ato extremo, saindo-se da estaca zero para o ponto de maior constrição, que é o da interceptação telefônica, na medida em que não se investigara coisa alguma. Considerava que, se assim o fosse, bastaria um ofício ao tribunal local para que este informasse sobre a identidade dos oficiais de justiça. Precedente citado: HC 84827/TO (DJE de 23.11.2007).
HC 95244/PE, rel. Min. Dias Toffoli, 23.3.2010. (HC-95244)

Crimes contra a Ordem Tributária e Persecução Penal

Os delitos previstos no art. 1º da Lei 8.137/90 são de natureza material, exigindo para sua tipificação a constituição definitiva do crédito tributário para o desencadeamento da ação penal. Tendo em conta essa orientação, a Turma deferiu habeas corpus para reconhecer a nulidade de ação penal instaurada contra acusados pela suposta prática de crimes contra a ordem tributária (Lei 8.137/90, art. 1º, III), por vislumbrar, no caso, falta de justa causa para o desencadeamento da ação penal. Alegava a impetração que a persecução penal iniciara-se antes mesmo de haver qualquer ato de fiscalização, e que o processo administrativo tendente a constituir o crédito tributário somente se encerrara pouco antes de prolatado acórdão pelo TRF da 3ª Região, em virtude de decisão do Conselho de Contribuintes, que negara provimento aos recursos interpostos pela empresa da qual os pacientes são sócios. Sustentava, assim, que a materialidade do crime não estaria configurada por ocasião do recebimento da denúncia e, em conseqüência, inexistiria justa causa apta a autorizar o desencadeamento da ação penal. Asseverou-se que careceria de justa causa qualquer ato investigatório ou persecutório judicial antes do pronunciamento definitivo da administração fazendária no tocante ao débito fiscal e responsabilidade do contribuinte. Considerou-se que o parquet não teria a faculdade de decidir subjetivamente sobre o que seria, numa visão prospectiva, “definitivo” em termos de lançamento tributário, autorizando, destarte, o oferecimento da denúncia antes de constituído o crédito em favor do Fisco. Ressaltou-se, ademais, que tal entendimento encontrar-se-ia, já por ocasião do recebimento da denúncia, pacificado no STF, e consubstanciada na Súmula Vinculante 24 (“Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.”).
HC 97118/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 23.3.2010. (HC-97118)

Demora na Prestação Jurisdicional e Interesse na Decisão - 2

Em conclusão de julgamento, a Turma deferiu habeas corpus para cassar acórdão proferido pelo STJ e convalidar vício processual que dera origem a writ impetrado naquela Corte. No caso, a impetração alegava que acórdão do STJ — que anulara processo penal, desde o recebimento da denúncia, por inobservância do art. 38 da Lei 10.409/2002 — causaria prejuízo ao paciente, haja vista que prolatado após mais de 2 anos da impetração, quando este já teria cumprido mais de 2/3 da pena e obtido o livramento condicional — v. Informativo 547. Considerou-se que, se o próprio paciente não teria mais interesse na decisão que lhe fora favorável, não haveria dúvida de que a nulidade outrora existente teria sido superada. Além disso, aduziu-se ser necessária a observância da utilidade das decisões proferidas no processo penal, bem como do princípio constitucional da razoável duração do processo.
HC 96079/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 23.3.2010. (HC-96079)

Interrogatório e Entrevista Reservada com Defensor

A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se alega constrangimento ilegal decorrente da ausência de citação do paciente e da não concessão do direito de entrevista reservada com o seu defensor, o que acarretaria a nulidade absoluta da ação penal. Aduz a impetração que o oficial de justiça, não localizando o paciente, procedera à citação de 3ª pessoa, no caso, a ex-companheira daquele, bem como que, com o advento da Lei 10.792/2003, seria dever do magistrado assegurar ao acusado a citada entrevista reservada, na qual poderá receber orientação técnica de seu defensor, a fim de propiciar maior segurança e amplitude de defesa. O Min. Dias Toffoli, relator, indeferiu o writ. Tendo em conta o comparecimento espontâneo do paciente ao interrogatório, entendeu que a citação, embora irregular, operara seu sentido. Ademais, enfatizou que, durante tal ato, fora nomeado defensor público, o qual fizera perguntas e posteriormente apresentara defesa prévia e alegações finais. Consignou, ainda, não haver prova de que não tivesse sido garantido ao paciente o direito de entrevista reservada, impugnação esta não argüida nos momentos processuais oportunos. Em divergência, o Min. Marco Aurélio concedeu a ordem para declarar insubsistente o processo a partir do vício originado do fato de não se ter aberto oportunidade ao acusado para a entrevista. Assentou que o juiz, ao constatar a falta de defensor, deveria ter suspendido a audiência para que o paciente tivesse contato com o defensor público designado. Reputou tratar-se de nulidade absoluta, haja vista que o contato prévio com o defensor constitui formalidade essencial à valia do ato. Salientou que a não alegação desse vício à primeira hora apenas confirmaria que o paciente estivera indefeso, equivocando-se o defensor público e o juiz. Afastou, também, a possibilidade de se cogitar de nulidade da citação ante o disposto no art. 570 do CPP (“A falta ou a nulidade da citação, da intimação ou notificação estará sanada, desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz para o único fim de argüi-la. O juiz ordenará, todavia, a suspensão ou o adiamento do ato, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar direito da parte.”). Após o voto do Min. Ayres Britto, acompanhando a divergência, pediu vista dos autos a Min. Cármen Lúcia.
HC 96465/MG, rel. Min. Dias Toffoli, 24.3.2010. (HC-96465)

Art. 155, § 2º, do CP: Furto Qualificado e Privilégio - 3

Em conclusão de julgamento, a Turma, por maioria, deferiu habeas corpus para assentar a compatibilidade entre as hipóteses de furto qualificado e o privilégio constante do § 2º do art. 155 do CP. No caso, o paciente fora condenado pela prática do crime previsto no art. 155, § 4º, I, do CP, em virtude da subtração de um aparelho de som, mediante arrombamento de janela, à pena de 2 anos, a qual fora substituída por 2 penas restritivas de direito (CP, art. 44) — v. Informativo 557. Aduziu-se que a jurisprudência do STF é assente no sentido da conciliação entre homicídio objetivamente qualificado e, ao mesmo tempo, subjetivamente privilegiado. Dessa forma, salientou-se que, em se tratando de circunstância qualificadora de caráter objetivo (meios e modos de execução do crime), seria possível o reconhecimento do privilégio, o qual é sempre de natureza subjetiva. Entendeu-se que essa mesma regra deveria ser aplicada na presente situação, haja vista que a qualificadora do rompimento de obstáculo (natureza nitidamente objetiva) em nada se mostraria incompatível com o fato de ser o acusado primário e a coisa de pequeno valor. Ademais, considerando a análise das circunstâncias judiciais (CP, art. 59) realizada pelo juízo monocrático, que revelara a desnecessidade de uma maior reprovação, reduziu-se a pena em 1/3, para torná-la definitiva em 8 meses de reclusão, o que implicaria a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva em caráter retroativo, tendo em conta a ausência de recurso da acusação, bem como a menoridade do paciente (menor de 21 anos na data do fato). Assim, tendo em conta que o prazo prescricional de 1 ano já teria transcorrido entre a data do recebimento da denúncia e a data da publicação da sentença penal condenatória, julgou-se extinta a punibilidade do paciente pela prescrição retroativa. Vencido o Min. Marco Aurélio que denegava o writ por reputar incabível a mesclagem, aduzindo que o legislador, no que pretendera aplicar a crimes qualificados a causa de diminuição, assim o fizera.
HC 98265/MS, rel. Min. Ayres Britto, 24.3.2010. (HC-98265)



SEGUNDA TURMA


Prisão Preventiva e Falta de Fundamentação


A Turma, superando o óbice do Enunciado 691 da Súmula do STF, por maioria, concedeu, de ofício, habeas corpus para permitir que condenado pela prática dos crimes descritos nos artigos 33 e 35, c/c o art. 40, V, todos da Lei 11.343/2006 aguarde em liberdade o julgamento de idêntica medida no STJ. No caso, o juiz sentenciante, após condenar o paciente, mantivera a prisão cautelar ao fundamento de que nessa condição ele permanecera durante toda a instrução criminal. Aduziu-se que o magistrado, quando da prolação da sentença penal condenatória, tem um duplo dever: o de fundamentar o decreto de condenação penal e o de justificar a decretação da custódia cautelar ou a sua manutenção. Enfatizou-se que essa orientação fora positivada pela Lei 11.719/2008 (“Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: ... Parágrafo único. O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta.”). Entendeu-se que, na espécie, o magistrado não motivara nem sequer indicara as razões pelas quais mantivera a segregação. Estenderam-se os efeitos da decisão aos co-réus. Vencida a Min. Ellen Gracie, relatora, que não conhecia do writ.
HC 99914/SC, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Celso de Mello, 23.3.2010. (HC-99914)


Pleno 24.3.2010 25.3.2010 19
1ª Turma 23.3.2010 24.3.2010 22
2ª Turma 23.3.2010 — 109

R E P E R C U S S Ã O G E R A L
DJE de 26 de março de 2010

REPERCUSSÃO GERAL EM AI N. 771.770-PR
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA
DIREITO CONSTITUCIONAL. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. RECEPÇÃO DO DECRETO-LEI Nº 70/66. PRESENÇA DE REPERCUSSÃO GERAL.

REPERCUSSÃO GERAL EM AI N. 776.522-RS
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA
DIREITO DO TRABALHO. CONTRATO TEMPORÁRIO. CATEGORIA PROFISSIONAL ESPECIAL. PROFESSORES. FÉRIAS. INCIDÊNCIA DO TERÇO CONSTITUCIONAL SOBRE A INTEGRALIDADE DO PERÍODO DE FÉRIAS GOZADAS. MATÉRIA RESTRITA AO PLANO DO DIREITO LOCAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 598.365-MG
RELATOR: MIN. AYRES BRITTO
PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DE RECURSOS DA COMPETÊNCIA DE OUTROS TRIBUNAIS. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.
A questão alusiva ao cabimento de recursos da competência de outros Tribunais se restringe ao âmbito infraconstitucional. Precedentes.
Não havendo, em rigor, questão constitucional a ser apreciada por esta nossa Corte, falta ao caso “elemento de configuração da própria repercussão geral”, conforme salientou a ministra Ellen Gracie, no julgamento da Repercussão Geral no RE 584.608.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 599.628-DF
RELATOR: MIN. AYRES BRITTO
PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. REGIME DE PRECATÓRIOS. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. ART. 100 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALCANCE. REPERCUSSÃO GERAL DAS QUESTÕES CONSTITUCIONAIS.
Têm repercussão geral os temas constitucionais atinentes ao princípio da continuidade dos serviços públicos e à aplicabilidade do regime de precatórios às entidades da Administração Indireta que prestam tais serviços.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 600.091-MG
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA
COMPETÊNCIA. JUSTIÇA COMUM E JUSTIÇA DO TRABALHO. PEDIDOS DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO AJUIZADA PELOS SUCESSORES DO EMPREGADO FALECIDO. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

Decisões Publicadas: 5

TRANSCRIÇÕES

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.



Governador do Distrito Federal - Prisão Preventiva - Admissibilidade


(v. Informativo 577)

HC 102732/DF*

RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

Voto do Ministro CELSO DE MELLO.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Trata-se de “habeas corpus”, que, impetrado em favor de José Roberto Arruda, Governador do Distrito Federal, tem por finalidade garantir, ao ora paciente, o direito de liberdade, desconstituindo-se, em conseqüência, ato decisório que determinou a sua prisão preventiva.
Aponta-se, como autoridade coatora, a Corte Especial do E. Superior Tribunal de Justiça, que, ao referendar decisão do eminente Ministro FERNANDO GONÇALVES, Relator do Inq 650/DF, ora em curso perante aquela Corte judiciária, proferiu o ato apontado como coator.
Sustenta-se, na presente impetração, em síntese, que, da “(...) leitura atenta do decreto prisional, nele identificam-se três fatores determinantes de sua ilegalidade: (i) falta de submissão da prisão à apreciação do Poder Legislativo; (ii) total ausência de fundamentação pela autoridade judicial, com a mera reprodução textual do pedido de prisão preventiva subscrito pelo Ministério Público; (iii) falta de demonstração da necessidade efetiva da prisão” (fls. 263 – grifei).
Todos sabemos que a privação cautelar da liberdade individual é sempre qualificada pela nota da excepcionalidade. Não obstante o caráter extraordinário de que se reveste, a prisão preventiva pode efetivar-se, desde que o ato judicial que a formalize tenha fundamentação substancial, com base em elementos concretos e reais que se ajustem aos pressupostos abstratos - juridicamente definidos em sede legal - autorizadores da decretação dessa modalidade de tutela cautelar penal (RTJ 134/798, Rel. p/ o acórdão Min. CELSO DE MELLO).
É por essa razão que esta Corte, em pronunciamento sobre a matéria (RTJ 64/77), tem acentuado, na linha de autorizado magistério doutrinário (JULIO FABBRINI MIRABETE, “Código de Processo Penal Interpretado”, p. 376, 2ª ed., 1994, Atlas; PAULO LÚCIO NOGUEIRA, “Curso Completo de Processo Penal”, p. 250, item n. 3, 9ª ed., 1995, Saraiva; VICENTE GRECO FILHO, “Manual de Processo Penal”, p. 243/244, 1991, Saraiva), que, uma vez comprovada a materialidade dos fatos delituosos e constatada a existência de meros indícios de autoria - e desde que concretamente ocorrente qualquer das situações referidas no art. 312 do Código de Processo Penal -, torna-se legítima a decretação, pelo Poder Judiciário, dessa especial modalidade de prisão cautelar.
É inquestionável que a antecipação cautelar da prisão - qualquer que seja a modalidade autorizada pelo ordenamento positivo (prisão em flagrante, prisão temporária, prisão preventiva, prisão decorrente da decisão de pronúncia e prisão resultante de sentença penal condenatória recorrível) - não se revela incompatível com o princípio constitucional da presunção de inocência (RTJ 133/280 - RTJ 138/216 - RTJ 142/855 - RTJ 142/878 - RTJ 148/429 - HC 68.726/DF, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, v.g.).
Impõe-se ressaltar, no entanto, que a prisão cautelar (“carcer ad custodiam”) - que não se confunde com a prisão penal (“carcer ad poenam”) - não objetiva infligir punição à pessoa que sofre a sua decretação. Não traduz, a prisão cautelar, em face da estrita finalidade a que se destina, qualquer idéia de sanção. Constitui, ao contrário, instrumento destinado a atuar “em benefício da atividade desenvolvida no processo penal” (BASILEU GARCIA, “Comentários ao Código de Processo Penal”, vol. III/7, item n. 1, 1945, Forense), tal como esta Suprema Corte tem proclamado:

“A PRISÃO PREVENTIVA - ENQUANTO MEDIDA DE NATUREZA CAUTELAR - NÃO TEM POR OBJETIVO INFLIGIR PUNIÇÃO ANTECIPADA AO INDICIADO OU AO RÉU.
- A prisão preventiva não pode - e não deve - ser utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia.
A prisão preventiva - que não deve ser confundida com a prisão penal - não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal.”
(RTJ 180/262-264, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Daí a clara advertência do Supremo Tribunal Federal, que tem sido reiterada em diversos julgados, no sentido de que se revela absolutamente inconstitucional a utilização, com fins punitivos, da prisão cautelar, pois esta não se destina a punir o indiciado ou o réu, sob pena de manifesta ofensa às garantias constitucionais da presunção de inocência e do devido processo legal, com a conseqüente (e inadmissível) prevalência da idéia – tão cara aos regimes autocráticos – de supressão da liberdade individual, em um contexto de julgamento sem defesa e de condenação sem processo (HC 93.883/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).
Isso significa, portanto, que o instituto da prisão cautelar - considerada a função exclusivamente processual que lhe é inerente - não pode ser utilizado com o objetivo de promover a antecipação satisfativa da pretensão punitiva do Estado, pois, se assim fosse lícito entender, subverter-se-ia a finalidade da prisão preventiva, daí resultando grave comprometimento ao princípio da liberdade (HC 89.501/GO, Rel. Min. CELSO DE MELLO).
É por isso que esta Suprema Corte tem censurado decisões que fundamentam a privação cautelar da liberdade no reconhecimento de fatos que se subsumem à própria descrição abstrata dos elementos que compõem a estrutura jurídica do tipo penal:

“(...) PRISÃO PREVENTIVA - NÚCLEOS DA TIPOLOGIA - IMPROPRIEDADE. Os elementos próprios à tipologia bem como as circunstâncias da prática delituosa não são suficientes a respaldar a prisão preventiva, sob pena de, em última análise, antecipar-se o cumprimento de pena ainda não imposta (...).”
(HC 83.943/MG, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – grifei)

Essa asserção permite compreender o rigor com que o Supremo Tribunal Federal tem examinado a utilização, por magistrados e Tribunais, do instituto da tutela cautelar penal, em ordem a impedir a subsistência dessa excepcional medida privativa da liberdade, quando inocorrente hipótese que possa justificá-la:

“Não serve a prisão preventiva, nem a Constituição permitiria que para isso fosse utilizada, a punir sem processo, em atenção à gravidade do crime imputado, do qual (...) ‘ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória’ (CF, art. 5º, LVII).
O processo penal, enquanto corre, destina-se a   apurar uma responsabilidade penal; jamais a antecipar-lhe as conseqüências.
Por tudo isso, é incontornável a exigência de que a fundamentação da prisão processual seja adequada à demonstração da sua necessidade, enquanto medida cautelar, o que (...) não pode reduzir-se ao mero apelo à gravidade objetiva do fato (...).”
(RTJ 137/287, 295, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei)

Entendo, no entanto, que os fundamentos subjacentes ao ato decisório emanado do eminente Relator e referendado pela Corte Especial do E. Superior Tribunal de Justiça, que decretou a prisão cautelar do ora paciente, ajustam-se aos estritos critérios que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consagrou nessa matéria, tal como o demonstrou o eminente Relator em seu substancioso voto.
Vale registrar, por necessário, que se reveste de plena legitimidade jurídico-constitucional a adoção, pelo Relator do Inq 650/DF, o eminente Ministro FERNANDO GONÇALVES, da técnica da motivação “per relationem” (HC 69.438/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 69.987/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).
Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, pronunciando-se a propósito da técnica da motivação por referência ou por remissão, reconheceu-a compatível com o que dispõe o art. 93, inciso IX, da Constituição da República, como resulta de diversos precedentes firmados por esta Suprema Corte (HC 54.513/DF, Rel. Min. MOREIRA ALVES – RE 37.879/MG, Rel. Min. LUIZ GALLOTTI – RE 49.074/MA, Rel. Min. LUIZ GALLOTTI).
É que a remissão feita pela decisão ora impugnada - referindo-se, expressamente, aos fundamentos (de fato ou de direito) que deram suporte à formulação do pedido de prisão preventiva pelo Ministério Público - constitui meio apto a promover a formal incorporação, ao seu ato decisório, da motivação a que este último se reportou como razão de pedir, tal como se verifica na espécie.
As razões que fundamentam o decreto judicial de prisão cautelar, podem ser assim resumidas:

“35. Nestes termos, os indícios da participação do Governador José Roberto Arruda (...) na grave conduta criminosa de coação da testemunha (art. 343 do CP), que é crime contra a administração da justiça vêm de mais de uma fonte e incluem: o bilhete manuscrito; as declarações de Edson Sombra prestadas à Polícia Federal; as declarações de Antonio Bento prestadas à Polícia Federal; as declarações de Geraldo Naves dadas à imprensa - no sentido de que, de fato, foi incumbido de levar um bilhete do governador Arruda para Edson Sombra; o envolvimento de Rodrigo Arantes, secretário particular de Arruda, quem segundo Antonio Bento, enviou os R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) para serem entregues a Edson Sombra e, ainda, o envolvimento do ex-Secretário de Comunicação de Arruda, que confirma ter intermediado uma conversa entre Edson Sombra e o Governador.
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37. Com efeito, José Roberto Arruda, com o concurso (...), ofereceu e deu dinheiro a Edson Sombra e ofereceu-lhe vantagem contratual com o GDF e o Banco de Brasília, em janeiro e fevereiro de 2010, em troca da assinatura da carta cujo conteúdo contém declaração falsa de que Durval Barbosa Rodrigues manipulou e forjou os vídeos em que aparecem políticos, empresários e servidores públicos de Brasília, com o nítido propósito de incriminar o Governador do DF e outras pessoas. A afirmação falsa contida na carta tem por finalidade alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante para os fins do inquérito n. 650-DF. O original da carta instrui a denúncia e foi apreendido no ato da prisão em flagrante em 4 de fevereiro de 2010.
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40. Assim, agindo em co-autoria e com unidade de desígnios, José Roberto Arruda, Geraldo Naves, Welligton Luiz Moraes, Antônio Bento da Silva, Rodrigo Diniz Arantes e Haroaldo Brasil de Carvalho fizeram Edson Sombra inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante no inquérito n. 650-DF e praticaram em co-autoria o crime de falsidade ideológica tipificado no artigo 299 do Código Penal. Por serem funcionários públicos, incorreram no aumento de pena previsto no parágrafo único da mesma norma. O Governador José Roberto Arruda incorre na agravante de ter instigado, organizado e dirigido a participação dos demais agentes criminosos (artigo 62-I e II do Código Penal).
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42. Além disso, a imprensa vem noticiando há vários meses o uso ilícito da estrutura administrativa do Estado para tentar impedir a tramitação do processo de ‘impeachment’ na Câmara Legislativa. A ameaça de demissão dos servidores públicos ocupantes de cargos comissionados, caso não participem de manifestações de apoio ao Governador Arruda foi amplamente noticiada pela imprensa. Ônibus que prestam serviço às Administrações Regionais foram usados para levar à Câmara Legislativa servidores públicos do Distrito Federal para manifestações contra o ‘impeachment’ do Governador Arruda, em claro desvio de finalidade do uso do bem público e de abuso de poder sobre os servidores.
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46. O caráter permanente do crime de quadrilha, aliado à alta lesividade dos crimes de corrupção de testemunha (art. 343 do Código Penal) e de falsificação ideológica de documento privado para influir em inquérito policial (art. 299 do Código Penal), praticados pelos requeridos, colocam em risco a ordem pública do Distrito Federal.
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50. Outra evidência da desfaçatez da ameaça à ordem pública decorrente da atuação do Governador Arruda decorre do fato de que policiais civis do Estado de Goiás foram detidos em frente à Câmara Legislativa, onde tramita o processo de ‘impeachment’, com equipamentos de escutas telefônicas. Os indícios são de que os policiais foram contratados por uma pessoa vinculada ao Governador com o intuito de realizar escutas telefônicas em Deputados da oposição. Ainda segundo a reportagem, a Polícia Civil do DF teria liberado os policiais sem autuá-los em flagrante. O fato acarretou a queda do Diretor-Geral da Polícia Civil do Distrito Federal Cléber Monteiro, cuja corporação é mantida com dinheiro público da União, administrado pelo Governador Arruda.
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54. Como exposto, há fortes indícios da participação do Governador Arruda no pagamento de vantagem pecuniária a uma testemunha do Inquérito 650, para coagi-la a mudar o depoimento e a assinar o conteúdo de carta ideologicamente falsa, a qual foi intimada a prestar depoimento à Polícia Federal sobre os fatos em apuração.
55. O crime de corrupção de testemunha é apenado com pena mínima de 3 anos e multa, pelo artigo 343 do Código Penal. O rigor do legislador justifica-se por tratar-se de crime contra a administração da Justiça. Crimes deste tipo afetam o livre exercício do Poder Judiciário, que é um dos três Poderes de República. Esta ação criminosa reflete o total desprezo dos requeridos pelo Poder Judiciário, visto que visam comprometer a lisura do processo penal e, assim, impedir a aplicação da lei penal. Necessitam, pois, de severa resposta do Estado.” (grifei)

Vê-se, desse modo, considerada a situação exposta nestes autos, que o comportamento do ora paciente configura clássica hipótese de decretação de prisão preventiva, pois traduz verdadeira interferência ilegítima na instrução probatória, revelando-se, até mesmo, criminosa a atitude daquele que corrompe testemunha.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e dos demais tribunais orienta-se no sentido de reconhecer a legitimidade jurídico-constitucional da decretação de prisão preventiva quando o indiciado/réu, diretamente ou por intermédio de terceiras pessoas, coage, ameaça, corrompe ou alicia testemunha (RTJ 204/348, Rel. Min. MENEZES DIREITO – HC 88.091/MG, Rel. Min. AYRES BRITTO – HC 91.407/SP, Rel. Min. ELLEN GRACIE – HC 136.942/RS, Rel. Min. FELIX FISCHER – RHC 24.891/PR, Rel. Min. LAURITA VAZ, v.g.), ou, ainda, oferece-lhe ou promete-lhe vantagem financeira indevida para que altere a verdade em seu depoimento (HC 92.741/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO).
Essa mesma orientação tem o beneplácito do magistério doutrinário (GUILHERME DE SOUZA NUCCI, “Código de Processo Penal Comentado”, p. 623, item n. 19, 2008, RT; LUIZ ROBERTO CICOGNA FAGGIONI, “Prisão Preventiva, Prisão Decorrente de Sentença Condenatória Recorrível e Prisão Decorrente de Decisão de Pronúncia – Considerações”, “in” Revista Brasileira de Ciências Criminais nº 41, p. 138, item n. 2.3.1; MIGUEL TEDESCO WEDY, “A Prisão em Flagrante e a Prisão Preventiva: uma análise crítica”, “in” Estudos em homenagem ao Des. Garibaldi Almeida Wedy, p. 147/148, 2004, Livraria do Advogado; ALEXANDRE VILELA, “Considerações acerca da Presunção de Inocência em Direito Processual Penal”, p. 108, item n. 3.3.3, 2005, Coimbra Editora, v.g.), valendo referir, quanto ao caso ora em análise, a lição de FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO (“Código de Processo Penal Comentado”, vol. I/742-743, 9ª ed., 2005, Saraiva):

“Pode também ser decretada se conveniente para a instrução criminal, ou seja, para preservar aquela fase procedimental em que o Juiz procura, com a colheita das provas, reconstruir o fato ocorrido para poder melhor discernir e julgar. Se, entretanto, o réu lhe cria obstáculos, ameaçando ou niquelando testemunhas, fazendo propostas a peritos, tentando convencer o Oficial de Justiça a não encontrar as pessoas que devam prestar esclarecimentos em juízo etc., seu encarceramento torna-se necessário por conveniência da instrução. Não confundir ‘conveniência’ com ‘comodidade’. Não pode o Juiz, porque o réu reside um pouco distante, mandar prendê-lo por conveniência da instrução, alegando que, quando dever apresentar-se para uma audiência, por exemplo, não será preciso a expedição da precatória ou quejandos.
Assim, se o indiciado ou réu estiver afugentando testemunhas que possam depor contra ele, se estiver subornando quaisquer pessoas que possam levar ao conhecimento do Juiz elementos úteis ao esclarecimento do fato, peitando peritos, aliciando testemunhas falsas, ameaçando vítima ou testemunhas, é evidente que a medida será necessária, uma vez que, do contrário, o Juiz não poderá colher, com segurança, os elementos de convicção de que necessitará para o desate do litígio penal. Aí, sim, o poder coercitivo do Estado se justifica para impedir que o réu prejudique a atividade jurisdicional.” (grifei)

Cumpre observar, ainda, por necessário, no tocante à alegação da necessidade de prévia autorização da Câmara Legislativa do Distrito Federal para instauração de persecução penal contra o ora paciente, que o Plenário desta Suprema Corte, ao apreciar a ADI 1.020/DF, de que fui Relator para o acórdão, firmou entendimento que desautoriza o pleito deduzido nestes autos:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI ORGÂNICA DO DISTRITO FEDERAL - OUTORGA DE PRERROGATIVAS DE CARÁTER PROCESSUAL PENAL AO GOVERNADOR DO DISTRITO FEDERAL - IMUNIDADE À PRISÃO CAUTELAR E A QUALQUER PROCESSO PENAL POR DELITOS ESTRANHOS À FUNÇÃO GOVERNAMENTAL - INADMISSIBILIDADE - OFENSA AO PRINCÍPIO REPUBLICANO - USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DA UNIÃO - PRERROGATIVAS INERENTES AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA ENQUANTO CHEFE DE ESTADO (CF/88, ART. 86, §§ 3º E 4º) - AÇÃO DIRETA PROCEDENTE.

PRINCÍPIO REPUBLICANO E RESPONSABILIDADE DOS GOVERNANTES.

- A responsabilidade dos governantes tipifica-se como uma das pedras angulares essenciais à configuração mesma da idéia republicana. A consagração do princípio da responsabilidade do Chefe do Poder Executivo, além de refletir uma conquista básica do regime democrático, constitui conseqüência necessária da forma republicana de governo adotada pela Constituição Federal.
O princípio republicano exprime, a partir da idéia central que lhe é subjacente, o dogma de que todos os agentes públicos - os Governadores de Estado e do Distrito Federal, em particular - são igualmente responsáveis perante a lei.

RESPONSABILIDADE PENAL DO GOVERNADOR DO DISTRITO FEDERAL.

- O Governador do Distrito Federal - que dispõe de prerrogativa de foro ‘ratione muneris’ perante o Superior Tribunal de Justiça (CF, art. 105, I, ‘a’) - está permanentemente sujeito, uma vez obtida a necessária licença da respectiva Câmara Legislativa (RE 153.968-BA, Rel. Min. ILMAR GALVÃO; RE 159.230-PB, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE), a processo penal condenatório, ainda que as infrações penais a ele imputadas sejam estranhas ao exercício das funções governamentais.
- A imunidade do Chefe de Estado à persecução penal deriva de cláusula constitucional exorbitante do direito comum e, por traduzir conseqüência derrogatória do postulado republicano, só pode ser outorgada pela própria Constituição Federal. Precedentes: RTJ 144/136, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE; RTJ 146/467, Rel. Min. CELSO DE MELLO. Análise do direito comparado e da Carta Política brasileira de 1937.

IMUNIDADE À PRISÃO CAUTELAR - PRERROGATIVA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA - IMPOSSIBILIDADE DE SUA EXTENSÃO, MEDIANTE NORMA DA LEI ORGÂNICA, AO GOVERNADOR DO DISTRITO FEDERAL.

- O Distrito Federal, ainda que em norma constante de sua própria Lei Orgânica, não dispõe de competência para outorgar ao Governador a prerrogativa extraordinária da imunidade à prisão em flagrante, à prisão preventiva e à prisão temporária, pois a disciplinação dessas modalidades de prisão cautelar submete-se, com exclusividade, ao poder normativo da União Federal, por efeito de expressa reserva constitucional de competência definida pela Carta da República.
- A norma constante da Lei Orgânica do Distrito Federal - que impede a prisão do Governador do DF antes de sua condenação penal definitiva - não se reveste de validade jurídica e, conseqüentemente, não pode subsistir, em face de sua evidente incompatibilidade, com o texto da Constituição Federal.

PRERROGATIVAS INERENTES AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA ENQUANTO CHEFE DE ESTADO.

- O Distrito Federal não pode reproduzir em sua própria Lei Orgânica - não obstante a qualificação desse diploma normativo como estatuto de natureza constitucional (ADIn 980-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO) - o conteúdo material dos preceitos inscritos no art. 86, §§ 3º e 4º, da Carta Federal, pois as prerrogativas contempladas nesses preceitos da Lei Fundamental, por serem unicamente compatíveis com a condição institucional de Chefe de Estado, são apenas extensíveis ao Presidente da República. Precedente: ADIn 978-PB, Rel. p/ o acórdão Min. CELSO DE MELLO.”
(ADI 1.020/DF, Rel. p/ o acórdão Min. CELSO DE MELLO)

Cumpre destacar, neste ponto, que a garantia da imunidade em sentido formal não impede a instauração de inquérito contra Governador de Estado ou do Distrito Federal, que está sujeito, em conseqüência - e independentemente de qualquer autorização do Legislativo -, aos atos de investigação criminal promovidos pela Polícia Judiciária, desde que essas medidas pré-processuais de persecução penal, no entanto, sejam adotadas no âmbito de procedimento investigatório em curso perante órgão judiciário competente - o STJ, no caso de o investigando ser Governador (CF, art. 105, I, “a”):

“- A garantia da imunidade parlamentar em sentido formal não impede a instauração de inquérito policial contra membro do Poder Legislativo, que está sujeito, em conseqüência - e independentemente de qualquer licença congressional -, aos atos de investigação criminal promovidos pela Polícia Judiciária, desde que essas medidas pré-processuais de persecução penal sejam adotadas no âmbito de procedimento investigatório em curso perante órgão judiciário competente: o STF, no caso de os investigandos serem congressistas (CF, art. 102, I, ‘b’).”
(Rcl 511/PB, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Tenho para mim, de outro lado, consideradas as razões ora expostas pelo eminente Ministro JOAQUIM BARBOSA, sobre a necessidade, ou não, de prévia autorização da Câmara Legislativa, para efeito de válida instauração, contra o Governador do Distrito Federal, ora paciente, de procedimento penal, que tal discussão, na presente fase ritual, revela-se prematura.

(...)

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Cabe referir, ainda, no que concerne a suposto envolvimento de Deputado Federal nos fatos objeto de apuração no Inq 650/DF, entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Rcl 2.101-AgR/DF, Rel. Min. ELLEN GRACIE (RTJ 183/112), em que, ao analisar questão semelhante à que se registra na presente causa, o Plenário desta Suprema Corte proferiu decisão consubstanciada em acórdão assim ementado:

“Reclamação. Negativa de seguimento. Agravo regimental. Art. 102, I, ‘b’ da Constituição Federal. Foro privilegiado. A simples menção de nomes de parlamentares, por pessoas que estão sendo investigadas em inquérito policial, não tem o condão de ensejar a competência do Supremo Tribunal Federal para o processamento do inquérito, à revelia dos pressupostos necessários para tanto dispostos no art. 102, I, ‘b’ da Constituição. Agravo regimental improvido.” (grifei)

Finalmente, o exame da pretensão jurídica ora deduzida estimula algumas reflexões que entendo imprescindíveis à formulação de juízo em torno dos fatos noticiados no presente “habeas corpus”.
A desejável convergência entre ética e política nem sempre tem ocorrido ao longo do processo histórico brasileiro, cujos atores, ao protagonizarem episódios lamentáveis e moralmente reprováveis, parecem haver feito uma preocupante opção preferencial por práticas de poder e de governo que se distanciam, gravemente, do necessário respeito aos valores de probidade, de decência, de impessoalidade, de compostura e de integridade pessoal e funcional.
Tais comportamentos, porque motivados por razões obscuras, por desígnios inconfessáveis ou por interesses escusos, em tudo incompatíveis com a causa pública, são guiados e estimulados por exigências subalternas resultantes de um questionável pragmatismo político, que, não obstante o profundo desvalor ético dos meios empregados, busca justificá-los, assim mesmo, em face de uma suposta e autoproclamada legitimidade dos fins visados pelos governantes.
Os membros de Poder, quando assim atuam, transgridem as exigências éticas que devem pautar e condicionar a atividade política, que só se legitima quando efetivamente respeitado o princípio da moralidade, que traduz valor constitucional de observância necessária na esfera institucional de qualquer dos Poderes da República.
A ordem jurídica não pode permanecer indiferente a condutas de quaisquer autoridades da República que hajam eventualmente incidido em censuráveis desvios éticos no desempenho da elevada função de representação política do Povo brasileiro.
Sendo assim, pelas razões expostas, peço vênia para denegar o presente “habeas corpus”, mantendo, em conseqüência, a prisão cautelar definitivamente decretada contra o ora paciente.

É o meu voto.

* acórdão pendente de publicação.

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS
22 a 26 de março de 2010


CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ) - Poder Judiciário - Pagamento Devido
Portaria nº 37/CNJ, de 22 de março de 2010 - Institui grupo de trabalho para estudo e apresentação de proposta de regulamentação de pagamento de passivos no âmbito do Poder Judiciário. Publicada DJE/CNJ de 22/3/2010, n. 53, p. 2.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF) - Prazo Processual - Feriado Forense - Semana Santa
Portaria nº 77/STF, de 17 de março de 2010 - Comunica que não haverá expediente na Secretaria do Tribunal nos dias 31 de março, 1º e 2 de abril de 2010 (Semana Santa), em virtude do disposto no inciso II do artigo 62 da Lei nº 5.010, de 30 de maio de 1966 e que os prazos que porventura devam iniciar-se ou completar-se nesses dias ficam automaticamente prorrogados para o dia 5 subsequente (segunda-feira). Publicada no DJE de 22/3/2010, n. 51, p. 99.

PODER JUDICIÁRIO - Orçamento - Despesa - Empenho
Portaria Conjunta nº 1/STF/CNJ/Tribunais Superiores/CJF/CSJT/TJDFT, de 25 de março de 2010 - Torna indisponível para empenho e movimentação financeira os valores constantes do anexo a esta Portaria, consignados aos Órgãos do Poder Judiciário da União na Lei nº. 12.214, de 26 de janeiro de 2010. Publicada no DOU de 26/3/2010, Seção 1, p. 172.


Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos
informativo@stf.gov.br

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Informativo STF - 580 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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