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quinta-feira, 23 de julho de 2009

JURID - Habeas corpus. Trancamento ação penal. Estelionato. [23/07/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Trancamento ação penal. Estelionato contra a previdência social.

Tribunal Regional Federal - TRF2ªR.

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL MESSOD AZULAY NETO

IMPETRANTE: BRAZ FERNANDO SANT'ANNA

IMPETRADO: JUÍZO DA 8A. VARA FEDERAL CRIMINAL DO RIO DE JANEIRO

PACIENTE: PATRICIA ESTEVES DE PINHO

ADVOGADO: BRAZ FERNANDO SANT'ANNA

ORIGEM: OITAVA VARA FEDERAL CRIMINAL DO RIO DE JANEIRO (200351015236522)

RELATÓRIO

Trata-se de Habeas Corpus impetrado por BRAZ FERNANDO SANT'ANNA em favor de PATRÍCIA ESTEVES PINHO, objetivando o trancamento da ação penal nº 2003.51.01.523652-2, nos autos da qual a ora paciente foi denunciada pela suposta prática dos delitos descritos nos artigos 288 e 171, § 3º (trinta e três vezes) e no art. 171, § 3º, c/c art. 14, II (uma vez), na forma do art. 69, todos do CP, por ter, na qualidade de sócia de escritório de advocacia, junto com dois outros denunciados, impetrado diversos mandados de segurança em face da Previdência Social, aduzindo falsamente a violação do devido processo legal nos atos de suspensão dos correlatos benefícios previdenciários, tendo ciência da ilicitude dos mesmos.

Alega o impetrante que a tese sustentada pelo parquet de configurar a conduta descrita clássico estelionato judiciário, não se subsume ao tipo legal, podendo comprometer o pleno exercício da atividade profissional do advogado, na medida em que inibirá sua atuação quando tiver ciência de ter sido o seu constituinte o autor da infração civil ou criminal.

Sustenta que a conduta teria outro contorno na hipótese de atuação do advogado durante o iter criminis do procedimento de obtenção do suposto benefício fraudulento junto ao INSS, situação que configuraria co-autoria ou participação delituosa, acrescentando que em momento algum a denúncia descreve conduta anterior ou concomitante à impetração dos mandados de segurança que tivesse contribuído para a obtenção dos benefícios supostamente fraudulentos.

Afirma, outrossim, que nas raríssimas ações em que o magistrado não vislumbrou a existência de direito líquido e certo, foram propostas ações ordinárias visando o restabelecimento dos benefícios, todas com sucesso.

Acompanham a inicial os documentos de fls. 08/284.

Indeferida a liminar, foram solicitadas as informações, que vieram às fls. 299/309, com documentos às fls. 310/576.

Parecer do Ministério Público Federal pela denegação da ordem (fls. 578/585).

É o relatório.

Des. Fed. MESSOD AZULAY NETO
Relator
2ª Turma Especializada

VOTO

A denúncia inicialmente ofertada contra a ora paciente relata que durante trabalhos de auditagem em Postos de Benefícios da Previdência Social foram detectadas inúmeras irregularidades na concessão de benefícios, os quais foram suspensos pelo INSS. Por conseqüência, foram impetrados inúmeros Mandados de Segurança visando o restabelecimento destes benefícios, dentre eles os ajuizados pelo escritório de advocacia em que trabalham três denunciados, inclusive a ora paciente (fls. 26/27).

Com relação à conduta da paciente a inicial acusatória relata o seguinte:

"(...)

O escritório de advocacia em que trabalhavam os denunciados PATRÍCIA ESTEVES, JOSÉ ROBERTO NEVES e ALEXANDRE SFRAPINI, visando restabelecer benefícios fraudulentos concedidos à época no Posto Xavier da Silveira que foram apurados pelas Auditorias do INSS, ajuizou cento e vinte e um Mandados de Segurança, conforme movimentações processuais que se encontram anexadas.

(...)

Verificam-se, assim, como elementos caracterizadores da plena ciência dos advogados PATRÍCIA ESTEVES, JOSÉ ROBERTO NEVES e ALEXANDRE SFRAPINI, e, obviamente, de seus clientes, de que os benefícios que se buscavam o restabelecimento do pagamento pela via judicial eram fraudulentos: a utilização por ocasião da obtenção do benefício previdenciário de vínculos empregatícios fictícios presentes reiteradamente em hipóteses de fraude, o mesmo acontecendo com os endereços fornecidos ao INSS; a presença significativa dentre os denunciados clientes dos advogados de pessoas com 39 anos, à época dos fatos - e que teriam, segundo os dados que embasaram a concessão, começado a trabalhar muito cedo; o fato da imensa maioria dos beneficiários serem residentes em locais bem distantes do Posto Xavier da Silveira; o fato de alguns dos segurados defendidos pelos aludidos advogados terem benefícios com números praticamente seqüenciais, sem que entre eles houvesse qualquer relação, circunstâncias que denotam, quando não o envolvimento direto dos advogados com as fraudes desde a obtenção do benefício, a arregimentação de tais pessoas a seu escritório por parte dos "intermediários" existentes entre os segurados e os servidores.

Há, outrossim, um notório "intercâmbio" entre os advogados envolvidos nos fatos tratados na presente denúncia, como se pode defluir do fato dos denunciados AMÉRICO e ONEIDE, clientes do escritório dos advogados ora denunciados, terem comparecido à Procuradoria da República acompanhados do advogado CARLOS ALBERTO ALENCAR DE LIMA, que também acompanhou outro cliente daquele escritório, JOSÉ FREIRE SANTIAGO (...), sendo interessante destacar que no depoimento em questão JOSÉ FREIRE confirmou nunca ter trabalhado nos locais que embasaram a concessão do benefício, nunca ter ido ao Posto, ter dito que não tinha direito para o DR. ALEXANDRE SFRAPINI, que, ainda assim lhe disse haver possibilidade de sucesso na ação.

Ainda a evidenciar o "intercâmbio" fraudulento entre diversos escritórios de advocacia, dentre eles aquele em que trabalhavam os ora denunciados, tem-se o exemplo de segurados que se utilizaram de dois dos endereços que mais figuraram nas hipóteses defraudes.

(...)

A se destacar, ainda, a circunstância de que todos os benefícios auditados se referiam a aposentadorias concedidas em valores próximos ao teto ou no teto, sendo absolutamente contrário á realidade vivenciada no Brasil que os segurados em questão em regra pessoas com baixa qualificação técnica, recebessem tal remuneração enquanto em atividade. (...)."

Conclui, aquela peça, por afirmar que as fraudes não eram e nem poderiam ser de conhecimento dos Juízes Federais quando da concessão das ordens mandamentais, a menos que tivessem eles a oportunidade de examinar todos os mandados de segurança em conjunto, asseverando que as observâncias do devido processo legal e da ampla defesa eram, também, de forma deliberada, frustradas, especialmente nos casos em que os endereços dos segurados eram falsos, circunstância que impedia as suas prévias intimações para apresentação de documentos que comprovassem a regularidade de seu benefício.

Por fim, afirma que a ora paciente atuou em todos os mandados de segurança, alegando que tais crimes eram praticados para assegurar a vantagem dos crimes de peculato outrora cometidos, salientando que "o valor advindo do pagamento dos atrasados quando do restabelecimento dos benefícios, via de regra aquele embolsado pelos advogados a título de "honorários", tornava essa atividade extremamente lucrativa para esses maus profissionais."

Formulada nos termos acima transcritos, a denúncia foi aditada, incluindo-se em relação à ora paciente o seguinte:

"(...)

a primeira denunciada, na qualidade de advogada e consoante a divisão de trabalho estabelecida, deu início, em 19/06/98, a execução de delitos de estelionato mediante a impetração, respectivamente, dos mandados de segurança números (...) aduzindo falsamente a violação do devido processo legal nos atos de suspensão dos correlatos benefícios previdenciários, uma vez que sabia notificados os segurados, bem como da ilicitude dos benefícios, uma vez que ajustada com os servidores do posto de concessão, tudo de molde a induzir a erro o Juízo Federal processante com vistas a obter o restabelecimento dos citados benefícios e assim causar nova lesão patrimonial ao INSS, fato este que não se verificou por circunstâncias alheias a sua vontade, qual seja, o não acolhimento da falsa tese pelo órgão julgador."

Como se vê, a denúncia assim ofertada preenche os requisitos do art. 41 do CPP, possibilitando à paciente o exercício de seu direito de defesa.

Não obstante a denúncia originalmente ofertada deixe a desejar quanto à descrição da conduta imputada à paciente, o aditamento veio aclarar a imputação fática que lhe é atribuída.

Conforme ressalta aquela peça, "não se está a imputar o tão só manejo da ação constitucional, mas o liame criminoso dos denunciados com servidores e ainda o uso, mediante fraude, do mandamus."( fls. 407).

É desnecessário, no presente caso, que tenha havido atuação dos advogados na obtenção do benefício, bastando para a configuração do delito que o restabelecimento do mesmo tenha se dado mediante a manutenção em erro ou a utilização de fraude na impetração dos mandados de segurança que visavam seu restabelecimento.

Assim acontecendo, é inegável a presença de elementos capazes de justificar o prosseguimento da persecução criminal, onde, evidentemente, serão garantidos à paciente todos os meios necessários à produção das provas que sustentem suas alegações, inviáveis de serem produzidas na via estreita do habeas corpus.

Pelo exposto, DENEGO A ORDEM.

É como voto.

Des. Fed. MESSOD AZULAY NETO
Relator
2ª Turma Especializada

EMENTA

HABEAS CORPUS - TRANCAMENTO AÇÃO PENAL - ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL - RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO SUSPENSO - ATUAÇÃO DO ADVOGADO.

I - Hipótese em que a imputação não se limita à impetração de mandado de segurança para restabelecer benefício previdenciário fraudulento, mas versa também sobre o liame entre advogados, beneficiários e servidores do INSS, a fim de manter aquela autarquia em erro, servindo-se do judiciário para tanto;

II - Presença de elementos que autorizam a continuidade da persecução penal;

III - Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas:

Decide a Segunda Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, DENEGAR A ORDEM nos termos do Relatório e do Voto constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 14 de julho de 2009. (data de julgamento)

Des. Fed. MESSOD AZULAY NETO
Relator
2ª Turma Especializada




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