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quinta-feira, 23 de julho de 2009

JURID - Calúnia. Art. 138, do CP. Animus caluniandis não comprovado. [23/07/09] - Jurisprudência


Calúnia. Art. 138, do CP. Animus caluniandis não comprovado. Recurso desprovido. Sentença absolutória mantida.

Tribunal Regional Federal - TRF2ªR.

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL MESSOD AZULAY NETO

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

APELADO: WALTER RUI DE SANTANA

ADVOGADO: ALDO FARO JUNIOR

ORIGEM: 1A. VARA FEDERAL - NITEROI/RJ (200851020003465)

RELATÓRIO

APELAÇÃO CRIMINAL interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face de Sentença do MM Juízo da 1ª Vara Federal Criminal que julgou IMPROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para ABSOLVER o denunciado da acusação da prática dos crimes tipificados nos arts. 138 c/c 141, II, do Código Penal, com fulcro no art. 386, III, do CPP, e da prática do crime descrito no art. 140 c/c 141, II, do CP, na forma do art. 386, VI, do CP.

Narra a denúncia (fls. 02/03) que o então Denunciado, ora Apelado, apresentara "Representação por Excesso de Prazo" ao conselho Nacional de Justiça (fls. 20/23), bem como documento intitulado de "Informação" ao Chefe da Delegacia de Polícia Federal em Niterói (fls. 44/49), imputando ao Magistrado Substituto LUIZ CLEMENTE PEREIRA FILHO a demora de cerca de um ano para a prolação de sentença no Processo nº 2005.51.02.004340-1 - cujo objeto era a sua reintegração nos quadros da Polícia Federal, em trâmite na 3ª Vara Federal de Niterói, para satisfazer um sentimento pessoal, já que estava chateado com o Agente Federal (ora Apelado).

Consta da referida Representação que o Apelado, por ter sido demitido do cargo de Agente de Polícia Federal, juntamente com outros dois Policiais Federais, ingressou com a referida Ação Ordinária, perante a 3ª Vara Federal de Niterói, intentando sua reintegração.

Segundo afirma, o apelado compareceu por meses à referida Vara Federal solicitando insistentemente a prioridade no julgamento da causa em vista das dificuldades financeiras por que passava por não receber seus vencimentos após a demissão. Conforme narra, seus colegas, demitidos nas mesmas circunstâncias em que ele o fora, já haviam sido reintegrados e se encontravam ocupando suas funções na Polícia Federal, por força de decisão unânime proferida pelo c. STJ nos Mandados de Segurança nºs 10.585 e 10.756/DF.

Após aguardar cerca de um ano para que a sentença fosse proferida, o Apelado representou ao Conselho Nacional de Justiça em face do Juiz Federal substituto LUIZ CLEMENTE PEREIRA FILHO, por excesso de prazo, em 26.04.07, alegando morosidade no desenvolvimento processual. No corpo do documento faz constar que o Agente de Polícia Federal aposentado, Marco Antônio Gomes Lopes, amigo do Juiz Titular da 3ª Vara Federal de Niterói, LEOPOLDO MUYLAERT, informara-lhe que "dificilmente o processo andaria, pois o juiz estaria chateado consigo". Alegava que o MM Juiz Federal Substituto Luiz Clemente Pereira Filho, estava retardando o julgamento do processo em que figurava como autor, em razão de suposta animosidade existente entre ambos.

Afirmou, ainda, que o servidor desta 3ª Vara Federal, de nome Marcelo, diante do tempo decorrido desde que o processo foi concluso para sentença, "gentilmente pediu para que ele tivesse muita fé".

A Representação foi arquivada por perda de objeto, uma vez que já havia sido satisfeita a prestação jurisdicional (fls. 38).

Em vista do exposto, os Juízes Federais Luiz Clemente Pereira Filho e Leopoldo Muylaert representaram junto ao Ministério Público (fls. 12/15), para que fossem tomadas as medidas penais cabíveis em face do ora apelado, que teria praticado o delito do art. 138 e 140, combinados com o art. 141, II, do CP.

O Juízo sentenciante decidiu pela improcedência da pretensão punitiva estatal, por entender desatendidos os requisitos para a conformação dos tipos penais imputados ao Réu.

Quanto à injúria, o próprio Ministério Público em alegações finais sustentou a absolvição por entender que "No que tange ao fato e à imputação contidos no aditamento de fls. 90/91, entendo que a acusação não deve prosperar. Analisando-se os depoimentos prestados pelos envolvidos, infere-se, a despeito da dubiedade do trecho transcrito da tal Informação, que o acusado não pretendia ou tencionava imputar, ainda que de forma vaga e imprecisa, o cometimento de eventual delito de advocacia administrativa pelo Dr. Leopoldo Muylaert."

O Magistrado sentenciante entende, então, ausente o elemento subjetivo do tipo, também conhecido como delo específico - o animus injuriandi, o propósito de ofender subjetivamente o Juiz Titular da 3ª Vara. Constata tão somente o condão de narrar os acontecimentos, sem que se possa depreender qualquer intenção de injuriar o ofendido.

Quanto à calúnia, o Magistrado entende ausentes os elementos objetivos da conduta típica de calúnia. Isto porque, o conteúdo da Reclamação interposta pelo Apelado destinada ao Conselho de Justiça não traz a alegação de que os MM Juízes Federais estariam agindo com dolo de prevaricar. Tudo o que está ali são alegações referentes à morosidade no trato de sua demanda e a necessidade na duração razoável do processo, face ao estado de penúria por que passava.

Desta Decisão absolutória apela, o Ministério Público, aos argumentos de que a Decisão absolutória não se embasou nas provas dos autos, pois a versão fantasiosa do Apelado teria o condão de afetar a honra objetiva do Juiz Federal Luiz Clemente Pereira Filho, ainda que indiretamente, tratando-se, portanto, no mínimo, de dolo indireto do agente.

Contrarrazões às fls. 311/334, pugna pelo desprovimento do recurso e manutenção da Sentença absolutória.

Em parecer de fls. 341/345, o Ministério Público opina pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

À d. revisão.

Desembargador Federal MESSOD AZULAY NETO
Relator
2ª Turma Especializada

VOTO

"EMENTA: PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL -CALÚNIA - ART. 138, DO CP - ANIMUS CALUNIANDIS NÃO COMPROVADO - RECURSO DESPROVIDO - SENTENÇA ABSOLUTÓRIA MANTIDA.

I - Hipótese em que se imputa ao acusado, policial federal demitido, o dolo de caluniar o MM Juiz processante de Ação Ordinária em que se discutia sua reintegração aos quadros da Polícia Federal.

II - Não se afere da leitura da Representação por Excesso de Prazo, interposta pelo Apelado no CNJ, sequer o dolo eventual de manchar a honra objetiva do Magistrado.

III - O dolo eventual consiste no querer alternativo direcionado ao resultado. Na espécie em análise não há prova alguma de que o Apelado tenha se dirigido para esse fim, mas, para o fim de salvar-se de situação de penúria por que passava, em vista do tempo decorrido sem receber salário.

III -Recurso do Ministério Público desprovido."

Como relatado, trata-se de APELAÇÃO CRIMINAL interposta pelo Ministério Público em face de Sentença do MM Juízo da 1ª Vara Federal de Niterói, que julgou IMPROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para absolver o Réu da imputação dos crimes de calúnia e injúria.

As razões recursais do Parquet cingem-se à absolvição do crime de calúnia, já que quanto à injúria, o próprio Órgão acusatório em alegações finais pediu a absolvição do Apelado.

As premissas consideradas pelo Ministério Público para fundamentar suas razões recursais sobre o dolo do apelado não me parecem as melhores.

Primeiramente, alega o Apelante que o Juiz sentenciante teria considerado que os diálogos reproduzidos na Reclamação - entre o policial, ora Apelado e o agente da Polícia Federal aposentado, que teria dito que dificilmente o processo andaria, pois o Juiz (supostamente caluniado) estaria chateado consigo - teriam sido inventados pelo então Réu.

Prossegue em suas razões aduzindo que a prova produzida nos autos não autorizam a conclusão do Juiz sentenciante pela ausência de dolo face, pois, sendo falsos os diálogos, teria o Apelado agido com intencionalidade de ferir a honra objetiva do MM Juiz Luiz Clemente, o que configuraria o tipo "imputar falsamente fato definido como crime".

Não é o que está nos fundamentos desta sentença atacada.

À fl. 292, o MM Juiz a quo faz considerar em suas razões de decidir duas possíveis conclusões: a) a de que os Agentes de Policia Federal referidos disseram ao Réu estas frases e, em juízo, não as confirmaram, e b) a de que os Policiais referidos não lhe disseram estas palavras. E para as duas, conclui o Magistrado que, "de tudo o que consta nos autos, inclusive pelo fato de que era corriqueira a presença do réu juntamente com seu advogado, na 3ª Vara, solicitando pressa, anunciando que o mesmo passava por situação de penúria, dependendo da ajuda de colegas para pagamento de aluguel e até alimentação (fl. 123), e que, por diversas vezes, o advogado do acusado esteve despachando na Ação Ordinária, como os próprios Juizes afirmam; enfim, de toda a prova produzida, até mesmo do depoimento do Acusado, o que se nos depreende é que o Réu acreditava que a entrega da prestação jurisdicional estava demorando demasiadamente (fl. 251), circunstância que nos parece absolutamente plausível diante da lastimável situação financeira que se viu passar. Assim, o denunciado não estaria imputando falsamente aos Juízes um fato definido como crime, mas sim estaria imputando tais fatos aos Juízes, acreditando que o retardamento no andamento do processo era verdadeiro."

E finaliza o MM Juiz sentenciante:

"De mais a mais, o Parquet Federal não logrou comprovar a presença do animus caluniandi. De acordo com Nelson Hungria, o dolo específico, nos crimes contra a honra, consubstancia-se na "consciência e vontade de ofender a honra alheia (reputação, dignidade ou decoro), mediante a linguagem falada, mímica ou escrita." (Comentário ao Código Penal, volume VI, arts. 137 ao 154, 5ª Ed., Rio de Janeiro: Forense, 1982, p. 53)"

Pode-se ver, portanto, que o Magistrado considerou a possibilidade de o diálogo entre o Apelado e o agente aposentado não tivesse de fato ocorrido, mas sua conclusão não se fundou nessa premissa, mas sim na ausência de dolo face à convicção do Réu de que seu processo estava sendo procrastinado em virtude de sentimento pessoal do Juiz Luiz Clemente, razão pela qual afastado este primeiro argumento do Parquet.

Em seguida rebate a tese de que não foi provado o animus caluniandi, expondo que "no mínimo, pouco se importou com a honra objetiva do Juiz Federal Luiz Clemente Pereira Filho (dolo eventual), no afã de ter a sua causa julgada o mais rápido possível."

Também não se acolherá a assertiva, por ser mais razoável, diante da situação em que se encontrava o Apelado e dos fatos trazidos nos autos, que o mesmo não intentou, nem sequer pretendeu arriscar, manchar a honra do MM. Juiz Federal em seu atuar.

O dolo eventual consiste no querer alternativo direcionado ao resultado. Na espécie em análise não há prova alguma de que o Apelado tenha se dirigido para esse fim, mas, para o fim de salvar-se de situação de penúria por que passava, em vista do tempo decorrido sem receber salário, já tendo sido seus colegas demitidos nas mesmas circunstâncias, reintegrados em seus cargos por força de decisão unânime do STJ em dois mandados de segurança julgados em favor dos mesmos.

Dessa forma, é plausível concluir que o Apelado agiu, sim, motivado pelo afã de ver sua causa julgada e sua capacidade de sobrevivência e a de seus filhos, restaurada. Não é razoável, contudo, que se diga que diante de tamanho desespero, o Apelado estivesse com sua intencionalidade voltada a ofender o Juiz que o sentenciaria, porque não há elementos nos autos que assegurem isso.

No mesmo sentido é o parecer do e. membro do Parquet:

"Deveras, restou longe de sr demonstrada nos autos a intenção do acusado de ofende, magoar ou macular a honra do MM. Juiz Federal Substituto Luiz Clemente Pereira Filho, da 3ª Vara Federal de Niterói."

Mais adiante analisa o MP:

"Aliás, nem mesmo o dolo genérico restou configurado no presente caso, porquanto não se demonstrou que o réu tinha conhecimento de que imputava uma conduta falsa ao magistrado; muito ao revés, parecia o acusado acreditar piamente no retardamento do julgamento do seu processo, como bem analisou o d. juízo a quo, especificamente às fls. 292/293."

"Com efeito, esclarece a jurisprudência do e. STJ: "Para a caracterização do crime de calúnia é necessária a presença da falsidade, onde o ofensor tem a consciência de atribuir ao ofendido a prática de uma ato delituoso, sabendo não corresponder a verdade." (RT 752/532 - grifo meu)"

Do exposto, meu voto é no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao apelo do Ministério Público Federal, para manter a absolvição do apelado nos termos do art. 386, III, do CPP.

DESEMBARGADOR FEDERAL MESSOD AZULAY NETO
2ª T. Especializada
Relator

EMENTA

PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL -CALÚNIA - ART. 138, DO CP - ANIMUS CALUNIANDIS NÃO COMPROVADO - RECURSO DESPROVIDO - SENTENÇA ABSOLUTÓRIA MANTIDA.

I - Hipótese em que se imputa ao acusado, policial federal demitido, o dolo de caluniar o MM Juiz processante de Ação Ordinária em que se discutia sua reintegração aos quadros da Polícia Federal.

II - Não se afere da leitura da Representação por Excesso de Prazo, interposta pelo Apelado no CNJ, sequer o dolo eventual de manchar a honra objetiva do Magistrado.

III - O dolo eventual consiste no querer alternativo direcionado ao resultado. Na espécie em análise não há prova alguma de que o Apelado tenha se dirigido para esse fim, mas, para o fim de salvar-se de situação de penúria por que passava, em vista do tempo decorrido sem receber salário.

III -Recurso do Ministério Público desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas:

Decide a Segunda Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, à unanimidade, NEGAR PROVIMENTO ao apelo do Ministério Público, nos termos voto do Relator, constante dos autos, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 14 de julho de 2009. (data de julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL MESSOD AZULAY NETO
Relator
2ª T. Especializada




JURID - Calúnia. Art. 138, do CP. Animus caluniandis não comprovado. [23/07/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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