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quinta-feira, 23 de julho de 2009

JURID - Apropriação indébita previdenciária. Não ocorrência. [23/07/09] - Jurisprudência


Apropriação indébita previdenciária. Não ocorrência da extinção da punibilidade. Pagamento parcial do débito.
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Tribunal Regional Federal - TRF2ªR.

RELATOR: DESEMBARGADORA FEDERAL LILIANE RORIZ

APELANTE: ANTONIO MANUEL AMARO MONTEIRO

ADVOGADO: RENATA PASSOS BERFORD GUARANA E OUTROS

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

ORIGEM: TERCEIRA VARA FEDERAL DE NITERÓI (200651020051750)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta por ANTONIO MANUEL AMARO MONTEIRO (fls. 231/249) em face da sentença proferida pelo MM. Juiz Federal LUIZ CLEMENTE PEREIRA FILHO, da 3a Vara de Niterói (fls. 212/222), que o condenou pelo crime de apropriação indébita previdenciária, previsto no artigo 168-A do Código Penal, na forma do artigo 71, do mesmo diploma legal.

Segundo a denúncia (fls. 2/2-C), ANTONIO MANUEL, na qualidade de principal responsável pela empresa AUTO SERVIÇO JANSEN DE MELLO Ltda., deixou de repassar à Previdência Social as contribuições recolhidas de seus empregados, no período de dezembro de 1997 a janeiro de 2000.

Ainda de acordo com a inicial, tal situação foi constatada por meio de confissão da dívida, feita pela própria empresa ao optar pelo REFIS, o que gerou os LDC`s - Lançamentos de Débitos Confessados - nº 35.208.237-2 e 35.208.236-4, no valor total de R$ 21.383,69 (vinte e um mil, trezentos e oitenta e três reais e sessenta e nove centavos), atualizados e acrescidos de juros e multa.

A exordial narra, também, que a empresa, optante do REFIS, foi excluída do referido programa em 17 de dezembro de 2001, com efeitos a partir de janeiro de 2002.

A denúncia foi recebida em 18/01/2007 (fl. 122).

De acordo com a sentença, às fls. 212/222, ANTONIO MANUEL foi condenado à pena de 3 (três) anos, 8 (oito) meses de reclusão e 128 (cento e vinte e oito) dias-multa, em regime aberto, pelo crime previsto no artigo 168-A, na forma do artigo 71, todos do Código Penal. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direito.

ANTONIO MANUEL apresentou as razões recursais (fls. 232/249) e aduziu, preliminarmente, que diante do pagamento do débito, houve a extinção da punibilidade com base no § 2o, do artigo 9o, da Lei 10.684/03. No mérito, afirmou que: 1) inexistem nos autos documentos comprobatórios do delito; 2) não houve dolo na conduta do apelante, tendo em vista as dificuldades financeiras sofridas pela empresa à época dos fatos; 3) não há como se aplicar a continuidade delitiva ao crime de apropriação indébita previdenciária.

Em contrarrazões (fls. 255/260), o Ministério Público Federal afirmou que não há como se extinguir a punibilidade do acusado, por aplicação do § 2o, do artigo 9o, da Lei 10.684/03, tendo em vista que o débito referente ao LDC nº 35.208.237-2 não foi quitado, sendo que ANTONIO MANUEL apenas comprovou o pagamento da LDC nº 35.208.236-4. Em relação ao mérito, afirmou que restaram demonstradas a autoria e a materialidade do delito.

O parecer foi juntado às fls. 265/281, tendo o Parquet opinado pelo parcial provimento do recurso para diminuir a pena, sob o argumento de que, diante do pagamento de parte da dívida, deve ser aplicada a atenuante prevista no artigo 65, III, "b" do Código Penal e reduzido o quantum decorrente da continuidade delitiva.

É o relatório.

À douta revisão.

LILIANE RORIZ
Relatora

VOTO

Admissibilidade

O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade, de modo que deve ser conhecido.

Preliminar

Extinção da punibilidade pelo pagamento do débito

ANTONIO MANUEL pugnou, preliminarmente, pela extinção da punibilidade tendo em vista o pagamento do débito referente às contribuições previdenciárias descontadas dos salários dos empregados da empresa AUTO SERVIÇO JANSEN DE MELLO Ltda.

Com efeito, comprovada a quitação integral do débito, impende reconhecer a extinção da punibilidade do crime previsto no art. 168-A, § 1o, inciso I, do Código Penal, com base no § 2o, do artigo 9o, da Lei 10.684/03.

Assim, entendo que, embora haja restrição legal quanto à aplicação do art. 9o, da Lei no. 10.684/2003, aos crimes previstos no art. 168-A, do CP - em razão da vedação ao parcelamento das contribuições previdenciárias dos empregados (art. 7º, da Lei n.º 10.666/03) -, esta mesma restrição não pode ser ampliada em prejuízo dos réus. Isso porque tal entendimento conflitaria com o próprio sistema processual adotado, que sempre previu a extinção da punibilidade com o pagamento integral do débito, por meio das Leis no. 9.249/1995 e 9.983/2000, divergindo, tão somente, quanto ao termo ad quem para a quitação do débito, antes do recebimento da denúncia ou antes do início da ação fiscal.

Ademais, a meu ver, a restrição se refere apenas ao parcelamento e, conseqüentemente, à suspensão da pretensão punitiva, não afetando a extinção, em decorrência do efetivo pagamento.

Destaque-se, ainda, que o § 2o do referido art. 9o não poderia se constituir em um parágrafo, por não ter relação com o caput do artigo, vez que trata de matéria distinta. Se houve falha do legislador, entretanto, na sistematização da norma legal, tal não pode afetar os réus em seus direitos.

Cabe assim, aplicar o dispositivo em questão, desde que provado o pagamento.

Entretanto, in casu, ANTONIO MANUEL não logrou comprovar a quitação integral do débito, tendo em vista que apenas apresentou o comprovante de pagamento da LDC - Lançamento de Débito Confessado - nº 35.208.236-4 (fls. 250 e 251), enquanto que a presente ação penal trata, também, da LDC nº 35.208.237-2.

Destarte, a preliminar deve ser afastada.

Mérito

Autoria e materialidade

A materialidade delitiva restou amplamente demonstrada através dos LDC`s - Lançamentos de Débitos Confessados - nºs 35.208.236-4 (fls. 76/79) e 35.208.237-2 (fls. 80/83), bem como pelo interrogatório de ANTONIO MANUEL, ocasião em que confirmou que deixou de recolher as contribuições descontadas de seus empregados (fl. 128).

Ademais, foram juntados aos autos os recibos referentes ao pagamento dos salários de empregados da empresa AUTO SERVIÇO JANSEN DE MELLO Ltda, às fls. 84/90, dando conta que, efetivamente, as contribuições previdenciárias foram descontadas dos salários dos mesmos.

A autoria também é inconteste.

O contrato social da empresa e suas diversas alterações (fls. 14/29) trazem o nome de ANTONIO MANUEL como sendo responsável por administrar e gerir o negócio.

No seu interrogatório, às fls. 128/129, esclareceu que:

Fl. 128 - "o acusado afirma ter deixado de recolher as contribuições descontadas de seus empregados em razão de dificuldades financeiras ocorridas na época; (...) que os demais sócios que se sucederam na gerencia da sociedade somente figuraram nessa qualidade para compor o quadro societário necessário para a configuração de uma sociedade por cotas de responsabilidade limitada"

A testemunha de acusação, Maria Lúcia Rubião de Andrade, Fiscal de Contribuições Previdenciárias, afirmou, à fl. 137, que:

Fl. 137 - "o débito ao qual se refere a presente ação penal é oriundo de confissão espontânea do acusado feita com o objetivo de ser admitido no REFIS; esclarece a depoente que mesmo os crédito (sic) fiscais objeto de confissão só podem ser lançados por auditor fiscal, tendo cabido a mesma essa tarefa"

As testemunhas de defesa, Francisca Maria de Azevedo (fl. 145), que foi secretária de ANTONIO MANUEL, por aproximadamente 18 (dezoito) anos, e Elizabeth Gabriel (fl. 146), que prestou serviços de contabilidade para a empresa AUTO SERVIÇO JANSEN DE MELLO Ltda, demonstraram, em seus depoimentos, que o apelante era, de fato, o responsável pela gerencia da empresa, vejamos:

Fl. 145 - "que o não recolhimento das contribuições por parte do acusado não ocasionou nenhum óbice na obtenção de sua aposentadoria" - depoimento de Francisca Maria de Azevedo.

Fl. 146 - "que se recorda que o réu por ocasião das rescisões dos contratos de trabalho sempre regularizava os débitos para que não houvesse qualquer prejuízo aos empregados" - depoimento de Elizabeth Gabriel.

Pelo exposto, a prova oral é harmoniosa no sentido de confirmar a materialidade do crime descrito na denúncia e a autoria atribuída a ANTONIO MANUEL, restando comprovado que o apelante foi o responsável pelo não pagamento das contribuições previdenciárias, não obstante descontadas dos salários dos empregados.

Dificuldades financeiras - inexigibilidade de conduta diversa

Quanto às alegadas dificuldades financeiras, que poderiam caracterizar a exclusão da culpabilidade, por inexigibilidade de conduta diversa, entendo que o réu não se desincumbiu de prová-las, conforme lhe determina o art. 156 do Código de Processo Penal.

Isto porque o apelante não trouxe aos autos nenhum documento que pudesse comprovar a alegada dificuldade, balizando sua defesa apenas em alguns depoimentos. Desta forma, não há elementos de convicção que se mostram, a meu sentir, suficientes para se concluir que a sociedade enfrentava dificuldades financeiras insanáveis à época dos fatos, ao menos na forma cabal exigida para fins de reconhecimento da excludente de culpabilidade.

No mesmo sentido, leiam-se os seguintes julgados desta Corte:

"PENAL - NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS - LEI 8.212, ART. 95, "D" E ART. 168-A, § 1o., INCISO I, DO CP - DOLO - ANIMUS DE FRAUDAR - ESPECIAL FIM DE AGIR - COMPROVAÇÃO - DESNECESSIDADE - REAL CAPACIDADE DE AGIR - DIFICULDADES FINANCEIRAS - INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA - CAUSA SUPRALEGAL DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE - PROVA - ÔNUS DO RÉU - COMPROVAÇÃO IN CASU - PROVA INDICIÁRIA - ART. 239, CPP - ABSOLVIÇÃO - POSSIBILIDADE, INC CASU - ART. 386, v, DO CPP - PRECEDENTES.

...omissis...

- As dificuldades financeiras aptas a ensejar o acolhimento de excludente de culpabilidade - inexigibilidade de conduta diversa -, são aquelas decorrentes de circunstâncias imprevisíveis ou invencíveis que tenham comprometido ou ameaçado, inclusive o patrimônio pessoal do sócio-gerente (TRF4, ACR2002.04.01.033161-7/SC, J17/02/03, in Informativo TRF/4a. Região no. 146, TRF4, ACR0401036491/RS, Rel. Fabio Bittencourt Rosa, t1, v.u., DJ 23/06/99) ... omissis..."

(ACR 2287, Processo no. 200002010090145/RJ - TRF 2a. Reg. - 6a. T, Rel. Desembargador Federal Poul Erik Dyrlund, DJ data: 08/09/2003, p. 178/179).

"PENAL - PROCESSO PENAL - NÃO REPASSE DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS RECOLHIDAS - DIFICULDADES FINANCEIRAS - ÔNUS DA PROVA - INCUMBÊNCIA DO RÉU -INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA - NÃO COMPROVAÇÃO.

...omissis...

3- A prova da existência de dificuldades financeiras incumbe ao réu. Caberá ao acusador, ao oferecer a denúncia, a prova do fato típico, da autoria bem como das circunstâncias que podem causar o aumento da pena. Já ao réu caberá as provas das causas que excluem a antijuridicidade, culpabilidade, punibilidade, bem como das circunstâncias que impliquem diminuição da pena, concessão de benefícios penais ou a própria inexistência do fato.

... omissis..." (ACR 2624, Processo no. 200002010610992/RJ - TRF 2a. Reg. - 6a. T, Rel. Desembargador Federal Sérgio Schwaitzer - DJ data: 20/05/2004, p. 256). (grifos nossos)

Diante do exposto, como o réu não logrou comprovar as dificuldades financeiras enfrentadas pela sociedade AUTO SERVIÇO JANSEN DE MELLO Ltda, correta se mostrou a sentença condenatória.

Aplicação da pena

O MM. Magistrado sentenciante aumentou a pena-base de ANTONIO MANUEL em 9 (nove) meses de reclusão e 96 (noventa e seis) dias-multa, pois considerou desfavoráveis ao réu duas circunstâncias judiciais, quais sejam, a culpabilidade do agente e as consequências do crime.

Quanto à primeira circunstância, a culpabilidade, o MM. Juiz a quo consignou que:

Fl. 220 - Quanto à culpabilidade, peço vênia para acompanhar o entendimento adotado pelo Exmo. Des. Fed. Abel Gomes, no julgamento da apelação criminal de cuja ementa transcrevo o trecho pertinente:

"II - Na análise das circunstâncias judiciais, verifica-se serem desfavoráveis aos réus a culpabilidade, dada a premeditação e o conhecimento potencial da ilicitude mais evidente nas condições pessoais, além dos maus antecedentes, à vista de condenações anteriores pela prática de fatos similares, ainda não transitados em julgado."

TRF2ª, 2a Turma Especializada, ACR 19985102206925-3, rel. Des. Federal ABEL GOMES, j. 06/09/2006, p. 191, transitado em julgado em 24/11/2006.

Vale ainda ser transcrito, do voto condutor, o seguinte trecho:

"A culpabilidade mostra-se elevada, pois houve premeditação na prática do injusto, sendo certo que a premeditação indica a circunstância de uma prática de conduta mais reprovável do que aquela desencadeada por dolo ímpeto . Note-se que CLAUDIA captava idosos e doentes a fim de ludibriá-los, fazendo-os crer que tinham direito à obtenção de benefício previdenciário, utilizando-os para a prática do delito."

O mesmo ocorre no delito em análise na presente ação penal, uma vez que o réu deixou de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, relevando intenso dolo, não somente no sentido de sua premeditação, mas intenso dolo no sentido de total menosprezo para com os bens jurídicos protegidos, quais sejam, o patrimônio e, remotamente, a fé pública, revelando, desse modo, maior reprovabilidade da conduta."

Diante da análise do trecho acima destacado, entendo que as circunstâncias destes autos são outras e que a culpabilidade, in casu, não poderá ser considerada em desfavor do réu.

Note-se que quando o MM. Juiz a quo referiu-se à premeditação, acompanhou voto do Exmo. Desembargador Federal Abel Gomes, que tratava de crime diverso, descrito no artigo 171, § 3º do Código Penal, em que a acusada "captava idosos e doentes a fim de ludibriá-los, fazendo-os crer que tinham direito à obtenção de benefício previdenciário, utilizando-os para a prática do delito".

Ou seja, no voto acima referido, é patente que a reprovabilidade da conduta encontra-se além dos elementos do próprio tipo legal, pois o agente não só induziu outrem em erro, mediante artifício ardil, como instigou pessoas mais vulneráveis - idosos e doentes - para o cometimento do crime, isto tudo sem falar que houve a premeditação, circunstância que, sem dúvida, pode ser extraída da descrição da conduta narrada pelo Exmo. Desembargador citado.

Porém, in casu, está-se diante de crime diverso e não há elementos no processo que nos indiquem, com a certeza necessária, de que ANTONIO MANUEL agiu de forma premeditada.

É claro em que há situações nas quais a intensidade do dolo deve ser pesada contra o réu, quando analisadas as circunstâncias judiciais, nos termos, inclusive, da jurisprudência juntada pelo MM. Magistrado sentenciante. Entretanto, no caso em que ora se analisa, não há dados concretos - que extrapolem os elementos normativos do tipo - que nos permitam aferir maior grau de reprovabilidade na conduta do agente, razão pela qual, afasto a incidência da culpabilidade do agente, como circunstância judicial a agravar a pena.

A segunda circunstância que foi considerada em desfavor do apelante, as consequencias do crime, também deve ser afastada.

Com efeito, embora o crime praticado por ANTONIO MANUEL tenha contribuído para agravar ainda mais a situação da combalida previdência social, o valor em si, de R$ 21.383,69 (vinte e um mil, trezentos e oitenta e três reais e sessenta e nove centavos), embora não seja de pequena monta, é comum para esta espécie de crime.

Ademais, deve-se levar em consideração que o houve o pagamento de parte dos valores não repassados à Previdência, referente à LDC n º 35.208.236-4, que, à época de apuração do débito, representava a quantia de R$ 8.606,28 (oito mil, seiscentos e seis reais e vinte e oito centavos).

Desta forma, subtraindo-se o valor já pago, pode-se afirmar que a omissão de ANTONIO MANUEL acarretou um prejuízo de R$ 12.777,41 (doze mil, setecentos e setenta e sete reais e quarenta e um centavos) ao INSS, valor apurado no ano de 2000, acrescidos de multa e juros.

Some-se que, embora não se trata de valor pequeno, está bem aquém do quantum que a jurisprudência vem considerando como relevante a ensejar aumento da pena-base, vejamos:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 168-A DO CP. PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO.

I - Revela-se suficientemente fundamentada a decisão que exasperou a pena-base em 1 (um) ano em razão das consequências do crime - prejuízo de R$ 1.124.550,74 (um milhão, cento e vinte e quatro mil, quinhentos e cinquenta reais e setenta e quatro centavos). (grifo nosso)

Agravo regimental desprovido. (STJ - AGA - Agravo Regimental no Agravo de Instrumento - 830099. Quinta Turma. Relator MINISTRO FELIX FISCHER. DJ. 24/03/2008)

APELAÇÃO CRIMINAL - ART. 168-A C.C ART. 71 DO CÓDIGO PENAL - MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS - INEXISTÊNCIA DE CAUSA EXCLUDENTE DA CULPABILIDADE - DOSIMETRIA DA PENA - A FIXAÇÃO DO NÚMERO DE DIAS-MULTA DEVE SEGUIR A MESMA METODOLOGIA EMPREGADA PARA A FIXAÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE - APELAÇÃO MINISTERIAL PROVIDA.

(omissis)

6. Considerando-se as circunstâncias judiciais elencadas no artigo 59 do Código Penal, em especial, aos antecedentes do réu, personalidade perniciosa e conseqüências do crime - o valor correspondente ao crédito tributário é superior a R$ 1.800.000,00 (um milhão e oitocentos mil reais) - fixa-se a pena-base acima do mínimo legal, em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, aumentada em 2/3 na terceira fase do procedimento dosimétrico em razão da continuidade delitiva, restando definitivamente fixada em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, a serem descontados em regime inicial semi-aberto. (grifo nosso)

7. (omissis)

8. Apelação ministerial provida. (TRF - 3a Região. ACR 2001.61.19.001588-8. Primeira Turma. Relator Desembargador Federal PAULO SARNO. DJ. 04/05/2009)

PENAL E PROCESSUAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ART. 168-A, CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE DO DELITO E AUTORIA CONFIGURADOS. DOLO GENÉRICO. DIFICULDADES FINANCEIRAS. PROVAS INSUFICIENTES. ALEGAÇÃO IMPRESTÁVEL PARA A EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE. CONTINUIDADE DELITIVA. RECURSO INTEGRALMENTE

(omissis)

3. Argumenta a defesa que a circunstância judicial do art. 59 levada em conta pelo juízo a quo, na fixação da pena base acima do mínimo legal, seria elemento inerente ao tipo penal do art. 168-A, § 1º, inciso I, do CP. O juízo a quo declinou, nos fundamentos da fixação da pena base, fundamento intangível. O indébito consolidado em maio de 2001 era da ordem de R$ 967.438,22 (novecentos e sessenta e sete reais, quatrocentos e trinta e oito reais e vinte e dois centavos). As conseqüências do crime são de fácil apreensão, pois, primeiramente, os empregados da empresa sofreram os descontos, a fim de financiar a seguridade social, a sua própria previdência social, inclusive e, surpreendentemente, a dos empresários também, como contribuintes individuais e vinculados ao Rgime Geral de Previdência Social que são.

4. As conseqüências são consideráveis, e serão tanto maiores quanto o montante do indébito afastar-se do mínimo legal estipulado para o ajuizamento do executivo fiscal respectivo; até o ponto em que o potencial lesivo da conduta for tamanho, em face do alto valor do indébito, que repercuta de forma nefasta na seguridade social e suas conseqüências possam ser estimadas como razoáveis, tanto no plano singular quanto no plano geral, supra-individual, merecendo então reprimenda maior. Isso só poderá ser atingido pelo juízo mediante o manejo das circunstâncias judiciais do artigo 59 do CP, e sua função primordial no implemento dos fins da pena, a reprimenda necessária à repressão e prevenção do crime. (grifo nosso)

(omissis)

(TRF- 3ªRegião. ACR 32321. Segunda Turma. Desembargador Federal Cotrim Guimarães. DJ 30/04/2009)

A propósito, a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região prevê, inclusive, alguns critérios para se aferir a grandeza da lesão a Previdência Social, conforme se vê dos julgados abaixo e, da mesma forma, não guardam similitude com o modelo adotado nestes autos:

PENAL E PROCESSO PENAL. OMISSÃO NO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ART. 168-A, § 1º, I, DO CP. DOLO GENÉRICO. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA POR DIFICULDADES FINANCEIRAS. COMPROVAÇÃO. DESNECESSIDADE DE PERÍCIA CONTÁBIL. SÚM. 67 DO TRF 4ª REGIÃO. UNIFICAÇÃO DAS PENAS. ART. 82 DO CPP. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS.

(omissis)

4. A circunstância judicial referente às conseqüências do crime, no art. 59 do CP, relaciona-se com a grandeza da lesão à Previdência Social, devendo ser valorada negativamente, toda vez que houver omissão de recolhimento de valores superiores a R$ 100.000,00 (cem mil reais). Precedentes desta Corte. (grifo nosso)

(TRF-4ª Região. ACR 2002.71.07.013022-0. Oitava Turma. Relator Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO. DJ 22/11/2006).

PENAL. OMISSÃO DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. INDIVIDUALIZAÇÃO DA CONDUTA. DESNECESSIDADE. MATERALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOLO. NÃO-CONFIGURAÇÃO. REDUÇÃO DA PENA-BASE. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA PRESCRIÇÃO RETROATIVA.

(omissis)

5. Nos crimes de sonegação de contribuições previdenciárias a omissão de recolhimento de valores superiores a R$ 30.000,00, por ato criminoso, enseja especial valoração negativa das conseqüências do crime, sem que se considere a totalidade do débito informado na denúncia, porque esse total já é considerado na fase final do crime continuado. (grifo nosso)

(TRF-4a Região. ACR 2004.71.07.006010-0. Sétima Turma. Relator Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS. DJ. 13/08/2008)

Destarte, os critérios acima não serviriam de parâmetro para aumentar a pena-base do apelante.

Ademais, "as graves consequências aos cofres públicos" não podem ser aferidas por exclusão aos valores que o legislador entende como de menor significância, como sugeriu o Magistrado a quo, ao afirmar que:

Fl. 221 - "Utilizando a analogia, depreende-se que o valor não repassado pelo réu trouxe graves consequencias aos cofres públicos, pois ultrapassa valores estipulados pelo legislador como de menor significância sendo merecedor se (sic) uma maior atividade repressora estatal".

Assim, diante do exposto, diminuo a pena-base de ANTONIO MANUEL para o patamar mínimo legal, de 02 (dois) anos de reclusão.

Na segunda fase de valoração da pena, entendeu o Parquet, em parecer (fl. 280), que o pagamento parcial da dívida, se não pode conduzir à extinção da punibilidade, há de ser levado em conta, ao menos, como circunstância atenuante, nos termos do artigo 65, III, "b", do Código Penal, ou ainda na forma do artigo 66, do mesmo diploma legal.

Entretanto, nos termos do verbete nº 231, da súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal, razão pela qual mantenho a pena em 02 (dois) anos de reclusão.

Na terceira fase, deve incidir o aumento referente à continuidade delitiva, apenas em patamar menor do que o considerado na sentença, tendo em vista o pagamento de parte da dívida, nos moldes do parecer do Ministério Público Federal (fl. 281).

Assim, aumento a pena em 6 (seis) meses de reclusão, tornando-a definitiva em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

Com a redução da pena, e tendo havido o trânsito em julgado da sentença para o Ministério Público Federal, o prazo prescricional da pretensão punitiva, aplicável à presente hipótese, passa a ser de 4 (quatro) anos, nos termos do art. 109, inciso V, do Código Penal, c/c o artigo 119 do mesmo diploma.

Levando-se em consideração que os fatos delituosos referentes ao LDC nº 35.208.237-2 ocorreram no período de janeiro de 1999 a janeiro de 2000 e excluindo-se do cômputo do prazo prescricional o lapso em que a empresa esteve vinculada ao REFIS - 14/04/2000 a 01/01/2002 (fl. 51) - pode-se afirmar que transcorreu o prazo prescricional de 4 (quatro) anos entre a data dos fatos e do recebimento da denúncia, ocorrida em 18/01/2007 (fl. 122).

Face o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso do réu para reduzir a sua pena definitiva para 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa, em regime aberto, no valor unitário mínimo. Por consequência, em caso de não interposição de recurso pela acusação, DECLARO, DE OFÍCIO, EXTINTA A PUNIBILIDADE DE ANTONIO MANUEL AMARO MONTEIRO, pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, com fundamento no artigo 61, do CPP, c/c os artigos 107, inciso IV, 110, §§ 1o e 2o e 109, inciso V, todos do Código Penal.

É como voto.

LILIANE RORIZ
Relatora

E M E N T A

PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. NÃO OCORRÊNCIA DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. PAGAMENTO PARCIAL DO DÉBITO. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. NÃO COMPROVAÇÃO DE DIFICULDADES FINANCEIRAS. ÔNUS DA DEFESA. DIMINUIÇÃO DA PENA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA PRESCRIÇÃO RETROATIVA DA PRETENSÃO PUNITIVA.

1. Não ocorrência da extinção da punibilidade pelo pagamento da dívida. O apelante não logrou comprovar a quitação integral do débito.

2. A materialidade do delito e a autoria foram amplamente comprovadas por prova documental e oral.

3. O réu não logrou comprovar as dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa. Não há nos autos elementos de convicção que se mostram suficientes para se concluir que a empresa enfrentava dificuldades financeiras insanáveis à época dos fatos, ao menos na forma cabal exigida para fins de reconhecimento da excludente de culpabilidade.

4. Diminuição de pena e, por consequência, em caso de não interposição de recurso pela acusação, extinta a punibilidade pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, com fundamento no art. 61, do CPP, c/c os artigos 107, inciso IV, 110, §§ 1o e 2o e 109, inciso V, todos do Código Penal.

5. Apelação parcialmente provida e declarada, de ofício, extinta a punibilidade pela ocorrência da prescrição, em caso de não interposição de recurso pela acusação.

A C Ó R D Ã O

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Segunda Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, e, em caso de não interposição de recurso pela acusação, reconhecer, de ofício, a extinção da punibilidade pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal, nos termos do voto da relatora.

Rio de Janeiro, 14 de julho de 2009 (data do julgamento).

LILIANE RORIZ
Relatora




JURID - Apropriação indébita previdenciária. Não ocorrência. [23/07/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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