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sexta-feira, 24 de julho de 2009

JURID - Tentativa de homicídio simples. Julgamento pelo Júri. [24/07/09] - Jurisprudência


Tentativa de homicídio simples. Julgamento pelo Tribunal do Júri que afastou o animus necandi.
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Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul - TJRS.

APELAÇÃO-CRIME. TENTATIVA DE HOMICÍDIO SIMPLES. JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JÚRI QUE AFASTOU O ANIMUS NECANDI, E POR CONSEGUINTE, SUA COMPETÊNCIA PARA JULGAR O FATO. DENUNCIADO CONDENADO PELA MAGISTRADA SINGULAR PELA PRÁTICA DO CRIME DE DISPARO DE ARMA DE FOGO. APELO DEFENSIVO. PRELIMINARES. NULIDADE DA SESSÃO PLENÁRIA. DESCABIMENTO.

O réu logrou adiar seu julgamento pelo Tribunal Popular por duas vezes, não obtendo êxito em adiá-lo outra vez graças à rigorosa e ponderada postura adotada pela juíza presidente. Ao contrário do que foi infielmente ventilado, ou seja, que a magistrada de primeiro grau teria "determinado ou solicitado" que o defensor do recorrente se retirasse da sessão plenária e levasse consigo o acusado e as testemunhas defesa, se extrai que, na verdade, descartando-se a usual distorção que vem sendo feita pela defesa dos fatos e das decisões prolatadas ao longo deste feito, foi o próprio defensor que decidiu não participar da sessão plenária, levando consigo seu cliente, tendo em vista que após longa argumentação, a qual se pode considerar inclusive hostil, referido causídico optou, em função de seus argumentos terem sido totalmente rechaçados, por retirar-se da sessão, aconselhando seu cliente a fazer o mesmo. Diante deste fato, em razão de o juízo a quo ter previsto que tal expediente poderia ser adotado como forma de mais uma vez alargar a marcha processual, referiu que o Defensor Público estava preparado para assumir a égide do denunciado, o que efetivamente realizou. E por ter entendido ser dispensável o depoimento em plenário das testemunhas arroladas pelo defensor anterior é que elas se evadiram da sessão. Ora, não pode o Estado tornar-se refém de técnicas defensivas, tanto que a Lei n.º 11.689/2008, buscando justamente eliminar uma das maiores causas da prescrição no procedimento dos processos de competência do Tribunal do Júri, passou a prever na nova grafia que deu ao artigo 457 do Código de Processo Penal, a possibilidade de julgamento sem a presença do acusado também para os crimes inafiançáveis, bastando, no caso de réu solto, sua devida intimação. E antes que se suscite a inaplicabilidade de tal regra aos fatos a ela precedentes, adianto que julgo se tratar de norma meramente processual, possuindo, dessarte, imediata aplicabilidade, nos termos do art. 2º do Código de Processo Penal. Explico. É que os réus que estiverem respondendo a processos sob o procedimento do Tribunal do Júri, ainda não julgados pelo juízo natural da causa, não serão condenados e terão de cumprir eventual sanção prisional em face da alteração de uma norma processual. Cumprirão pena, se for o caso, por terem sido julgados e condenados pela prática de um ilícito que cometeram, inexistindo, desse modo, qualquer alteração no Direito Penal, motivo pelo qual entendo não se cuidar de regra processual penal material. Assim, pelas razões expostas, não verifico qualquer nulidade na debatida sessão de julgamento.

ARGÜIÇÃO DE NULIDADE DO PROCESSO. ALEGAÇÕES DE OFENSA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL, AFRONTA ÀS LEIS INFRACONSTITUCIONAIS, FALTA DE DEFESA E DESCUMPRIMENTO DO PRAZO PARA O OFERECIMENTO DE DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. O objetivo da defesa desde o início do feito foi tumultuá-lo, possivelmente ante a possibilidade de ver extinta a punibilidade do réu devido à prescrição, que inclusive teve seu reconhecimento almejado no presente apelo. Ora, causa estranheza a alegação defensiva de que "O processo durante toda a sua extensão foi construído sobre nulidade, irregularidade que deu a ela diversos recursos aos tribunais" (sic), uma vez que os incontáveis recursos interpostos foram, em sua quase totalidade, improvidos, o que corrobora a absoluta regularidade no trâmite deste feito. Ao mais, inexistiu a alegada falta de defesa. Com efeito, diante da desistência de atuar em plenário do advogado constituído pelo réu, este foi brilhantemente patrocinado pela Defensoria Pública, que estava nomeada para este fim desde a data de 10/01/2008, a pedido do próprio imputado, não sendo tal órgão comunicado acerca da constituição de defensor particular. Por último, não foi demonstrado qualquer prejuízo suportado pelo acusado em função das supostas nulidades. Ao contrário, entendo que a sentença que condenou o recorrente apenas pela prática do crime de disparo de arma de fogo lhe foi consideravelmente favorável, levando-se em conta a prova contida no feito. Em outra mão, o descumprimento do prazo para oferecimento da denúncia não causa qualquer nulidade, visto que não é preclusivo, acarretando apenas a possibilidade de apresentação de ação penal privada subsidiária da pública, no prazo estabelecido pelo art. 38 do Código de Processo Penal. Durante este período e até que ocorra a prescrição da pretensão punitiva, poderá o órgão ministerial ofertar peça incoativa.

MÉRITO. ROGO DE RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO. INVIABILIDADE. Levando em consideração as penas concretizadas, quais sejam, um ano e seis meses de detenção e noventa dias-multa, já com trânsito em julgado para o órgão ministerial, os prazos prescricionais são de quatro anos, conforme dispõem os artigos 109, V, e 114, II, ambos do Código Penal. Assim, em sendo o fato perpetrado na data de 27/01/2001, a denúncia recebida em 29/05/2003, a decisão que pronunciou o recorrente publicada em 14/11/2005, a que confirmou o decisum em 05/10/2006 e a sentença condenatória lavrada pela juíza de primeiro grau em 11/09/2008, constato que não foi implementado o lapso temporal exigido à ocorrência da referida causa extintiva de punibilidade. Ao vindicá-la, olvidou-se a defesa dos marcos interruptivos da prescrição presentes no caso, previstos nos incisos I, II, III e IV do art. 117 da Lei Substantiva Penal.

PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. INADMISSIBILIDADE. A materialidade delitiva defluiu do auto de apreensão e do laudo pericial. No que diz respeito à autoria, em que pese a negativa do acusado, se mostrou inconteste mediante o restante da prova oral, tendo em vista que quatro testemunhas asseguraram que o recorrente desferiu disparos de arma de fogo em via pública. Por outro lado, as alegações defensivas relativas ao laudo pericial não possuem qualquer relevância. De fato, o citado laudo foi juntado aos autos e analisado no momento oportuno, a saber, a sessão plenária. Ademais, impossível exigir-se que os experts constatassem se a arma de fogo foi utilizada no dia do fato e por quem teria sido aproveitada, por absoluta inviabilidade técnica. Não obstante, o exame residuográfico, ao oposto do que entende a defesa, não constitui prova imprescindível à condenação, sendo apenas mais um elemento probatório quando existente.

ALEGAÇÃO DE LEGÍTIMA DEFESA OU ESTADO DE NECESSIDADE. INOCORRÊNCIA. A prova carreada ao processo não sustenta a tese defensiva alternativa de ter o denunciado agido sob o abrigo de legítima defesa ou estado de necessidade, até por que o réu negou estar armado.

APENAMENTO. PLEITO DE EXCLUSÃO DA PENA DE MULTA. IMPOSSIBILIDADE, NO ENTANTO, REDUÇÃO OPERADA. A multa, incluída no preceito secundário do tipo, nada mais é do que decorrência legal da condenação, descabendo ao magistrado excluí-la. Saliente-se, ainda, que sua aplicação não implica, de per si, infringência ao princípio da intranscendência, segundo o qual a pena imposta ao acusado não passará da sua pessoa. Entretanto, possível é a amortização da sanção imposta. É que a repreensão pecuniária foi determinada em noventa dias, à razão unitária de um salário mínimo. Logo, o número de dias-multa se mostrou longínquo do mínimo legal, causa pela qual o diminuo para quinze dias-multa, a fim de que guarde certa proporção com a punição corporal estabelecida - um ano e seis meses de detenção. Ainda, conquanto tenha constituído inúmeros causídicos durante o trâmite deste processo, o réu juntou aos autos extrato semestral de benefício concedido pela previdência social em função de aposentadoria por invalidez, no valor líquido médio aproximado de quatrocentos e quarenta reais, assim como comprovante de rendimentos pagos e de retenção de imposto de renda na fonte. Desse modo, amortizo a razão de cada dia-multa para 05/30 do salário mínimo vigente à época do fato.

Preliminares afastadas e apelo parcialmente provido.

Apelação-Crime nº 70027430917

Terceira Câmara Criminal - Regime de Exceção

Comarca de Porto Alegre

JOÃO MARIA CâNDIDO REIS SANTOS
APELANTE

MINISTÉRIO PÚBLICO
APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Criminal - Regime de Exceção do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em afastar as preliminares e dar parcial provimento ao apelo, apenas para reduzir a pena de multa cominada ao apelante para quinze dias-multa à razão de 5/30 do salário mínimo vigente à data do episódio, sendo mantida, no demais, a sentença recorrida.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des. Manuel José Martinez Lucas e Des. Marcel Esquivel Hoppe.

Porto Alegre, 06 de julho de 2009.

DES. MARCO ANTÔNIO RIBEIRO DE OLIVEIRA,
Relator.

RELATÓRIO

Des. Marco Antônio Ribeiro de Oliveira (RELATOR)

O Ministério Público da Comarca de Porto Alegre/RS denunciou João Maria Cândido Reis Santos, com 53 anos de idade à época do fato, como incurso nas iras do art. 121, caput, c/c o art. 14, II, ambos do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso:

"No dia 27 de janeiro de 2001, por volta das 11h, na Av. Bento Gonçalves, 7153, Bairro Agronomia, nesta Capital, o denunciado João Maria Cândido Reis Santos, mediante disparos de arma de fogo, auto de apreensão de fls., tentou matar DEJAYR ARAÚJO BAPTISTA, sem contudo atingi-lo.

Na oportunidade, movido por pretéritas desavenças, o denunciado empurrou um veículo até a frente da oficina da vítima e, ao ser interpelado sobre isso, saiu do local para se armar e voltou em seguida, quando, já armado, efetuou disparos contra o ofendido, não se consumando seu intento por circunstâncias alheias à sua vontade, já que, por erro de pontaria, não conseguiu atingir a vítima, e, ao tentar desferir outros disparos, sua arma falhou".

A denúncia foi recebida em 29/05/2003 (fl. 152).

Após regular instrução sobreveio decisão publicada em 14/11/2005 (fl. 679), que julgou procedente a acusação, pronunciando o denunciado nas reprimendas do art. 121, caput, c/c o art. 14, II, ambos da Lei Substantiva Penal (fls. 675/679).

Irresignada, a defesa interpôs recurso em sentido estrito (fls. 683/684). Em suas extensas razões suscitou uma série de nulidades, requerendo, ao final, a reforma total da decisão de pronúncia (fls. 685/751).

O recurso foi contra-arrazoado (fls. 753/757).

A decisão foi mantida pelo juízo a quo (fl. 758).

O Procurador de Justiça Dr. Luiz Henrique Barbosa Lima Faria Corrêa manifestou-se pelo improvimento do recurso defensivo (fls. 762/769).

A defesa aditou seu recurso, a fim de pleitear também a desclassificação do episódio denunciado para "simples briga, rixa desavença, desentendimento desarmado entre vizinhos", bem como o arquivamento do feito em razão de o fato se encontrar prescrito (fls. 770/771).

O Procurador de Justiça opinou pela rejeição da prescrição e pelo não conhecimento do aditamento aos termos do recurso inicial (fls. 772/776).

Em sessão realizada na data de 05/10/2006 a Terceira Câmara Criminal deste Tribunal afastou as preliminares e negou provimento ao recurso defensivo (fls. 780/784).

A defesa opôs embargos declaratórios (fls. 787/804), oferecendo, em seguida, aditamento (fls. 805/812), sendo os embargos rejeitados (fls. 825/831).

A defesa opôs novos embargos de declaração contra a decisão que julgou os embargos declaratórios opostos anteriormente (fls. 834/849).

Por meio de decisão monocrática o Des. Newton Brasil de Leão negou seguimento ao recurso, com base no inciso II do art. 324 do Regimento Interno deste Tribunal (fls. 850/851).

O defensor interpôs recursos especial e extraordinário (fls. 857/877 e 878/898).

Os recursos foram contra-arrazoados pelo órgão ministerial (fls. 900/905).

O 2º Vice-Presidente deste Tribunal à época, Des. Danúbio Edon Franco, negou seguimento aos recursos interpostos (fls. 907/910v).

O defensor interpôs agravo de instrumento e "agravo de decisão" contra a referida decisão (fls. 911 e 925/939).

O último recurso foi de plano indeferido pelo Des. Danúbio Edon Franco (fls. 940/941).

Foi determinada a apresentação de libelo, tendo em vista que o agravo de instrumento interposto não possui efeito suspensivo (fl. 942).

O Ministério Público ofereceu libelo-crime acusatório (fls. 943/944).

A defesa apresentou contrariedade ao libelo (fls. 951/966).

Determinado o desentranhamento de documentação juntada pela defesa (fl. 1081), esta requereu carta testemunhável, argumentando que a magistrada singular não recebeu o recurso de apelação que interpôs (fls. 1083/1084).

A juíza a quo declarou ser descabida a carta testemunhável, pois a decisão atacada não denegou recurso (fl. 1086).

A defesa impetrou mandado de segurança contra ato decisório da magistrada titular da 2ª Vara do Tribunal do Júri da Comarca de Porto Alegre (fls. 1105/1150), o qual teve a inicial indeferida pelo Des. Newton Brasil de Leão (fls. 1103/1104).

Inconformada, a égide interpôs apelação (fls. 1149/1150 e 1151/1174), que foi conhecida pelo Des. José Antônio Hirt Preiss como agravo regimental, sendo-lhe negado provimento (fls. 1247/1249).

O defensor requereu que a magistrada de primeiro grau se declarasse impedida "de prosseguir administrando o presente processo penal", o que não foi acolhido (fls. 1225/1229 e 1230/1231).

Requeridos certidão narratória e exame e julgamento de suspeição e impedimento, ambos pedidos foram indeferidos (fls. 1237, 1238/1242 e 1243/1244).

A égide demandou a remessa do feito a este Tribunal de Justiça, com fundamento no art. 100 do Código de Processo Penal (fl. 1250).

A juíza de primeiro grau desacolheu o pedido, determinando sua autuação em apartado. Formado o incidente de exceção de suspeição e impedimento, este foi julgado improcedente por esta Corte (fl. 1251).

Após múltiplos percalços o imputado foi finalmente julgado pelo Tribunal do Júri, que afastou o animus necandi de sua conduta, e, por conseguinte, sua competência para julgar o episódio, sendo o réu condenado pela magistrada singular como incurso nas sanções do art. 10, § 1º, III, da Lei n.º 9.437/97, às penas de um ano e seis meses de detenção em regime semi-aberto e noventa dias-multa à razão unitária de um salário mínimo, sendo denegada a substituição por restrições de direitos e a suspensão condicional do castigo prisional, assim como a aplicação dos institutos previstos na Lei n.º 9.099/95 (fls. 1598/1601).

A sentença foi publicada em 11/09/2008 (fl. 1601).

Inconformada, a defesa apelou, com fundamento no art. 593, I e III, "a", do Código de Processo Penal (fls. 1751/1752). Em suas razões argüiu, preliminarmente, a nulidade do julgamento em que o réu restou condenado pela magistrada singular, bem como de todo o processo, por ausência de defesa, cerceamento de defesa, ofensa à Constituição Federal, decorrente de inobservância do princípio do contraditório, afronta às leis infraconstitucionais, tais como o Código Penal e o Código de Processo Penal, e descumprimento do prazo estipulado para o oferecimento da denúncia. No mérito, postulou a absolvição do réu, forte nos incisos I, II, IV e VI do art. 386 do Código de Processo Penal. Subsidiariamente vindicou que seja decretada extinta sua punibilidade ou excluída a pena de multa que lhe foi atribuída (fls. 1753/1776).

O apelo foi contra-arrazoado (fls. 1778/1787).

O Procurador de Justiça Dr. Paulo Fernando dos Santos Vidal manifestou-se pelo afastamento das preliminares e improvimento do recurso defensivo (fls. 1796/1803).

O processo veio concluso em regime de exceção na data de 03/04/2009 (fl. 1819).

É o relatório.

VOTOS

Des. Marco Antônio Ribeiro de Oliveira (RELATOR)

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, daí por que é conhecido.

Inicialmente, cumpre advertir se cuidar de fato relativamente simples. Sucede que por meio do emprego de praticamente todos os recursos cabíveis, muitas vezes de forma repetitiva, extensa e sem fundamento consistente, a defesa procrastinou a marcha processual, fazendo o feito atingir oito volumes e quatro apensos.

Em relação à primeira preliminar argüida pela defesa, de nulidade do julgamento proferido em sessão plenária, por ter a juíza presidente supostamente contrariado "todos os princípios básicos fundamentais do cidadão", bem como descumprido ou desobedecido ordem de Ministra do Superior Tribunal de Justiça e do Des. Newton Brasil de Leão - desta Corte, não merece acolhida.

Com efeito, ao justificar as razões da manutenção da data de julgamento, a magistrada a quo assim se manifestou (fls. 1607/1609):

"(...) Primeiro, o Doutor Ajala sistematicamente pediu designação de data para esse plenário de julgamento, inclusive se propôs a trazer o ora acusado aqui presente para que finalmente fosse realizado, já que adiado por três oportunidades. Verdade seja dita, o Doutor Ajala entrou no processo agora, em data recente. Tivemos diversas atuações anteriores neste processo que já se avoluma com sete volumes. Eu não posso crer que o senhor não tenha conhecimento do processo e não tenha as cópias disponíveis porque acredito que o senhor não teria memória suficiente para integralmente decorar as páginas e o conteúdo do que há nos processos para sistematicamente aportar com recursos, seja no Tribunal de Justiça, seja em Brasília (...) O Mandado de Segurança, este juízo não ignora também a existência dele, mas não houve deferimento de liminar (...) Inicialmente, interpôs habeas corpus em 21 de agosto do corrente aqui no Tribunal de Justiça do Estado e os objetivos do habeas corpus eram dois: O primeiro, porque ele gostaria que fosse mantida a figura do assistente de defesa por meio da Defensoria Pública, queria que houvesse essa figura, figura legal inexiste; a segunda insurgência era em relação à prisão preventiva, cujo cumprimento do mandado pendia em relação ao acusado. Na cronologia dos fatos, às folhas 1.552 e 1.553, o mesmo defensor hoje aqui presente - poderia ser outro, já que tantos defensores atuaram - ele disse que estava ciente da data do júri de hoje e pedia o imediato recolhimento do mandado de prisão. Posteriormente, há um acórdão do STJ de lavra da Ministra Maria Teresa, cujo teor diz ao final e na parte dispositiva, naquilo cujo cumprimento estou obrigada por determinação legal, é no sentido de conceder a ordem. Ele não pedia que fosse solto o acusado, não que fosse solto, fosse tornado sem efeito o decreto de prisão que havia contra ele e que pendia de cumprimento. O Tribunal daqui negou e o STJ deferiu em menor extensão, não como pediu, mas em menor extensão, dizendo: 'Defiro, sim, mas condicionando-se à apresentação do acusado, em cartório, no prazo de cinco dias', do que não é novidade nenhuma, isso sempre acontece. O que o fez, aliás, no dia seguinte, comparecendo o acusado em cartório, como dá conta a folhas 1560, inclusive acompanhado do bacharel que está aqui presente e foram ambos intimados da data de hoje. Ao final, do acórdão, a Ministra determinou a designação de nova data, mas por um único motivo: porque a sessão anteriormente designada já estava prejudicada e por um único motivo e motivo fático, pela fluência do tempo. O tempo passou e eu não tinha como realizar aquele júri de agosto quando já estávamos mais diante. São esses os argumentos que me fazem manter o julgamento e a prerrogativa do acusado de ser defendido será absolutamente mantida, no sentido de que a Defensora Pública do Estado que aqui atua, não foi intimada da desconstituição, talvez o juízo intuindo e talvez por cautela que pudesse não haver mais uma vez a realização deste plenário, cujo desrespeito aos jurados é enorme. Em relação aos sucessivos pedidos de afastamento desta julgadora do processo, apenas para conhecimento dos senhores jurados, nenhum deles foi acolhido pelo Tribunal por falta de embasamento, muitos deles sequer foram conhecidos e o manejo de recursos deste processo é tamanho e aqueles que compuserem entre os sete chegarão à conclusão que o processo é de uma simplicidade ímpar. O que nós temos aqui são cópias, cópias e cópias de pedidos de recursos, de habeas, de mandado de segurança, de correição parcial, carta testemunhável, etc, com o único objetivo, para que não chegássemos a este momento. Aqui estamos e realizaremos o julgamento com toda a tranqüilidade, com toda a serenidade. Eu não me sinto impedida e suspeita, se assim me sentisse, sairia do processo imediatamente, como já fiz por mais de uma oportunidade em Porto Alegre e por um problema ético em relação a um profissional que foi desrespeitoso com a minha pessoa naquela petição que aportou no processo e o processo ficou sob a condução da minha colega substituta de tabela e colega de vara, Dra. Laís Ethel Corrêa Pias. Os pedidos já foram sistematicamente enfrentados pelo Tribunal e sistematicamente negados. Se existe algum outro pedido lá cujo enfrentamento não tenha ocorrido, eu desconheço. E, por fim, há registro nos autos, os senhores não vão ter cópias de muitas peças porque a nova lei realmente limitou as cópias, o nosso próprio Tribunal de Justiça já afirmou em algumas oportunidades, os desembargadores que atuam no julgamento dos processos do acusado, de que talvez nunca tenham visto durante toda a atividade jurisdicional profissional que tem certamente mais de 25 anos de profissão, tanto que estão no grau máximo da magistratura do estado, que nunca viram um processo com o aporte de tantos recursos como o que ora será submetido a julgamento. O fato é simples, o julgamento é revestido de uma simplicidade ímpar. O julgamento, então, é mantido. O Doutor Artur Costa, Defensor Público, está apto e presente antes das 09 horas da manhã e tomará o assento em defesa ao acusado e o Doutor Ajala, se realmente for o seu intento, ou seja, se o senhor mudou de idéia e não quer mais que o Doutor Artur Costa fique sentado ao seu lado, como seu assistente, a porta está disponível para que o senhor se retire (...)".

E compulsando os autos verifico que agiu corretamente a nobre julgadora. De fato, inicialmente foi assentada a data de 29/11/2007 para o julgamento do imputado (fl. 1011). Porém, apenas seis dias antes da concretização do julgamento, o procurador que vinha defendendo-o com maior intensidade desde 2003 (fls. 327/329), pois após sua constituição outros também tiveram poderes outorgados para defendê-lo (fls. 510/512), atuando em algumas ocasiões até serem destituídos (fls. 580/582), renunciou à procuração que lhe foi outorgada, juntamente com a outra defensora que permanecia estabelecida como tal à época, alegando terem sido dispensados pelo réu (fls. 1295/1297). Por esse motivo, a sessão plenária foi cancelada, sendo determinada a intimação do recorrente para no prazo de cinco dias constituir novo patrono, sob pena de nomeação de Defensor Público em caso de inércia (fl. 1298).

Devidamente intimado (fl. 1301), João Maria requereu lhe fosse nomeado Defensor Público (fls. 1321/1323), o que foi operado (fl. 1325), sendo designada nova data para o seu julgamento, qual seja, 12/06/2008 (fls. 1333 e 1355).

Expedido mandado de intimação para o réu acerca da nova data demarcada, sobreveio informação de que ele nunca residiu no endereço que declinou (fls. 1407 e 1413).

No dia anterior ao de seu julgamento, peticionou o imputado, por meio da Defensoria Pública, bem como juntou documentos, a fim de comprovar impossibilidade de comparecer à sessão designada, postulando sua transferência (fls. 1399/1402).

Analisando tal quadro, a magistrada de primeiro grau, fundamentadamente, para assegurar a aplicação da lei penal, decretou a prisão preventiva do acusado (fls. 1414/1416).

Aportou aos autos petição subscrita por advogado, Dr. João Adão Cardoso Ajala, acompanhada de procuração, requerendo a retratação da decisão, para fins de determinar a suspensão dos efeitos do mandado de prisão expedido, marcando-se data e horário para o denunciado apresentar-se ao juízo, assim como novo dia para a sessão de julgamento. Além disso, vindicou o causídico seu cadastro como procurador do réu, mantendo-se também o Defensor Público anteriormente nomeado, pois o defensor pretendia atuar como "assistente da defesa" na sessão de julgamento (fls. 1430/1431 e 1432).

A juíza de primeira instância manteve sua decisão (fl. 1434).

O réu teve dois habeas corpus impetrados em seu favor neste Tribunal, um no serviço de plantão e outro por meio de distribuição normal, os quais objetivaram, em síntese, a revogação da prisão decretada. Todavia, ambos foram denegados (fls. 1441/1444, 1446/1449, 1491/1494 e 1495/1496).

O causídico antes mencionado, Dr. João Adão Cardoso Ajala, impetrou mandado de segurança neste Tribunal, pleiteando, em síntese, que lhe fosse permitida a carga dos autos, sendo cadastrado como procurador do ora recorrente para atuar como "assistente" da Defensoria Pública, entretanto, o pedido foi indeferido por maioria em julgamento proferido pela Terceira Câmara Criminal deste Tribunal (fls. 1457/1472 e 1547/1550).

A defesa propugnou novamente junto ao juízo a quo pela suspensão do mandado de prisão, o que foi indeferido, sendo estipulado o dia 11/09/2008 para a sessão de julgamento, bem como determinada a intimação do réu por edital (fls. 1499 e 1501/1502).

O denunciado acostou petição requerendo a revogação da nomeação da Defensoria Pública como sua patrocinadora, a fim de que o Dr. João Adão Cardoso Ajala assumisse sua defesa, almejando, mais uma vez, o recolhimento do mandado de prisão expedido. Não obstante, referido patrono vindicou que lhe fosse deferida carga dos autos (fls. 1551/1553).

O pedido de carga foi indeferido, porém, a magistrada singular permitiu a extração de cópias, desde que um funcionário do Cartório acompanhasse o advogado (fl. 1558).

Sobreveio decisão proferida pela Ministra Maria Thereza de Assis Moura, integrante do Superior Tribunal de Justiça, determinando a suspensão dos efeitos da decisão que decretou a prisão preventiva do ora apelante, desde que este se apresentasse perante a Segunda Vara do Tribunal do Júri da Comarca de Porto Alegre, no prazo de cinco dias, a fim de ser intimado da data de seu julgamento. Ao final do decisum, a Ministra estipulou a comunicação, com urgência, ao referido juízo, para que demarcasse nova data para a sessão de julgamento, a fim de que fosse devidamente cumprida sua decisão (fls. 1562/1565).

Sucede que analisando com atenção a aludida decisão, verifica-se que à época em que o writ, substitutivo de recurso ordinário em habeas corpus contra ato da Terceira Câmara Criminal deste Tribunal, foi impetrado naquela Corte, o julgamento do réu pelo Tribunal do Júri, marcado para a data de 12/07/2008, havia sido antecipado para 12/06/2008.

Logo, ao contrário do que tenta fazer crer o combativo advogado recorrente, a determinação no sentido de que fosse assinalada nova data para a sessão do julgamento, constante ao final da decisão do Superior Tribunal de Justiça, deu-se tão-somente em função de tal decisum ter sido prolatado em 29/08/2008, ou seja, ulteriormente ao período que a Ministra tinha ciência ter sido designado para o julgamento, inexistindo, assim, qualquer ordem de adiamento da sessão plenária marcada para 11/09/2008, na qual o Conselho de Sentença afastou sua competência para julgar o caso e o imputado restou condenado pela juíza singular.

Ex positis, não constato a ocorrência de qualquer nulidade na sessão de julgamento datada de 11/09/2008, aferindo como correta a atitude da juíza de primeiro grau de manter a sessão de julgamento.

Ora, não pode o Estado tornar-se refém de artimanhas defensivas, tanto que a Lei n.º 11.689/2008, buscando justamente eliminar uma das maiores causas da prescrição no procedimento dos processos de competência do Tribunal do Júri, passou a prever na nova grafia que deu ao artigo 457 do Código de Processo Penal, a possibilidade de julgamento sem a presença do acusado também para os crimes inafiançáveis, bastando, no caso de réu solto, sua devida intimação.

E antes que se suscite a inaplicabilidade de tal regra aos fatos a ela precedentes, adianto que julgo tratar-se de norma meramente processual, possuindo, dessarte, imediata aplicabilidade, nos termos do art. 2º do Código de Processo Penal.

Explico. É que os réus que estiverem respondendo a processos sob o procedimento do Tribunal do Júri, ainda não julgados pelo juízo natural da causa, não serão condenados e terão de cumprir eventual sanção prisional em face da alteração de uma norma processual.

Cumprirão pena, se for o caso, por terem sido julgados e condenados pela prática de um ilícito que cometeram, inexistindo, desse modo, qualquer alteração no Direito Penal, motivo pelo qual entendo não se cuidar de regra processual penal material.

Retornando-se ao caso concreto, como se pode extrair do relatório e da fundamentação até agora lançada, o réu logrou adiar seu julgamento pelo Tribunal Popular por duas vezes, não obtendo êxito em adiá-lo outra vez graças à rigorosa e ponderada postura adotada pela juíza presidente.

Mais, ao contrário do que foi infielmente ventilado à fl. 1756, ou seja, que a magistrada de primeiro grau teria "determinado ou solicitado" que o Dr. João Adão Cardoso Ajala se retirasse da sessão plenária e levasse consigo o acusado e as testemunhas defesa, se extrai que, na verdade, descartando-se a usual distorção que vem sendo feita pela defesa dos fatos e das decisões prolatadas ao longo deste feito, foi o próprio defensor que decidiu não participar da sessão plenária, levando consigo seu cliente, conforme exsurge das fls. 1603/1611, tendo em vista que após longa argumentação, a qual se pode considerar inclusive hostil, referido causídico optou, em função de seus argumentos insubsistentes terem sido totalmente e apropriadamente rechaçados, talvez até em uma atitude de desespero, por retirar-se da sessão, aconselhando seu cliente a fazer o mesmo.

Diante deste fato, em razão de o juízo a quo ter previsto que tal expediente poderia ser adotado, como forma de mais uma vez alargar a marcha processual, o Defensor Público Dr. Artur Costa estava preparado para assumir a égide do denunciado, o que efetivamente realizou. E por ter entendido ser dispensável o depoimento em plenário das testemunhas arroladas pelo defensor anterior é que elas se evadiram da sessão (fl. 1610).

Curioso ressaltar que tal situação já havia inclusive sido antevista pelo Desembargador Vladimir Giacomuzzi, deste Tribunal, que argumentou ao deliberar sobre o mandado de segurança impetrado pelo defensor do acusado a fim de atuar como "assistente da defesa": "Compreendo a preocupação da ilustre Juíza de Direito, receosa de que a constituição do novo defensor, com o afastamento da Defensoria Pública, possa se constituir em manobra para que o acusado se furte ao julgamento popular. Os malabarismos propostos pelo primitivo defensor constituído pelo réu no processo reforçam o temor judicial. Penso todavia que a digna Presidente do Tribunal do Júri tem como se prevenir, mantendo de sobre aviso a Defensoria Pública, na hipótese eventual de não comparecimento à sessão de julgamento do Advogado agora constituído, o que não creio que tal venha a acontecer. Esta é, também uma característica da atuação da nobre instituição estatal, a Defensoria Pública" (fl. 1550).

Pelas razões expostas, não verifico qualquer nulidade na debatida sessão de julgamento.

Quanto ao pedido de nulidade de todo o processo, restou claro, infelizmente, que o objetivo da defesa desde o início do feito foi tumultuá-lo, possivelmente no anseio de ver extinta a punibilidade do réu devido à prescrição, que inclusive teve seu reconhecimento almejado no presente apelo.

Ora, causa estranheza a alegação defensiva de que "O processo durante toda a sua extensão foi construído sobre nulidade, irregularidade que deu a ela diversos recursos aos tribunais" (sic - fl. 1756), uma vez que os incontáveis recursos interpostos pela defesa foram, em sua quase totalidade, improvidos, o que corrobora a absoluta regularidade no trâmite deste feito.

Ao mais, inexistiu a alegada falta de defesa. Com efeito, como se viu do que já foi exposto, diante da desistência de atuar em plenário do advogado constituído pelo réu, este foi brilhantemente patrocinado pela Defensoria Pública, que estava nomeada para este fim desde a data de 10/01/2008 (fl. 1325), a pedido do próprio imputado (fls. 1321/1323), não sendo tal órgão comunicado acerca da constituição de defensor particular.

Em outra mão, o descumprimento do prazo para oferecimento da denúncia não causa qualquer nulidade, visto que não é preclusivo, acarretando apenas a possibilidade de apresentação de ação penal privada subsidiária da pública, no prazo estabelecido pelo art. 38 do Código de Processo Penal. Durante este período e até que ocorra a prescrição da pretensão punitiva, poderá o órgão ministerial ofertar peça incoativa.

Ao mais, a certidão de fl. 151 aclarou o motivo do atraso no oferecimento da exordial, consubstanciado no extravio dos autos do inquérito policial.

Por último, não foi demonstrado qualquer prejuízo suportado pelo acusado em função das supostas nulidades. Ao contrário, entendo que a sentença que condenou o recorrente apenas pela prática do crime de disparo de arma de fogo lhe foi consideravelmente favorável, levando-se em conta a prova contida no feito.

Ex positis, passo ao exame de mérito do recurso defensivo.

In limine, cumpre analisar o rogo defensivo de suposta incidência da prescrição no caso em testilha, que não merece prosperar.

De fato, levando em consideração as penas concretizadas, quais sejam, um ano e seis meses de detenção e noventa dias-multa, já com trânsito em julgado para o órgão ministerial, os prazos prescricionais são de quatro anos, conforme dispõem os artigos 109, V, e 114, II, ambos do Código Penal.

Assim, em sendo o fato perpetrado na data de 27/01/2001, a denúncia recebida em 29/05/2003 (fl. 152), a decisão que pronunciou o recorrente publicada em 14/11/2005 (fl. 679), a que confirmou o decisum em 05/10/2006 (fls. 780/784) e a sentença condenatória lavrada pela juíza de primeiro grau em 11/09/2008 (fl. 1601), constato que não foi implementado o lapso temporal exigido à ocorrência da referida causa extintiva de punibilidade.

Ao vindicá-la, olvidou-se a defesa dos marcos interruptivos da prescrição presentes no caso, previstos nos incisos I, II, III e IV do art. 117 da Lei Substantiva Penal.

De outra banda, também não assiste razão à defesa ao demandar absolvição por insuficiência de provas.

É que a materialidade delitiva defluiu do auto de apreensão (fl. 16) e do laudo pericial (fls. 918/921). No que diz respeito à autoria, em que pese a negativa do acusado (fls. 156/162), se mostrou inconteste mediante o restante da prova oral, senão vejamos.

Dejair Araújo Baptista contou: "Já tinha dado uns atritos antes, isso foi num sábado de manhã, a gente chegou na oficina, meus filhos trabalhavam comigo na época, o seu João que está aí como testemunha, que era proprietário da Kombi, ele tinha encostado na frente da minha oficina, ele tinha botado o carro na frente da minha oficina, ele entrou dentro da oficina, dentro da Kombi do rapaz, empurrou aproximadamente uns 30m para trás sem autorização, foi onde houve a confusão. Meus filhos foram falar para ele, ele estava armado mesmo. Pegaram a discutiu, fui intervir, ele me empurrou. Quando me empurrou, meu guri bateu nele, por cima do ombro deu guri deu um tapa nele. Ele entrou dentro de uma pecinha assim, abriu a pochete, com a arma, eu disse que nos meus filhos tu não vai atirar, eu fui em cima dele impedir ele, ele me disparou 3 disparos, foi mais, porque 2 falhou, não acertou nenhum, consegui tirar a arma dele e levar no mesmo instante na Delegacia de Polícia (...)" (fls. 417/421).

Marcelo Bandeira Baptista, filho de Dejair, relatou: "É que foi assim: eu cheguei na oficina, e ele tinha mexido numa Kombi de um cliente nosso, tirou da frente e empurrou para trás sem a permissão de ninguém, fomos reclamar para ele e ele começou a discussão, começou tudo (...) Conforme a discussão, deu uns empurrão, ele entrou para dentro e puxou a arma e começou a atirar (...) Começou com ele e o pai, se empurraram, começaram a discutir, um empurrou o outro, aí nós nos metemos para apartar, ele estava dando os tiros (...) Desarmamos ele e entregamos para a polícia a arma (...)" (fls. 421/423).

Dejair Araújo Baptista Júnior, também filho de Dejair, narrou: "Aconteceu que ele entrou dentro da Kombi de um cliente nosso que estava fazendo um serviço e empurrou, tirou da frente da área. Falei para ele que ele não tinha o direito de entrar dentro do carro. Ele começou a discutir comigo. Empurrou meu pai. Empurrou meu pai, e eu empurrei ele. Ele quis agredir, correu para dentro do terreno, perto da frente ali, deu 3 disparos na frente do meu pai (...)" (fls. 423/426).

E Nabor Fernando da Costa Silva também confirmou que o réu efetuou disparos de arma de fogo em via pública, afirmando que estava passando pelo local do fato e assistiu a contenda (fls. 440/443).

Nesse cenário, a meu juízo, restou comprovado que o apelante operou disparos de arma de fogo em via pública.

Ora, absolutamente descabida a tese defensiva de que o imputado não detinha uma arma de fogo na ocasião do episódio, tendo em vista que ele sequer soube explicar como um artefato bélico registrado em nome de sua ex-companheira acabou sendo apreendido pela Polícia Civil (fl. 16), circunstância que demonstra a verossimilhança da narrativa oferecida por Dejair e seus dois filhos.

No mais, as alegações de que o denunciado não teria sido o causador do entrevero e de desavenças anteriores ao caso sub judice entre Dejair Araújo Baptista e o apelante, não possuem qualquer relevância, pois o que está em análise é o comportamento do recorrente de ter efetuado disparos de arma de fogo em via pública.

Outrossim, não há qualquer demonstração da teoria arquitetada pela defesa no sentido de que Dejair Araújo Baptista, João Duarte Souza e Nabor Fernando da Costa Silva sejam sócios em negócio de desmanche de veículos.

Ainda, embora irrelevante, já que sequer foram valoradas neste acórdão as narrativas oferecidas por João Duarte de Souza, convém observar que a contradição existente em seus informes foi justificada pelo próprio, que referiu perante a autoridade judicial não ter revelado o que sabia em sede inquisitorial porque pretendia "não se meter" no caso (fl. 444).

Sobremais, acerca da alegada incoerência existente entre as declarações de Nabor e das demais testemunhas referidas neste voto, verifico que não ocorreu.

Com efeito, Nabor não asseverou de forma contraditória que os tiros foram disparados da rua em direção ao terreno, como tenta fazer crer a defesa, tanto que descreveu: "O João Maria entrou, esse o moreno, dentro de casa, pegou a arma e veio. Eles discutiam na frente da casa quando ele efetuou os disparos (...) ele estava com medo porque ele estava no meio da rua, o que estava disparando, por causa do movimento de veículos. Ele apontava a arma e se cuidava dos veículos que vinham vindos, o trânsito estava fluindo naquela hora" (fl 441).

Nesse quadro, com mínimo esforço interpretativo percebe-se que, na verdade, a testemunha referiu-se à rua do mesmo modo que as demais se aludiram ao terreno da residência do acusado. Afinal, se Nabor houvesse efetivamente narrado o fato como aduziu a defesa, não teria qualquer lógica sua alegação de que o apelante se preocupava com o tráfego de veículos enquanto atirava. Ou seja, segundo Nabor, o recorrente disparava o artefato bélico de um lado da rua, no qual sua casa estava situada, em direção às demais testemunhas presenciais do evento, que estavam nas proximidades, preocupando-se com o tráfego dos veículos que passavam atrás daquelas, inexistindo, assim, dissonância nas declarações analisadas.

Sobre as demais contradições ventiladas pela defesa à fl. 562, nos itens I, II e III, são absolutamente irrelevantes, porquanto é natural que pessoas não recordem a forma exata em que ocorreu um episódio que lhes causou total desespero. Ou seja, não rememorar com literalidade se foram dois ou três disparos efetuados, se apenas Dejair Júnior e Marcelo desarmaram o acusado, ou se o pai daqueles também auxiliou no desarme em algum momento, não traz qualquer repercussão ao episódio em exame.

O fato é que todas as testemunhas mencionadas neste voto confirmaram a ocorrência dos disparos de arma de fogo em via pública, narrando de modo suficientemente coerente, a meu juízo, a motivação, a forma e a autoria dos disparos referidos.

Por outro viés, resta sem a menor comprovação a argüição recursal de que Dejair teria orientado as testemunhas sobre o que deveriam dizer em audiência.

Isso posto, avalio ter restado suficientemente demonstrado que o apelante efetuou disparos de arma de fogo em via pública, motivo pelo qual mantenho sua condenação nos termos em que proferida em primeiro grau.

Ressalto, por último, que as alegações defensivas relativas ao laudo pericial, mais uma vez, não possuem qualquer relevância. De fato, o citado laudo foi juntado aos autos e analisado no momento oportuno, a saber, a sessão plenária.

Ainda, como referido no próprio laudo, "os exames de recentidade de tiro estão suspensos definitivamente, por razões de ordem técnica". Ademais, impossível exigir-se que os experts constatassem se a arma de fogo foi utilizada no dia do fato e por quem teria sido aproveitada, por absoluta inviabilidade técnica.

Não obstante, o exame residuográfico, ao oposto do que entende a defesa, não constitui prova imprescindível à condenação, sendo apenas mais um elemento probatório quando existente.

Em outra mão, a prova carreada ao processo não sustenta a tese defensiva alternativa de ter o denunciado agido sob o abrigo de legítima defesa ou estado de necessidade, até por que o réu negou estar armado.

Enfim, o conjunto probatório trazido à tona é, a meu juízo, plenamente suficiente para manter a condenação lançada em primeira instância.

Feitas essas considerações, passo a estudar as reprimendas que foram cominadas ao apelante.

Quanto à sanção fundamental, o módico acréscimo de dois meses, obrado pela sentenciante, resta justificado pela desfavorabilidade das vetoriais do art. 59 do Código Penal referentes à conduta social e personalidade do condenado.

Com efeito, este ostenta uma condenação com trânsito em julgado posterior à data do injusto sob julgamento pelo cometimento do crime de ameaça (processo n.º 001/2.05.0019861-7), além de uma condenação pela prática do delito de uso de documento falso (feito n.º 001/2.05.0014131-3), que embora ainda não tenha transitado em julgado oficialmente, já teve apelação julgada por esta Corte, a qual lhe negou provimento, além deste Tribunal ter obstado seguimento à pretensão de interposição de recursos aos Tribunais Superiores, conforme se pode verificar das decisões de n.º 70020315255 e 70023481401.

Na segunda fase da individualização do castigo, este foi adequadamente ampliado em quatro meses devido à agravante da reincidência (processo n.º 001/2.05.0405877-1), sendo definitivado em um ano e seis meses de detenção, diante da ausência de outras causas modificadoras.

Com relação à sanção pecuniária, determinada em noventa dias, à razão unitária de um salário mínimo, comporta redução. É que o número de dias-multa se mostrou longínquo do mínimo legal, causa pela qual o diminuo para quinze dias-multa, a fim de que guarde certa proporção com a punição corporal estabelecida. Ainda, conquanto tenha constituído inúmeros causídicos durante o trâmite deste processo, o réu juntou aos autos extrato semestral de benefício concedido pela previdência social em função de aposentadoria por invalidez, no valor líquido médio aproximado de quatrocentos e quarenta reais (fl. 1727), assim como comprovante de rendimentos pagos e de retenção de imposto de renda na fonte (fls. 1728/1729). Desse modo, amortizo a razão de cada dia-multa para 05/30 do salário mínimo vigente à época do fato.

Em contraposição ao que pleiteou a defesa, é inviável a exclusão da pena de multa porque, incluída no preceito secundário do tipo, nada mais é do que decorrência legal da condenação, descabendo ao magistrado excluí-la.

Saliento, ainda, que sua aplicação não implica, de per si, infringência ao princípio da intranscendência, segundo o qual a pena imposta ao acusado não passará da sua pessoa.

De fato, a sanção pecuniária recai, de forma direta, tão-somente sobre o patrimônio do réu. Por conseguinte, o fato de haver reflexos nas condições econômicas de seus familiares, por ser um efeito indireto, não viola o art. 5º, inc. XLV, da Constituição Federal.

Nesse sentido:

"PORTE ILEGAL DE ARMA. ART. 14 DA LEI 10.826/03 (...) PEDIDO DE AFASTAMENTO DA PENA PECUNIÁRIA. INCABIMENTO. Cuida-se de cominação legal, não se trata de possibilidade de sua aplicação, mas da imposição prevista no tipo penal. A multa é imputada cumulativamente com a pena privativa de liberdade àquele que comete o delito. DISPENSA DO PAGAMENTO DA MULTA E DAS CUSTAS A análise a respeito da possibilidade de pagamento de multa ou custas processuais é do Juízo de Execução Criminal. APELO DEFENSIVO IMPROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Crime Nº 70018103168, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em 17/10/2007).

APELAÇÃO CRIME. ROUBO MAJORADO PELO CONCURSO DE PESSOAS. A prova dos autos é farta e segura para fundamentar juízo condenatório. Manutenção da sentença condenatória de primeira instância. Inviável o afastamento da pena de multa, pois expressamente prevista no tipo penal que o réu restou condenado cumulativamente com a pena privativa de liberdade. Ademais, a precária situação financeira do apelante foi valorada no momento da fixação do quantum de cada dia-multa. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO DA DEFESA. (Apelação Crime Nº 70021256086, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marcel Esquivel Hoppe, Julgado em 03/10/2007).

APELAÇÃO-CRIME. ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO (...) IMPOSSÍVEL O AFASTAMENTO DA PENA DE MULTA, UMA VEZ QUE CUMULATIVA COM A PENA RESTRITIVA DE LIBERDADE. EVENTUAL IMPOSSIBILIDADE DE PAGAMENTO HÁ DE SER ARGÜIDA NO JUÍZO DA EXECUÇÃO. Preliminares rejeitadas. Apelo improvido. (Apelação Crime Nº 70017970997, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em 27/06/2007)".

Apropriado o regime semi-aberto para o cumprimento da repreensão carcerária, porquanto entende este órgão fracionário que a reincidência conduz ao regime imediatamente mais gravoso ao que seria usualmente fixado, in casu, o aberto.

Incabível a substituição por restrições de direitos ou a suspensão condicional da pena prisional aplicada, porque não preenchidos os requisitos dos artigos 44 e 77 da Lei Substantiva Penal.

Ressalto, por fim, que o fato delituoso ocorreu em janeiro de 2001 e somente agora a condenação está sendo mantida por este tribunal, o que torna real as notícias da imprensa no sentido da demora na prestação jurisdicional, demora que, muitas vezes, não resta esclarecida pela referida imprensa mas no processo sua realidade é demonstrada.

Ante o exposto, afasto as preliminares e dou parcial provimento ao apelo, apenas para reduzir a pena de multa cominada ao apelante para quinze dias-multa à razão de 5/30 do salário mínimo vigente à data do episódio, sendo mantida, no demais, a sentença recorrida.

Des. Manuel José Martinez Lucas (REVISOR) - De acordo.

Des. Marcel Esquivel Hoppe - De acordo.

DES. MARCO ANTÔNIO RIBEIRO DE OLIVEIRA - Presidente - Apelação Crime nº 70027430917, Comarca de Porto Alegre: "À UNANIMIDADE, AFASTARAM AS PRELIMINARES E DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO, APENAS PARA REDUZIR A PENA DE MULTA COMINADA AO APELANTE PARA QUINZE DIAS-MULTA À RAZÃO DE 5/30 DO SALÁRIO MÍNIMO VIGENTE À DATA DO EPISÓDIO, SENDO MANTIDA, NO DEMAIS, A SENTENÇA RECORRIDA."

Julgador(a) de 1º Grau: DRA MARTA BORGES ORTIZ

GHP/agm.




JURID - Tentativa de homicídio simples. Julgamento pelo Júri. [24/07/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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