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sexta-feira, 3 de julho de 2009

JURID - Responsabilidade civil. Relação de consumo. [03/07/09] - Jurisprudência


Responsabilidade civil. Tratamentos odontológicos realizados em clínica indicada pela ré. Relação de consumo.


Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro - TJRJ.

NONA CÂMARA CÍVEL

APELAÇÃO CÍVEL nº 2009.001.24897

RELATOR: DESEMBARGADOR CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA

RESPONSABILIDADE CIVIL. TRATAMENTOS ODONTOLÓGICOS REALIZADOS EM CLÍNICA INDICADA PELA RÉ. RELAÇÃO DE CONSUMO. APLICAÇÃO DAS NORMAS PROTETIVAS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. AUSÊNCIA DAS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE. LAUDOS PERICIAIS QUE ATESTAM A FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANOS DE ORDEM MATERIAL E MORAL CARACTERIZADOS E CONFIGURADOS. VALOR A SER APURADO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA A TÍTULO DE RETRATAMENTO QUE DEVE, POR ÓBVIO, ENCONTRAR-SE NA MÉDIA DO QUE, ORDINARIAMENTE, COSTUMA SER COBRADO, NÃO SE FAZENDO NECESSÁRIA A CONVERSÃO DO FEITO EM DILIGÊNCIA. TRANSTORNOS DE ORDEM PSÍQUICA QUE OFENDEM À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E ULTRAPASSAM OS LIMITES DO RAZOÁVEL. ARBITRAMENTO EM CONSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS NORTEADORES DA MATÉRIA. SENTENÇA QUE JULGA PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS. DESPROVIMENTO DO RECURSO. Relação de consumo a ensejar a responsabilização objetiva da ré, na forma das normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor. Ausência das excludentes de responsabilidade. Diferenciação entre obrigação de meio e de resultado. Atividade odontológica que é vista como obrigação de resultado. A atuação do profissional da odontologia enseja uma expectativa na parte de precisão do serviço prestado. Na presente demanda o autor se submeteu a tratamentos odontológicos realizados por profissionais de clínica indicada pela ré. Laudos periciais categóricos no sentido da ocorrência de falha técnica nos procedimentos adotados. Dever de reparar os danos materiais que se afigura inconteste. Pretensão de conversão do feito em diligência que não merece amparo. Valor a ser apurado em sede de liquidação de sentença pelo necessário retratamento dentário a ser realizado que, por óbvio, deve se encontrar na média do que, ordinariamente, costuma ser cobrado por tais serviços, não se fazendo necessária a apresentação prévia de orçamentos. Dano moral configurado em razão do abalo psíquico provocado no demandante em razão do ocorrido, que ultrapassa os limites do razoável e ofende a sua dignidade. Arbitramento em consonância com os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e o da vedação ao enriquecimento sem causa. DESPROVIMENTO DO RECURSO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 2009.001.24897, em que é apelante ASSOCIAÇÃO EDUCACIONAL VEIGA DE ALMEIDA e apelado CICERO BARBOZA DE MACENA,

ACORDAM os Desembargadores da 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso, negando provimento ao mesmo, nos termos do voto do Relator.

Rio de Janeiro, 09 de junho de 2009.

Desembargador CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA
Relator

VOTO DO RELATOR

Trata-se de ação indenizatória. Alega o autor que, ao ser submetido a tratamentos dentários em clínica indicada e vinculada a ré, ficara com seqüelas que ainda perduram e o incomodam, pelo que pugna por reparação por danos material e moral. A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para condenar a ré ao pagamento de reparação por dano material em valor a ser apurado em liquidação de sentença e dano moral no importe de R$ 12.000,00 (doze mil reais), o que desafiou a interposição do presente recurso.

O recurso de apelação interposto pela parte ré não merece provimento. Embora as razões recursais apenas impugnem as questões da não fixação da condenação por dano material e da excessividade dos danos morais, faz-se necessária a análise de todos os demais aspectos ensejadores da responsabilização da ré.

Inicialmente, convém destacar que a hipótese em comento, induvidosamente, versa sobre relação de consumo, o que permite a aplicação das normas insertas no Código de Defesa do Consumidor que são de ordem pública e de interesse social.

Trata-se, pois, de responsabilidade objetiva, na forma preceituada pelo artigo 14 da suso referida Codificação, bastando para o autor a prova do fato, do dano e do nexo de causalidade para que reste configurado o dever do fornecedor de serviços de responder por eventuais prejuízos causados aos consumidores, independentemente de culpa, salvo, se comprovadas as excludentes de responsabilidade do fato exclusivo de terceiro ou da vítima, caso fortuito ou força maior.

Importante destacar, por oportuno, que a melhor doutrina e jurisprudência concebem importante classificação das obrigações, dividindo-as em obrigações de meio ou de resultado. Enquanto nesta última o devedor assume obrigação de atingir o resultado, sem o qual haverá o inadimplemento, na primeira o devedor apenas assume obrigação de empregar os esforços no sentido de atingir o resultado, sem que, contudo, esteja vinculado a obtê-lo.

No caso da atividade odontológica, a obrigação, inequivocamente, se afigura como de resultado, na medida em que enseja uma expectativa na parte de precisão do serviço prestado, não podendo, pois, ser entendida tal obrigação como de meio, em que o profissional assume a obrigação de empregar sua melhor perícia para buscar o resultado, que, por vezes, pode não vir a ser atingido.

Na presente demanda o autor submeteu-se a tratamentos odontológicos em clínica indicada e vinculada a parte ré/recorrente, dos quais decorreram diversos transtornos, sem que, contudo, tenham os resultados por ele desejados sido atingidos.

O laudo pericial adunado aos autos às fls. 272/281, mais precisamente a fls. 274, quanto aos elementos 47 e 13, in verbis, é categórico no sentido da ocorrência de falha técnica nos procedimentos adotados pela clínica odontológica, no tocante à fratura do segundo (13) e do tratamento endodôntico do primeiro (47).

Vejamos:

Tratamento endodôntico do elemento 47.

"O tratamento endodôntico atual é feito vedando-se os canais com guta-percha (material semelhante a borracha) e cimento específico para esse fim, após limpeza e alargamento dos canais. Ocorre que o material obturador deve ficar restrito a área interna do dente, sem extravasar para a região óssea. Um ocasional extravasamento de cimento é reabsorvido pelo organismo, após um curto período de tempo. No entanto o extravasamento de cone de guta-percha, como o ocorrido conforme pode ser verificado pela radiografia anexa (anexo 2), só pode ser removido com um tratamento de canal ou, em alguns casos, como cirurgia para-endodôntica." (grifos nossos)

Elemento 13.

"Em relação ao dente 13 (canino superior direito) que fraturou a raiz, segundo a ré devido ao bruxismo, deve ser considerado que o autor já possuía anteriormente ao tratamento com a ré, uma coroa com núcleo (pino) metálico curto dentro do canal. Assim, não se pode afirmar com certeza que a fratura foi devido a um suposto bruxismo do autor.

Conclui-se assim, que a fratura foi devido a trauma sofrido, ou pela altura da coroa que pode interferir na articulação, com ou sem bruxismo, ou trauma sofrido durante a manipulação profissional. (grifos nossos) O bruxismo isoladamente não é causa da fratura, uma vez que o dente vinha resistindo bem ao suposto bruxismo antes do tratamento com a ré."

Outra não é a conclusão extraída da perícia elaborada no Processo Ético Odontológico (PEO) nº 100/2005, instaurado para a apuração da denúncia formulada pelo autor junto ao Conselho Regional de Odontologia.

A propósito, as respostas aos quesitos de nº 9 e 11 enviados pela ré:

"9 - Esclareça o perito se o tratamento de canal do elemento do canal 47 está de acordo com as técnicas atuais de endodontia?

R: O elemento 47 apresenta extravasamento de material obturador, o que pode causar o desconforto relatado pelo denunciante.

11 - Esclareça o perito se as alegações do paciente condizem com o histórico clínico e radiológico e se imputaram algum dano ao paciente?

R: Sim, principalmente devido à perda do elemento 13 e o tratamento endodôntico do elemento 47."

Assim, não é outra a causa de todos os transtornos suportados pelo demandante que não os equivocados procedimentos odontológicos adotados pela clínica de odontologia. Tendo restado afastada pelas perícias a existência de qualquer causa excludente da responsabilidade da ré, outra solução não se afigura adequada que não a imposição a mesma do dever de arcar com todos os prejuízos suportados pelo demandante.

Analisados os aspectos concernentes a responsabilização da ré, passemos ao enfrentamento dos argumentos expendidos nas razões recursais.

Quanto a argumentação relativa a necessidade de conversão do feito em diligência para que sejam juntados aos autos, no mínimo, 3 (três) orçamentos relativos aos serviços a serem prestados, não merece a mesma acolhida. Com efeito, o valor a ser apurado em liquidação de sentença pelo necessário retratamento a ser realizado, por óbvio, não pode fugir a media do que, ordinariamente, é cobrado para a realização de tais serviços, razão pela qual infundada a pretensão de conversão em diligência do feito para a vinda aos autos de 3 (três) orçamentos.

No que tange ao argumento recursal relativo aos danos morais e a excessividade do valor arbitrado sob esta rubrica, melhor sorte não assiste a recorrente.

Com efeito, o dano moral na hipótese em comento afigura-se manifesto, caracterizado como in re ipsa, decorrente do próprio fato em si. Os transtornos de ordem psíquica suportados pelo demandante ultrapassam os limites do razoável e ofendem a sua dignidade como pessoa.

Sabe-se que no arbitramento da verba compensatória por danos imateriais deve o magistrado estar atento aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, não podendo fixar quantia reduzida de modo a não servir de desestímulo ao lesante e nem excessiva de forma a importar em enriquecimento sem causa da vítima.

Na hipótese dos autos, todas as premissas acima delineadas foram objeto de observação pela Magistrada sentenciante quando do arbitramento do importe de R$ 12.000,00 (doze mil reais), a titulo de danos morais, razão pela qual não merece ser reduzido o referido valor.

Dessa forma, nenhum reparo há que ser providenciado no julgado a quo não merecendo acolhimento as razões recursais.

À conta de tais fundamentos, voto no sentido de conhecer do recurso, negando-lhe provimento, para o fim de manter íntegra a r.sentença guerreada.

Rio de Janeiro, 09 de junho de 2009.

Desembargador CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA
Relator

Publicado em 18/06/09




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