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segunda-feira, 20 de julho de 2009

JURID - Ação ordinária. Servidores Públicos do Poder Executivo. [20/07/09] - Jurisprudência


Ação ordinária. Servidores Públicos do Poder Executivo. Conversão monetária dos vencimentos em URV.

Tribunal de Justiça da Bahia - TJBA.

TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

APELAÇÃO CÍVEL Nº 30.341-2/2009, DE SALVADOR.

APELANTE: RUTH SANTOS PEREIRA DE ARAÚJO E OUTROS.

APELADO: ESTADO DA BAHIA

RELATOR: JUIZ JOSEVANDO SOUZA ANDRADE SUBSTITUINDO O DES. CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. SERVIDORES PÚBLICOS DO PODER EXECUTIVO. CONVERSÃO MONETÁRIA DOS VENCIMENTOS EM URV. PRINCÍPIO DA IRREDUTIBILIDADE DE SUBSÍDIOS E VENCIMENTOS. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO GENÉRICA DO ÍNDICE DE 11,98%. APELO PROVIDO PARCIALMENTE. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.

Sabendo-se que a conversão monetária utilizando-se a média calculada sobre os valores resultantes da divisão do valor nominal da remuneração percebida pela cotação da URV do último dia dos meses de referência ocasionou, para os servidores, perdas salariais, decorrentes da desvalorização diária da moeda no referido interstício (perdas estas que não teriam ocorrido na hipótese de utilização da cotação da URV na data do efetivo recebimento da remuneração), então se deve reconhecer - em medida de resguardo ao princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos - o direito de tais servidores à reparação das perdas sofridas.

O percentual de 11,98% não pode ser aplicado aleatoriamente aos servidores do Poder Executivo, tendo em vista que, quanto a estes, não há sequer a presunção de que os mesmos, à época, percebiam os seus salários entre o dia 20 e 22 do mês, já que o Poder Executivo não se encontra dentre o rol de Poderes cujo repasse da dotação orçamentária está agendado para o dia 20 do mês pelo artigo 168 da CF.

Apelo parcialmente provido, para afastar a aplicação genérica do percentual de 11,98%, e, reformar a sentença, a fim de que, em liquidação, seja apurada a perda eventualmente sofrida por cada um dos Apelados, considerando-se correta a regra da conversão segundo a URV da data do efetivo pagamento, observando-se, ademais, o quando explicitado no tocante à correção monetária, prescrição, e limite temporal da apuração do resíduo (consistente na edição de lei que altere o padrão remuneratório da categoria a qual esteja vinculada o servidor).

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 30.341-2/2009, de Salvador, sendo apelante, Ruth Santos Pereira de Araújo e outros e apelado, o Estado da Bahia.

Acordam os Desembargadores, componentes da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, por maioria em dar provimento parcial a presente apelação cível, pelas seguintes razões:

Trata-se de recurso de apelação interposto por Ruth Santos Pereira de Araújo e outros, inconformados com a sentença que julgou improcedente a ação por eles ajuizada.

Irresignados com a sentença prolatada às fls. 90/97, os Autores aduziram que a sentença fere as disposições da MP 434, convertida na Lei 8.880/94 e que o aumento conferido pela Lei 6.570/94 não supre a lesão ocasionada pela conversão equivocada do vencimento de fevereiro/94 em URV; que a matéria já foi debatida nos tribunais, estando já assentado no STF que os servidores do Estado da Bahia sofreram lesão; que o STJ, do mesmo modo, já reconheceu o direito à diferença de reajuste decorrente da conversão de seus vencimentos em URV.

Ao examinar-se o mérito do recurso, verifica-se que algumas ponderações serão necessárias.

Quando da concretização do Plano Real, a Medida Provisória n.º 434, de 27 de fevereiro de 1994, estabeleceu as diretrizes do programa de estabilização econômica, ocasião em que foi criada a URV - Unidade Real de Valor e fixados os diferentes modos de conversão monetária.

Dessa forma, a referida Medida Provisória, no art. 18, determinou que os salários dos trabalhadores em geral fossem calculados em URV, a partir da divisão dos valores nominais percebidos em cada um dos quatro meses anteriores a março de 1994 pela cotação da URV em cruzeiros reais da data em que se deu o efetivo pagamento em cada um dos meses antes referenciados.

Em seu art. 21, todavia, a Medida Provisória fixou regra específica para os servidores públicos, determinando que os vencimentos destes passassem a ser expressos em URV, a partir de 1º de março de 1994, através da divisão dos valores percebidos entre novembro de 1993 a fevereiro de 1994 pela cotação da URV em cruzeiros reais do último dia destes mencionados meses, independente da data do pagamento.

Assim dispunha o art. 21 da MP 434/1994:

Art.21 - Os valores das tabelas de vencimentos, soldos e salários e das tabelas de funções de confiança e gratificadas dos servidores civis e militares serão convertidos em URV em 1º de março de 1994:

I - dividindo-se o valor nominal, vigente em cada um dos quatro meses imediatamente anteriores à conversão, pelo valor em cruzeiros reais do equivalente em URV do último dia do mês de competência, de acordo com o Anexo I desta medida provisória;

II - extraindo-se a média aritmética dos valores resultantes do inciso anterior.

Quando da edição desta MP, diversos Tribunais passaram, então, no âmbito administrativo, a proferir resoluções atribuindo ao art. 21 supra interpretação segundo a qual tal dispositivo não englobaria os magistrados e membros do Poder Judiciário, tendo em vista que a expressão "dos servidores civis e militares" referia-se apenas aos membros do Poder Executivo.

O Ministro Néri da Silveira, na sessão de julgamento da ADIN 1797-0 PE, assim se pronunciou sobre a questão:

"O que levou precisamente, o Tribunal, em Sessão Administrativa, a entender que os membros do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e do ministério público, a que se refere a regra do artigo 168 da Constituição, não estavam previstos, expressamente, na Medida Provisória n.º 434/94. Ademais, a expressão servidores públicos civis e militares é típica dos servidores do Poder Executivo.

Essa foi a consideração que o Tribunal teve presente, ao determinar que se adotasse como data de referência, para a conversão, o dia 20 e não o último dia do mês de competência."

A MP 434/1994, todavia, foi reeditada sob o n.º 457/1994, tendo, na ocasião, alterado a redação do art. 21, para, afastando a interpretação anterior, fazer a respectiva norma incidir sobre os membros do Poder Judiciário, do Poder Legislativo e do Ministério Público da União. Veja-se a redação dada ao art. 21 pela MP 457/1994:

Art.21. Os valores das tabelas de vencimentos, soldos e salários e das tabelas de funções de confiança e gratificadas dos servidores civis e militares e membros dos Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e do Ministério Público da União são convertidos em URV em 1º de março de 1994:

I - dividindo-se o valor nominal, vigente nos meses de novembro e dezembro de 1993 e janeiro e fevereiro de 1994, pelo valor em cruzeiros reais do equivalente em URV do último dia desses meses, respectivamente, independentemente da data do pagamento, de acordo com o Anexo I desta medida provisória; e

II - extraindo-se a média aritmética dos valores resultantes do inciso anterior.

A nova redação dada ao art. 21 passou a conduzir, na época, o entendimento de que todos os servidores públicos, indistintamente, estavam submetidos à regra de que a conversão monetária da remuneração deveria considerar o valor da URV equivalente ao último dia dos meses de novembro e dezembro de 1993 e janeiro e fevereiro de 1994, independentemente da data de pagamento.

Todavia, após a reedição sob o número 482, a MP foi convertida na Lei n.º 8880/1994, a qual não albergou a alteração promovida pela MP 457, mantendo o tratamento dado à matéria pela MP 434 (de 27 de fevereiro de 1994), que se referia apenas a "servidores civis e militares".

Com isso, os Tribunais pátrios restauraram o entendimento de que o art. 21 da MP 434, convertido no art. 22 da Lei 8880/1990, ao falar em "servidores civis e militares" referia-se apenas aos membros do Poder Executivo, de modo que os servidores do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e do Ministério Público da União estariam enquadrados do art. 19 da Lei 8880/1994, o qual trata dos trabalhadores em geral e estabelece que:

Art. 19 - Os salários dos trabalhadores em geral são convertidos em URV no dia 1º de março de 1994, observado o seguinte:

I - dividindo-se o valor nominal, vigente nos meses de novembro e dezembro de 1993 e janeiro e fevereiro de 1994, pelo valor em cruzeiros reais do equivalente em URV na data do efetivo pagamento, de acordo com o Anexo I desta Lei; e

II - extraindo-se a média aritmética dos valores resultantes do inciso anterior.

Registra-se que tal entendimento também foi adotado pelo STF, o qual, inclusive, teve oportunidade de explicitá-lo no julgamento da já citada Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 1797-0, quando decidiu pela constitucionalidade da resolução proferida pelo TRT da 6ª Região, que estendeu aos seus membros a diferença remuneratória de 11,98%, resultante da perda salarial ocorrida por força da conversão monetária efetuada com base na URV do último dia dos meses especificados (novembro e dezembro de 1993 e janeiro e fevereiro de 1994) e não na data do efetivo pagamento.

O Ministro Ilmar Galvão, relator da ADIN 1797-0 PE, em seu voto, que restou vencedor, afirmou que:

"Do texto posto em definitivo pela lei, afora outras alterações de menor monta, resultou excluída a referência aos membros dos Poderes legislativo, Judiciário e do Ministério Público, sendo fora de dúvida que a modificação ensejou a mesma interpretação que fora dada ao art. 21 da Medida Provisória 434 (...)"

O Poder Público, contudo, ao promover a conversão dos salários dos servidores, não o fez conforme a interpretação dada pelo STF, eis que a remuneração dos servidores do Judiciário, Legislativo e Ministério Público não foi convertida pelo equivalente em URV na data do seu efetivo pagamento, mas sim pelo equivalente no último dia do mês.

Assim, por força das decisões administrativas proferidas pelos Tribunais, a questão foi bastante discutida no que tange à percepção de diferenças salariais pelos servidores do Poder Judiciário, o que deu ensejo à pacificação da jurisprudência no sentido de atribuir aos servidores do Poder Judiciário Federal o direito à reposição da perda sofrida, no importe de 11,98%. Neste ponto, esclarece-se mais o seguinte:

O art. 168 estabelece o dia vinte de cada mês como limite para o repasse dos recursos correspondentes às dotações orçamentárias para os Poderes Legislativo e Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública. Assim, embora este dispositivo não fixe expressamente a data em que a remuneração dos servidores destes poderes deva ser efetuada, é de conhecimento público que o crédito mensal dos vencimentos é realizado logo após a disponibilidade dos recursos, de modo que os servidores públicos, de tais Poderes, na esfera federal, comumente recebem seus salários entre os dias 20 e 22 de cada mês.

Acerca do tema, manifestou-se o prof. Dércio Munhoz em parecer constante da ADIN - 1.244/SP, citada pela MM. Juíza Federal Telma Maria Santos, da 3ª Vara de Sergipe (Proc. JF/SE nº 98.000.0496-3) - nos seguintes termos:

A fixação do momento da conversão dos valores em cruzeiros reais para URV na data do efetivo pagamento atenderia, portanto, à condição necessária para manutenção, na nova moeda, do poder de compra dos salários percebidos nos quatro meses anteriores. Se, nos cálculos, se levassem em conta datas diferentes daquelas do efetivo pagamento, as conseqüências serias as seguintes:

a. se fosse considerada uma data anterior à do efetivo recebimento dos salários (usar, por exemplo, o valor da URV do dia 1º quando o salário do mês anterior era sistematicamente pago no dia 5), os cálculos do salário levariam a um valor superior ao salário médio, também em URV, anteriormente recebido (beneficiando o grupo com aumento nominal, em URV, para os meses futuros ou, o que tem o mesmo sentido, um aumento do poder de compra, comparativamente aos meses que antecederam a introdução da nova moeda);

b. se, diferentemente, fosse considerada (para os cálculos) uma data posterior à do efetivo pagamento (usar, por exemplo, o valor da URV no dia 30 para um salário efetivamente recebido no dia 25 do mês), o novo valor do salário médio em URV, a vigorar nos meses futuros, seria inferior ao salário médio, também em URV, anteriormente recebido (prejudicando o grupo, em face da redução do salário nominal, em URV, a ser pago nos meses futuros, pois o poder de compra dos salários a vigorar a partir de 1º de março seria inferior ao poder de compra médio dos salários percebidos nos quatro meses anteriores).

Dessa forma, a jurisprudência acatou os cálculos que demonstraram que, considerando-se a data de pagamento correspondente ao dia 20 do mês, a perda remuneratória ocorrida em virtude da conversão realizada com base no último dia do mês alcançou o patamar de 11,98%, passando este índice a ser aplicado nas decisões prolatadas na esfera federal. Vale repetir: o índice de 11,98% foi alcançado considerando-se as situações em que a data de pagamento teria ocorrido no dia 20 do mês.

Em seguida, tal índice (11,98%) passou a ser também aplicado, pela jurisprudência, na esfera estadual aos servidores do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e do Ministério Público. O aresto a seguir transcrito, corrobora esta assertiva:

AÇÃO DE COBRANÇA - AUTOR QUE DEMONSTROU SER SERVIDOR DO PODER JUDICIÁRIO - CARÊNCIA - PRELIMINAR REPELIDA - AFASTA-SE A PRELIMINAR DE CARÊNCIA DA AÇÃO, SE O AUTOR DEMONSTROU SER SERVIDOR DO PODER JUDICIÁRIO ESTADUAL E A PRETENSÃO DEDUZIDA É REFERENTE AO PERÍODO EM QUE JÁ HAVIA INGRESSADO NO SERVIÇO PÚBLICO - AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA - DIFERENÇA SALARIAL - PRESCRIÇÃO - INOCORRÊNCIA - SE A ADMINISTRAÇÃO RECONHECEU O DIREITO DOS SERVIDORES QUANTO À OBTENÇÃO DA DIFERENÇA SALARIAL, O QUE IMPLICOU INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL, NÃO É DE SER ACOLHIDA A ALEGAÇÃO DE QUE TERIA OPERADO A PRESCRIÇÃO - AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA - SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL - PODER JUDICIÁRIO - VENCIMENTOS - CONVERSÃO DO CRUZEIRO REAL PARA URV - DEVIDA A DIFERENÇA DE 11,98% - CORREÇÃO MONETÁRIA - IGPM - JUROS DE MORA 1% AO MÊS A PARTIR DA CITAÇÃO - DESCONTO DE IMPOSTO DE RENDA - A utilização da URV da data do último dia de cada mês e não a do dia do efetivo pagamento, para a conversão dos vencimentos, acarretou uma supressão na remuneração no percentual de 11,98%, violando o princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos, sendo devida ao servidor do poder judiciário a incorporação da diferença relativa à conversão de cruzeiro real em URV. Deve ser adotado o IGPM como indexador monetário, por ser o que melhor reflete a variação inflacionária mensal. Os juros de mora são devidos a partir da citação do devedor, no percentual de 1% ao mês, não merecendo amparo a insurgência contra a determinação de desconto de valor correspondente ao imposto de renda, dado o caráter remuneratório da verba pleiteada. (TJMS - AC 2003.012487-0/0000-00 - Nova Andradina - 4ª T.Cív. - Rel. Des. Elpídio Helvécio Chaves Martins - J. 16.12.2003)

No Estado da Bahia, a Lei 10.400/2006, em seu artigo 6º, reconheceu e regulamentou o pagamento das diferenças salariais aos servidores estaduais do Poder Judiciário, acatando, inclusive, o índice de 11,98%.

Pois bem. Prestadas as informações acima (com o objetivo apenas de melhor posicionar o caso concreto na conformação histórica da matéria, o que auxilia no desenvolvimento do raciocínio), cumpre, neste momento, passar à análise do pleiteado direito dos servidores do Poder Executivo à reposição salarial e diferenças resultantes de eventuais perdas oriundas da conversão monetária realizada em 1994.

Se levada em consideração tão somente a interpretação dada ao texto normativo consolidado na Lei 8880/1994 - de que o art. 22, ao falar em "servidores públicos civis e militares" refere-se aos servidores do Poder Executivo - então, a conclusão seria no sentido de que a conversão monetária considerando a URV do último dia do mês foi realizada com acerto, eis que apenas deu efetivo cumprimento a ordem normativa consignada no referido art. 22 da Lei 8880/1994, pelo que não haveria qualquer ilegalidade a ser sanada.

Contudo, a prevalência de tal entendimento implicaria na chancela da violação ao princípio da irredutibilidade dos vencimentos dos servidores públicos, previsto no art. 37, inciso XV, que assim dispõe: "o subsídio e os vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos são irredutíveis, ressalvado o disposto nos incisos XI e XIV deste artigo e nos artigos 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I."

O princípio da irredutibilidade de subsídios e vencimentos está consagrado no comando supra referido e tem por escopo a garantia da independência do servidor público no exercício do múnus público, não podendo, por conseguinte, ser desrespeitado, ainda que por força de lei infraconstitucional.

Acerca do tema, assim se manifestou Alexandre de Moraes (Constituição do Brasil Interpretada. São Paulo, Editora Atlas, 2002. p.867):

"O alcance dessa garantia constitucional de irredutibilidade de vencimentos foi definido pelo STF, que estabeleceu tratar-se de cláusula que 'veda a redução do que se tem'; não podendo, portanto, o quantum remuneratório sofrer redução. Ressaltamos, inclusive, que, mesmo que não haja direito adquirido do servidor público aos critérios legais de fixação do valor de sua remuneração, eventual alteração ou redução das parcelas que a compõem, não poderão desrespeitar o princípio da irredutibilidade, sendo proibida a diminuição do valor da remuneração em sua totalidade".

Sendo assim, sabendo-se que a conversão monetária utilizando-se a média calculada sobre os valores resultantes da divisão do valor nominal da remuneração percebida pela cotação da URV do último dia dos meses de referência ocasionou, para os servidores, perdas salariais, decorrentes da desvalorização diária da moeda no referido interstício (perdas estas que não teriam ocorrido na hipótese de utilização da cotação da URV na data do efetivo recebimento da remuneração), então se deve reconhecer - em medida de resguardo ao princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos - o direito de tais servidores à reparação das perdas sofridas.

Dessa forma, em nível de fundamentação, reconhece-se que a conversão monetária, no tocante aos servidores públicos, ainda que do Poder Executivo, deveria ter sido realizada considerando-se o valor da URV na data do efetivo pagamento (ocorrido nos meses de referência) e não na data do último dia de cada mês.

Destarte, aos servidores são devidas diferenças eventualmente havidas e a incorporação de percentual a ser apurado, na hipótese de restarem realmente demonstrada a ocorrência de perdas salariais.

Neste particular, ressalta-se, de logo, que o percentual de 11,98% não pode ser aplicado aleatoriamente aos servidores do Poder Executivo, tendo em vista que, quanto a estes, não há sequer a presunção de que os mesmos, à época, percebiam os seus salários entre o dia 20 e 22 do mês, já que o Poder Executivo não se encontra dentre o rol de Poderes cujo repasse da dotação orçamentária está agendado para o dia 20 do mês pelo artigo 168 da CF.

Nesse sentido, os arestos a seguir transcritos:

"MANDADO DE SEGURANÇA. PLANO REAL. LEI 8880/94. CONVERSÃO. URV.SERVIDORES DO EXECUTIVO. PREJUÍZO. INEXISTÊNCIA. SEGURANÇA DENEGADA. A jurisprudência já firmou o entendimento de que a correção de 11,98% (onze vírgula noventa e oito por cento), decorrente da aplicação da Lei 8880/94, não é devida aos servidores do Poder Executivo. Segurança denegada. MS 9468 / DF; MANDADO DE SEGURANÇA. 2003/0235439-1. Ministro PAULO MEDINA. DJ 14.06.2004 p. 156".

"PENSIONISTA DE MILITAR - 11,98% - LEI 8880/94 - INEXISTÊNCIA DO DIREITO À INCORPORAÇÃO - CONSTITUIÇÃO FEDERAL ART. 168 - I. Existe a impossibilidade de extensão aos servidores civis e militares do poder executivo federal da diferença do índice de 11,98%, visto que não estão os mesmos resguardados pelo art. 168 da Constituição Federal. II. O citado artigo estabelece o dia 20 (vinte) ao reger a liberação de recursos orçamentários referentes ao poder legislativo, ao poder judiciário e ao ministério público. III. Os militares não foram desrespeitados em seus direitos pelos dispositivos das medidas provisórias nº 434/94 e 457/94 e da Lei nº 8.880/94, que efetivaram a conversão de suas pensões e vantagens em URV em 1º de março de 1994. IV. Recurso improvido. (TRF 2ª R. - AC 2003.51.01.028955-0 - 7ª T.Esp. - Rel. Juiz Fed. Conv. Theophilo Antônio Miguel Filho - DJU 09.08.2006 - p. 116)".

"ADMINISTRATIVO - PROCESSUAL CIVIL - SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL - PODER EXECUTIVO - ÍNDICE DE 11,98% - CONVERSÃO DE VENCIMENTOS - URV - APLICAÇÃO DA LEI 8.880/94 - RECURSO ESPECIAL EM MANDADO DE SEGURANÇA - AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA - ACÓRDÃO REFORMADO - SEGURANÇA DENEGADA - RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO - 1. Consoante a pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é devida a diferença de 11,98%, relativa à conversão de cruzeiros reais em URVs, apenas aos servidores dos poderes legislativo e judiciário e do ministério público, os quais, por força do art. 168 da CF, percebiam efetivamente seus salários no dia 20 de cada mês. 2(...). 4. Recurso Especial conhecido e provido. (STJ - RESP 200600453376 - (825128) - AM - 5ª T. - Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima - DJU 19.06.2006 - p. 207)".

Dessa forma, cabe a verificação, em cada caso concreto, da ocorrência ou não de perda salarial, o que depende, para realização do cálculo correspondente, das datas em queefetivamente, nos meses de referência, ocorreram os respectivos pagamentos, o que deverá ser apurado em fase posterior de liquidação de sentença.

A jurisprudência pátria ratifica o quanto exposto:

"AÇÃO ORDINÁRIA. SERVIDORES PÚBLICOS DO PODER EXECUTIVO. CONVERSÃO. URV. PREJUÍZO NECESSIDADE DE PROVA. REPARAÇÃO DAS PERDAS. CONSTATADAS EM PERÍCIA. JUROS DE 0,5% AO MÊS. Os servidores do Poder Executivo, salvo comprovação de perda, não possuem direito ao recebimento do resíduo em decorrência da conversão dos valores de seus vencimentos em URV (...). (TJMG - 3ª CC, Rel. Des. Kildare Carvalho, Processo n.º 10024.03.162773-0/001, publ. Em 23.06.2003)".

Conclui-se, portanto, que os servidores do Poder Executivo têm efetivo direito ao recebimento das diferenças e incorporações necessárias à recomposição salarial pleiteada na proporção das perdas individualmente sofridas quando da conversão da moeda nacional para URV, o que, por conseguinte, afasta a aplicação irrestrita do percentual de 11,98%.

Ante todo o exposto, dá-se provimento parcial ao apelo para reformando-se a sentença, determinar que a perda sofrida por cada servidor seja verificada e apurada mediante liquidação de sentença, considerando-se, para tanto, correta a regra da conversão segundo a URV da data do efetivo pagamento. Ademais, quando da realização dos cálculos, deve-se observar as limitações a seguir expostas:

a) o percentual relativo à perda remuneratória ocorrida, após apurada em liquidação de sentença, deve respeitar o patamar máximo de 11,98%,

b) a correção monetária deve incidir a partir da data em que cada prestação devida deveria ter sido paga, adotando-se os índices legais;

c) deve-se observar a prescrição qüinqüenal que atinge as prestações vencidas em data anterior ao qüinqüênio que antecedeu o ajuizamento da ação, nos termos da sentença.

d) por fim, nos termos em que restou decidido pelo STF, na ADIN 1797-0 PE, especifica-se, nesta oportunidade, os limites temporais da apuração da diferença, no sentido de que é a mesma devida até a data em que tenha sido ou que seja editado comando normativo que altere o padrão remuneratório da categoria a qual esteja o servidor vinculado.

Salvador,

Presidente

Relator

Procurador de Justiça

mc/




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