Jurisprudência Tributária
Ação declaratória. Imunidade constitucional. ICMS. Preliminar de ilegitimidade ativa.
Tribunal de Justiça de Mato Grosso - TJMT.
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL
APELAÇÃO Nº 24374/2009 - CLASSE CNJ - 198 - COMARCA CAPITAL
APELANTE: AMEC - ASSOCIAÇÃO MATO-GROSSENSE DE ENSINO E CULTURA
APELADO: ESTADO DE MATO GROSSO
Número do Protocolo: 24374/2009
Data de Julgamento: 06-7-2009
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA - IMUNIDADE CONSTITUCIONAL - ICMS - PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA - REJEITADA - IMUNIDADE INVOCADA PELA CONSUMIDORA FINAL - IMPOSSIBILIDADE - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO IMPROVIDO.
De acordo com a jurisprudência emanada do Superior Tribunal de Justiça, sendo o ICMS tributo que comporta transferência do respectivo encargo financeiro, gera para o contribuinte de fato legitimidade para ir a juízo defender sua pretensa imunidade.
A imunidade das entidades de assistência social sem fins lucrativos não exclui o imposto sobre a circulação de mercadorias (ICMS), relativo aos bens que adquirem.
APELANTE: AMEC - ASSOCIAÇÃO MATO-GROSSENSE DE ENSINO E CULTURA
APELADO: ESTADO DE MATO GROSSO
R E L A T Ó R I O
EXMO. SR. DR. ANTONIO HORÁCIO DA SILVA NETO
Egrégia Câmara:
Trata-se de apelação cível interposta por AMEC - Associação Matogrossense de Ensino e Cultura, contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Especializada da Fazenda Pública, que nos autos da Ação Declaratória n. 530/2006, julgou-a improcedente, sob o fundamento de que a imunidade constitucional outorgada às entidades de assistência social, sem fins lucrativos, não afasta a incidência do ICMS.
Afirma que a sentença deve ser totalmente reformada, uma vez que a recorrente é uma entidade sem fins lucrativos e de assistência social, e por conseqüência, é imune aos impostos, por força do artigo 150, inciso VI, alínea 'c', da Constituição Federal, sendo certo que tal imunidade engloba também o ICMS.
Assevera que de acordo com os documentos carreados aos autos, verifica-se que a recorrente preenche todos os requisitos ensejadores à concessão da imunidade pleiteada com a ação declaratória.
Ressalta que no tocante a fixação dos honorários advocatícios estes devem ser reduzidos, vez que estão em desacordo com o que preconiza o artigo 20, § 4º do Código de Processo Civil.
Ao final pede pelo provimento do recurso (fls.409/439).
Em resposta, a apelada alega preliminarmente a ilegitimidade ativa da postulante.
No mérito, aduz que a norma constitucional que concede imunidade tributária as entidades de assistência social sem fins lucrativos (art. 150, VI, 'c'), não se subsume o ICMS, vez que este imposto incide sobre as operações relativas à circulação de mercadoria, não se aplicando assim, a referida regra imunizante.
Ao término pugna pelo improvimento do recurso (fls.449/461).
A Procuradoria-Geral de Justiça deixou de se manifestar nos presentes autos por entender que inexiste no caso posto razão que justifique a intervenção ministerial (fls.471/474).
É o relatório.
V O T O (PRELIMINAR - ILEGITIMIDADE ATIVA)
EXMO. SR. DR. ANTONIO HORÁCIO DA SILVA NETO (RELATOR)
Egrégia Câmara:
Ao analisar os autos, verifico que a preliminar suscitada pelo apelado não merece acolhida, pois se depreende do caso em tela que a recorrente, possui legitimidade para postular a imunidade tributária, vez que é consumidora final (energia, telefonia, entre outros), e como tal, suporta o ônus de pagar o ICMS quando da utilização dos serviços mencionados.
É sabido que o ICMS está entre os impostos considerados indiretos, ou seja, em que a pessoa tributada pelo Poder Público, no caso as concessionárias de energia elétrica e telefonia, transfere o encargo tributário a um terceiro, que, efetivamente o suporta, ou seja, o contribuinte de fato.
No caso dos autos, quem suporta o valor do imposto embutido, expressa e destacadamente, na conta de energia elétrica e de telefonia é a recorrente, vez que é consumidora final do produto. E esta realidade econômica não é ignorada pelo Direito, tanto que o artigo. 166, do CTN, permite a restituição do tributo a quem prove o haver assumido. Ou, como ensina Aliomar Baleeiro:
"O contribuinte de fato não é estranho à relação jurídica fiscal, e isso o diz o art. 166 do Código Tributário nacional. A realidade econômica, em princípio, e salvo exceções óbvias, pode ser oposta à forma jurídica. Aí não há ficções jurídicas necessárias, do ponto de vista técnico, à aplicação e cobrança do tributo" (In Limitações Constitucionais ao poder de tributar. 7 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 287).
Nesta esteira de raciocínio, o Superior Tribunal de Justiça decidiu casos semelhantes, verbis:
"a) TRIBUTÁRIO - ICMS - TRANSFERÊNCIA - ENCARGO - LEGITIMIDADE - CONTRIBUINTE DE FATO. O ICMS, sendo tributo que comporta transferência do respectivo encargo financeiro, gera para o contribuinte de fato legitimidade para ir a juízo defender sua IMUNIDADE. Recurso provido. (REsp 197345/SP, Rel. Min. Garcia Vieira, data do julg.: 18.03.1999, DJ de 10.05.1999).
b) Processual Civil. ICMS sobre consumo de energia elétrica. legitimidade do consumidor para promover ação postulando exonerar-se do tributo. Preliminar rejeitada.
Embora não seja contribuinte de direito, o consumidor de energia o é, indiretamente, eis que é ele que sofre o ônus tributário (ICMS) embutido no consumo, tendo legítimo interesse de promover ação visando eximir-se da ação. (...)" (REsp 48.135-0/SP, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJ de 19.09.1994,
Assim sendo, não há que se falar em ilegitimidade da recorrente.
Posto isso, rejeito a preliminar suscitada.
É como voto.
V O T O
EXMO. SR. DR. ANTONIO HORÁCIO DA SILVA NETO (RELATOR)
Egrégia Câmara:
O recurso é próprio e tempestivo, por isso dele conheço.
Como já relatado, trata-se de apelação cível interposta por AMEC - Associação Mato-grossense de Ensino e Cultura, contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Especializada da Fazenda Pública, que nos autos da Ação Declaratória n. 530/2006, julgou-a improcedente, sob o fundamento de que a imunidade constitucional outorgada às entidades de assistência social, sem fins lucrativos, não afasta a incidência do ICMS.
Depreende-se dos autos que o cerne da demanda cinge-se ao fato de que a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 150, inciso VI, alínea 'c', estabelece que é defeso ao Poder Público instituir tributo sobre o patrimônio, renda ou serviços, das instituições de assistência social e educacional, sem fins lucrativos. Logo, na seção das limitações constitucionais ao poder de tributar, a Carta Magna confere uma imunidade tributária com a finalidade de estimular e resguardar a iniciativa assistencial e educacional no País.
Dessa maneira, a norma constitucional mencionada, prevê que aos entes tributantes é defeso instituir impostos sobre, dentre outras hipóteses, o patrimônio, renda ou serviços das instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos, como é o caso da recorrente.
Amparada nesse fundamento, a apelante interpôs a ação declaratória 530/2006, bem como a presente apelação cível, com o intuito de obter, via determinação judicial, a exclusão dos valores apurados a título de ICMS das contas de energia elétrica e telefones, tendo em vista a mencionada imunidade constitucional.
Pois bem, quando a recorrente paga o valor de sua conta de energia elétrica, telefone, entre outras, ela está pagando o valor efetivo do serviço utilizado, e não o ICMS atrelado a mencionada fatura, estabelecendo-se assim, uma relação jurídica diversa da indicada pela apelante, ou seja, de natureza estritamente contratual e não tributária.
Destarte, seguindo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, firma-se o entendimento de que o ICMS incidente sobre energia elétrica, assim como serviços de telefonia, não oneram o patrimônio, renda ou serviços da instituição consumidora. Muito embora as decisões tratem de casos em que o município invoca a imunidade recíproca contra a cobrança do referido imposto sobre energia elétrica, os mesmos fundamentos de rejeição são aplicados ao caso dos autos. Por oportuno, cita-se:
"EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA PARA ILUMINAÇÃO PÚBLICA. ICMS. IMUNIDADE INVOCADA PELO MUNICÍPIO. IMPOSSIBILIDADE. 2. A jurisprudência do Supremo firmou-se no sentido de que a imunidade de que trata o artigo 150, VI, a, da CB/88, somente se aplica a imposto incidente sobre serviço, patrimônio ou renda do próprio Município. 3. Esta Corte firmou entendimento no sentido de que o município não é contribuinte de direito do ICMS, descabendo confundi-lo com a figura do contribuinte de fato e a imunidade recíproca não beneficia o contribuinte de fato. Agravo regimental a que se nega provimento." (STF, 2. Turma, AI-AgR 671412/SP, rel. Ministro Eros Grau, julgado em 01/04/2008, DJU 24/4/2008).
Assim sendo, entendo que a mencionada imunidade não exclui, no caso dos entes sem fins lucrativos, a incidência do imposto sobre a circulação de mercadorias (ICMS) relativa às contas de energia elétrica, bem como aos bens que essas instituições vierem a adquirir, e isto por uma única razão, as tais entidades não são contribuintes do mencionado tributo, mas tão somente consumidoras, haja vista que entende-se por contribuinte o industrial, o comerciante ou o produtor que promove a saída da mercadoria conforme preconiza o Código Tributário Nacional em seu art. 121, parágrafo único, inciso I, senão vejamos:
"Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.
Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:
I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;"
Nessa esteira de raciocínio, o egrégio Tribunal do Rio Grande do Sul tem se manifestado, verbis:
"EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. ICMS. AÇÃO DECLARATÓRIA. ENTIDADE SEM FINS LUCRATIVOS. IMUNIDADE SOMENTE SOBRE PRODUTOS ADQUIRIDOS NO MERCADO EXTERNO. A imunidade das entidades de assistência social sem fins lucrativos não exclui o imposto sobre a circulação de mercadorias (ICMS) relativo aos bens que adquirem e isto por uma única razão: não são contribuintes do tributo, são consumidoras; contribuinte é o industrial, o comerciante ou o produtor que promove a saída da mercadoria (CTN - art. 121, parágrafo único, inciso I). Procedida por sociedade sem fins lucrativos, de caráter educacional, a importação não se destina à mercancia, mas às atividades de ensino. Não se constitui, por evidente, operação de natureza mercantil ou assemelhada. Os conceitos de renda, patrimônio e serviços devem ser tomados em acepção ampla, levando em conta saber se a instituição de educação, como adquirente de bens importados, há de suportar a carga financeira do tributo, ou se possível a transferência do peso tributário. Se impossível compensar, mesmo atento ao mecanismo da não cumulatividade, que não se opera no caso pelo fato de a apelada não praticar atos de mercancia, de circulação de mercadorias, impunha-se, como se impõe o reconhecimento da imunidade. De outra forma estar-se-ia onerando seu patrimônio, renda ou serviço com a carga de ICMS incidente sobre os bens importados, o que expressamente vedado pelo dispositivo constitucional por último citado - art. 150, VI, c). E a razão de ser da imunidade está em viabilizar a própria atividade, ante a fragilidade e o descaso do Estado na prestação dos serviços de educação e assistência. Apelo do Estado desprovido. Unânime. Apelo da autora desprovido, por maioria. (Apelação Cível Nº 70020095295, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Genaro José Baroni Borges, Julgado em 19/09/2007). (Grifo Nosso)
No que concerne a condenação em honorários advocatícios no Valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), entendo que também laborou em acerto o magistrado a quo, haja vista que a fixação do quantum se encontra em consonância ao que preceitua o artigo 20, § 4.º, do Código de Processo Civil.
Portanto, o pleito da recorrente não encontra respaldo na legislação de regência, ou seja, a imunidade concedida pela Carta Magna às entidades de assistência social, sem fins lucrativos não engloba o referido tributo (ICMS), motivo pelo qual não verifico motivos que dêem ensejo a modificação da decisão aqui combatida.
Posto isso, nego provimento ao recurso.
É como voto.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. EVANDRO STÁBILE, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DR. ANTONIO HORÁCIO DA SILVA NETO (Relator), DES. EVANDRO STÁBILE (Revisor) e DES. JURACY PERSIANI (Vogal convocado), proferiu a seguinte decisão: À UNANIMIDADE, IMPROVERAM O RECURSO.
Cuiabá, 06 de julho de 2009.
DESEMBARGADOR EVANDRO STÁBILE - PRESIDENTE DA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL EM SUBSTITUIÇÃO LEGAL
DOUTOR ANTONIO HORÁCIO DA SILVA NETO - RELATOR
Publicado em 14.07.2009
JURID - Ação declaratória. Imunidade constitucional. ICMS. [17/07/09] - Jurisprudência
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