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terça-feira, 18 de agosto de 2009

JURID - Dano moral. Consumidor. Defeito do produto. [18/08/09] - Jurisprudência


Apelação cível. Ação de indenização. Dano moral. Consumidor. Defeito do produto.
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Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul - TJRS.

Apelação Cível Nº 70025629684

Décima Câmara Cível

Comarca de Porto Alegre

APELANTE/RECORRIDO ADESIVO: BALLDARASSI INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS FARMACEUTICOS LTDA

APELANTE/RECORRIDO ADESIVO: DIMED S/A DISTRIBUIDORA DE MEDICAMENTOS

RECORRENTE ADESIVO/APELADO:JAIR MACIEL LOVAY

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. CONSUMIDOR. DEFEITO DO PRODUTO.

COMERCIANTE. ILEGITIMIDADE PASSIVA. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. Consoante exegese dos artigos 12 e 13 do CDC, a responsabilidade do comerciante, por danos oriundos de acidente de consumo, é subsidiária. Entendimento doutrinário e jurisprudencial. Caso em que, plenamente identificado o fabricante do produto, contra quem fora igualmente dirigida a demanda, inexiste adminículo probatório a sinalizar má conservação do bem, o que afasta a legitimidade da ré Dimed S.A. para figurar no pólo passivo desta ação. Juízo terminativo prolatado, de ofício quanto a esta.

NULIDADE DA SENTENÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. Tendo o magistrado singular concluído que os documentos e elementos constantes dos autos bastavam à formação do seu convencimento, não há óbice ao julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 330, I do CPC. Despacho do magistrado singular no sentido de saber as provas pretendidas pelas partes, do qual o réu não se manifestou. Matéria alcançada pela preclusão. Inspeção feita pela magistrada singular que encontra guarida no artigo 440 do CPC.

INSETO ENCONTRADO NO INTERIOR DE MEDICAMENTO. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. Da interpretação do art. 12 do CDC e de acordo com a melhor doutrina acerca do tema, a responsabilidade do fabricante é objetiva, decorrendo do simples fato de ter colocado no mercado de consumo produto que não oferece a segurança que dele se espera, pondo em risco a saúde do consumidor. Hipótese em que foi encontrado um inseto no interior do medicamento produzido pela ré. Quebra da confiança que os consumidores, em geral, depositam na qualidade do produto. Hipótese de dano in re ipsa.

QUANTUM INDENIZATÓRIO. REDUÇÃO. Na fixação do valor indenizatório deve o magistrado, por seu prudente arbítrio, levar em consideração as condições econômicas e sociais do ofendido e do agressor; a gravidade potencial da falta cometida; as circunstâncias do fato; o comportamento do ofendido e do ofensor; sem esquecer o caráter punitivo da verba e que a reparação não pode servir de causa a enriquecimento injustificado. A análise de tais critérios, aliada às demais particularidades do caso concreto, conduz à redução do montante indenizatório para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigidos monetariamente conforme determinado no ato sentencial.

JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. Os juros moratórios, em se tratando de responsabilidade civil extracontratual, são devidos a contar da data do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do STJ. Sentença mantida no ponto.

DANO MATERIAL. COMPROVAÇÃO. Condenação da ré ao pagamento do prejuízo material suportado pelo autor, comprovado por meio da nota fiscal do medicamento comprado, que se mantém. Sucumbência redimensionada.

ILEGITIMIDADE PASSIVA DA RÉ DIMED S.A. RECONHECIDA, DE OFÍCIO. APELO DESTA PREJUDICADO.

APELAÇÃO DA RÉ BALLDARASSI PARCIALMENTE PROVIDO,

RECURSO ADESIVO PREJUDICADO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em, de ofício, EXTINGUIR O FEITO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, ex vi do art. 267, VI do CPC, EM RELAÇÃO À RÉ DIMED S.A., E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA RÉ BALLDARASSI, RESTANDO PREJUDICADO O EXAME DO APELO DA DIMED S.A. E DO RECURSO ADESIVO DO AUTOR.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. PAULO ANTÔNIO KRETZMANN (PRESIDENTE) E DES. TÚLIO DE OLIVEIRA MARTINS.

Porto Alegre, 30 de julho de 2009.

DES. PAULO ROBERTO LESSA FRANZ,
Relator.

RELATÓRIO

Des. Paulo Roberto Lessa Franz (RELATOR)

Adoto o relatório das fls. 62/63, aditando-o como segue.

Proferindo sentença, o magistrado singular julgou a demanda procedente, condenando as rés a restituir o valor de R$ 18,22 ao autor, corrigido monetariamente pelo IGP-M, desde a compra do produto. Ainda, condenou as requeridas ao pagamento de 10.000,00, atualizado monetariamente pelo IGP-M, desde a sentença, e acrescidos de juros legais de 1% ao mês, contados da data da compra. No capítulo acessório do decisum, condenou as demandadas ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 15% sobre o valor total da condenação.

A demandada DIMED S/A opôs embargos declaratórios (fls. 66/69), os quais foram desacolhidos (fl. 76).

Inconformadas, as demandadas apelaram.

A requerente Balldarassi Ltda., em suas razões (fls. 70/74), postula, preliminarmente, a desconstituição da sentença, pois a magistrada, ao apreciar o frasco de remédio comprado pela autora, produziu prova em favor desta, não oportunizando a produção da prova pericial, restando caracterizado o cerceamento de defesa. Em relação ao mérito, alegou que o dano moral mencionado pela autora na inicial não restou comprovado. Asseverou não ter cometido nenhum ilícito, sustentando a possibilidade de o medicamento ser falsificado, não havendo, pois, dever de indenizar os danos morais e materiais alegados na exordial. Pugnou, alternativamente, pela redução dos honorários advocatícios para 10% e do quantum indenizatório fixado na sentença, bem como pela incidência dos juros moratórios desde a citação. Por fim, postulou o provimento do apelo.

A ré DIMED S/A, por seu turno, postulou a reforma da decisão, argumentando que a autora deveria ter comprovado que a embalagem em que se encontrava o inseto estava realmente lacrada. Aduziu que se o inseto encontrava-se dentro do medicamento antes da compra, o autor não comprovou o abalo moral daí decorrente. Asseverou que deve ser afastada a condenação por danos materiais, visto que o produto deveria ser substituído e não ser restituído o valor do mesmo. Ao final, pugnou pelo provimento da apelação.

O autor recorreu adesivamente às fls. 92/95, postulando, tão-somente, a majoração do quantum indenizatório fixado na sentença a título de danos morais, o qual se mostrou irrisório em relação ao caso dos autos.

Com as contra-razões das partes, subiram os autos a esta Corte, vindo conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTOS

Des. Paulo Roberto Lessa Franz (RELATOR)

Eminentes Colegas!

Trata-se de apelações interpostas por DIMED S/A DISTRIBUIDORA DE MEDICAMENTOS e BALLDARASSI INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS FARMACEUTICOS LTDA e recurso adesivo interposto por JAIR MACIEL LOVAY, em face da sentença de procedência prolatada nos autos da ação ordinária de reparação de dano material c/c indenização por dano moral que a última move contra as primeiras.

COMERCIANTE. ILEGITIMIDADE PASSIVA. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO.

Pirma facie, cumpre extinguir o processo, de oficio, em relação à ré DIMED S.A., em razão de ser parte ilegítima para figurar no pólo passivo da demanda, restando prejudicado o exame do apelo interposto por esta.

Com efeito, consoante ressai da exegese dos artigos 12 e 13 do Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade do comerciante, por danos oriundos de acidente de consumo, é subsidiária, remanescendo tão-somente quando:

"Art. 13.

(...)

I - o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;

II - o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador;

III - não conservar adequadamente os produtos perecíveis.

A propósito do tema, cumpre trazer à colação excerto de percuciente lição doutrinária:

"RESPONSÁVEIS - Quando alude ao fornecedor, o Código pretende alcançar todos os partícipes do ciclo produtivo-distributivo, vale dizer, todos aqueles que desenvolvem as atividades descritas no art. 3º do CDC.

Em matéria de responsabilidade por danos, no entanto, o art. 12 discrimina alguns fornecedores, reponsabilizando somente o fabriacante, o produtor, o contrutor, bem como o importador, excluindo, portanto, em primeira intenção, a figura do comerciante.

(...)

RESPONSABILIDADE DO COMERCIANTE - A responsabilidade do comerciante, nos acidentes de consumo, é meramente subsidiária, pois os obrigados principais são aqueles elncados no art. 12.

(In: GRINOVER, Ada Pellegrini et al.. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 180 e 192).

No mesmo norte, os seguintes precedentes desta Corte:

"APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE CONSUMO. FATO DO PRODUTO. INADEQUAÇÃO. INSEGURANÇA. FEZES E TEIAS DE LARVAS ENCONTRADAS EM CAIXA DE BOMBONS. FORNECEDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. COMERCIANTE. ILEGITIMIDADE PASSIVA. DANO MORAL. QUANTIFICAÇÃO. HONORÁRIOS. (...) Já a ré Zaffari, a teor do art. 13 do CDC, tem responsabilidade subsidiária em acidentes de consumo e, in casu, inocorrendo qualquer das hipóteses elencadas nos incisos I, II e III do art. 13, é, de fato, parte ilegítima para figurar no pólo passivo da demanda. 4. A identificação inequívoca do fabricante - Nestlé, no caso - afasta a aplicação dos incisos I e II do art. 13, e a inexistência de prova acerca da má conservação do produto desautoriza a incidência do inciso III. (...) PROVIDOS EM PARTE AMBOS OS APELOS. UNÂNIME". (Apelação Cível Nº 70015322399, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 05/07/2006)

"APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE CONSUMO. FATO DO PRODUTO. INADEQUAÇÃO. INSEGURANÇA. PRODUTO COM SEGUNDA ETIQUETA ALTERANDO A DATA DE FABRICAÇÃO, DE VALIDADE E O NÚMERO DO LOTE DO HERBICIDA UTILIZADO EM LAVOURA, NÃO APRESENTANDO O RESULTADO ESPERADO QUANDO DE SUA APLICAÇÃO, ALÉM DE PREJUÍZOS AO AUTOR. COMERCIANTE. ILEGITIMIDADE PASSIVA. (...) 2. O comerciante possui responsabilidade subsidiária em acidentes de consumo sempre que presente uma das hipóteses previstas no art. 13, do CDC. Existindo identificação clara do fabricante e não restando demonstrada a má conservação do produto, ilegítimo, pois, o comerciante para compor o pólo passivo da lide. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME". (Apelação Cível Nº 70016871717, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 28/12/2006)

Ao concreto, à evidência, não há falar em dificuldade de identificação do fabricante do remédio, tendo, inclusive, sido contra ele direcionada a demanda. De outro lado, inexiste, nos autos, adminículo probatório a sinalizar que o defeito no produto derivou de sua má conservação pelo comerciante.

Nesse contexto, o reconhecimento, ex oficio, da ilegitimidade ad causam de DIMED S.A é medida que se impõe.

Passo, então, a análise do apelo do ré Balldarassi Indústria e Comércio de Produtos Farmacêuticos Ltda.

CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA.

Inicialmente, cumpre rechaçar a preliminar de cerceamento de defesa veiculada nas razões recursais.

É cediço que cabe ao juiz, destinatário da prova colhida no curso da instrução, deliberar sobre a necessidade ou não da produção de determinada prova, para formação de seu convencimento. Neste sentido, o seguinte precedente deste Órgão Fracionário:

"RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. CADASTRAMENTO NEGATIVO. MANUTENÇÃO APÓS PAGAMENTO DA DÍVIDA. PROVA ORAL. DISPENSA. PODERES DO JUIZ. O julgador de primeiro grau é o real destinatário das provas a serem produzidas pelas partes, cabendo-lhe, portanto, em um primeiro momento, a prerrogativa de deferi-las ou indeferi-las, consoante a relevância que revelarem para a formação de seu livre convencimento. Certo também que tal faculdade não é absoluta e vem regulada em lei, pois há casos em que a dispensa pode cercear o direito de defesa do litigante, o que aqui, porém, não se verifica, ante a inexistência do ilícito, visto que a negativação foi decorrente da inadimplência da demandante [...] APELAÇÃO IMPROVIDA. PRELIMINAR AFASTADA". (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70009822222, DÉCIMA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: LUIZ ARY VESSINI DE LIMA, JULGADO EM 11/11/2004).

Logo, entendendo o magistrado, a quem a prova é dirigida, que os documentos e elementos constantes dos autos bastam à formação do seu convencimento, evitando onerar as partes e retardar a prestação jurisdicional, não há óbice ao encerramento da instrução, não ensejando a não-realização de prova pericial, qualquer ofensa à ampla defesa.

Outrossim, insta destacar que as partes foram intimadas para apresentaram as provas que pretendiam produzir, sendo que a apelante não se manifestou, tratando-se, pois, de matéria preclusa.

Gize-se, ainda, que o fato de a magistrada singular ter apreciado o frasco de remédio a olho nu não se mostra suficiente a acoimar o decisum de nulidade, visto que tal medida é autorizada pelo artigo 440 do CPC, que assim prescreve:

Art. 440. O juiz, de ofício ou a requerimento da parte, pode, em qualquer fase do processo, inspecionar pessoas ou coisas, a fim de se esclarecer sobre fato, que interesse à decisão da causa.

Destarte, rejeito a prefacial.

DANO MORAL.

Com relação ao mérito, não enseja reparos o decisum, porquanto os elementos probatórios constantes dos autos vão ao encontro dos fatos narrados pela autora na inicial. Senão vejamos.

Consoante restou assente na inspeção realizada pela magistrada singular, o frasco de remédio apresentado pela autora, parcialmente consumido, "havia cerca de metade de liquido esverdeado. Imerso no líquido é possível ver com clareza a presença de um pequeno inseto.". A julgadora unipessoal acrescenta, ainda, que "não há qualquer sinal de violação do lacre, sendo que o spray ainda é protegido por uma tampa de plástico".

Deste modo, não sobejam dúvidas quanto à veracidade dos fatos expostos pela autora na inicial, donde ressalta a responsabilidade objetiva da demandada para o evento, conforme previsão expressa do art. 12 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:

"Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

§ 1º O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - sua apresentação;

II - o uso e os riscos que razoavelmente se esperam;

III - a época em que foi colocado em circulação.

§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado.

§ 3º O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

I - que não colocou o produto no mercado;

II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro".

A propósito do tema, preleciona Sergio Cavalieri Filho, (in Programa de Responsabilidade Civil, 5ª edição, 2ª tiragem, p. 475):

"Pela teoria do risco do empreendimento, todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem como os critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços. O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos".

E aqui, insta anotar que desimporta o fato de a consumidora ter ou não comprovado os danos sofridos em razão da ingestão do liquido, pois segundo a norma consumeirista em comento e de acordo com a melhor doutrina acerca do tema, a responsabilidade do fabricante decorre do simples fato de ter colocado no mercado de consumo produto que não oferece a segurança que dele se espera, pondo em risco a saúde do consumidor, exatamente como ocorreu in casu.

Aliás, como bem apanhado pelo e. Des. Luiz Ary Vessini de Lima, no julgamento da Apelação Cível n.º 70002240265, em 04.10.2001:

"os consumidores em geral não dispõem de conhecimento técnico e científico para avaliar a qualidade dos produtos que utilizam. Tampouco possuem informações a respeito da forma como são fabricados, se são seguidas normas basilares de higiene nas etapas desse processo.

Por isso, a confiança nos fornecedores é um aspecto fundamental para a tranqüilidade de todos os cidadãos. Da sua quebra, decorre uma sensação de medo e impotência, já que, na vida moderna, tornou-se praticamente impossível não fazer uso de bens manufaturados".

Portanto, diante das alegações trazidas na peça portal e da inspeção judicial, competia à apelada demonstrar: que não colocou o produto no mercado de consumo, a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, nos termos do que preceitua o art. 12, § 3º, do CDC, ônus do qual não se desincumbiu.

Aliás, seria plenamente viável à demandada demonstrar, por meio de prova pericial, a infalibilidade do processo de industrialização de seus medicamentos, o que não se preocupou em fazer, devendo, portanto, responder pelos danos causados à consumidora lesada.

Ademais, intimada acerca das provas que pretendia produzir, a requerida não se manifestou nos autos, não se preocupando comprovar existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, ônus que lhe competia, nos termos do art. 333, II do CPC.

Ainda, não merece prosperar o argumento de que o produto possa ser falsificado, porquanto tal tese não foi levantada na fase instrutória e sequer vem acompanhado de qualquer elemento probatório.

No que pertine a indigitada inexistência de comprovação do abalo moral sofrido pela autora, melhor sorte não socorre o apelante.

Isto porque o caso dos autos se reveste da hipótese de danum in re ipsa, o qual se presume, conforme as mais elementares regras da experiência comum, prescindindo de prova quanto à ocorrência de prejuízo concreto.

No ensinamento de Sérgio Cavalieri Filho tem-se, igualmente, a compreensão da desnecessidade de prova, quando se trata de dano moral puro (in Programa de Responsabilidade Civil, 5ª ed., 2ª tiragem, 2004, p. 100):

"...por se tratar de algo imaterial ou ideal a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material. Seria uma demasia, algo até impossível exigir que a vitima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia; não teria ela como demonstrar o descrédito, o repúdio ou o desprestígio através dos meios probatórios tradicionais, o que acabaria por ensejar o retorno à fase da irreparabilidade do dano moral em razão de fatores instrumentais.

Nesse ponto a razão se coloca ao lado daqueles que entendem que o dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ilícito em si. (...) Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti que decorre das regras de experiência comum".

No mesmo diapasão, a jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

"RESPONSABILIDADE CIVIL. MULTA DE TRÂNSITO INDEVIDAMENTE COBRADA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL.DANO PRESUMIDO. VALOR REPARATÓRIO. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO 1. Como se trata de algo imaterial ou ideal, a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material. Por outras palavras, o dano moral está ínsito na ilicitude do ato praticado, decorre da gravidade do ilícito em si, sendo desnecessária sua efetiva demonstração, ou seja, como já sublinhado: o dano moral existe in re ipsa. Afirma Ruggiero: "Para o dano ser indenizável, 'basta a perturbação feita pelo ato ilícito nas relações psíquicas, na tranqüilidade, nos sentimentos, nos afetos de uma pessoa, para produzir uma diminuição no gozo do respectivo direito." (...) 3. Os simples aborrecimentos triviais aos quais o cidadão encontra-se sujeito devem ser considerados como os que não ultrapassem o limite do razoável, tais como: a longa espera em filas para atendimento, a falta de estacionamentos públicos suficientes, engarrafamentos etc. (...)" (REsp 608918/RS, 1ª Turma, Min. José Delgado, DJ: 20.05.2004)

E o entendimento sufragado por esta Corte:

"RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS, BEBIDA SERVIDA EM RESTAURANTE. CORPOS ESTRANHOS ENCONTRADOS NO INTERIOR DA GARRAFA. PROVA PERICIAL E TESTEMUNHAL. FALTA DE PROVA DOS DANOS MATERIAIS. 1. A interpretação conjunta da prova pericial, que examinou o conteúdo do líquido servido ao cliente, bem como de outras garrafas idênticas, concluindo tratar-se de produto impróprio para o consumo, e da prova testemunhal, confirmando a existência de corpos estranhos no líquido na data dos fatos, antes do prazo de vencimento da bebida, autoriza a procedência do pedido indenizatório. 2. Responde o fabricante pelos prejuízos extrapatrimoniais causados ao proprietário do restaurante, pelo fato de ter causado constrangimento em razão da reação indignada do cliente. 3. O dano moral puro prescinde de produção probatória, pois considerado in re ipsa. (...)" Apelação Cível Nº 70007166044, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José Giacomolli, julgado em 04/08/2004).

"RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. FATO DO PRODUTO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. VALOR DA INDENIZAÇÃO. REDUÇÃO. Cumpre ao fornecedor abrigar seus produtos em embalagens seguras e informar adequadamente o consumidor acerca dos riscos e da forma adequada de utilização dos bens. A inobservância deste dever, resultando em dano, enseja o dever de indenizar. Ausência de demonstração das causas eximentes previstas no CDC (art. 12, § 3º). Configuração de danos morais puros, que independem de comprovação. Diminuição do quantum indenizatório, considerando-se a pouca gravidade do dano. Apelo parcialmente provido, rejeitadas as preliminares." (Apelação Cível Nº 70003173408, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ary Vessini de Lima, julgado em 24/04/2003).

EMBARGOS INFRINGENTES. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSETO ENCONTRADO NA BOLACHA. DEFEITO NO PRODUTO. RELAÇÃO DE CONSUMO. DANOS MORAIS RECONHECIDOS. DISCUSSÃO A RESPEITO DO VALOR ARBITRADO. MAJORAÇÃO. CONFIRMADA. 1. O dano moral puro prescinde de produção probatória, pois considerado in re ipsa. 2. A indenização por danos morais deve ser arbitrada de acordo com a análise de uma série de variáveis, a fim de que se reúnam elementos do caso concreto, suficientes ao arbitramento. 3. A verba indenizatória fixada na decisão do voto condutor da maioria, mostrou-se adequada às peculiaridades do caso concreto. RECURSO DESPROVIDO, POR MAIORIA. (EMBARGOS INFRINGENTES Nº 70007317084, QUINTO GRUPO DE CÂMARAS CÍVEIS, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: NEREU JOSÉ GIACOMOLLI, JULGADO EM 21/11/2003).

Destarte, a condenação da demandada ao pagamento da indenização vindicada pela autora era medida que se impunha no presente, devendo, pois, ser mantida a sentença, no ponto.

QUANTUM INDENIZATÓRIO.

É sabido que, na quantificação da indenização por dano moral, deve o julgador, valendo-se de seu bom senso prático e adstrito ao caso concreto, arbitrar, pautado nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, um valor justo ao ressarcimento do dano extrapatrimonial.

Neste propósito, impõe-se que o magistrado atente às condições do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado, assim como à intensidade e duração do sofrimento, e à reprovação da conduta do agressor, não se olvidando, contudo, que o ressarcimento da lesão ao patrimônio moral deve ser suficiente para recompor os prejuízos suportados, sem importar em enriquecimento sem causa da vítima.

A dúplice natureza da indenização por danos morais vem ressaltada na percuciente lição de Caio Mário, citado por Sérgio Cavalieri Filho, em sua obra Programa de Responsabilidade Civil:

"Como tenho sustentado em minhas Instituições de Direito Civil (v. II, n.176), na reparação por dano moral estão conjugados dois motivos, ou duas concausas: I - punição ao infrator por haver ofendido um bem jurídico da vítima, posto que imaterial; II - pôr nas mãos do ofendido uma soma que não é o pretium doloris, porém o meio de lhe oferecer oportunidade de conseguir uma satisfação de qualquer espécie, seja de ordem intelectual ou moral, seja mesmo de cunho material, o que pode ser obtido 'no fato' de saber que esta soma em dinheiro pode amenizar a amargura da ofensa e de qualquer maneira o desejo da vingança" (in: Programa de Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p.108/109, grifei).

Diverso não é o entendimento do Colendo STJ, consoante se verifica do seguinte precedente:

"ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE - CIVIL - DANO MORAL - VALOR DA INDENIZAÇÃO. 1. O valor do dano moral tem sido enfrentado no STJ com o escopo de atender a sua dupla função: reparar o dano buscando minimizar a dor da vítima e punir o ofensor, para que não volte a reincidir. 2. Posição jurisprudencial que contorna o óbice da Súmula 7/STJ, pela valoração jurídica da prova. 3. Fixação de valor que não observa regra fixa, oscilando de acordo com os contornos fáticos e circunstanciais. 4. Recurso especial parcialmente provido". (RESP 604801/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 23.03.2004, DJ 07.03.2005 p. 214)

E deste Órgão Fracionário:

"RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO. REEDIÇÃO DAS ALEGAÇÕES DA CONTESTAÇÃO. HIPÓTESE DE NÃO CONHECIMENTO. (...). INSCRIÇÃO INDEVIDA NO SERASA. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. VALOR. O cadastramento injustificado em órgão de restrição de crédito diz com dano moral puro. Indenização não deve ser em valor ínfimo, nem tão elevada que torne desinteressante a própria inexistência do fato. Atenção às circunstâncias do evento e aos precedentes da Câmara. Manutenção de equivalência de valores entre lides de semelhante natureza. (...). Negado provimento ao apelo da ré na parte que se conhece e provido o recurso do autor em parte naquilo que não restou prejudicado. Unânime". (Apelação Cível nº 70009930314, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, julgado em 10/03/2005)

Na hipótese sob comento, considerando as condições do autor, que litiga ao abrigo da gratuidade de justiça; e da requerida, pessoa jurídica com capital social de R$ 75.000,00; bem como a reprovabilidade da conduta desta, que não cumpriu com o seu dever de segurança e qualidade na relação de consumo, ocasionando abalo à moral da autora; entendo adequada a redução do quantum indenizatório para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), que deverá ser corrigido monetariamente conforme determinado no ato sentencial.

Impende consignar, outrossim, que o quantum se coaduna com as peculiaridades do caso e com os parâmetros utilizados por esta Câmara, em situações análogas.

Assim, resta prejudicado o exame do recurso adesivo, que visa à majoração do montante da indenização.

JUROS DE MORA. TERMO INICIAL.

Quanto ao dies a quo dos juros de mora, igualmente deve ser mantido o decisum, porquanto, tratando-se de responsabilidade civil extracontratual, devem incidir a contar do evento danoso, consoante entendimento exarado na Súmula 54 do STJ, ao qual me filio.

DANO MATERIAL.

Em relação ao dano material, ao contrário do que ocorre com o dano extrapatrimonial, não decorre do próprio fato ilícito, exigindo a comprovação do efetivo prejuízo experimentado.

No caso, o documento coligido à fl. 11 dos autos dá conta do prejuízo material no total de R$ 18,22 (dezoito reais e vinte e dois centavos), correspondentes ao valor do medicamento comprado pela autora, que deverá ser ressarcido pelo demandado, conforme determinando no decisum recorrido.

SUCUMBÊNCIA. REDIMENSIONAMENTO.

Diante do encaminhamento do voto, cumpre a redistribuição do ônus sucumbencial.

A parte autora deverá arcar com 50% das custas processuais e honorários advocatícios devidos aos patronos da ré Dimed S.A., fixados em R$ 750,00, nos termos do art. 20, §4º do CPC.

A ré Balldarassi, por sua vez, arcará com o restante das despesas processuais, ou seja, 50%, bem como à verba honorária devido ao patrono da autora, que arbitro em 15% sobre o valor da condenação, a teor das operadoras elencadas no art. 20, 3º do CPC.

Fica suspensa a exigibilidade de tais verbas com relação ao autor, em razão deste litigar ao abrigo da gratuidade de justiça.

Por derradeiro, apenas consigno que o entendimento ora esposado não implica ofensa a quaisquer dispositivos, de ordem constitucional ou infraconstitucional, inclusive àqueles mencionados pelas partes em suas manifestações no curso no processo.

Diante do exposto, o VOTO é no sentido de:

a) EXTINGUIR O FEITO, DE OFÍCIO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, ex vi do art. 267, VI do CPC, em relação à ré Dimed S.A., face à ilegitimidade passiva ad causam;

b) DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA RÉ BALLDARASSI, para efeito de reduzir o quantum indenizatório fixado na sentença para R$ 5.000,00 (cinco mil reais);

c) Redimensionar a sucumbência, nos termos da fundamentação retro;

d) Mantidas as demais disposições sentenciais;

e) PREJUDICADO O EXAME DA APELAÇÃO DA RÉ DIMED S.A E DO RECURSO ADESIVO DO AUTOR.

Des. Túlio de Oliveira Martins (REVISOR) - De acordo.

Des. Paulo Antônio Kretzmann (PRESIDENTE) - De acordo.

DES. PAULO ANTÔNIO KRETZMANN - Presidente - Apelação Cível nº 70025629684, Comarca de Porto Alegre: "EXTINGUIRAM, DE OFÍCIO, O FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, EM RELAÇÃO À RÉ DIMED S.A. E DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA RÉ BALLDARASSI, PREJUDICADO O EXAME DO APELO DA DIMED S.A. E DO RECURSO ADESIVO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: ELISA CARPIM CORREA

Publicado em 12/08/09




JURID - Dano moral. Consumidor. Defeito do produto. [18/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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