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quinta-feira, 1 de julho de 2010

JURID - Obrigação de fazer. Tutela [25/06/10] - Jurisprudência


Plano de saúde é obrigado a excluir cláusula de contrato e garantir internação a assegurado


Circunscrição: BRASÍLIA
Processo: 2009.01.1.130007-5
Vara: VIGÉSIMA VARA CIVEL


SENTENÇA

FRANCISCO CARLOS PEREIRA DIAS ajuizou ação de obrigação de fazer, c/c pedido de tutela antecipada, em desfavor de AMIL ASSITÊNCIA MÉDICA INTERNACIONAL LTDA, partes qualificadas nos autos.

Aduz, em suma, que é beneficiário de contrato de prestação de serviços médicos e hospitalares, oriundo de convênio entre a ré e o CONFEA/CREA, e que em 15 de agosto de 2009 precisou acionar o Plano de saúde porque foi hospitalizado, em caráter de urgência, com suspeita de "gripe suína"e "pneumonia", ficando internado desde então no Hospital Santa Lúcia.

Afirma, ainda, que nada obstante a urgência do procedimento de internação, a ré se recusou a autorizar os custos e despesas decorrentes da internação, em razão de estar o autor cumprindo prazo de carência, olvidando-se, contudo, a situação de emergência que dispensa o cumprimento de tal prazo, sendo nula a cláusula contratual que dispõe em contrário.

Anota, na sequência, que em razão da recusa da ré, foi obrigado a deixar uma caução de R$ 5.000,00 no cartão de crédito, requerendo, assim, em tutela antecipada, seja determinado à ré que custeie a internação do autor, arbitrando-se multa para caso de descumprimento e, no mérito, a confirmação da tutela concedida, declarando-se a nulidade da cláusula contratual que impede o autor de usufruir o plano de sáude em razão da carência, reembolsando-se, também, o valor gasto para contratação de advogado, no valor de R$ 3.000,00, bem como condenando a ré ao pagamento de danos morais e aos ônus de sucumbência.

Emenda apresentada às fls. 25/26, aduzindo que gastou com a internação o valor de R$ 1.000,00 de honorários médicos e R$ 3.033,70 de custos hospitalares.

Tutela antecipada deferida, fls. 41/42, determinando à ré que arque com as despesas decorrentes da internação do autor, no valor de R$ 4.033,70, facultado prazo de cinco dias para efetivação do depósito, sob pena de multa diária.

Depósito realizado, fl. 49.

Devidamente citada, apresentou a ré a contestação de fls. 61/77, aduzindo, em suma, que o contrato assinado entre as partes prevê um prazo de carência de 180 dias para o procedimento realizado (internação),prazo este não cumprido pelo autor.

Alega, ainda, que o prazo de carência é perfeitamente admitido pela lei 9.656/98, bem como as limitações de cobertura, e que segundo a Resolução 13 do CONSU, a cobertura para os casos de emergência e urgência não incluem as internações.

Tece considerações sobre o equilíbrio contratual, sobre responsabilidade contratual e liberdade de contratar, colacionando doutrina e jurisprudência que entende amparar seu posicionamento.

Questiona, ademais, o pedido de devolução dos valores gastos com advogado e dos valores pedidos a título de despesas médicas, já que esse valor não corresponde à tabela paga pela ré junto ao Hospital, sustentando, também, a inexistência de qualquer dano moral e pleiteando, ao final, o julgamento pela improcedência total dos pedidos.

Foi deferido pedido de expedição de alvará do valor depositado em cumprimento à decisão de tutela antecipada, fls. 116, levantado às fls. 117.

Não foi ofertada réplica.

A seguir foram os autos conclusos para sentença.

É o relatório do que basta. PASSO A DECIDIR.

A hipótese é de julgamento antecipado da lide, na forma do art. 330, I do CPC.

Principio por dizer que a relação posta sob exame possui nítida natureza consumerista, já que a ré é fornecedora de serviços médicos e hospitalares, nos termos do art. 3º da Lei 8.078/90; o autor é consumidor, conforme art. 2º da mesma lei; sendo de adesão o contrato assinado entre as partes. Assim, será a demanda analisada levando-se em conta os princípios protetivos do Código Consumerista.

Pois bem.

É fato incontroverso, porque não contestado, que em 20/07/2009 as partes assinaram contrato para prestação de serviços médicos e hospitalares, e que em 15/08/2009 foi o autor atendido no hospital Santa Lúcia, em caráter de urgência, acometido de suspeita de "gripe suína" e "pneumonia".

Também incontroverso que o autor foi internado no referido hospital, na mesma data, às próprias expensas, porque a ré se recusou a custear tal procedimento, sob alegação de que estava em cumprimento de prazo de carência, tendo o autor desembolsado o valor total de R$ 4.033,70, incluindo honorários médicos e despesas várias, conforme documentos de fls. 35/39.

O ponto nodal da lide, em verdade, cinge-se a verificar se o procedimento de urgência ou emergência esta dispensado do cumprimento do período de carência exigido contratualmente, como insistentemente sustenta a ré.

Pois então.

Reza a lei 9.656/98, art. 35-C, que:

"Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos:

I - de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizada em declaração do médico assistente; e

II - de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional."

A situação demonstrada nos autos enquadra-se, inegavelmente, como procedimento de emergência, porquanto os procedimentos adotados em relação ao autor (internação com suspeita de gripe suína e pneumonia) ocorreram por implicarem risco de morte, alegação esta não questionada pela ré.

Neste sentido, verifico que o prazo de carência disposto no contrato não poderia ser licitamente exigido, nos termos da legislação já transcrita, porque é óbvio que uma situação que implica risco de morte não pode ficar adstrita a qualquer prazo carencial, sob pena de inviabilização do próprio objeto do contrato.

A única exigência da lei 9.656/98, e que foi atendida pelo autor no tocante ao atendimento de emergência, é que se houvesse passado 24 horas da assinatura do contrato, confira-se:

"Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas:

V - quando fixar períodos de carência:

a) prazo máximo de trezentos dias para partos a termo;

b) prazo máximo de cento e oitenta dias para os demais casos;

c) prazo máximo de vinte e quatro horas para a cobertura dos casos de urgência e emergência".

Assim sendo, NULAS são as estipulações contratuais que dispõe prazo de carência para internações, ainda que se tratem de emergência, porque manifestamente abusivas, conforme o art. 51, IV, do Código Consumerista, reconhecendo-se, por conseguinte, ter o autor cumprido o requisito legal para ter direito à cobertura do plano quanto ao procedimento realizado.

No tocante à alegação da ré, de que a resolução da CONSU estaria amparando sua conduta, ao dispor em seu art. 3º, §1º, que a cobertura para situações de emergência não incluem custos com internação, também não lhe socorre razão, porque é claro que referido normativo não pode se sobrepor ao Código Consumerista, devendo-se desconsiderar sumariamente referida norma, porque em evidente contrariedade ao art. 51, IV, do CDC, já citado.

Por tudo que se foi exposto, pode-se concluir que ressarcimento dos valores gastos pelo autor, referentes à sua internação emergencial, no valor de R$ 4.033,70, é totalmente devido.

Frise-se, aliás, que a ré impugnou os valores pleiteados pelo requerente, sob a inocente alegação de que os valores cobrados do autor não são aqueles praticados pelo Plano de saúde. Porém, novamente descoberta de razão, a uma, porque não declinou qual seria o excesso cobrado, fazendo genérica sua impugnação, razão suficiente para não ser acolhida.A duas, porque o autor demonstrou, documentalmente, o valor que gastou com a internação, fl. 35/39, devendo a ré, pois, arcar com eventual diferença derivada de tabela praticada pelo plano e da tabela cobrada de particulares, diferença esta que derivou de sua culpa exclusiva, face a indevida recusa de autorizar a internação.

Quanto ao pedido de ressarcimento do valor de R$ 3.000,00, pela contratação de advogado para esta demanda, entendo que não pode ser acolhido, porque a escolha do causídico e o acordo quanto ao pagamento dos honorários convencionais deu-se por livre vontade do autor, não se podendo transferir à ré a obrigação assumida unicamente por ele.

Em relação aos danos morais entendo que não restou caracterizado, porque o autor sequer descreveu quais teriam sido eles, as consequências negativas da conduta da ré ou a violação ao seu direito de personalidade, mas simplesmente deduziu pedido neste sentido, sem quaisquer outras digressões. Além disso, é bem sabido que o simples descumprimento contratual não caracteriza o dano moral indenizável, devendo seu pedido, neste tópico, ser julgado totalmente improcedente.

Face todo o exposto, com fulcro no art. 269, I do CPC, resolvo o mérito da lide e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos deduzidos para:

1) Confirmar a tutela antecipada e declarar a nulidade da cláusula contratual que dispõe sobre o prazo de carência de 180 dias, inclusive para internações;

2) Determinar à ré o ressarcimento do valor de R$ 4.033,70 ao autor, referente aos gastos com a sua internação, cujo valor já foi depositado nos autos e levantado pelo requerente.

Pela sucumbência recíproca e proporcional, cada parte pagará os honorários de seus advogados, sendo as custas divididas 50% para cada uma, nos termos do art. 21 do CPC.

Transitada em julgado,nada mais requerido, arquive-se.

Publique-se. Registre-se.Intimem-se.

Brasília - DF, segunda-feira, 22/03/2010.



JURID - Obrigação de fazer. Tutela [25/06/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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