Horas extras. Trabalho realizado em regime de turnos ininterruptos de revezamento.
Tribunal Regional do Trabalho - TRT3ªR.
(TRT 3ª R.; 982/2009-087-03-00.2; Setima Turma; Relª Desª Alice Monteiro de Barros; DEJMG01/07/2010)
Processo: 00982-2009-087-03-00-2 RO
Data da Sessão: 24/06/2010
Data da Publicação: 01/07/2010
Órgão Julgador: Setima Turma
Juiz Relator: Des. Alice Monteiro de Barros
Juiz Revisor: Des. Paulo Roberto de Castro
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO 3a. REGIÃO
TRT-RO-00982-2009-087-03-00-2
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO 3a. REGIÃO
TRT-RO-00982-2009-087-03-00-2
*00982200908703002*
Recorrentes: HERALDO FERREIRA DA SILVA
FIAT AUTOMÓVEIS S.A.
Recorridos: OS MESMOS
EMENTA: HORAS EXTRAS. TRABALHO REALIZADO EM REGIME DE TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. Nos termos da Orientação Jurisprudencial 360 da SDI-1 do TST, "faz jus à jornada especial prevista no art. 7o., XIV, da CF/1988 o trabalhador que exerce suas atividades em sistema de alternância de turnos, ainda que em dois turnos de trabalho, que compreendam, no todo ou em parte, o horário diurno e o noturno, pois submetido à alternância de horário prejudicial à saúde, sendo irrelevante que a atividade da empresa se desenvolva de forma ininterrupta". Assim, uma vez demonstrado que o reclamante prestava serviços com alternância de turnos, compreendendo o horário diurno e noturno, está caracterizado o trabalho em regime de turnos ininterruptos de revezamento, a autorizar o pagamento, como extras, das horas trabalhadas além da sexta diária.
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Recurso Ordinário, em que figuram, como recorrente, HERALDO FERREIRA DA SILVA; FIAT AUTOMÓVEIS S.A. e, como recorridos, OS MESMOS.
RELATÓRIO
A r. sentença de f. 607/620, proferida pelo MM. Juiz da 4a. Vara do Trabalho de Betim, complementada pela decisão de embargos de declaração de f. 638, julgou procedentes, em parte, os pedidos formulados na reclamação ajuizada por HERALDO FERREIRA DA SILVA em face de FIAT AUTOMÓVEIS S.A.
As partes não se conformam com essa decisão.
O reclamante recorre ordinariamente às f. 624/637. Insiste no pedido de pagamento das horas laboradas após a 6a. diária em sistema de turno ininterrupto de revezamento como horas extras. Requer o pagamento do adicional noturno após às 05h. Por fim, pede a majoração do valor arbitrado a título de compensação por danos morais.
A reclamada, por sua vez, interpõe recurso ordinário às f. 639/654. Opõe-se ao pagamento dos minutos residuais, argumentando que os cartões de ponto retratam fielmente a jornada cumprida. Sustenta que os requisitos para o deferimento da compensação por dano moral não foram devidamente preenchidos. Pede a redução do valor arbitrado a título de honorários periciais e exclusão da multa prevista no art. 477 da CLT. Assevera, por fim, que o crime de falso testemunho não restou comprovado e, por essa razão, é desnecessária a expedição de ofícios à Polícia Federal e ao MPF.
Contrarrazões do reclamante às f. 658/668 e da reclamada às f. 669/676.
Desnecessário o parecer escrito da d. Procuradoria, porque ausente interesse público.
É o relatório.
VOTO
Os recursos são próprios e tempestivos. As representações também são regulares, conforme instrumentos de mandato de f. 45 e 515. Ademais, os comprovantes de recolhimento do depósito recursal e do pagamento das custas processuais encontram-se às f. 655/656.
Logo, conheço dos recursos porque atendidos os pressupostos de admissibilidade.
MÉRITO
RECURSO DO RECLAMANTE
TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO
O reclamante insiste no pedido de pagamento das horas trabalhadas a partir da 6a. diária, nos turnos ininterruptos de revezamento. Alega que as normas coletivas que permitiram o elastecimento da jornada diária de 06h em turnos ininterruptos de revezamento não abrangem todo o período contratual.
É incontroverso que o reclamante trabalhou em dois turnos: das 06h às 15h48min e das 15h48min à 01h09min (f. 285/349).
Portanto, a princípio, o reclamante faz jus à jornada especial prevista no art. 7o., XIV, da CF, consoante o disposto na OJ 360, da SDI-I, do TST, in verbis:
TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO. DOIS TURNOS. HORÁRIO DIURNO E NOTURNO. CARACTERIZAÇÃO (14.03.2008). Faz jus à jornada especial prevista no art. 7º., XIV, da CF/1988 o trabalhador que exerce suas atividades em sistema de alternância de turnos, ainda que em dois turnos de trabalho, que compreendam, no todo ou em parte, o horário diurno e o noturno, pois submetido à alternância de horário prejudicial à saúde, sendo irrelevante que a atividade da empresa se desenvolva de forma ininterrupta.
A empresa colacionou aos autos instrumentos coletivos que, segundo ela, autorizam a adoção de turnos ininterruptos de revezamento com jornadas de 44 horas semanais.
Realmente, o ACT 2001/2002, por meio das cláusulas segunda e terceira, instituiu dois turnos com revezamento semanal (f. 195). De acordo com a negociação coletiva "as jornadas semanais de efetivo trabalho serão de 44:00 horas quando no primeiro turno e 41:00 horas quando no segundo turno, perfazendo a média plurissemanal de 42:30 horas efetivamente trabalhadas, sendo remuneradas 44h a cada semana". Conforme a cláusula quarta (f. 195), esse instrumento coletivo vigorou de 20.03.01 a 20.03.02.
Em 30.08.06 o Sindicato Profissional e a reclamada firmaram um Termo Aditivo convalidando os horários dos turnos de revezamento instituídos pelo ACT de 2002 (f. 200/201).
Durante o interregno compreendido entre o final da vigência do ACT 01/02 e a assinatura do Termo Aditivo acima citado, não há nenhuma norma coletiva que preveja jornada superior a seis horas ao empregado submetido ao revezamento em dois turnos.
Nesse contexto, entendo que não há se falar em ratificação de jornada de trabalho. Isso porque as condições ajustadas no ACT 01/02 regeram as relações das partes durante a sua vigência (de 20.03.01 até 20.03.02). Logo, o Termo Aditivo firmado em 30.08.06 não possui o condão de retroagir para legitimar uma jornada pretérita.
Na esteira desse entendimento, já se pronunciou o C. TST, por meio da OJ 322, da SDI-I, do TST, in verbis:
"Nos termos do art. 614, /S/S 3o., da CLT, é de 2 anos o prazo máximo de vigência dos acordos e das convenções coletivas. Assim sendo, é inválida, naquilo que ultrapassa o prazo total de 2 anos, a cláusula de termo aditivo que prorroga a vigência do instrumento coletivo originário por prazo indeterminado".
Com efeito, o ACT 01/02 perdeu a sua eficácia em 20.03.02, pois nenhum outro acordo foi firmado após essa data, de modo a perpetuar a jornada superior a 06h em turnos de revezamento. Cumpre salientar que o Termo Aditivo de f. 200/201 prevê, de forma expressa, a manutenção do horário das 06h às 15h48min e das 15h48min à 01h09min, para o trabalho em revezamento semanal (cláusula terceira, f. 201), e teve sua vigência fixada de 30.08.2006 a 30.09.2007.
O ACT 2007 manteve a instituição dos turnos ininterruptos de revezamento até 30.04.08 (f. 207/208).
Por sua vez, o ACT 2008 renovou o acordo que autorizou a adoção dos turnos ininterruptos por mais setenta dias, ou seja, até 09.07.08 (f. 212/213).
O acordo de f. 215/216, resultante de consulta direta aos empregados, fixou a vigência do ACT 2008 até 31.12.08.
Por fim, o ajuste coletivo de f. 217/218 manteve o sistema de turnos ininterruptos até 01.01.10.
Assim, não há óbice à aplicação do Termo Aditivo de f. 200/201 e os acordos que o sucederam, pois, além de terem vigência certa e dentro do prazo previsto pela CLT, alcança parte do período do contrato de trabalho.
Dessa forma, o reclamante, faz jus ao pagamento, como extras, da 7a. e 8a. horas trabalhadas no intervalo compreendido entre 20.03.02 a 30.08.06, observado o limite prescricional fixado em 29.06.04. Inteligência da OJ 360, da SDI-I, do TST.
Por fim, ressalto que a hipótese não dá ensejo à aplicação do entendimento consubstanciado na Súmula 85, III, do TST, pois não se trata de mero não-atendimento às exigências legais para a compensação de jornada, mas de ausência de norma coletiva a amparar o elastecimento da jornada diária de 6h em turnos ininterruptos de revezamento.
Logo, diante da existência do trabalho em turnos ininterruptos, é devido o pagamento das 7a. e 8a. horas trabalhadas, com reflexos já deferidos em primeira instância.
Serão observados o adicional convencional e o divisor 180, na forma da OJ 275, da SDI-1, do C. TST.
Provejo, em parte.
ADICIONAL NOTURNO PRORROGAÇÃO DA JORNADA
Não se conforma o reclamante com a decisão que indeferiu o pagamento de adicional noturno sobre as horas prorrogadas após a jornada noturna.
Examino.
É incontroverso o fato de que o reclamante, em algumas oportunidades, laborou cumprindo jornada das 22h54min às 06h (vide, por exemplo, cartões de f. 325/326).
A reclamada, em defesa, asseverou que não existem diferenças a favor do obreiro, pois as horas noturnas foram devidamente contabilizadas e quitadas/compensadas, com a incidência do adicional respectivo.
Entretanto, a prova documental juntada com a defesa não corrobora as alegações da empresa. A título de amostragem, veja-se que no dia 17.08.07 (f. 326) o reclamante laborou das 22h11min às 06h, com 01h de intervalo intrajornada. Porém, foram contabilizadas apenas 05h50min para fins de pagamento do adicional noturno (f. 329). Evidente, pois, que o lapso trabalhado após às 05h não chegou a ser computado.
Com efeito, o C. TST vem entendendo que o cumprimento parcial da jornada noturna de fato autoriza a incidência da parcela em epígrafe sobre todo o período trabalhado após 05h.
Nesse sentido, vale transcrever a seguinte ementa:
RECURSO DE REVISTA - JORNADA MISTA - ADICIONAL NOTURNO PRORROGAÇÃO. Por disciplina judiciária, curvo-me ao entendimento atual e majoritário da C. SBDI-1, no sentido de ser devido o pagamento do adicional noturno sobre as horas prorrogadas do horário noturno, ainda que se trate de jornada mista. Precedentes. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS O Tribunal Regional deferiu os honorários advocatícios a despeito de o Autor não estar assistido pelo seu sindicato. São indevidos, portanto, os honorários advocatícios. Inteligência das Súmulas nos 219 e 329 e da Orientação Jurisprudencial no. 305 da SBDI-1, todas do TST. Recurso de Revista conhecido parcialmente e provido. Processo: RR - 689/2007-029-04-00.7 Data de Julgamento: 18/03/2009, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 8a. Turma, Data de Divulgação: DEJT 20/03/2009.
Os fundamentos dessa decisão ressaltam, de forma clara:
"Sempre compreendi que o entendimento sumulado supracitado só é aplicável quando o empregado trabalha integralmente no período noturno. Assim, nas jornadas em que o empregado labora parcialmente no horário diurno e parcialmente no noturno, não seria devido o adicional noturno sobre as horas trabalhadas após as 5h da manhã. As excedentes são horas normais, contratadas e compensadas, e, não, em prorrogação. Não obstante tal posicionamento, curvo-me, por disciplina judiciária, ao entendimento atual e majoritário da C. SBDI-1, no sentido de ser devido o pagamento do adicional noturno sobre as horas prorrogadas do horário noturno, ainda que se trate de jornada mista".
Indiscutível, pois, o cabimento do adicional noturno sobre todo o lapso trabalhado além das 5h. É de bom alvitre salientar que não é necessário o cumprimento integral da jornada no horário noturno para aplicação do disposto na Súmula 60, II, do TST.
Em sendo assim, defiro o pagamento do adicional noturno sobre as horas trabalhadas após às 05h, com os reflexos já deferidos, conforme se apurar em liquidação.
Provejo.
COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL (MATÉRIA COMUM A AMBOS OS RECURSOS)
De acordo com a inicial, o obreiro foi contratado pela reclamada, em 25.04.1995, para exercer a função de operador de produção, tendo sido imotivadamente dispensado 16.03.09. Alegou que em decorrência dos serviços prestados à reclamada contraiu doença ocupacional (hérnia discal). Desse modo, postulou o pagamento de compensação por danos morais.
O d. julgador de origem, com base no conjunto de provas constantes dos autos, acolheu o pleito e condenou a reclamada ao pagamento de R$10.000,00 a título de compensação por danos morais.
As partes recorrem dessa decisão.
Enquanto o reclamante pleiteia a majoração do valor arbitrado, a reclamada sustenta que os requisitos necessários para o deferimento da compensação por danos morais não foram preenchidos.
Examino.
De acordo com o laudo pericial de f. 546/560, o obreiro relatou ter sofrido lombalgia aguda em 2005, durante o exercício de suas tarefas. A moléstia culminou no seu afastamento do trabalho por cerca de quatro meses e foi diagnosticada como sendo "hérnia de disco L4-L5". Após esse interregno, o reclamante informou que foi desviado de função, tendo trabalhado normalmente por cerca de mais um ano. No entanto, o trabalhador disse ao perito que as dores voltaram muito fortes, sendo necessária intervenção cirúrgica e novo afastamento do trabalho, dessa vez, por cento e vinte dias. Depois da alta do INSS, o obreiro afirmou que retornou ao trabalho e não teve novos afastamentos; mas, tão-somente passou a sentir dores após a dispensa.
O i. vistor, diante da entrevista realizada com o obreiro, concluiu que "não há redução da capacidade laborativa, estando apto ao trabalho".
Verifica-se, portanto, que o laudo pericial não investigou a existência do nexo de causalidade entre a moléstia do reclamante e as atividades laborativas. As respostas aos quesitos também não elucidaram a questão. Além disso, as partes não solicitaram a prestação de esclarecimentos.
Entretanto, os demais documentos constantes dos autos, associados à prova oral produzida, permitem concluir pela existência do nexo causal.
Com efeito, os atestados de saúde ocupacional revelam que o reclamante laborava em situação de risco ergonômico, decorrente de movimento postural e/ou repetitivo (f. 97/99).
A par desse fato, a primeira testemunha do obreiro, Sr. Cláudio Henrique Serafim, declarou que o reclamante trabalhava em pé, mas, por diversas vezes, era obrigado a inclinar o corpo para pegar peças e colocá-las sobre uma bancada. Numa dessas ocasiões, o depoente afirmou ter visto o reclamante "travar" a coluna (f. 600). A testemunha acrescentou, ainda, que o obreiro não participava de rodízio funcional, desempenhando sempre as mesmas atividades.
A segunda testemunha obreira, Sr. Joaquim Nascimento, confirmou que o reclamante executava as tarefas na forma descrita pelo Sr. Cláudio (f. 600/601).
Por fim, declarou a segunda testemunha empresária, Sr. Rubens Araújo Bretas: "que se recorda do reclamante trabalhando na preparação de ar-condicionado; que nessa atividade, o reclamante abaixava constantemente e carregava peças com cerca de 01kg;" (f. 602 grifei).
Conforme se extrai do laudo pericial, a reclamada mudou o obreiro de função por duas vezes (f. 551/552). Essa circunstância atrai para a empresa o ônus probatório, pois, competia a ela demonstrar que a atividade exercida pelo reclamante não traduzia em risco para a sua integridade física, o que, todavia, não se verificou.
Note-se que o expert admitiu a possibilidade de as atividades laborativas culminarem em Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho (DORT), pois o obreiro apresentou sintomas de doenças ocupacionais descritas na Lista B, do Anexo II, do Decreto 3.048/99 "dorsalgia" (quesitos 1.3 e 1.11 f. 554/556).
Vale frisar, inclusive, que o reclamante, ao ser admitido pela reclamada, foi considerado apto para o trabalho, pois não há registro de qualquer restrição à atividade física que ele desenvolvia em prol da empresa.
Por todas essas razões, concluo que o trabalho desenvolvido pelo reclamante teve papel determinante no aparecimento da moléstia.
Falta verificar a dimensão do prejuízo ocasionado e a existência de culpa da reclamada que justifique o dever de reparar.
As condições de trabalho revelam que a empresa expôs o obreiro ao risco, pois competia-lhe provar a adoção de medidas capazes de evitar a superveniência do dano, o que não ocorreu. A recorrente tinha conhecimento do risco ergonômico; logo, cabia-lhe a adoção de medidas a evitar a incidência da patologia ou ao menos a sua progressão após o aparecimento dos primeiros sintomas, o que, todavia, não se verificou.
Portanto, há que se confirmar o julgado de origem dada a conduta culposa da reclamada face à negligência com seu empregado.
O quadro retratado não deixa dúvida quanto à existência do dano, do nexo de causalidade e da culpa da reclamada pelo evento, pelo que, passo ao exame da reparação pretendida, qual seja, compensação por danos morais.
No caso, o perito concluiu que o obreiro não é portador de patologia atual. No entanto, é incontroverso que o reclamante submeteu-se a tratamentos conservador e cirúrgico para hérnia discal póstero-mediana em L4-L5 e discoartrose incipiente em L3-L4 em agosto de 2006 (f. 553).
Vale frisar que a caracterização do dano moral resulta da ofensa aos direitos da personalidade, os quais incluem a integridade física. Logo, se o reclamante sofreu ofensa capaz de comprometer esse direito da personalidade, em razão de ato ilícito praticado pela empregadora, o dano moral é evidente.
Embora o sofrimento do obreiro não possa ser quantificado, a importância a ser deferida deve atender principalmente a duas finalidades: compensar a vítima e punir o infrator, com o objetivo de coibir a reiteração da conduta ilícita. No caso em apreço, a lesão exigiu tratamento longo, inclusive com intervenção cirúrgica. A reclamada, por sua vez, não chegou a tomar medidas efetivas de proteção à saúde do empregado. E tanto foi assim que, após o primeiro retorno, quando a função do reclamante havia sido alterada, houve recidiva da doença, circunstância que demonstra a permanência do risco ergonômico mesmo após a ciência dos primeiros sintomas da moléstia.
A meu ver, a importância de R$10.000,00 atende a esses pressupostos e por esse motivo deve mantida. De fato, a recorrente concorreu com culpa para a lesão do reclamante. Lado outro, conquanto o reclamante experimente desconforto físico, é evidente que ele permanece apto para o trabalho (f. 560, quesito 17). Sendo assim, não vislumbro fundamento que sustente a majoração pretendida pelo obreiro.
Por fim, mantenho o valor arbitrado a título de honorários periciais (R$1.000,00), porque compatível com o trabalho realizado pelo i. vistor.
Assim sendo, nego provimento a ambos os recursos.
RECURSO DA RECLAMADA
MINUTOS RESIDUAIS
A reclamada sustenta que o obreiro não comprovou ter trabalhado antes e depois da jornada, de modo a ensejar o pagamento de horas extras. Alega, ainda, que todo o tempo trabalhado encontra-se devidamente quitado, conforme registros constantes dos cartões de ponto.
Examino.
Os controles de ponto (f. 285/349) demonstram que os limites de tolerância para assinalação do ponto, estabelecidos no art. 58, /S/S1o., da CLT eram respeitados.
Todavia, em depoimento, o obreiro afirmou que, antes de registrar o início da jornada, gastava 10min com troca de uniforme e mais 10min na "passagem de turno". Após o término da jornada, o reclamante informou que "passava o cartão magnético e, depois, ia para o vestiário onde demorava cerca de 10 minutos e, em seguida, ia embora" (f. 599 - grifei).
A prova oral produzida, além de confirmar o fato de que o ponto só era marcado após a troca de uniforme, revelou a existência de tempo de percurso gasto dentro das dependências da empresa que não era contabilizado.
A primeira testemunha ouvida a rogo do obreiro, Sr. Cláudio Henrique Serafim, declarou: "que da portaria até o refeitório o trajeto demorava cerca de 12 minutos; que, em seguida, trocava de roupa, demorando cerca de 05 minutos, e, depois, se dirigia para a área de trabalho, demorando cerca de 05 minutos no trajeto; que logo quando chegava na área de trabalho, passava o cartão magnético registrando o seu horário de trabalho," (f. 599/600)
Até mesmo a testemunha apresentada pela reclamada, Sr. Renato Araújo Silva, confirmou que o tempo gasto com a troca de uniforme e deslocamentos dentro da empresa não era computado na jornada de trabalho: "que antes de iniciar suas atividades, vai para o refeitório, toma café, troca de roupa e, em seguida, vai para o seu setor de trabalho; que costuma passar o seu cartão magnético 05 minutos antes do início do turno (...); que na saída, passa o cartão e, em seguida, troca de roupa e vai embora;" (f. 601).
Em sendo assim, o reclamante encontrava-se à disposição da empresa, no momento da troca do uniforme, bem como no deslocamento para o setor de trabalho, a teor do disposto no art. 4o. da CLT. Tenho entendido que a colocação de uniforme constitui preparação necessária para o trabalho, sendo essa a razão pela qual o lapso de tempo gasto nessa atividade configura tempo à disposição do empregador, na forma do dispositivo consolidado já referido.
Por fim, mantenho o tempo fixado pelo juízo (37min diários) a título de minutos residuais, porquanto a empresa não se insurgiu, no aspecto.
Nego provimento.
MULTA DO ART. 477 DA CLT
A reclamada opõe-se ao pagamento da multa em epígrafe, aduzindo que a quitação das verbas rescisórias ocorreu tempestivamente.
Sem razão.
De acordo com o documento de f. 08, o reclamante recebeu a notificação de sua dispensa em 12.03.09.
O TRCT de f. 95, por sua vez, revela que o acerto rescisório foi efetuado em 26.03.09. Como o aviso prévio foi indenizado, as verbas rescisórias deveriam ter sido quitadas no prazo estabelecido pelo art. 477, /S/S6o., "b", da CLT, ou seja, até 23.03.09 (segunda-feira).
Logo, o reclamante faz jus ao pagamento da multa em epígrafe.
Nada a prover.
CRIME DE FALSO TESTEMUNHO
O MM. Juiz a quo determinou a expedição de ofício à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal para apuração do crime de falso testemunho (art. 342 do CPB). Isso porque as testemunhas Cláudio Henrique Serafim, Joaquim Nascimento, Renato Araújo Silva e Rubens Araújo Bretas teriam prestado depoimentos contraditórios com relação à fruição do intervalo intrajornada.
A reclamada não se conforma com essa decisão. Aduz que a medida tomada pelo juízo é desnecessária, pois o crime de falso testemunho não restou configurado.
Contudo, entendo que a reclamada não possui interesse em recorrer, no aspecto. A expedição de ofícios às autoridades competentes não constitui penalidade ou condenação, pois visa, tão-somente, dar ciência das decisões judiciais aos órgãos dos demais Poderes, que, juntamente com o Poder Judiciário, atuam no sentido de se fazer cumprir o ordenamento jurídico pátrio. Não há que se negar à Justiça do Trabalho o cumprimento dessa tarefa.
Nada a reformar, portanto.
CONCLUSÃO
Pelo exposto, conheço de ambos os recursos. No mérito, dou parcial provimento ao apelo do reclamante para deferir o pagamento das 7a. e 8a. horas trabalhadas como extras, bem como do adicional noturno sobre as horas trabalhadas após às 05h, com os reflexos já deferidos em primeira instância, tudo conforme a fundamentação. Quanto ao recurso da reclamada, nego-lhe provimento. Acresço à condenação o valor de R$4.000,00, com custas adicionais, pela reclamada, no importe de R$80,00.
FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,
O Tribunal Regional do Trabalho da 3a. Região, por sua 7a. Turma, unanimemente, conheceu de ambos os recursos. No mérito, por maioria de votos, deu parcial provimento ao apelo do reclamante para deferir o pagamento das 7a. e 8a. horas trabalhadas como extras, bem como do adicional noturno sobre as horas trabalhadas após às 05h, com os reflexos já deferidos em primeira instância, tudo conforme a fundamentação. Quanto ao recurso da reclamada, sem divergência, negou-lhe provimento. Acresceu à condenação o valor de R$4.000,00, com custas adicionais, pela reclamada, no importe de R$80,00. Vencido o Exmo. Des. Marcelo Lamego Pertence, que majorava a indenização por dano moral para R$20.000,00.
Belo Horizonte, 24 de junho de 2010.
ALICE MONTEIRO DE BARROS
Juíza Relatora
JURID - Horas extras. Trabalho realizado em regime de turnos. [02/07/10] - Jurisprudência
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