Anúncios


sexta-feira, 28 de agosto de 2009

JURID - Agravo de instrumento. Garantia ao mínimo existencial. [28/08/09] - Jurisprudência


Agravo de instrumento. Ação civil pública. Garantia ao mínimo existencial. Princípio fundamental da dignidade da pessoa humana.


Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro - TJRJ

4ª CÂMARA CÍVEL

AGRAVO DE INSTRUMENTO N.º 15206/09

Relator: Desembargador SIDNEY HARTUNG

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. GARANTIA AO MÍNIMO EXISTENCIAL. PRINCÍPIO FUNDAMENTAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. CONTROLE DE JURIDICIDADE. TUTELA DE URGÊNCIA.

Decisão agravada de deferimento parcial de liminar. Determinação de transferência do contingente prisional excedente a 150 presos, sob pena de multa diária de R$10.000,00 (dez mil reais).. Acesso a melhores condições de limpeza e higiene, erradicação de insetos e fornecimento de água potável. Garantia ao Mínimo Existencial, subprincípio imponderável ligado ao Princípio Fundamental da Dignidade da Pessoa Humana (art.1º., III da CRFB/88).

Está o Estado de Direito juridicamente vinculado aos termos da Constituição Federal. Máxima Efetividade de Direitos Fundamentais, na ponderação entre princípios constitucionais deve prevalecer aquele que ofereça maior efetividade a tais direitos.

Normas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata, (art.5º, p. 1º. da CRFB/88). Possibilidade de Controle de Juridicidade, trata-se de controle mais complexo, que subordina o atuar administrativo diretamente aos Princípios Constitucionais. Preenchimento dos Requisitos para a concessão da tutela de urgência. Preliminar de nulidade da decisão que não merece prosperar, eis que a leitura do art.2º da Lei 8437/92, deve ser feita de forma sistemática, harmonizando-se com os arts. 11, 12 e 19 da Lei 7347/85, e com o art. 273, I do CPC, que ressalvam situações de urgência, como a ora em análise.. Manutenção da decisão agravada.

REJEIÇÃO DA PRELIMINAR. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n.º 15205/09, em que é Agravante ESTADO DO RIO DE JANEIRO, Agravado DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

ACORDAM os Desembargadores desta 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, POR UNANIMIDADE, em REJEITAR A PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO, e NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo-se a r. decisão recorrida.

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo ESTADO DO RIO DE JANEIRO contra decisão, contida por cópia às fls. 125-128, que, em Ação Civil Pública, deferiu em parte a liminar requerida pela DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, para determinar que o Estado:

a) promova, no prazo de 10 dias contados da sua intimação, da transferência do contingente prisional excedente à capacidade máxima de 150 presos da Polinter Base Grajaú para outras unidades prisionais, abstendo-se de transferir para aquela novos presos que ocasionem a suplantação do limite de 150 presos, sob pena de multa diária de R$10.000,00 (dez mil reais).

b) Providencie, no prazo de 24 horas, que todos os presos da unidade tenham acesso à água potável, durante os horários de refeições, bem como lhes sejam fornecido material de limpeza e de higiene, assim como atendimento médico imediato, sob pena de multa diária de R$10.000,00 (dez mil reais).

c) providencie a todos os detentos que ali permanecerem o fornecimento de colchão, procedendo, ainda, 'a erradicação das baratas e insetos existentes mediante a completa dedetização da unidade, tudo devendo ser feito no prazo de 15 dias, sob pena de multa diária de R$1.000,00 (mil reais).

Pretende o recorrente a concessão de efeito suspensivo ao recurso, sob o argumento de risco de imposição de medida de cumprimento impossível pelo Estado e de exposição à constrição patrimonial indevida.

Alega a restrição de recursos do erário, o qual tem prioridades estabelecidas segundo o programa de governo democraticamente referendado. Argui que na espécie não pode o Judiciário impor obrigação de fazer, posto que apenas ocorre violação de direito quando há o dever de atuar, o qual inexiste na espécie. Defende que os direitos positivos apenas existem sob a reserva do possível ou da soberania orçamentária do legislador.

Afirma que não é possível ao Judiciário se imiscuir no mérito administrativo, sob pena de haver ofensa ao art.2º. da CRFB/88. O recorrente ainda defende que há o risco de periculum in mora inverso.

Pretende, dessa forma, a concessão de efeito suspensivo ao presente e, no mérito, a reforma da decisão agravada in totum, ou caso não seja cassada a decisão, pretende que seja dado provimento parcial ao recurso para que se lhe atribua um prazo razoável, de no mínimo 90 dias, para as transferências dos presos excedentes e finalização das reformas materiais da unidade prisional.

Vindo os autos a este Relator, foi indeferido o efeito suspensivo, conforme fls. 133-134, determinando-se a manifestação dos agravados.

Às fls. 136-143, o agravado apresenta suas contrarrazões, aduzindo, não ser aplicável à hipótese o princípio da reserva do possível, uma vez que houve o cumprimento da liminar pelo Estado do Rio de Janeiro, com a transferência de 396 presos para outras unidades prisionais, sem que tenha havido qualquer gravame ao Estado do Rio de Janeiro ou ao sistema carcerário estadual.

Afirma que a garantia da inafastabilidade da função jurisdicional legitima a atuação do Poder Judiciário para promover a correção de rumos, quando há graves lesões a direitos fundamentais.

Alega que a postura passiva não condiz com a tutela e preservação de direitos constitucionais, especialmente aquele que assegura a integridade física e moral dos presos. Por fim, pugna pela manutenção da decisão recorrida. À fl. 146-149, parecer da douta Procuradoria de Justiça pelo conhecimento e improvimento do recurso.

É O RELATÓRIO.

Em que pese os argumentos do recorrente, não merece prosperar o seu recurso.

Primeiramente, passa-se à análise da preliminar de violação do art.2º. da Lei 8437/92, ao argumento de falha procedimental. A interpretação do dispositivo citado deve ser feita de forma sistemática, harmonizando-se com os arts. 11, 12 e 19 da Lei 7347/85, pois este é norma específica às ações civis públicas, bem como com o art. 273, I do CPC, os quais têm como finalidade resguardar situações de urgência, em que haja indiscutível plausibilidade do direito, e possibilidade de dano irreparável ou de difícil reparação, como na hipótese ora em análise. Assim, correta a decisão do r. julgador monocrático.

Trata a hipótese de se garantir o acesso ao mínimo existencial, aos presos custodiados na Polinter Base Grajaú, pretendendo a transferência do contingente excedente a 150 pessoas, além da determinação de que sejam tomadas providências básicas, tais como o acesso à água potável, a dedetização do local, o fornecimento de camas e colchões, além do banho de sol.

Pretende o Estado a reforma da decisão liminar, ao argumento de serem tais direitos normas programáticas submetidas ao princípio da reserva do possível. Todavia, há que se ressaltar que não se submetem a tal reserva os direitos relacionados diretamente ao mínimo existencial, imponderáveis, uma vez que oriundos do Princípio Fundamental da Dignidade da Pessoa Humana, epicentro axiológico do ordenamento jurídico, previsto no art.1º., III da CRFB/88.

É do conhecimento geral que os recursos do Estado são limitados, assim devem ser aplicados primordialmente nos fins os quais a Carta Maior considera como essenciais.

Não se pode olvidar que o Estado de Direito Constitucional está juridicamente vinculado aos termos da Constituição Federal, a qual traça princípios norteadores, que devem orientar e legitimar o agir das autoridades políticas.

Ademais, doutrinariamente hoje prevalece o princípio da máxima efetividade, trata-se de princípio operativo, o qual aponta que no caso de dúvidas deve-se preferir interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais.

Conforme preceitua o art.5º., p. 1º. Da CRFB/88, as normas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.

Também não merece prosperar a tese de violação ao Princípio da Separação dos Poderes. Tradicionalmente entendia-se por um controle de legalidade dos atos administrativos, modernamente melhor admitir o controle de juridicidade, trata-se de controle mais complexo e completo, o qual subordina o atuar administrativo diretamente aos Princípios Constitucionais. Conforme preceitua Paulo Bonavides: "se o velho Estado de Direito do liberalismo fazia o culto da lei, o novo Estado de Direito do nosso tempo faz o culto da Constituição".

Nas lições de Gustavo Binenbojm "a atuação administrativa só será válida, legítima e justificável quando condizente, muito além da legalidade, com o sistema de princípios e regras delineados na Constituição, de maneira geral, e com os direitos " (Gustavo Binenbojm, Uma Teoria do Direito Administrativo, Direitos Fundamentais, Democracia e Constitucionalização, Ed.Renovar, 1ª. edição, p.133).

No mesmo sentido a jurisprudência deste E. Tribunal de Justiça:

"DIREITO ADMINISTRATIVO. VISITA ÍNTIMA SUSPENSA. MÉRITO DO ATO ADMINISTRATIVO. CONTROLE DE JURIDICIDADE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Para além de um controle de legalidade, cabe ao Poder Judiciário um controle de juridicidade do ato administrativo, devendo ser observada não só a regra jurídica, bem como os princípios que norteiam e compõem o ordenamento jurídico como um todo. RECURSO IMPROVIDO" (2008.001.64369. APELACAO. 1ª Ementa DES. LEANDRO RIBEIRO DA SILVA. Julgamento: 16/06/2009. DECIMA QUINTA CAMARA CIVEL)

Ressalte-se ainda, que como bem apontou a D. Procuradoria de Justiça, é o agravo de instrumento via estreita, na qual devem ser apenas analisados se preenchidos os requisitos para a concessão da tutela antecipada. Por todo exposto, entende este Relator estarem presentes todos os requisitos para a concessão da tutela de urgência, sendo irretocável a decisão.

Assim, não merecem prosperar as razões recursais, devendo ser mantida a r. decisão recorrida.

Diante do exposto, REJEITA-SE A PRELIMINAR E NEGA-SE PROVIMENTO AO RECURSO.

Rio de Janeiro, 04/08/2009.

SIDNEY HARTUNG
Desembargador Relator

Publicado em 04/08/09




JURID - Agravo de instrumento. Garantia ao mínimo existencial. [28/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário