Ação anulatória. Empresário individual. Capacidade de ser parte. Legitimidade. Coisa julgada. Negócio jurídico.
Tribunal de Justiça do Distrito Federal - TJDF.
Órgão - 6ª Turma Cível
Processo N. - Apelação Cível 20030110616874APC
Apelante(s): CARLOS JOSÉ BATISTA CARDOSO ME
Apelado(s): CARLOS BLAESE NETO E OUTROS
Relator: Desembargador JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA
Revisora: Desembargadora ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO
Acórdão Nº: 409.974
EMENTA
AÇÃO ANULATÓRIA. EMPRESÁRIO INDIVIDUAL. CAPACIDADE DE SER PARTE. LEGITIMIDADE. COISA JULGADA. NEGÓCIO JURÍDICO. SIMULAÇÃO. VALIDADE. CÓDIGO CIVIL 1916. ANULABILIDADE. ART. 2.035 DO CC/2002. LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ.
I - A firma individual é apenas uma espécie de nome empresarial. Assim, é irrelevante que tenha sido extinta, para fins de exame do pressuposto processual de existência consistente na capacidade de ser parte do empresário individual, bem como de sua legitimidade ad causam.
II - A teor do artigo 301, §§ 2º e 3º, do CPC, a coisa julgada ocorre entre ações idênticas, isto é, que possuem as mesmas partes, causa de pedir e pedido. Ademais, nos termos do art. 469 do CPC, não fazem coisa julgada nem os motivos, nem a verdade dos fatos estabelecida como fundamento de uma sentença.
III - A eficácia dos negócios jurídicos é imediata, caso não se sujeite a nenhum termo inicial ou condição suspensiva.
IV - O instituto da simulação foi modificado com o advento do novo Código Civil, não mais se configurando causa de anulabilidade do negócio jurídico, mas sim de nulidade, razão pela qual pode ser conhecida a qualquer tempo, até de ofício, visto tratar-se de matéria de ordem pública. Mas, de acordo com o art. 2.035 do CC/2002, versando a simulação sobre questão afeta à validade, não é possível aplicar esse novo regime jurídico aos atos e negócios jurídicos constituídos antes da entrada em vigor do novo Código Civil.
V - Para configuração da litigância de má-fé, a conduta imputada à parte deve subsumir-se a uma das hipóteses taxativas previstas no art. 17 do CPC.
VI - Negou-se provimento ao recurso.
ACÓRDÃO
Acordam os Senhores Desembargadores da 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA - Relator, ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO - Revisora, OTÁVIO AUGUSTO - Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador OTÁVIO AUGUSTO, em proferir a seguinte decisão: REJEITADAS AS PRELIMINARES. NEGOU-SE PROVIMENTO AO RECURSO. DECISÃO UNÂNIME , de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 3 de março de 2010
Certificado nº: 11 43 BF 99 00 04 00 00 0C EF
08/03/2010 - 18:42
Desembargador JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA
Relator
RELATÓRIO
Os autos versam sobre ação de conhecimento, subordinada ao procedimento comum, de rito ordinário proposta por CARLOS JOSÉ BATISTA CARDOSO ME em face de GERALDO VILELA COUTO e OUTROS.
O autor alega que, para recomprar o imóvel que havia vendido para terceiro, o réu Geraldo lhe emprestou a quantia de R$45.000,00 (quarenta e cinco mil reais), mediante o pagamento de juros de 5,5% ao mês.
Afirma que Geraldo, dolosamente, como queria uma garantia de que essa dívida seria paga pelo autor, o coagiu a lhe entregar uma nota promissória assinada em branco e a simular a cessão dos direitos aquisitivos do referido imóvel, exigindo, inclusive, o respectivo recibo de quitação no valor de R$180.000,00 (cento e oitenta mil reais) e uma procuração por instrumento público, com poderes para negociar o bem, outorgada a Aristides que, à época era funcionário de Geraldo. Diz que, a partir de outubro de 1999, não teve mais condições de honrar o pagamento da dívida em razão dos elevados juros.
Segundo o autor, Geraldo ainda simulou uma cessão dos direitos desse imóvel para o réu Márcio, dando-lhe inclusive recibo de quitação, e este, por sua vez, simulou a venda do bem ao réu Gilmar, que, também, simulou a venda do bem para a ré Multigraf, que simulou a cessão de 35% dos direitos sobre o bem para o réu Carlos. Afirma, portanto, que os réus agiram em conluio para prejudicá-lo com a perda do imóvel.
Diante desses fatos, foi proposta a ação em exame visando anular os atos e os negócios jurídicos especificados na emenda à inicial, com o objetivo de retomar o citado imóvel.
O juiz pronunciou a decadência do direito do autor, porque decorridos mais de quatro anos entre data da propositura da demanda (01/08/2003) e aquela em que foi celebrada a cessão de direitos entre ele e Geraldo (20/07/1998), da qual decorreram os demais atos e negócios jurídicos (art. 178, § 9º, V, "b", do CC/1916).
Inconformado, o autor apela. Argumenta que não há decadência, porque a cessão de direitos simulada com o réu Geraldo somente passou a produzir efeitos em outubro de 1999, quando o autor deixou de adimplir o pagamento das prestações referentes ao mencionado empréstimo e as demais simulações passaram a ser feitas pelos réus. Diz que a sentença é omissa quanto à confissão feita pelo réu Aotamiram em sua contestação e que há prova de que as cessões de direitos foram simuladas pelos réus com o objetivo de lhe prejudicar.
O recurso foi preparado, conforme guia de fls. 657.
O recurso foi contrariado pelos réus Carlos, Multigraf, Gilmar, Luis e Leny às fls. 662/671, na qual alegam as seguintes preliminares: a) ausência de pressuposto processual e ilegitimidade ad causam, visto que a firma individual que figura no pólo ativo da demanda já havia sido extinta antes da propositura da ação; b) coisa julgada, porque a matéria debatida nos autos já foi apreciada nos processos n.º 2000.01.1.033775-8 e n.º 2001.01.1.123943-8, que tramitaram, respectivamente, perante à 8ª e à 19ª Varas Cíveis de Brasília.
O recurso, também, foi contrariado pelos réus Geraldo e Márcio, respectivamente, às fls. 673/690 e às fls. 691/694.
É o relatório.
VOTOS
O Senhor Desembargador JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA - Relator
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
DA PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO PROCESSUAL E DE ILEGITIMIDADE AD CAUSAM DO AUTOR
Os réus suscitam preliminar de ausência de pressuposto processual e de ilegitimidade ad causam, ao argumento de que a firma individual que figura no pólo ativo da demanda já havia sido extinta antes da propositura da ação.
Segundo consta do documento de fls. 13, é certo que a firma individual Carlos José Batista Cardoso ME foi extinta em 13.09.1999, antes do ajuizamento da demanda em 01/08/2003.
Ocorre que a firma individual é apenas uma espécie de nome empresarial adotado por empresário pessoa física, no caso Carlos José Batista Cardoso.
A propósito, destaca-se abalizada doutrina:
"É possível, porém, a exploração de atividade econômica por uma pessoa física. (...). Se não for informal - traço, aliás, comum na hipótese -, o empresário pessoa física terá registro na Junta Comercial e nos cadastros de contribuintes como firma individual. Note-se que está é apenas uma espécie de nome empresarial (Cap. 6., item 9.1) e não representa nenhum mecanismo de personalização ou separação patrimonial. O empresário individual, ao providenciar os registros obrigatórios por lei, não está constituindo um novo sujeito de direito, com autonomia jurídica, mas simplesmente regularizando a exploração de atividade econômica. Há grande confusão conceitual nesse campo, principalmente porque, sob a perspectiva do direito tributário, muitas vezes encontram-se sob o mesmo regime de obrigações instrumentais o empresário individual e algumas sociedades. É necessário, contudo, ressaltar que a firma individual não é sujeito de direito, mas categoria de nome empresarial. O sujeito - isto é, o credor, devedor contratante, demandante, demandado, falido etc. - será sempre a pessoa física do empresário individual, identificado pela firma que levou a registro". (1)
Assim, se a firma individual é apenas uma espécie de nome empresarial, é irrelevante que tenha ocorrido o registro da extinção da firma Carlos José Batista Cardoso ME perante a Junta Comercial, para fins de exame do pressuposto processual de existência consistente na capacidade de ser parte do empresário individual, bem como de sua legitimidade ad causam.
Apesar de não ter sido observada a melhor técnica na inicial quando da indicação de Carlos como "representante" de sua firma individual, dando a falsa idéia de que se tratava de pessoas distintas, o exame dos pressupostos processuais e condições da ação devem ser feitos em relação a Carlos, e não a sua firma individual, pois, como visto, é ele o sujeito da relação jurídica material e processual em exame.
Ressalte-se que entendimento contrário violaria a boa fé processual, visto que, nos termos da sentença proferida nos autos do processo n. 2000.01.1.033775-8, que tramitou perante a 8ª Vara Cível de Brasília (fls. 40/44), referente à ação em que também se pretendia à anulação dos mencionados negócios jurídicos, houve um entendimento equivocado de que a referida firma individual seria uma pessoa jurídica, uma empresa e, ainda, distinta do empresário individual Carlos, razão pela qual o processo foi extinto sem resolução do mérito, por carência de ação.
Ante o exposto, rejeito as preliminares.
DA PRELIMINAR DE COISA JULGADA
Os réus alegam a ocorrência de coisa julgada, uma vez que a matéria debatida nos autos já foi apreciada nos processos n.º 2000.01.1.033775-8 e n.º 2001.01.1.123943-8.
A teor do artigo 301, §§ 2º e 3º, do CPC(2) , a coisa julgada ocorre entre ações idênticas, isto é, que possuem as mesmas partes, causa de pedir e pedido.
O processo n.º 2001.01.1.123943-8, que tramitou perante a 19ª Vara Cível de Brasília, versou sobre ação reivindicatória com pedido de imissão de posse proposta em face da autora (fls. 391/415). Logo, não há coisa julgada, visto que não há identidade de partes, de causa de pedir e de pedido dessa demanda reivindicatória com os elementos da ação em exame, na qual se pretende a anulação de atos e negócios jurídicos.
Ademais, não faz coisa julgada o exame feito apenas incidentalmente acerca da questão referente às alegadas simulações, por ocasião da fundamentação da sentença proferida no processo n.º 2001.01.1.123943-8, nos termos do art. 469 do CPC(3) .
Por sua vez, o processo n.º 2000.01.033775-8, que tramitou perante a 8ª Vara Cível de Brasília (fls. 361/365), foi extinto sem resolução do mérito e, portanto, fez coisa julgada apenas formal, o que não impede que o autor intente novamente a ação (art. 268, CPC(4) ).
Rejeito a preliminar.
DO MÉRITO
O autor propôs a ação em exame visando anular os atos e os negócios jurídicos especificados na emenda à inicial, para ter de volta o imóvel neles indicado, a saber: 1) cessão de direitos aquisitivos sobre o imóvel, na qual figurou como cedente, celebrada com o réu Geraldo, assim como o respectivo recibo de quitação (20/07/1998 - fls. 16/19); 2) cessão de direitos aquisitivos sobre o imóvel citado celebrada entre o réu Geraldo e o réu Márcio, este na qualidade de cessionário, assim como o respectivo recibo de quitação (10/12/1998 - fls. 22/24); 3) cessão de direitos aquisitivos sobre o imóvel citado celebrada entre o réu Márcio e o réu Gilmar, este na qualidade de cessionário, assim como o respectivo recibo de quitação (13/05/1999 - fls. 22/23, fls. 57); 4) cessão de direitos aquisitivos sobre o imóvel citado celebrada entre o réu Gilmar e a ré Multgraf, esta na qualidade de cessionário, assim como o respectivo recibo de quitação (20/07/1999 - fls. 30/32); 5) cessão de 32, 50% dos direitos aquisitivos sobre o imóvel citado celebrada entre os réus Luiz e Leny e o réu Carlos, este na qualidade de cessionário (19/12/2001 - fls. 33/35); 6) procuração por instrumento público outorgada por seu representante ao réu Aristides com poderes para negociar o referido imóvel (20/01/1998 - fls. 20), assim como o substabelecimento outorgado por este ao réu Aotamiram (17/07/1998 - fls. 21), aquele outorgado por Aotamiram ao réu Márcio (fls. 16/11/1998 - fls. 25), aquele outorgado por Márcio ao réu Gilmar (27/09/1999 - fls. 29).
O juiz pronunciou a decadência do direito do autor, porque decorridos mais de quatro anos entre data da propositura da demanda (01/08/2003) e aquela em que foi celebrada a cessão de direitos celebrada entre ele e o réu Geraldo (20/07/1998), da qual decorreram os demais atos e negócios jurídicos (art. 178, § 9º, V, "b", do CC/1916).
O autor apela ao argumento de que os efeitos da cessão de direitos simulada com o réu Geraldo somente foram produzidos a partir de outubro de 1999, quando deixou de adimplir o pagamento das prestações referentes ao empréstimo feito com esse réu.
Todavia, razão não lhe assiste, porque, de acordo com a cláusula 3ª do instrumento de cessão de direitos (fls. 17/19), a eficácia desse negócio jurídico foi imediata, não tendo sido estipulado sua sujeição a nenhum termo inicial (art. 125, CC/2002(5) ) ou condição suspensiva (art. 131, CC/2002(6) ).
Saliente-se que, em razão do acolhimento da prejudicial de mérito consistente na decadência, ficou prejudicado o exame das demais matérias de mérito.
Convém ressaltar, ainda, que não se desconhece que o instituto da simulação foi modificado com o advento do novo Código Civil, não mais se configurando causa de anulabilidade do negócio jurídico, mas sim de nulidade, razão pela qual pode ser conhecida a qualquer tempo, até de ofício, visto tratar-se de matéria de ordem pública.
Contudo, não é possível a aplicação desse novo regime jurídico da simulação ao caso dos autos. Isso porque, de acordo com o art. 2.035 do CC/2002(7) , tratando-se de questão afeta à validade dos atos e negócios jurídicos constituídos antes da entrada em vigor do novo Código Civil, a exemplo do que ocorre com a simulação, deve se obedecer ao disposto no Código Civil de 1916.
Observa-se que todos os atos e negócios jurídicos especificados pelo autor na emenda à inicial (fls. 52/56) e que se pretende anular foram constituídos antes da vigência do novo Código Civil.
Assim, a teor do art. 2.035 do Código Civil de 2002, para se examinar a validade deles, devem ser observadas as regras do Código Civil de 1916, em especial aquelas previstas nos artigos 147, II, e 178, § 9º, V, "b", que disciplinam a simulação como causa de anulabilidade do negócio jurídico e sujeitam a respectiva ação anulatória ao prazo decadencial de 4 (quatro) anos, a contar do dia em que se realizou o ato ou o contrato.
Por fim, ausente a litigância de má-fé, como assevera um dos réus em contrarrazões, porque a conduta imputada ao autor não se subsume a nenhuma das hipóteses taxativamente previstas no art. 17 do CPC(8) .
A condenação a esse título não pode ser fundada em meras presunções, exigindo-se a demonstração de que tenha havido intuito ilegítimo. Contudo, no caso, o autor apenas exerceu seu direito de ação, assegurado constitucionalmente (CF/88, art. 5º, XXXV), limitando-se a desenvolver tese jurídica em seu favor, circunstância que não faz concretizar qualquer das hipóteses do art. 17 do Código de Processo Civil. Depois, o fato de a apelação apresentar argumentos frágeis, por si só, não induz má fé ou intuito protelatório do ato de recorrer do autor.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.
É como voto.
A Senhora Desembargadora ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO - Revisora
Cabível e tempestivo o recurso, dele conheço, atendidos que se encontram os demais pressupostos de admissibilidade.
Trata-se de apelação de sentença que pronunciou a decadência do direito do autor para anular a cessão de direitos do imóvel descrito na exordial, ao fundamento de que o negócio jurídico fora celebrado em 20/07/1998, tendo se completado o prazo decadencial em 20/07/2002.
Irresignado, o autor apela (fls. 651/656). Alega que os efeitos da cessão de direitos somente foram gerados a partir de 1999 e não na data da celebração da referida cessão, uma vez que, em verdade, o documento foi outorgado, juntamente com o recibo de R$ 180.000,00 e a procuração pública, como garantia de um empréstimo de R$ 45.000,00.
Afirma que a simulação da venda do imóvel, supostamente recebido em garantia, só ocorreu quando deixou de adimplir as prestações do empréstimo, a partir de outubro de 1999; defendendo que o prazo de decadência teria se completado em outubro de 2003, o que afastaria a decadência, visto que a demanda foi proposta em 01/08/2003.
Reitera os argumentos lançados na inicial, aduzindo que "a cessão de direito e o recibo de venda foram firmados tão somente como garantia do empréstimo contraído pela apelante, junto ao primeiro apelado, como também que os negócios entabulados entre os apelados foram simulados com o fim de maliciosamente tomarem o imóvel do apelante".
De inicio, aprecio as preliminares suscitadas pelos apelados em sede de contrarrazões.
Afirmam os apelados que a firma individual Carlos José Batista Cardoso ME foi extinta antes da propositura desta demanda, restando patente a ilegitimidade do autor para compor a lide.
É de se ver que a denominação da firma individual é mera ficção jurídica, criada com o propósito de habilitar a pessoa física a praticar atos de comércio.
Com efeito, não há que se falar em pessoa jurídica e, consequentemente, em ilegitimidade, uma vez que a firma individual se confunde com a pessoa física, tanto que não existe separação entre o patrimônio da empresa e do titular, daí a responsabilidade ilimitada.
Os apelados aduzem a ocorrência de coisa julgada, informando que a matéria tratada nos presentes autos já foi analisada nos processos 2001 01 1 123943-8 e 2000 01 1 033775-8.
Ocorre a coisa julgada quando se repete demanda cujo mérito já foi decidido em feito anterior, por sentença da qual não caiba mais recurso. Os elementos identificadores da demanda, que permitem aferir se uma proposta é idêntica à anterior, são as partes, a causa de pedir e o pedido. Fala-se, a propósito, da tríplice identidade: eadem personae, eadem res e eadem petendi.
No caso dos autos, é de se ver que a ação reivindicatória com pedido de imissão na posse (processo nº 2001 01 1 123943-8) não estampa nenhuma identidade com a presente ação.
Por outro lado, o outro processo referido (2000 01 1 033775-8) foi extinto sem resolução de mérito, o que impede a formação da coisa julgada material.
Nesse passo, não verifico a presença de pressuposto processual negativo.
Afasto as preliminares.
No mérito, a despeito das doutas razões expendidas pelo nobre causídico, o recurso não merece ser provido.
A cessão de direitos que o apelante objetiva que se declare a nulidade, apontando simulação, ocorreu em 20/07/1998 (fls. 17/19).
Aplicam-se, portanto, ao caso, as regras do Código Civil de 1916, que determina o prazo decadencial de quatro anos, a contar do dia em que se realizou o ato.
Não havendo condição suspensiva, uma vez que, no contrato, há estipulação expressa determinando a eficácia imediata do negócio jurídico, não merece guarida a tese defendida pelo apelado de que a simulação da venda do imóvel, supostamente recebido em garantia, só teria ocorrido quando deixou de adimplir as prestações do empréstimo, a partir de outubro de 1999.
É certo que o apelante poderia ter obstado a consumação da decadência com a propositura da ação, mas optou por se manter inerte, propondo-a em 01/08/2003, após o implemento do prazo decadencial. Destarte, correta a sentença que declara a decadência, porquanto caracterizada está a caducidade do direito.
Trago a colação aresto desta Corte que prestigia a tese perfilhada:
"ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JÚRIDICO - SIMULAÇÃO - PROCURAÇÃO - DECADÊNCIA - CÓDIGO CIVIL DE 1916 - PREJUDICIAL DE MÉRITO - OITIVA DE TESTEMUNHAS - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - JUSTIÇA GRATUITA.
1 - Se a procuração foi firmada na vigência do Código de Civil de 1916, a ação para anular o negócio jurídico por vício de vontade deve ser ajuizada dentro do prazo de 4(quatro) anos, conforme preconizava o artigo o artigo 178, § 9º, X, alínea "b" do referido Diploma Legal.
2 - A decadência ou a prescrição devem ser obrigatoriamente apreciadas antes do saneamento do processo, ou antes mesmo da audiência.
3 - Mesmo a parte beneficiária da justiça gratuita deve suportar as custas processuais e honorários advocatícios, sujeitando-se, portanto, ao princípio da sucumbência. Fica, contudo, sobrestada nos termos do artigo 12 da Lei 1.060/50.
4 - Apelo provido parcialmente." (20050710118617APC, Relator SANDRA DE SANTIS, 6ª Turma Cível, julgado em 15/08/2007, DJ 20/09/2007 p. 123)
Em sede de contrarrazões o apelado, Geraldo Vilela Couto, alega que o recurso é manifestamente protelatório, pugnando pela condenação do apelado por litigância de má-fé.
Sem razão.
Examinando os autos, o que se observa é que o apelante valeu-se do direito subjetivo de ação, utilizando-se dos meios processuais disponíveis a fim de defender o direito que acredita ser possuidor e essa conduta, ressalto, não caracteriza o improbus litigator.
É que a litigância de má-fé, conforme vasto entendimento, há de ser comprovada, não podendo ser simplesmente presumida. As penalidades previstas nos artigos 16 e 18 do CPC somente são aplicadas quando restar patente prova no sentido de que a parte agiu nos moldes do art. 17 do aludido codex. Não havendo qualquer prova nesse sentido, não se configura litigância de má-fé.
ANTE O EXPOSTO, nego provimento ao recurso.
É como voto.
O Senhor Desembargador OTÁVIO AUGUSTO - Vogal
Com o Relator.
DECISÃO
REJEITADAS AS PRELIMINARES. NEGOU-SE PROVIMENTO AO RECURSO. DECISÃO UNÂNIME .
DJ-e: 17/03/2010
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1 - COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, v.3. São Paulo: Saraiva, 2005. [Voltar]
2 - "Art. 301. Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar: Omissis. § 2o Uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido. § 3o Há litispendência, quando se repete ação, que está em curso; há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso". [Voltar]
3 - "Art. 469. Não fazem coisa julgada: I - os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença; II - a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença". [Voltar]
4 - "Art. 268. Salvo o disposto no art. 267, V, a extinção do processo não obsta a que o autor intente de novo a ação. A petição inicial, todavia, não será despachada sem a prova do pagamento ou do depósito das custas e dos honorários de advogado". [Voltar]
5 - "Art. 125. Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva, enquanto esta se não verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa". [Voltar]
6 - "Art. 131. O termo inicial suspende o exercício, mas não a aquisição do direito". [Voltar]
7 - "Art. 2.035. A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2.045, mas os seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de execução". [Voltar]
8 - "Art. 17. Reputa-se litigante de má-fé aquele que: I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; II - alterar a verdade dos fatos; III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal; IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo; V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; VI - provocar incidentes manifestamente infundados; VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório". [Voltar]
JURID - Empresário individual. Capacidade de ser parte. [13/04/10] - Jurisprudência
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