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sexta-feira, 11 de junho de 2010

JURID - Salário "por fora". [11/06/10] - Jurisprudência


Salário "por fora".

Tribunal Regional do Trabalho - TRT3ªR

Processo: 01393-2009-042-03-00-0 RO

Data de Publicação: 11/06/2010

Órgão Julgador: Primeira Turma

Juiz Relator: Juiz Convocado Cleber Lucio de Almeida

Juiz Revisor: Des. Manuel Candido Rodrigues

Ver Certidão

RECORRENTE: BEIJA FLOR COMÉRCIO DE TINTAS LTDA.

RECORRIDO: ULISSES MAIA DE MOURA

EMENTA: SALÁRIO "POR FORA". Tratando a demanda de pedido de pagamento de diferenças decorrentes de salário "por fora", há que se considerar a dificuldade da prova, em razão das circunstâncias em que, normalmente, algumas empresas adotam tal prática. Dessa forma, havendo elemento capaz de demonstrar a veracidade das alegações do empregado de que recebia salário que era pago extra-folha, deve ser deferido o pleito inicial.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recurso ordinário, interposto contra decisão proferida pelo MM. Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Uberaba, em que figuram: como recorrente, BEIJA FLOR COMÉRCIO DE TINTAS LTDA. e, como recorrido, ULISSES MAIA DE MOURA.

RELATÓRIO

O MM. Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Uberaba, pela sentença de f. 138/154, cujo relatório adoto e a este incorporo, julgou procedentes, em parte, os pedidos formulados, para condenar a reclamada a pagar ao reclamante: a) diferenças de aviso prévio; férias acrescidas de um terço dos períodos de 2006/2007, 2007/2008 e 8/12 de férias proporcionais de 2008/2009, acrescidas de 1/3; 13º salário e FGTS de todo o período laborado, bem como a multa de 40%; b) adicional de insalubridade em grau máximo durante todo o período laborado, sobre o piso da categoria, com reflexos em aviso prévio, férias + 1/3, décimo terceiro, FGTS, bem como na multa de 40% e c) honorários advocatícios no percentual de 20% sobre o valor do montante da execução. Condenou, ainda, a reclamada a pagar os honorários periciais, no importe de R$1.000,00.

Opostos embargos de declaração pela reclamada (f. 155/157), estes foram julgados improcedentes, nos termos da decisão de f. 158/159.

Inconformada, a reclamada interpôs recurso ordinário, às f. 160/174, insurgindo-se contra a sentença que lhe condenou ao pagamento de diferenças salariais decorrentes do pagamento extra-folha, de adicional de insalubridade, em grau máximo, que corresponderá a 40% do piso da categoria do reclamante, honorários periciais e honorários advocatícios.

Contrarrazões do reclamante às f. 179/181.

Tudo visto e examinado.

VOTO

ADMISSIBILIDADE

Conheço do recurso interposto pela reclamada, porquanto satisfeitos os pressupostos objetivos e subjetivos de sua admissibilidade.

Conheço também das contrarrazões, tempestivas e subscritas por procurador regularmente constituído nos autos.

MÉRITO

Salário "por fora"

A reclamada insurge-se contra a sentença que a condenou ao pagamento de diferenças salariais decorrentes do pagamento extra-folha. Sustenta que o reclamante não se desincumbiu do ônus da prova na presente demanda, inexistindo prova de que havia pagamento de salário "por fora".

Sem razão, contudo.

O reclamante alegou, na inicial, que recebia remuneração no valor de R$537,84 (valor anotado na CTPS) acrescida de R$500,00, salário "por fora", perfazendo uma média de R$1.000,00 mensais.

A reclamada, por sua vez, contestou tal alegação, afirmando ser esta absurda e inaceitável. Afirma que é ônus do empregado comprovar a existência e o valor dos pagamentos "por fora", os quais devem ser cabalmente comprovados.

É certo que o recebimento de salário extra-folha garante ao obreiro a projeção de tais verbas, para todos os fins.

Trata-se de prova extremamente difícil, cabendo ao julgador buscar, através das provas admitidas, pelo menos, algum indício capaz de autorizar o deferimento do pedido.

Nesse sentido é o entendimento jurisprudencial:

"SALÁRIO 'EXTRAFOLHA' - COMPROVAÇÃO. Considerando as circunstâncias com que o salário 'extrafolha' é, usualmente, pago pela empregadora, há que se considerar as dificuldades que norteiam a prova de sua existência em juízo. Se os elementos e circunstâncias dos autos geram convicção quanto à percepção de valor salarial 'por fora' pela reclamante, inclusive sendo colacionadas cópias de outros julgados reconhecendo tal prática, nos estabelecimentos da reclamada, torna-se imperiosa a declaração de seu recebimento pela autora, para os devidos fins legais, inclusive quitação de reflexos, como componente da base de cálculo de outros direitos trabalhistas" (TRT 3ª Reg. - RO- 15023/99 - 4ª T. - Rel. Juíza Lucilde D'Ajuda Lyra de Almeida - Publ. MG. 01.04.00).

A configuração do salário "por fora" pode ser comprovada através de prova testemunhal, desde que se apresente legítima e fidedigna e, isso, ocorreu no presente caso.

Com efeito, os elementos dos autos autorizam concluir pela existência de pagamento de salário extra-folha, como alegado na peça inicial.

De fato, a testemunha indicada à oitiva pelo reclamante confirmou a tese de que os empregados da reclamada recebiam salários "por fora".

No aspecto, a testemunha Leandro Martins Sen afirmou que: "trabalhou na reclda de 26/05/2008 a 25/04/2009, na função de preparador de tinta; o depoente percebia salário de R$1.000,00, mas era anotado na CTPS o salário contratual por volta de R$530,00; no primeiro mês de trabalho do depoente, percebeu remuneração bruta de R$800,00, sendo que o salário fixo era por volta de R$400,00 e pouco reais; o reclte percebia por volta de r$1.000,00 por mês, sendo que o salário base era por volta de R$530,00; o depoente presenciou o reclte recebendo essa importância durante todo o período em que trabalhou na reclda; o pagamento de todos os funcionários não era feito de forma individualizada; todos visualizavam o valor que os outros colegas estavam recebendo; todos os funcionários assinavam recibo referente à parcela extrafolha; a parcela extrafolha era paga em dinheiro; e a parcela fixa era depositada em banco" (f. 135/136).

Já a testemunha da reclamada, Sra. Fabiana Alves Vilela Ferreira, revelou que "não sabe informar o valor médio da remuneração mensal do reclte; também não sabe informar a forma de composição da forma de remuneração do reclte;nunca presenciou a ocorrência de pagamento de funcionários da empresa; os funcionários assinavam os recibos de pagamento durante a jornada de trabalho" (f. 136).

Quanto ao valor do salário, considero correta a r. sentença, que acolheu como verdadeira a importância de R$1.000,00 (um mil reais) mensais, em média, indicada na inicial, uma vez que tal importância fora confirmada pela testemunha do reclamante. Ressalta-se que a testemunha da reclamada nada sabia informar sobre a remuneração do autor, de forma que seu depoimento não foi capaz de afastar a pretensão obreira.

Por fim, cumpre observar que o MM. Juiz a quo, ao colher os depoimentos das partes e das testemunhas, está em posição privilegiada inclusive para observar manifestações inconscientes dos depoentes, as quais contribuem para lhes revelar a verdadeira realidade dos fatos. Assim, se o Magistrado prolator da sentença entendeu valorar o depoimento de determinada testemunha, no auxílio da formação de sua convicção, acolhe-se sua percepção e segue-se o entendimento por ele esposado.

Nada a prover.

Base de cálculo do adicional de insalubridade

A recorrente se mostra inconformada com a condenação ao pagamento do adicional de insalubridade, em grau máximo, calculado sobre o piso da categoria. Sustenta, em suma, que este deve incidir sobre o salário mínimo.

Assiste-lhe razão.

Em relação à base de cálculo do adicional cumpre esclarecer que, promulgada a Constituição Federal de 1988, foi questionada a recepção da parte final do art. 192 da CLT. O questionamento decorre do fato de que, enquanto o art. 192 da CLT, na sua parte final, define o salário mínimo como base de cálculo do adicional de insalubridade, a Constituição Federal de 1988, no art. 7o, inciso IV, proíbe a vinculação do salário mínimo "para qualquer fim".

É inegável a incompatibilidade entre a parte final do art. 192 da CLT e o art. 7o, inciso IV, da Constituição Federal, porquanto a vedação da vinculação do salário mínimo "para qualquer fim" permite afirmar que a intenção do constituinte foi impedir a vinculação do salário mínimo aos ganhos auferidos pelos trabalhadores, dentre eles o adicional de insalubridade. Significa dizer que a parte final do art. 192 da CLT não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, perdendo, portanto, o seu fundamento de validade.

A questão foi levada ao Supremo Tribunal Federal (STF), que editou a Súmula Vinculante n. 4, in verbis: "Salvo os casos previstos na Constituição Federal, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou empregado, nem ser substituído por decisão judicial".

De acordo com a Súmula Vinculante n. 4, o salário mínimo não pode ser usado como base de cálculo do adicional de insalubridade, o que significa expresso reconhecimento da inconstitucionalidade da parte final do art. 192 da CLT.

Em razão da Súmula Vinculante n. 4, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) alterou a redação da sua Súmula n. 228, definindo como base de cálculo do adicional de insalubridade o salário básico do empregado, salvo critério mais vantajoso estabelecido por meio da negociação coletiva.

Contudo, a Súmula n. 228 do Tribunal Superior do Trabalho teve a sua aplicação suspensa por liminar deferida nos autos da Reclamação Constitucional n. 6.266, sob o argumento de que a Súmula do TST permitia a substituição do salário mínimo pelo salário básico no cálculo do adicional de insalubridade sem base normativa. Liminares no mesmo sentido foram proferidas nos autos das Reclamações ns. 6.275 e 6.277.

As liminares deferidas têm em conta a parte final da Súmula Vinculante n. 4 do STF, que impede a definição da base de cálculo do adicional de insalubridade por decisão judicial. Sob esta ótica, somente por meio da lei ou da negociação coletiva poderá ser definida a nova base de cálculo do adicional de insalubridade.

Considerando que no Estado Democrático de Direito ao juiz é vedado criar normas jurídicas, a parte final da Súmula Vinculante n. 4 do STF não merece reparos.

No entanto, cumpre ter presente que criar norma jurídica não se confunde com aplicar uma norma jurídica existente a uma situação concreta similar àquela disciplinada pelo legislador. É em razão desta distinção, inclusive, que o art. 126 do CPC e o art. 8º da CLT autorizam o juiz a recorrer à analogia para suprir eventual omissão do Direito.

Na verdade, a integração do Direito, quando verificada a sua omissão, se impõe ao juiz, uma vez que a ele é vedado deixar de sentenciar ou despachar alegando lacuna da lei (art. 126 do CPC e arts. 8º e 769 da CLT).

Assim, verificando, no julgamento do pedido de adicional de insalubridade, a existência da lacuna do Direito do Trabalho (com a declaração da sua inconstitucionalidade, a parte final do art. 192 da CLT é excluída do ordenamento jurídico) o juiz tem o dever de, para supri-la, recorrer à analogia, ou seja, às normas que tratem de situação similar ao caso concreto a ser julgado.

E qual seria a base de cálculo definida por lei que poderia ser aplicada ao adicional de insalubridade? A resposta está no art. 193, § 1o, da CLT, que aponta como base de cálculo do adicional de periculosidade o salário do trabalhador, sem acréscimo resultante de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa.

Assim, aplicando-se à hipótese, por analogia, o art. 193, § 1o, da CLT, pode ser dito que, diante da inconstitucionalidade do art. 192, parte final, da CLT e sua exclusão do ordenamento jurídico, o adicional de insalubridade passa a ter como base de cálculo o salário contratual do trabalhador, livremente pactuado pelas partes ou estabelecido em acordo ou convenção coletiva, sem acréscimo resultante de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa.

Esta solução não significa criação de uma nova base de cálculo para o adicional de insalubridade por decisão judicial, mas a aplicação de uma base de cálculo já consagrada pelo legislador a uma situação similar carente de regulamentação legislativa, valendo observar que o art. 7o, inciso XXIII, da Constituição Federal assegura aos trabalhadores o direito ao recebimento de adicional de remuneração no caso de labor em condições insalubres e perigosas, sem fazer distinções entre eles, o que significa que a Constituição da República trata as duas situações - trabalho insalubre e trabalho perigoso - da mesma forma, aparecendo aí a identidade de ratio legis que autoriza o recurso à analogia.

No entanto, esta Eg. Turma julgadora tem entendido que a base de cálculo do adicional de insalubridade é o salário mínimo, pois, ainda que reconhecida a inconstitucionalidade do art. 192, da CLT - e, por conseguinte, da própria Súmula 228, do TST -, tem-se que a parte final da Súmula Vinculante n. 4, do STF não permite criar critério novo por decisão judicial.

Diante disso, ressalvado o ponto de vista deste Relator, dou parcial provimento ao apelo, neste particular, para determinar que a base de cálculo do adicional de insalubridade seja o salário mínimo.

3- Honorários periciais

Pugna a reclamada pela redução dos honorários periciais, sustentando que o valor arbitrado é exorbitante, ferindo o princípio da razoabilidade.

Não merecem redução os honorários periciais fixados em R$1.000,00, valor condizente com as despesas e tempo gastos pelo perito para execução do laudo, bem como com a complexidade da perícia.

Ademais, esta d. Turma firmou jurisprudência no sentido de que a fixação dos honorários periciais no montante de R$ 1.000,00 (um mil reais) é bastante e suficiente para remunerar condignamente o expert, cumprindo, ainda, a função de ressarci-lo por eventuais despesas decorrentes da perícia, inclusive com transporte, nos deslocamentos.

Nego provimento.

4- Honorários advocatícios

Data venia do entendimento explicitado pelo MM. Juízo a quo, a condenação aos honorários advocatícios não pode prevalecer.

É indevido o pagamento de honorários advocatícios, tendo em vista que, nas lides decorrentes de relação de emprego, a parcela somente é devida quando preenchidos os requisitos previstos no artigo 14 da Lei n. 5.584/70 e na Súmula 219/TST, ou seja, a situação de miserabilidade do reclamante e a assistência pelo sindicato de sua categoria profissional.

A alteração da competência da Justiça do Trabalho para apreciar lides envolvendo relações de trabalho não modificou a disciplina do pagamento dos honorários advocatícios no processo trabalhista fixada nos moldes da Lei n. 5.584/70. Ainda vigora nesta Justiça o jus postulandi, mantendo-se, assim, a atribuição exclusiva do sindicato profissional para prestar a assistência judiciária. Demais, a Súmula 329/TST firmou o entendimento de que ainda se mantém o posicionamento da Súmula 219/TST, em face da Constituição de 1988.

Ressalta-se que o art. 404 do Código Civil tem não aplicação na seara laboral por ausência de omissão, diante da citada norma que vigora nesta Especializada (arts. 8º e 769, ambos da CLT). O preceito contido no Código Civil constitui uma indenização de direito material com o fito exclusivo de recompor o patrimônio do lesionado. Assim, os arts. 389, 402 e 404 do Código Civil não têm o alcance de consagrar o princípio da sucumbência no processo do trabalho, representando uma indenização de direito material com vistas a recompor o patrimônio do lesionado.

Portanto, provejo o recurso, neste aspecto, para excluir a condenação da reclamada no pagamento de honorários advocatícios no percentual de 20% sobre o valor do montante da execução.

ISTO POSTO, dou provimento parcial ao recurso para: a) determinar que a base de cálculo do adicional de insalubridade seja o salário mínimo; b) excluir a condenação da reclamada no pagamento de honorários advocatícios.

Mantenho o valor da condenação, por compatível.

FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela sua Primeira Turma, preliminarmente, à unanimidade, conheceu do recurso; no mérito, sem divergência, deu-lhe provimento parcial para: a) determinar que a base de cálculo do adicional de insalubridade seja o salário mínimo; b) excluir a condenação da reclamada no pagamento de honorários advocatícios. Mantido o valor da condenação, por compatível.

Belo Horizonte, 07 de junho de 2010.

CLÉBER LÚCIO DE ALMEIDA
Juiz Convocado




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