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terça-feira, 14 de julho de 2009

JURID - Condenado motorista embriagado. [14/07/09] - Jurisprudência


Justiça condena motorista que, embriagado, provocou acidente e mortes


Autos n° 040.04.003120-9
Ação: Ação Penal - Especial/Especial
Autor:
Justiça Pública
Acusado: Antônio Neumann

Vistos, etc.

O Órgão do Ministério Público, em exercício neste Juízo, no uso de suas atribuições legais, com base no auto de prisão em flagrante, ofereceu denúncia contra Antônio Neumann, qualificado nos autos, dando-o como incurso, nas sanções do art. 302, caput (seis vezes), e art. 306, todos da Lei 9.503/97, c/c art. 69 do Código Penal pelos seguintes fatos delituosos:

"No dia 20 de agosto de 2004, por volta das 15:30 horas, o denunciado, motorista profissional, conduzindo um caminhão de placa MCZ 4429 - SC, chassi 9BW2M82T44R403294, marca VW, modelo 23220, ano 2003, de propriedade da C&A Administradora de Bens, embriagado conduziu seu veículo sem a atenção devida, no KM 303 da BR 101, neste município, abalroando um veículo e ocasionando o "engavetamento" de diversos outros (ver Boletim de Acidente da Polícia Rodoviária Federal), que estavam parados em uma fila na pista de rolamento.

O sinistro resultou na morte de Sirlei Giordani Rafagnin, Paula Giordani Rafagnin, Iuri Campana, Altemir Rafagnin, Rodrigo Krischeldorf e Guilherme Locatelli Rafagnin."


Concluiu o Ministério Público requerendo a citação do denunciado para se ver processado, produzir defesa e, ao final, sua condenação nas penas correspondentes aos crimes cometidos.

Com a denúncia vieram o inquérito policial, e rol de testemunhas.

Anexados ao inquérito policial estão o laudo de dosagem alcoólica (fl. 50), laudos de exames cadavéricos (fl. 51/56) e laudo pericial dos discos diagramas de tacógrafo (fls. 118/128).

Recebida a denúncia, foi determinada a expedição de carta precatória para realização da citação e interrogatório do réu (fl. 04).

Posteriormente, foi deferida a habilitação de assistente de acusação no feito (fl. 135).

O acusado não foi localizado no momento da citação, sendo tal fato considerado como quebra de fiança, ensejando a expedição de mandado de prisão (fls. 143/144).

Na sequência, foi o acusado citado por edital e não tendo comparecido a audiência de interrogatório foi determinada a suspensão do processo nos termos do art. 366 do CPP (fls. 150).

O acusado através de seu defensor constituído compareceu ao feito justificando sua ausência nos atos anteriormente praticados e requerendo o restabelecimento da liberdade provisória. O pedido foi deferido com base nos documentos carreados pelo acusado, consoante incidente em apenso.

Designada data o acusado foi interrogado às fls. 157/158 e apresentou defesa prévia (fl. 160), a qual veio acompanhada de rol de testemunhas (fl. 160/165). Ainda em peças apartadas o acusado postulou pela realização de várias diligência, cujo pedido restou indeferido às fl. 185.

Durante a instrução probatória foram inquiridas cinco testemunhas de acusação (fls. 186/187, 194, 205/206, 213 e 215), e quatro testemunhas de defesa (fl. 232/235 e 238).

Na fase do art. 499 do Código de Processo Penal, o Ministério Público requereu a atualização dos antecedentes criminais do acusado, o que restou atendido às fls. 241/242). Já o acusado requereu a expedição de ofício para as empresas PEDRO MUFATO & CIA LTDA e DIRECTA AUTOMAÇÃO LTDA, solicitando informações, o que foi deferido, cujas respostas foram juntadas às fls. 255/261), das quais foram dadas vistas à defesa, que disse nada ter a requerer (fls. 266).

Em alegações finais, o Ministério Público postulou pela condenação do réu e aplicação do aumento de pena previsto no art. 70 do CP em grau máximo, em virtude do número de vítimas.

O Assistente de Acusação, apesar de intimado deixou de apresentar suas alegações finais.

A defesa, ao apresentar suas alegações finais, postulou pela absolvição do acusado com base no art. 386, inciso VI do CPP, suscitando ausência de provas em relação a autoria, afirmando que em momento algum as testemunhas afirmaram que o acusado foi o responsável pela colisão. Insurgiu-se contra os depoimentos das testemunhas e provas carreadas ao inquérito policial, especialmente, àquelas relacionadas a embriaguês afirmando que apresentam elas índices diferentes, bem como, que o exame de bafômetro não possui o nome do acusado e o exame de laboratório foi carreado ao feito uma cópia e não o original. Também discorreu sobre a perícia dos tacógrafos afirmando que estes não pertenciam ao veículo conduzido pelo acusado que incendiou-se. Aduzindo que a prova indiciária não pode servir para fundamentar a decisão. Afirmou também a defesa que o acusado não estava dirigindo sob influência de álcool e que não há prova robusta de que a pista estivesse sinalizada, ou ainda, de que tenha sido o acusado o causador do acidente, pois seu caminhão poderia ter apresentado defeito.

Requereu, ao final, a absolvição e em caso de entendimento diverso a aplicação do benefícios previstos em Lei, especialmente, o disposto no art. 54, do Código Penal.

É o relatório.

DECIDO.

Trata-se de ação penal pública incondicionada movida pelo Ministério Público contra Antônio Neumann, o qual é acusado da prática dos crimes previstos nos arts. 302 (seis vezes) e 306, ambos do Código de Trânsito Brasileiro.

Para melhor compreensão faremos a análise dos delitos separadamente.

1 - Do Delito de Homicídio Culposo

Dispõe o artigo 302 do Código de Trânsito Nacional:

"Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:

Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor."


A materialidade emerge das declarações produzidas em ambas as fases procedimentais, bem como, através dos boletins de acidente de trânsito (fls. 36/49 e 60/73), exame laboratorial de teor alcoólico (fl. 50) e laudos periciais de exame cadavérico (fls. 51/56).

A autoria, por seu turno, é inconteste e aflora das declarações prestadas pelo próprio acusado tanto na fase policial quanto em juízo, bem como, pelos depoimentos das testemunhas e demais elementos de convicção que reunidos nos autos patenteiam a culpabilidade do mesmo no evento, senão vejamos:

O réu ao ser ouvido pela autoridade policial e na presença de seu defensor constituído na época, prestou as seguintes informações às fls. 07/08:

"Que, saiu da cidade de Meleiros/SC, com destino a Jaraguá do Sul/SC, com uma carga de arroz; Que, almoçou na cidade de Meleiros, por volta das 13:00 horas, onde 'bebeu uma cachaça daquelas grandes'; Que, seguiu pela BR 101, e quando por volta das 15:30 horas, num determinado trecho da BR 101, 'quando viu não deu mais tempo de frenar', acabou colidindo na traseira de um veículo que bateu no outro e, assim, sucessivamente; [...] Que, realizou o teste do bafômetro assim como também autorizou a colher material sangüíneo para exame; [...] Que, não é alcoólatra e uma vez ou outra é que toma 'umas cachaças antes do almoço' [...]" (grifo no original)

Em juízo o acusado prestou depoimento semelhante, tendo declarado às fls. 157/158:

"que no dia dos fatos estava fazendo a Rota Meleiro/Jaraguá do Sul/SC; que almoçou em um restaurante na cidade de Meleiro/SC; que somente teria ingerido um aperitivo na hora do almoço, a título de bebida alcoólica; que não sabe explicar porque seu exame de dosagem alcoólica apresentou nível muito superior ao permitido pela legislação de trânsito em vigor, se apenas teria tomado um aperitivo no almoço; que estava a três noites e meia sem dormir; que a sua empresa pediu para acelerar a viagem, uma vez que iria carregar ainda naquele dia na cidade de Jaraguá do Sul/SC; que carregou arroz na cidade de meleiro por volta das 11:00 horas; que após o almoço e ter rodado uma hora e meia, parou em um posto para verificar os pneus e esticar o corpo; que acerca do acidente só se recorda da colisão ocorrida em sua faixa de direção; que alega que não chegou a ver a fila de carros parados no momento do acidente. [...]; que se recorda que ocorreram seis mortes em decorrência do acidente; [...] que não lembra de ter visto sinalização de obras na rodovia ou viaturas da PRF; que as vezes toma um aperitivo na hora do almoço; que o aperitivo que se refere são as batidas oferecidas nos restaurantes de beira de estrada; [...] " (grifo nosso)

A testemunha Jader Bonfim da Silva, inquirido em juízo à fls. 186/187 declarou:

"que estava de plantão e recebeu o acusado em flagrante delito, o qual foi apresentado por policiais Rodoviários Federais; que esclarece que naquele dia recebeu o telefonema da PRF informando que havia ocorrido o acidente e solicitaram que fossem ao local para dar ajuda pois haviam várias vítimas; que o depoente foi ao local e chegou junto com os bombeiros, mas não havia nada a fazer pois as vítimas já haviam falecido; que se não se engana faleceram seis vítimas; que não recorda quantos veículos se envolveram no acidente mais eram mais de dez; que a informação era que de que estavam recapiando o asfalto e os veículos estavam parados quando o caminhão bateu atrás deles; que conversou com o acusado na Delegacia; que o acusado aparentava meio fora de si, meio grogue, meio aéreo; que a PRF já chegou com o exame alcoólico pronto; que o exame acusava embriagues; que tirou fotos do local do acidente; que pegou fogo em vários carros; que não recorda se o acusado saiu ferido do acidente; que viu um caminhão queimado, mas não recorda se era o do acusado; que tinha sinalização na pista indicando a inicialização das obras; que não sabe dizer se além dos falecidos tiveram vítimas com ferimentos, pois o fato não chegou a Delegacia; que o acidente ocorreu por volta de 17:30 horas; [...] que não assistiu o depoimento do acusado; que só perguntou a ele na cela se ele sabia aonde estava, se sabia o que tinha acontecido e em que cidade ele estava; que ele respondeu que não sabia; que não tinha consciência de onde estava; que os policiais não comentaram sobre a velocidade do caminhão; que ele comentou que tinha tomado umas cachaças no meio do caminho; que não chegou a verificar se tinha marca de frenagem na pista; que o tempo era bom e tinha sol. [...] que o acusado foi apresentado sozinho na Delegacia; que se não se engana foi apresentado somente teste do exame do bafômetro; que o depoente não esteve no hospital; que não ajudou a montar o inquérito; que o inquérito deve ter sido montado pelo escrivão [...]." (grifo nosso)

Claudemir Borges, Policial Rodoviário Federal, na fase judicial declarou às fls. 194:

"que foi chamado para auxiliar no atendimento das vítimas do acidente, não o tendo presenciado; que ao chegar no local o motorista do caminhão não mais se encontrava; que não se recorda de ter visto o réu submeter-se a exame de alcoolemia, mas o teste foi feito e lembra o depoente que o acusado estava embriagado, já que apresentava o hálito e 'todos os sintomas de alguém embriagado'; que morreram seis ou sete pessoas carbonizadas; [...] que lembra que o acidente ocorreu na parte da tarde e que o tempo era bom, já que havia obras na rodovia, 'sendo que quando o tempo não é bom não há obras'; que a pista estava bem sinalizada, indicando a existência de obras; [...]" (grifo nosso)

Inquirido acerca dos fatos declarou Maurício Amado às fls. 205:

"que o depoente é Policial Rodoviário Federal, lotado no Posto de Paulo Lopes; que participou do atendimento ao acidente ocorrido no dia 20/08/2004, ocasião em que 06 pessoas foram a óbito; que por ocasião dos fatos recorda-se o depoente que, o tráfego estava fluindo em meia pista no sentido norte/sul; que os veículos estavam parados e o caminhão conduzido pelo acusado colidiu na lateral de um automóvel chevette, veículo este que havia sido o primeiro a ser liberado para trafegar no sentido norte/sul, sendo que imediatamente após atingir esse chevette o caminhão do acusado colidiu contra a traseira do último veículo que estava parado na fila, portanto no sentido sul/norte; que a colisão foi muito forte e outros veículos que estava à frente do último também foram atingidos, de modo que pelo que se recorda o depoente, ocorreram vítimas não apenas naquele primeiro veículo da fila; [...] que o depoente se recorda que o acusado foi levado ao hospital de Laguna, pois também sofreu lesões e somente cerca de aproximadamente duas horas após os fatos é que se submeteu ao exame de 'bafômetro'; que quando ao mais, após a leitura do depoimento que prestou na fase policial o depoente confirma na íntegra os seus exatos termos." (grifo nosso)

A testemunha presencial dos fatos Peterson Silveira Francisconi, inquirido em juízo declarou à fl. 215:

"que no dia dos fatos, se dirigia no sentido sul-norte na BR-101, nas proximidades de Itapirubá/SC; que em razão de um recapeamento na rodovia, ficou parado em uma fila de carros; que havia sinalização e policiamento local; que, repentinamente, o carro do depoente foi atingido pelo impacto de outros veículos que estavam atrás; que um caminhão vinha no mesmo sentido e teria ocasionado o engavetamento de vários carros; que o depoente não viu o caminhão; que os dois carros que estavam atrás do depoente pegaram fogo, bem como mortos os integrantes dos referidos veículos; que o veículo do depoente chegou a pegar fogo. [...] que o impacto sofrido se deu em torno de 03 min. (três minutos) após a parada na fila pelo depoente; que observou os dois carros atrás do seu parados; que antes de o depoente se aproximar da fila de veículos, já havia Policiais na rodovia sinalizando a redução da velocidade. [...] que no dia dos fatos , o tempo estava 'bom'."

Verifica-se que o próprio acusado admitiu que no dia dos fatos ingeriu bebida alcoólica e que não viu os veículos parados à sua frente, tampouco, a sinalização no local indicando obras na pista, bem como, afirmou que estava sem dormir há cerca de 03 (três) noites e meia.

Portanto, sua responsabilidade pela colisão e consequente morte das seis vítimas, emerge dos autos sem sombra de qualquer dúvida, pois além de sua confissão temos ainda o fato de que a mesma encontra-se corroborada pelas testemunhas ouvidas e também pelos documentados e croquis de acidente de trânsito carreados ao feito, estes últimos elaborados pelos agentes de trânsito, dotado de presunção juris tantum de veracidade, devendo prevalecer ante a ausência a ausência de prova em sentido contrário.

Do mesmo modo, a imprudência empregada pelo acusado é latente e encontra-se também evidenciada nos autos, pela embriaguês e pela ausência de cautelas, eis que, como afirmou, dirigia há vários dias sem dormir. Além disso, ele próprio confessa que não percebeu a sinalização ao longo da pista, e sequer que o trânsito estava parado, vindo a colidir naqueles veículos parados à sua frente, no que resultou num acidente de grandes proporções, onde seis pessoas foram vitimadas.

Acrescente-se também, que ao contrário do que alega a defesa, a prova testemunhal demonstra de forma irretocável que no dia dos havia extensa sinalização ao longo da rodovia indicando obras na pista e recomendando a diminuição de velocidade, o que não foi observado e atendido pelo acusado que colidiu violentamente na traseira do último veículo parado na fila, causando com isso um grande engavetamento e incêndio em vários veículos. Tal fato, inclusive é confessado pela testemunha Pedro Pereira da Silva, arrolada pelo acusado, o qual inquirido em juízo disse expressamente: "(...) que trafegavam em uma reta, a uma velocidade aproximada de 50 Km/h pois havia placas indicando a existência de obras na rodovia (...)" (fls. 233).

Ainda no que concerne ao estado de embriaguês, apesar da insurgência da defesa, temos que o simples fato do acusado ter admitido que ingeriu bebida alcoólica, dizendo inclusive que "bebeu uma cachaça daquelas grandes" (fls. 07) e seguiu na direção de veículo automotor já seria suficiente para demonstrar sua culpabilidade, eis que é inequívoco que a bebida alcoólica retira ou retarda os reflexos e percepções do motorista, que no caso do acusado, já estavam prejudicados pelo fato dele estar sem dormir por vários dias.

Se tanto não bastasse há ainda nos autos prova escorreita da embriaguês, esta atestada pelo exame laboratorial de fl. 50, o qual atestou concentração de 1,26 g/l (grama por litro), valor este que convertido em decigrama equivale a 12,6 dg/l (decigramas litros), ou seja, nível superior ao permitido pela legislação vigente na época, que era de seis decigramas consoante disposto na Resolução n. 81, de 19 de novembro 1998 do CONTRAN.

É importante frisar, que o acusado autorizou a realização dos exames (bafômetro e laboratorial), os quais apresentaram níveis diferentes por óbvias razões, já que o primeiro foi realizado com base no ar expelido dos pulmões longo tempo após o acidente, e o segundo com base na análise do sangue coletado do acusado, sendo este último bem mais preciso, tratando-se portanto, de elemento de prova apto e válido a demonstrar a embriaguês. Quanto ao fato de ter sido juntada cópia do referido exame, tal não poderia ser diferente, eis que o mesmo foi requisitado por este juízo ao hospital local, o qual, por certo, não iria remeter o original, mas sim cópia daquele laudo que consta de seu prontuário.

Finalmente, é de se frisar que a embriaguez atribuída ao acusado também foi confirmada pelos depoimentos das testemunhas conforme já citado, bem como, pelo próprio acusado que admitiu a ingestão de cachaça, bebida destilada com alto teor alcoólico, consoante depoimentos colacionados nos autos.

No que concerne a alegação da defesa de que o inquérito policial encontra-se eivado de vícios e que por esta razão a prova indiciária não poderia ser utilizada para fundamentar a presente decisão, também não comporta acolhida, primeiro porque o inquérito é peça informativa e serve de subsídio para a deflagração da ação penal, sendo que eventual vício não tem o condão de contaminar o processo crime. Segundo porque, não se vislumbra qualquer vício ou nulidade no referido inquérito. Terceiro porque, as provas coletadas na fase indiciária encontram respaldo nas provas produzidas em juízo sob o crivo do contraditório e ampla defesa.

Ademais extrai-se da jurisprudência que "[...] havendo algum suporte probante na fase judicial, a prova colhida no inquérito policial pode ser convocada para fundamentar a decisão condenatória" (APR n. 34.493, da Capital, rel. Dr. Nilton Macedo Machado).

Ademais, o juiz goza do princípio do livre convencimento para escolher e avaliar as provas produzidas.

Sobre o tema decidiu-se:

"PENAL - ACIDENTE DE TRÂNSITO - DISPUTA ENTRE DOIS VEÍCULOS EM EXCESSO DE VELOCIDADE EM LOCAL INADEQUADO - ATROPELAMENTO DE TRANSEUNTE - DOLO EVENTUAL

"PROCESSUAL - PROVA - PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO - PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS - RECURSO DESPROVIDO

"Relativamente a análise e avaliação da prova, nosso Direito adotou o princípio do livre convencimento, baseado na fundamentação, lastreada nos autos do processo.

"Havendo critica sã, raciocínio lógico, em forma de silogismo, demonstrando o magistrado os motivos do convencimento, é o que basta.

"Assim, pode o julgador optar por declarações no inquérito, desde que corroboradas por elementos produzidos ao crivo do contraditório.

"Age com dolo eventual o condutor de veículo que disputa corrida com outro, em local inadequado, nas proximidades de região habitada, onde haja restaurantes, porquanto, conscientemente, assume o risco de danos pessoais a terceiros, principalmente transeuntes"
(Ap. crim. n. 99.012837-7, de Itajaí, rel.: Des. Amaral e Silva).

Assim temos que as provas reunidas no feito demonstram que no dia dos fatos o acusado guiava o caminhão da empresa onde trabalhava, sob influência de álcool e com reflexos e percepções alteradas, quando ignorou a sinalização ao longo da rodovia, vindo a colidir contra os veículos que estavam regularmente parados à sua frente, no que resultou num grande impacto, causando o engavetamento de veículos, onde vários deles pegaram fogo, resultando na morte das vítimas Sirlei Giordani Rafagnin, Paula Giordani Rafagnin, Iuri Campana, Altemir Rafagnin, Rodrigo Krischeldorf e Guilherme Locatelli Rafagnin.

Portanto, as vítimas tiveram suas vidas interrompidas pela conduta irresponsável e imprudente do acusado, o qual desrespeitou as leis e orientações de trânsito, ao guiar veículo automotor de grande porte, embriagado e por via de grande fluxo de veículos, vindo, em conseqüência, a causar o acidente resultando no óbito de seis pessoas.

Em face disso, impõe-se a condenação do acusado pelo crime previsto no art. 302, caput, da Lei n. 9.503/97 c/c art. 70 do Código Penal, vez que o réu com uma única ação praticou seis delitos, sendo este o número de vítimas levadas a óbito pela colisão.

Neste sentido a manifestação jurisprudencial:

"CRIME DE TRÂNSITO. HOMICÍDIO CULPOSO (ART. 302, CAPUT, DA LEI N. 9.503/97). PLURALIDADE DE VÍTIMAS. CONCURSO FORMAL. CONDUÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR EM EXCESSO DE VELOCIDADE, PROVOCANDO COLISÃO COM MORTES. PERDA DO CONTROLE DO AUTOMÓVEL EM CURVA E SUBSEQÜENTE INVASÃO DA CONTRAMÃO DE DIREÇÃO, COM ABALROAMENTO DE MOTOCICLETA QUE TRAFEGAVA NO SENTIDO OPOSTO. MATERIALIDADE E AUTORIA SOBEJAMENTE COMPROVADAS. PROVA TESTEMUNHAL FIRME E SEGURA SOBRE O ATO IMPRUDENTE DO MOTORISTA CONDUTOR DO VEÍCULO CAUSADOR DO SINISTRO. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS INVIÁVEL. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA NÃO DEMONSTRADA. INEXISTÊNCIA DE COMPENSAÇÃO DE CULPAS EM DIREITO PENAL. PLEITO IMPROVIDO.

REQUERIMENTO PELA DIMINUIÇÃO DA PENALIDADE DE SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO. FIXAÇÃO PELO MESMO TEMPO DA REPRIMENDA CORPORAL, AFIGURANDO-SE EXACERBADA. NECESSIDADE DE SE GUARDAR PROPORCIONALIDADE ENTRE A PENA DE SUSPENSÃO E A PENA RESTRITIVA DE LIBERDADE. PEDIDO ATENDIDO.

RÉU QUE POSTULA A REDUÇÃO DA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. FIXAÇÃO QUE NÃO OBSERVOU A SITUAÇÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA DO AGENTE. DIMINUIÇÃO QUE SE IMPÕE. REQUERIMENTO ACOLHIDO."
(Apelação Criminal n. 2006.027511-7, de Ascurra; Relator Des. Alexandre d'Ivanenko; Decisão em 18/07/2008)

2 - Do Delito de Direção sob Influência de Álcool

No tocante ao delito previsto no art. 306, caput, da Lei n. 9.503/97, a doutrina e a jurisprudência predominante entendem que o definido no art. 302, caput, do mesmo diploma, que é de dano, absorve o que é de perigo.

A respeito, Damásio E. de Jesus assinala que "se de um delito de mera conduta advém resultado naturalístico, o sujeito responde pelo delito material (homicídio culposo de trânsito)" (Crimes de trânsito, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 1999, p. 163).

Neste sentido também é a manifestação do nosso egrégio Tribunal de Justiça:

"APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME DE TRÂNSITO - HOMICÍDIO CULPOSO (ART. 302 DO CTB) - RECURSO DA ACUSAÇÃO PRETENDENDO A CONDENAÇÃO TAMBÉM POR EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (ART. 306 DO CTB) EM CONCURSO FORMAL - ABSORÇÃO DO DELITO MENOS GRAVE PELO MAIS GRAVE - PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO CORRETAMENTE APLICADO - RECURSO DESPROVIDO" (Apelação Criminal n. 2006.035332-5, de Blumenau, rel. Des. Torres Marques, j. em 3/4/2007).

"EMBRIAGUEZ AO VOLANTE - CRIME DE PERIGO ABSORVIDO PELO CRIME DE DANO PREVISTO NO ART. 302 DO CTB - EXCLUSÃO DA CONDENAÇÃO - RECURSO PROVIDO EM PARTE" (APR n. 2003.004365-9, de Chapecó, rel. Des. Torres Marques).

Ainda:

"[...] Condução de veículo automotor sob a influência de álcool. Absorção deste delito, de mera conduta, pelo de lesões corporais culposas (art. 303, parágrafo único, do Código de Trânsito). Exclusão, da sentença, da condenação pelo crime de embriaguez ao volante, com a devida adequação da pena" (Apelação Criminal n. 2004.019072-7, de Joinville, rel Des. Maurílio Moreira Leite, j. em 24/8/2004).

Assim, deve o acusado ser absolvido da prática do delito descrito no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, pois na hipótese o homicídio culposo, absorve o crime de embriaguez ao volante previsto no art. 306 do CTB, tendo em vista o princípio da consunção.

Apurada a responsabilidade do acusado em relação ao crime previsto no art. 302 do CTB, passo a aplicar a pena.

Analisando as circunstâncias judiciais do artigo 59, caput, do Código Penal, conclui-se que a culpabilidade, aqui compreendida como a censurabilidade do comportamento, e a intensidade do dolo, não extrapola a normalidade objetiva. Não registra antecedentes. Tampouco há nos autos dados concretos que possibilitem aquilatar, com segurança, a personalidade e a conduta social. Os motivos, vale dizer, a fonte propulsora em praticar a ação, no caso, configura-se pela intenção de aventurar-se a dirigir sob influência de álcool em via de grande fluxo, credencia-se como modalidade perigosa e suficiente para ensejar a majoração da reprimenda nesta fase. As circunstâncias revelaram despreocupação singular, posto que se não fosse a embriaguês do acusado o acidente poderia ter sido evitado e com isto a morte das vítimas. As conseqüências foram gravíssimas, eis que resultaram na morte de seis pessoas, das quais duas delas eram crianças e quatro adultos de idades entre 38 a 25 anos. Por fim, as vítimas, em nada concorreram para o delito, apenas obedeceram a sinalização e param sob a rodovia e foram tolhidas pelo acusado.

Assim, por infração ao art. 302, do Código de Trânsito Brasileiro, fixo a pena-base em 03 (três) anos de detenção, e 03 (três) meses de proibição para obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor (art. 293 do CTB).

Na segunda fase, por não existirem circunstâncias agravantes ou atenuantes da pena, mantenho a reprimenda em 03 (três) anos de detenção.

Na terceira fase, presente a causa especial de aumento de pena prevista no art. 70 do CP, conforme já exposto no corpo desta decisão, elevo a reprimenda em 1/2, em razão do número de vítimas, quantificando a reprimenda em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de detenção e 04 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de proibição para obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor (art. 293 do CTB).

Segundo estabelece o artigo 33, parágrafo 2º, alínea b, do Código Penal, o regime inicial de cumprimento da pena do acusado será o semi-aberto.

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE em parte a denúncia e, em conseqüência:

1 - ABSOLVO o denunciado ANTONIO NEUMANN, qualificado nestes autos, da imputação prevista no art. 306 do CTB, com fulcro no art. 386, VI do CPP;

2 - CONDENO o denunciado ANTONIO NEUMANN, qualificado nestes autos, à pena privativa de liberdade de 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de detenção, em regime semi-aberto, e 04 (quatro meses) meses e 15 (quinze) dias de proibição para obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, por infração ao art. 302, do Código de Trânsito Brasileiro.

CONDENO-O, ainda, ao pagamento das custas do processo (art. 804, do CPP).

Concedo ao condenado o direito de recorrer em liberdade, haja vista que respondeu ao processo em liberdade e por inexistirem quaisquer dos requisitos autorizadores da prisão cautelar.

Transitada esta em julgado, procedam-se as devidas comunicações, recomendadas pela Egrégia Corregedoria-Geral de Justiça.

P.R.I.

Laguna (SC), 07 de julho de 2009.

RENATO MÜLLER BRATTI
Juiz de Direito



JURID - Condenado motorista embriagado. [14/07/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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