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terça-feira, 14 de outubro de 2008

Informativo STF 62 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Brasília, 3 a 7 de março de 1997 - Nº 62


Este Informativo, elaborado pela Assessoria da Presidência do STF a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas na semana pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.


ÍNDICE DE ASSUNTOS

Crime Societário e Denúncia

Decreto Regulamentar e ADIn

Exame de Dependência Toxicológica

Extinção da Punibilidade

Extradição de Brasileiro Naturalizado

Fundamentação Válida

Imissão Provisória e Desapropriação

Incidência Cumulativa de Adicionais

Prequestionamento

Reformatio in Pejus

Revisão de Benefícios: Termo Inicial

Soberania do Júri


PLENÁRIO


Decreto Regulamentar e ADIn - 1

O julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada contra decreto legislativo que susta, com base no art. 49, V, da CF ("É da competência exclusiva do Congresso Nacional: V - sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa;"), decreto regulamentar do Poder Executivo impõe o exame incidental da conformidade deste decreto com a lei por ele regulamentada, sem o que não se pode saber se o Poder Legislativo exerceu validamente a competência prevista no citado art. 49. Hipótese que não se confunde com aquelas em que o decreto regulamentar figura como o objeto principal da ação direta, o que a jurisprudência do STF não admite sob o fundamento de que, ou o decreto impugnado está de acordo com a lei regulamentada, e então ela é que seria inconstitucional, ou não está de acordo, e o caso seria de mera ilegalidade do decreto. Precedente citado: ADIn 748-RS (RTJ 143/510).


Decreto Regulamentar e ADIn - 2

Com base nesse entendimento - e após verificar a existência de desconformidade apenas parcial entre o decreto regulamentar sustado pelo Decreto Legislativo 111/96, da Câmara Legislativa do Distrito Federal, e a lei por ele regulamentada (Lei Distrital 237/92, que fixa o teto remuneratório dos servidores públicos locais) -, o Tribunal referendou decisão do Presidente que, durante o período de recesso, deferira, a pedido do Governador do Distrito Federal, a suspensão de eficácia do mencionado decreto legislativo, "salvo quanto à sustação, que se mantém em vigor, dos arts. 2º e 4º do D. 17.128/96", tidos, à primeira vista, como exorbitantes da LD 237/92 (decisão publicada na íntegra no DJU de 3.2.97). ADIn 1.553-DF, rel. Min. Marco Aurélio, 6.3.97.


Extradição de Brasileiro Naturalizado

A extradição por tráfico de entorpecentes de brasileiro naturalizado antes do fato que motivar o pedido só é permitida pela CF em caso de "comprovado envolvimento" (art. 5º, LI). Este requisito inviabiliza, desde logo, o deferimento de extradição fundada em prisão cautelar (extradição instrutória), dada a impossibilidade de afirmar-se, em tal hipótese, o "comprovado envolvimento" exigido pela CF. Com esse entendimento, o Tribunal indeferiu pedido de extradição formulado com base em ordem de prisão decretada em procedimento investigatório movido no Estado requerente contra o extraditando, brasileiro naturalizado, por crime de tráfico praticado após a naturalização. Ressalvou-se, no entanto, a possibilidade de renovação do pedido desde que comprovado o envolvimento do extraditando. Precedente citado: Ext 541-República Italiana (RTJ 145/428). EXT 690-República Italiana, rel. Min. Néri da Silveira, 6.3.97.


Auditor de Tribunal de Contas Estadual

Concluído o julgamento de ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República contra dispositivos da Constituição do Estado de Minas Gerais que disciplinam a forma de provimento e as vantagens do cargo de auditor do Tribunal de Contas local. Foram declaradas inconstitucionais a norma que previa o ingresso na carreira de auditor independentemente de concurso público e a que conferia a esses servidores os mesmos direitos dos juízes do Tribunal de Alçada local. ADIn 1.067-MG, rel. Min. Carlos Velloso, 23.05.96.


PRIMEIRA TURMA


Crime Societário e Denúncia

Não é inepta denúncia que imputa a diretores de empresa que deixa de recolher contribuição social descontada de seus empregados a prática dos crimes previstos nos arts. 168 do CP (conforme art. 86 da Lei 3807/60) e 5º da Lei 7492/86 (conforme art. 95, d e § 1º, da Lei 8112/90), pelo simples fato de figurarem eles, no contrato social, como gerentes da sociedade durante o período em que os mencionados recolhimentos deixaram de ser feitos. Precedentes citados: RHC 65.369-SP (RTJ 124/547); RHC 63.825-SP (RTJ 114/226); RHC 58.544-SP (RTJ 101/563). HC 74791-RJ, rel. Min. Ilmar Galvão, 4.3.97.


Imissão Provisória e Desapropriação - 1

A garantia da justa e prévia indenização (CF, art. 5º, XXIV) assegura que o pagamento desta seja feito antes da transferência do domínio, e não por ocasião da imissão provisória do expropriante na posse do imóvel. Continua aplicável, portanto, o entendimento firmado pelo STF sob a vigência das Constituições de 1946 e 1967 (RMS 9.648-BA, DJU de 23.8.62; RE 91.611-PE, RTJ 101/717; RE 70.144-GB, RTJ 57/437; RE 116.409-RJ, RTJ 126/854). Com base nesse fundamento, a Turma conheceu e deu provimento a recurso extraordinário interposto pelo Estado de São Paulo contra decisão do Tribunal de Justiça local - confirmada pelo STJ -, que condicionara a imissão provisória do recorrente na posse de imóvel urbano não-residencial ao pagamento do valor apurado em avaliação prévia. Precedente citado: RE 141.795-SP (DJU de 29.9.95). RE 176.290-SP, rel. Min. Sydney Sanches, 4.3.97.


Imissão Provisória e Desapropriação - 2

Casos análogos estão sendo julgados pelo Plenário nos RREE 170235-SP, 170931-SP, 172201-SP, 176108-SP, 177607-SP, 179179, 185031-SP, 185933-SP (situação atual: adiado o julgamento pelo pedido de vista do Ministro Sepúlveda Pertence, depois do voto do Ministro Carlos Velloso, relator, entendendo que o art. 15 do DL 3365/41 autoriza apenas a imissão realmente provisória - não, portanto, a imissão irreversível que em geral se verifica nas ações expropriatórias -, e do voto dos Ministros Moreira Alves, Maurício Corrêa, Francisco Rezek, Ilmar Galvão, Celso de Mello, Octavio Gallotti, Sydney Sanches e Néri da Silveira, afastando qualquer incompatibilidade entre esse dispositivo e a CF).


Prequestionamento

A Súmula 356 do STF ("O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento.") é aplicável mesmo que as questões suscitadas no extraordinário hajam surgido no julgamento em que proferida a decisão recorrida. AI 189.266-SP (AgRg), rel. Min. Moreira Alves, 4.3.97.


Fundamentação Válida

Nada impede que o relator, para negar seguimento a agravo de instrumento, adote por transcrição os argumentos defendidos pela parte agravada. Com base nesse entendimento, a Turma confirmou despacho do relator que acolhera como suas as razões com as quais o agravado (Fazenda do Estado de São Paulo) contestava a alegação de ofensa ao princípio da não-cumulatividade pelo fato de a legislação estadual não autorizar a correção monetária de créditos escriturais do ICMS (despacho publicado na íntegra no DJU de 22.11.96). AI 181.138-SP (AgRg), rel. Min. Moreira Alves, 4.3.97.


Exame de Dependência Toxicológica

A alegação de ser o réu viciado em drogas, o fato de já haver sido condenado por uso de entorpecentes e a existência de laudo extrajudicial assinado por psicólogo de estabelecimento penal atestando essa condição não são suficientes para desautorizar, sem o reexame aprofundado da prova, o indeferimento pelas instâncias ordinárias de exame de dependência toxicológica, especialmente quando a magnitude da ação criminosa - tráfico internacional em associação de mais de dez quilos de cocaína -, torne improvável a versão de que acusado buscava apenas satisfazer as necessidades ditadas pelo suposto vício. Precedentes citados: HC 69.733-SP (DJU de 21.5.93); HC 73.305-RJ (DJU de 19.4.96); HC 69.995-RS (RTJ 146/874); HC 70.268-MG (RTJ 157/100). HC 75.004-MS, rel. Min. Octavio Gallotti, 4.3.97.


Incidência Cumulativa de Adicionais

A LC 645/89, do Estado de São Paulo, ao determinar que o reenquadramento dos servidores do quadro do magistério local fosse feito sem levar em conta as referências resultantes de adicionais por tempo de serviço obtidos de conformidade com legislação revogada, de modo a impedir a incidência cumulativa desses adicionais, deu cumprimento ao disposto no art. 37, XIV, da CF ("os acréscimos pecuniários percebidos por servidor público não serão computados nem acumulados, para fins de concessão de acréscimos ulteriores, sob o mesmo título ou idêntico fundamento;"), nos termos previstos pelo art. 17 do ADCT ("Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título."). Com base nesse entendimento, a Turma conheceu e deu provimento a recurso extraordinário interposto pelo Estado de São Paulo contra acórdão do TJ local que, fundado no princípio da irredutibilidade de vencimentos, determinara o cômputo das citadas referências. Precedente citado: RE 174.529-SP (DJU de 18.8.95). RE 198.611-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, 4.3.97.


SEGUNDA TURMA


Soberania do Júri

A anulação, por contrariedade manifesta à prova dos autos, de decisão do Tribunal do Júri que acolhe, dentre as versões constantes do processo, a mais favorável ao acusado, ofende o princípio da soberania dos veredictos (CF, art. 5º, XXXVIII). Com base nesse fundamento, a Turma deferiu, por empate na votação, habeas corpus impetrado contra acórdão do Tribunal de Justiça da Paraíba que, reconhecendo a existência de dolo eventual - e não mera culpa consciente -, anulara decisão do júri que desclassificara para homicídio culposo o crime de homicídio doloso imputado ao paciente por haver ele causado a morte da vítima, em atropelamento durante corrida em via pública ("racha" ou "pega"). Antes disso, o Tribunal de Justiça já havia pronunciado o réu, ao prover recurso da acusação interposto contra decisão do juiz singular que, por ocasião da pronúncia, desclassificara o delito para homicídio culposo. Vencidos os Ministros Maurício Corrêa e Carlos Velloso, que confirmavam o acórdão impugnado. Precedente citado: RECr 104061-PR (RTJ 117/1273). HC 74.750-PB, rel. Min. Marco Aurélio, 4.3.97.


Reformatio in Pejus

Acolhendo a alegação de ofensa ao princípio ne reformatio in pejus, a Turma deferiu habeas corpus contra acórdão que, no julgamento de apelação interposta apenas pela defesa em favor de réu condenado pela prática de tráfico de drogas - crime sujeito à disciplina do art. 2º, § 1º, da Lei 8072/90 ("A pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado.") -, reformou a sentença que fixara o regime inicial aberto para o cumprimento da pena, determinando fosse ela cumprida integralmente em regime fechado. Constrangimento ilegal caracterizado tendo em vista não ser possível reforma mais gravosa ao réu sem que haja recurso da acusação. Precedente citado: HC 68.847-RJ (RTJ 138/218). HC 74.679-DF, rel. Min. Néri da Silveira, 4.3.97.


Extinção da Punibilidade

Nos crimes contra a ordem tributária (Lei 8.137/90), a extinção da punibilidade "quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia" (Lei 9.249/95, art. 34) pressupõe a satisfação integral do débito, e não apenas o seu parcelamento. Precedente citado: INQ (QO) 1.028-RS (DJ de 30.8.96). HC 74.754-SP, rel. Min. Néri da Silveira, 4.3.97.


Revisão de Benefícios: Termo Inicial

Tendo em conta a auto-aplicabilidade do art. 40, § 5º, da CF/88 ("O benefício da pensão por morte corresponderá à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, até o limite estabelecido em lei,..."), considera-se a data da promulgação da Constituição como termo inicial para efeito de recebimento dos benefícios atualizados na forma do art. 20 do ADCT ("dentro de cento e oitenta dias, proceder-se-á à revisão dos direitos dos servidores públicos inativos e pensionistas e à atualização dos proventos e pensões a eles devidos, a fim de ajustá-los ao disposto na Constituição"). Com base nesse entendimento, por maioria de votos, a Turma negou provimento a agravo regimental interposto pelo Estado do Paraná, no qual se sustentava que o beneficiário só teria direito à atualização da pensão após transcorrido o prazo de 180 dias estabelecido por aquela regra transitória. Vencido o Min. Marco Aurélio, que dava provimento ao agravo regimental para determinar o processamento do RE. Precedente citado: RE 204.441-PR (julgado pela 2ª Turma em 17.12.96). AI 183.419-PR (AgRg), rel. Min. Carlos Velloso, 4.3.97.


Sessões

      Ordinárias

      Extraordinárias

      Julgamentos

Pleno

      05.03.97

      06.03.97

      07

1a. Turma

      04.03.97

        

      243

2a. Turma

      04.03.97

        

      176


CLIPPING DO DJ

07 de março de 1997


ADIn N. 202-3 *
RELATOR: MIN. OCTAVIO GALLOTTI

EMENTA: - Em face do disposto no art. 96, I, c, da Constituição Federal, compete ao Tribunal de Justiça (não ao Governador) o provimento dos juízes de carreira no cargo de Desembargador, independentemente de aprovação da Assembléia Legislativa, quer nessa hipótese, quer na da escolha de membros oriundos da advocacia ou do Ministério Público (C.F., art. 94). A vedação de férias coletivas também pela Constituição da Bahia, contrapõe-se ao estabelecido nos artigos 66, e seguintes, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, recebida pela Constituição de 1988, e invade a competência reservada, pela mesma Carta (art. 93), à lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal. * noticiado no Informativo 43

HABEAS CORPUS N. 74580-6 *
RELATOR: MIN. ILMAR GALVÃO

EMENTA: HABEAS CORPUS. ESTUPRO. VÍTIMA MENOR DE QUATORZE ANOS. PRESUNÇÃO DE VIOLÊNCIA.
O consentimento da menor de quatorze anos para a prática de relações sexuais e sua experiência anterior não afastam a presunção de violência para a caracterização do estupro.
Habeas Corpus indeferido.

* noticiado no Informativo 58

MANDADO DE SEGURANÇA N. 22371-5
RELATOR: MIN. MOREIRA ALVES

EMENTA: Mandado de segurança. Efeito suspensivo a recurso de revisão interposto perante o Tribunal de Contas da União.
- Pela disciplina desse recurso de revisão, faz ele as vezes, no plano administrativo, da ação rescisória no terreno jurisdicional, com relação à qual a jurisprudência desta Corte tem entendido inadmissível a outorga cautelar de eficácia suspensiva ao ajuizamento dela, para obstar os efeitos decorrentes da coisa julgada (vejam-se, a propósito, os acórdãos na RTJ 54/454 e na RTJ 117/1).
Mandado de segurança indeferido.

RECURSO EXTRAORDINARIO N. 205029-6 *
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO

EMENTA: - CONSTITUCIONAL. ACESSO À JUSTIÇA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. Lei 1.060, de 1950. C.F., art. 5º, LXXIV.
I. - A garantia do art. 5º, LXXIV -- assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos -- não revogou a de assistência judiciária gratuita da Lei 1.060, de 1950, aos necessitados, certo que, para obtenção desta, basta a declaração, feita pelo próprio interessado, de que a sua situação econômica não permite vir a Juízo sem prejuízo da sua manutenção ou de sua família. Essa norma infraconstitucional põe-se, ademais, dentro no espírito da Constituição, que deseja que seja facilitado o acesso de todos à Justiça (C.F., art. 5º, XXXV).
II. - R.E. não conhecido.

* noticiado no Informativo 55

RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS N. 74395-1
RELATOR: MIN. MAURÍCIO CORRÊA

EMENTA: RECURSO DE HABEAS CORPUS. FALSO TESTEMUNHO. CONCURSO EVENTUAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
1. Esta Corte já decidiu diversas vezes que o advogado pode ser co-autor, em tese, do crime de falso testemunho, não se justificando, por isso, o trancamento da ação penal.
2. Recurso conhecido e não provido.

HABEAS CORPUS N. 73455-3 *
RELATOR: MIN. FRANCISCO REZEK

EMENTA: (...)
II - Quem tem legitimação para propor habeas corpus tem também legitimação para dele recorrer. Nas hipóteses de denegação do writ no tribunal de origem, aceita-se a interposição, pelo impetrante ¾ independentemente de habilitação legal ou de representação ¾, de recurso ordinário constitucional. Tal entendimento se aplica ao impetrante que é bacharel em Direito, sob pena do fracionamento da isonomia em detrimento de quem optou pelos serviços de um advogado.
Ordem parcialmente concedida para determinar o processamento e a subida do recurso ordinário interposto.
* noticiado no Informativo 37

HABEAS CORPUS N. 74083-9
RELATOR: MIN. FRANCISCO REZEK

EMENTA: HABEAS CORPUS. PREVENÇÃO. NULIDADE RELATIVA SANADA PELA PRECLUSÃO.
A nulidade decorrente da não-observância da prevenção é relativa, sanável se não alegada no momento próprio.
Ordem denegada.

HABEAS CORPUS N. 74242-4 *
RELATOR: MIN. OCTAVIO GALLOTTI

EMENTA: - Assistente de acusação habilitado no processo. Seu prazo, para apelar, é de cinco dias, sem que se lhe aplique o disposto no parágrafo único do art. 598 do Código de Processo Civil.
Precedentes do Supremo Tribunal: HC 59.668, RTJ 105/90 e HC 69.439, DJ de 27-11-92.

* noticiado no Informativo 52

HABEAS CORPUS N. 74135-5 *
RELATOR: MIN. FRANCISCO REZEK

EMENTA: HABEAS CORPUS. STF. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA INEXISTENTE. COAÇÃO IMPUTADA A JUIZ DE PRIMEIRO GRAU. RESOLUÇÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: INSUFICIENTE PARA DETERMINAR A COMPETÊNCIA DO SUPREMO. PEDIDO NÃO-CONHECIDO.
Não compete ao STF julgar o pedido de habeas corpus contra decisão de juiz de primeiro grau. O tribunal de origem não deve remeter para o Supremo ¾ sem julgamento do mérito ¾ writ com o argumento de que o magistrado agiu com base em resolução sua. Cabe ao tribunal apreciar o pedido.
Habeas corpus não-conhecido. Remessa dos autos ao Tribunal de Justiça do Paraná.

* noticiado no Informativo 47

HABEAS CORPUS N. 73517-7 *
RELATOR: MIN. FRANCISCO REZEK

EMENTA: (...)
O Supremo tem jurisprudência a dizer da impossibilidade da concessão do benefício da substituição da pena privativa de liberdade pela pena de multa quando há cominação cumulativa da pena privativa de liberdade com a pena de multa. O artigo 60 §2º do Código Penal não se aplica à Lei 6.368/76 (precedente: HC 70.445).
Ordem denegada.

* noticiado no Informativo 33

HABEAS CORPUS N. 74161-4
RELATOR: MIN. OCTAVIO GALLOTTI

EMENTA: - Substituição de pena privativa de liberdade, com a duração de seis meses, cabível, em tese, tanto pela aplicação de multa, como pela restrição de direitos (artigos 44 e 60, § 2º, do Código Penal).
Crime cumulativamente punível com pena privativa de liberdade e multa (art. 319 do Código Penal). Impossibilidade de substituição, nessa hipótese, pela sanção pecuniária (Precedente do S.T.F.: HC 70.445, RTJ 152/845).

HABEAS CORPUS N. 74463-0
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: (...)
- A suspensão condicional do processo - que constitui medida despenalizadora - acha-se consubstanciada em norma de caráter híbrido. A regra inscrita no art. 89 da Lei nº 9.099/95 qualifica-se, em seus aspectos essenciais, como preceito de caráter processual, revestindo-se, no entanto, quanto às suas conseqüências jurídicas no plano material, da natureza de uma típica norma de direito penal, subsumível à noção da lex mitior.
- A possibilidade de válida aplicação da norma inscrita no art. 89 da Lei nº 9.099/95 - que dispõe sobre a suspensão condicional do processo penal ("sursis" processual) - supõe, mesmo tratando-se de fatos delituosos cometidos em momento anterior ao da vigência desse diploma legislativo, a inexistência de condenação penal, ainda que recorrível.
Condenado o réu, ainda que em momento anterior ao da vigência da Lei dos Juizados Especiais Criminais, torna-se inviável a incidência do art. 89 da Lei nº 9.099/95, eis que, com o ato de condenação penal, ficou comprometido o fim precípuo para o qual o instituto do "sursis" processual foi concebido, vale dizer, o de evitar a imposição da pena privativa de liberdade. Precedente.

RECURSO EXTRAORDINARIO N. 185050-7 *
RELATOR PARA O ACORDÃO: MIN. OCTAVIO GALLOTTI

EMENTA: Taxas de licença e funcionamento, de prevenção de incêndio e de publicidade.
Inconstitucionalidade da exação, ante a identidade de sua base de cálculo (metro quadrado de área ocupada ou construída) com a utilizada para a cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU (art. 145, § 2º, da Constituição).
Precedente do Tribunal Pleno: ERE 115.683 (RTJ 131/887).

* noticiado no Informativo 38

Acórdãos publicados: 212


TRANSCRIÇÕES

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do Informativo STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.


Ação Civil Pública e Legitimidade
RE 163.231-SP *
Ministro Maurício Corrêa (relator)



Relatório:- O Ministério Público do Estado de São Paulo, com fundamento nos artigos 129, III, da Constituição Federal e 4°, 5°, 11 e 12 da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, ajuizou ação civil pública, consistente em medida cautelar satisfativa, contra a ASSOCIAÇÃO NOTRE DAME DE EDUCAÇÃO E CULTURA, entidade de ensino estabelecida em São Vicente, naquele Estado, que neste recurso figura como recorrida, objetivando fazer com que tal entidade se adequasse às normas de reajustes dos encargos educacionais legalmente fixados pela autoridade competente, no caso, pelo Conselho Estadual de Educação, decorrente de autorização legal.
2. Esclarece em sua inicial, que "a obediência, quanto ao estrito cumprimento das disposições legais, é de interesse transindividual, haja vista não comportar exceções, bem assim pelo fato de refletir também na situação daqueles consumidores, indetermináveis", que viessem a integrar o corpo discente do estabelecimento.
3. O juízo de primeira instância concedeu a liminar postulada (fls.43/43-v°, do 1° volume) e no mérito rejeitou a preliminar de ilegitimidade de parte, suscitada pela requerida, e julgou procedente a ação (fls. 16/23 do 2° volume), para o fim de determinar que a ré se limitasse a cobrar os valores homologados pelo Conselho Estadual de Educação.
4. Inconformada com esse entendimento, interpôs a Associação Notre Dame de Educação e Cultura recurso de apelação (fls.24/27, do 2° volume), reiterando a preliminar de ilegitimidade de parte do Ministério Público, e o Tribunal de Justiça, julgando o recurso (fls.68/74, do 2° volume), acolheu a preliminar reiterada, negando legitimidade ativa ao Parquet para representar os interesses de pais de alunos, dos próprios alunos de escolas particulares e terceiros, extinguindo o processo, consoante o disposto no art. 267, VI, do Código de Processo Civil, concluindo o decisum, verbis:

"[...]
Sob a ótica desse criativo Promotor, aqui e sempre que se envolve o Parquet em ações que tais, prorrogada a jurisdição do feito a incerto e sempre crescente número de pacientes jurisdicionados.
Não parece ter sido essa em verdade a intenção do legislador constituinte, que de uma penada teria assim erigido o Parquet em Curador e custos legis universal, sem oitiva dos beneficiados, dispensado o concurso ou ao menos a presença obrigatória do advogado, visto que levado o alcance do posicionamento ministerial às suas culminâncias, todo e qualquer interesse pode ser tido e rotulado de difuso, na esteira do que disse alguém alhures, que tudo que afeta o menor dos indivíduos a todos afeta...
Por outro lado não pode realmente o Parquet exercer o munus que a lei concedeu ao advogado, pena de insuportável usurpação e virtual obsolescência da nobre atividade, relegada que estaria ao rol das excentricidades das partes, não se vislumbrando porque alguém - refere-se aqui os não pobres no sentido da lei - iria procurar e pagar um advogado, se pode ter seus interesses superiormente e gratuitamente defendidos por uma instituição do porte do Ministério Público, de indiscutível ascendência moral e festejável nível intelectual.
Isto posto, merece o r. decisório guerreado reparos.
Acolhe-se a matéria preliminar levantada em sede recursal, para negar-se legitimação ativa ao Parquet para representar os interesses de pais de alunos, dos próprios alunos de escolas particulares pagas e terceiros. Extingue-se o processo consoante o dispositivo ínsito no artigo 267, VI, do CPC." (Fls. 68/74).

5. Interpostos embargos de declaração (fls.79/90, 2° volume), foram eles rejeitados (fls.94/95, 2° volume). Daí o presente recurso extraordinário (fls.97/128, 2° volume), com fundamento no art. 102, III, a, da Constituição Federal, por violação ao seu art. 129, III. No que interessa, diz o recorrente (fls.125/127, 2° volume):

"(...) a análise exclusivamente privatística do v. acórdão, de cunho individualista, inspirado no liberalismo, que teve seu apogeu no século passado, não mais se coaduna com as exigências da sociedade hodierna, que reclama novas conceituações e classificações para os direitos dela decorrentes. [...]
O que deveria ter sido notado pelo v. acórdão, concessa maxima venia, é que aos termos "difuso" e "coletivo" se contrapõe a noção de direito "individual". Somente isto. E o Ministério Público não está defendendo direito individual, de uma pessoa física determinada, mas de toda a "classe", de toda a "categoria" de consumidores de determinado serviço (mensalidades escolares), contra os abusos cometidos por entidade privada que exerce função típica do poder público e de relevância pública: o ensino.
Tivesse o Parquet ajuizado ação em favor de Tício ou Caio, aí sim poder-se-ia falar em ilegitimidade ativa de parte. Não no caso dos autos.
E ao Ministério Público se conferiu legitimidade para defender, por meio de ação civil pública, os direitos coletivos (art. 129, III, CF). [...]
O papel do Supremo Tribunal Federal no exame dessa questão é de relevância máxima, pois estará a Corte decidindo sobre o conceito de interesses e direitos coletivos e difusos, incorporados no texto constitucional pela norma do art. 129, III, e que estão, hoje, a reclamar uma definição do Pretório Excelso."

6. O extraordinário foi admitido na origem (fls.131). Vindo os autos a esta Corte, neles se manifestando o Ministério Público Federal, em parecer da Subprocuradora-Geral da República, então em exercício, Dra. Maria da Glória Ferreira Tamer (fls. 135/141), que tem a seguinte ementa:

"Ministério Público. Legitimação "ad causam" . Ação Civil Pública.
Aumento de mensalidades escolares.
Parecer pelo provimento do recurso."

É o relatório.

Voto: A matéria constante deste extraordinário está devidamente prequestionada de forma expressa e inequívoca, pois desde a postulação da inicial lastreou-se o pleito na faculdade outorgada ao Ministério Público para agir na proteção dos interesses coletivos, a que se refere o artigo 129, III, da Constituição Federal. Tal fundamento constitucional foi objeto de análise na sentença, no aresto impugnado, além do que consignado nos embargos declaratórios interpostos. Foi o apelo, ademais, admitido pelo então 3° Vice-Presidente do Tribunal a quo.
2. O acórdão questionado, acolhendo preliminar suscitada no recurso de apelação manifestado pela recorrida, negou legitimidade ativa ao Parquet para a ação civil pública consistente em medida cautelar satisfativa de interesse de pais de alunos e dos próprios alunos de escolas particulares pagas, ajuizada com a finalidade de compelir a Associação Notre Dame de Educação e Cultura a adequar-se às normas de reajustes dos encargos educacionais legalmente fixados pela autoridade competente, no caso, pelo Conselho Estadual de Educação com base na Lei n° 8.030/90.
3. Como se viu do relatório, o mencionado acórdão recorrido não reconheceu ao Parquet a necessária legitimidade ad causam para a postulação da ação, porque em se tratando de mensalidades escolares poderiam elas ser objeto de irresignação de cada um dos interessados no respectivo aumento havido como ilegal, dado o caráter individual da obrigação, invadindo assim área de atuação profissional do advogado.
4. Com efeito, vem o Ministério Público cada vez mais se destacando na escalada da organização do Estado, sobretudo no campo da proteção dos interesses difusos e coletivos. Como ressalta JOSÉ AFONSO DA SILVA, (Curso de Direito Constitucional Positivo, 12ª edição revista, 1996, Malheiros Editores, págs. 553/558), "a Constituição de 1891 não o mencionou, senão para dizer que um dos membros do Supremo Tribunal Federal seria designado Procurador-Geral da República, mas a lei n° 1.030, de 1890, já o organizava como instituição. A Constituição de 1934 o considerou como órgão de cooperação nas atividades governamentais. A de 1946 reservou-lhe um título autônomo, enquanto a de 1967 o incluiu numa seção do capítulo do Poder Judiciário e a sua Emenda 1/69 o situou entre os órgãos do Poder Executivo. Agora, a Constituição lhe dá o relevo de instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis".
5. Resulta daí estarem as funções institucionais do Ministério Público relacionadas no art. 129, da Constituição, do qual emerge como titular da ação penal, da ação civil pública para a tutela dos interesses públicos, difusos e coletivos, e da ação direta de inconstitucionalidade genérica.
6. A ação civil pública, regulada pela Lei 7.347, de 24.7.1985, recebeu status constitucional no artigo 129 da Lei Magna de 1988, ao determinar que entre as funções institucionais do Ministério Público se insere a de "promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos".
7. Deixando de lado o exame histórico do aparecimento no ordenamento jurídico nacional da proteção estatal sobre esses direitos, verifico que a partir da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, os direitos difusos e coletivos passaram a integrar o complexo das funções do Ministério Público, como na hipótese dessa lei que assegurou ao Parquet, em seu artigo 1°, a respectiva defesa por meio desse rito processual, ao proclamar o inciso V desse dispositivo a viabilidade do procedimento "a qualquer outro interesse difuso ou coletivo".
8. Posteriormente, com o advento da nova ordem constitucional, ficou expresso que dentre as competências do Ministério Público estariam aquelas pertinentes à promoção do "inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos" (CF, artigo 129, inciso III).
9. Restou ampliada a atuação do órgão ministerial para albergar esses interesses, consolidando-a ainda mais, ao determinar o Código de Defesa do Consumidor, aprovado pelo Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990, em seu artigo 81, que a defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

"I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base,
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum."

10. E no mais recente diploma acerca do tema, que é a Lei n° 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, veio o seu artigo 25, IV, a, dimensionar ainda mais o conceito do que é interesse coletivo, atribuindo ao Ministério Público a competência para a sua defesa.

11. Como se sabe o termo difuso, já do domínio público nos dias de hoje, não foi criado modernamente, visto que tem a sua origem na doutrina romanística. Vittorio Scialoja já se referia ao conceito de difuso, no século passado, ao mencionar que "direitos difusos, que não se concentram no povo considerado como entidade, mas que tem por próprio titular realmente cada um dos participantes da comunidade" (Procedura Civile Romana, Anonima Romana Edtoriale, Roma 1932, parágrafo 69, pág. 345). Àquela ocasião, todavia, não se havia estabelecido a diferença entre direitos difusos e coletivos, não obstante alguns desses direitos sendo coletivos fossem rotulados implicitamente como difusos. Por isso mesmo Massimo Villone já houvesse concebido que interesse difuso é "uma personagem absolutamente misteriosa". (La Colocazzione Instituzionale dell'interesse difuso in La Tutela Degli Interessi Difusi nel Dirito Comparato, Giufré, Milão, 1976, pág.73).
12. Hoje as fronteiras dos dois interesses estão definitivamente delimitadas, sendo difuso o interesse que abrange número indeterminado de pessoas unidas pelo mesmo fato, enquanto interesses coletivos seriam aqueles pertencentes a grupos ou categorias de pessoas determináveis, possuindo uma só base jurídica. Portanto, a indeterminidade seria a característica fundamental dos interesses difusos, e a determinidade aqueles interesses que envolvem os coletivos.
13. Teori Albino Zevascky classifica esses direitos, sob o aspecto subjetivo, os difusos como transindividuais, como aqueles que não têm titular individual, sendo que a ligação entre os seus vários titulares decorre de mera circunstância de fato; e os coletivos, também transindividuais, com determinação relativa de seus titulares, ou seja, que não têm titular individual e a ligação entre os vários titulares coletivos nasce de uma relação jurídica-base. Definido o conceito dessa forma, seriam difusos, por exemplo, as vítimas do uso de um determinado remédio, que vendido a uma clientela indeterminada, fosse nocivo à saúde; e coletivos aqueles que, constituídos em grupos ou categorias, fossem objeto de certo ato que violasse direitos desses grupos ou categorias, razão pela qual Péricles Frade conceituou-os como aqueles que "têm como característica principal a ligação com o fenômeno associativo, dirigindo-se aos fins institucionais dos grupos". (Conceito de Interesses Difusos, RT, 2ª ed., pág. 39).
14. Nessa mesma esteira posiciona-se Édis Milaré:

"Embora a distinção entre interesses difusos e interesses coletivos seja muito sutil - por se referirem a situações em diversos aspectos análogos - tem-se que o principal divisor de águas está na titularidade, certo que os primeiros pertencem a uma série indeterminada e indeterminável de sujeitos, enquanto os últimos se relacionam a uma parcela também indeterminada mas determinável de pessoas. Funda-se, também, no vínculo associativo entre os diversos titulares, que é típico dos interesses coletivos ausente nos interesses difusos". (A Ação Civil Pública na Nova Ordem Constitucional, Saraiva, 1990, págs. 27/28).

15. Da mesma forma, apenas com fundamentação distinta, é a opinião de Alcides A. Munhoz da Cunha (A Evolução das Ações Coletivas no Brasil, Revista de Processo n° 77, págs. 224/235); Kazuo Watanabe (Demandas Coletivas e os Problemas Emergentes da Práxis Forense, Forense, págs. 185/196) e tantos outros.
16. No entanto, ao editar-se o Código de Defesa do Consumidor, pelo seu artigo 81, inciso III, uma outra subespécie de direitos coletivos fora instituída, dessa feita, com a denominação dos chamados interesses ou direitos individuais homogêneos assim entendidos os decorrentes de origem comum.
17. Por tal disposição vê-se que se cuida de uma nova conceituação no terreno dos interesses coletivos, sendo certo que esse é apenas um nomen iuris atípico da espécie direitos coletivos. Donde se extrai que interesses homogêneos, em verdade, não se constituem como um tertium genus, mas sim como uma mera modalidade peculiar, que tanto pode ser encaixado na circunferência dos interesses difusos quanto na dos coletivos.
18. Por isso mesmo Kazuo Watanabe (ob.cit, pág.196), que integrou a comissão que aprestou os estudos preliminares da então proposta do Código do Consumidor, haver afirmado que, no ponto, são "interesses ou direitos individuais homogêneos, os de origem comum, permitindo a tutela deles a título coletivo. Origem comum não significa, necessariamente, uma unidade factual e temporal", endossando igual escólio Hugo Nigri Mazzini (A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, Saraiva, pág. 10, 7ª edição, 1995), para quem "os interesses individuais homogêneos, em sentido lato, na verdade não deixam de ser também interesses coletivos".
19. Quer se afirme na espécie interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão nitidamente cingidos a uma mesma relação jurídica-base e nascidos de uma mesma origem comum, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque incluem grupos, que conquanto atinjam as pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais, no sentido do alcance da ação civil pública, posto que sua concepção finalística destina-se à proteção do grupo. Não está, como visto, defendendo o Ministério Público subjetivamente o indivíduo como tal, mas sim a pessoa enquanto integrante desse grupo. Vejo, dessa forma, que me permita o acórdão impugnado, gritante equívoco ao recusar a legitimidade do postulante, porque estaria a defender interesses fora da ação definidora de sua competência. No caso agiu o Parquet em defesa do grupo, tal como definido no Código Nacional do Consumidor (artigo 81, incisos II e III) e pela Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei n° 8.625, de 12 de fevereiro de 1993), cujo artigo 25, inciso IV, letra a, o autoriza como titular da ação, dentre muitos, para a proteção de outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos.
20. E a respeito dessa nota que caracteriza os interesses difusos e coletivos, a transindividualidade e indivisibilidade, anotou J.C. Barbosa Moreira que os interessados nessa relação, tal qual a dos autos, "se põem numa mesma espécie de comunhão tipificada pelo fato de que a satisfação de um só implica por força a satisfação de todos, assim como a lesão de um só constitui, ipso facto, lesão da inteira coletividade" (A legitimação para a Defesa dos Interesses Difusos no Direito Brasileiro, Revista Ajuris 32/82), aduzindo, a propósito Ada Pellegrini Grinover, acerca dos interesses coletivos, no círculo protegido pela tutela estatal, que "a satisfação de um interessado implica necessariamente a satisfação de todos, ao mesmo tempo em que a lesão de um indica a lesão de toda a coletividade". (A Problemática dos Interesses Difusos, editora Max Limonada, página 31).
21. Tal é a hipótese que não pressinto inconstitucionalidade da parte final do dispositivo, como chegou a dizê-lo Ives Gandra da Silva Martins, em artigo que escreveu para a revista Ciência Jurídica, n° 62, páginas 10 a 22, tendo-a como afrontadora ao inciso III, do artigo 129 da Carta da República, pois em verdade o Ministério Público está por esse mecanismo credenciado a defender os interesses coletivos, interesses esses que são os dos autos e consignados no preceito constitucional e regulamentados pela Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (artigo 25, IV, a) e pelo Código do Consumidor (artigo 81, II e III).
22. Não paira nenhuma dúvida que a recorrida autorizou o aumento das mensalidades contra legem, sendo certo inclusive que há farta prova nos autos de que não se obedeceu à legislação da época quando se reuniu a comunidade escolar, através da Associação de Pais e Mestres, descumprindo-se nuclearmente o que então determinava a Lei n°.8.030/90, que disciplinava a forma das cobranças das respectivas mensalidades.
23. Procurado o Ministério Público de São Vicente, por alguns pais que tinham dificuldade em arcar com os ônus do aumento, optou o representante do Parquet pela propositura da ação civil pública.
24. Estaria o MPE extrapolando as suas atribuições? Parece-me que não, pois dessa forma procedendo o fez com base no dispositivo constitucional do artigo 129, inciso III, da Carta Política, que a ele assegura a proteção de outros interesses difusos e coletivos, e fundadamente assim estava legitimado não só pela norma constitucional, senão também pelo próprio Código do Consumidor e por sua Lei Orgânica, que ao MP cometeram, dentre outros, o dever de proteger os direitos coletivos.
25. Se o universo dos alunos e de seus pais é indeterminado, mas determinável, porque basta a coleta dos dados perante a instituição recorrida para se levantar a nominata respectiva, nem por isso se retira o caráter de interesses coletivos, que pelo referido Código são definidos como transindividuais de natureza indivizível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica-base. E é exatamente o que ocorre nestes autos, em que há um objeto comum que os une, consubstanciado no aumento que a todos atingiu; há um grupo, objeto dos mesmos interesses e interligados pela mesma causa e uma parte contrária, no caso a Associação Notre Dame de Educação e Cultura, que atrai a legitimidade da postulação pela relação jurídica-base.
26. Coincidentemente Alcides A. Munhoz da Cunha, ao discorrer sobre interesses coletivos, (A Evolução das Ações Coletivas no Brasil, Revista do Processo n° 77, págs. 224/235), cita exemplo de todo semelhante ao caso dos autos; diz ele:

"Situação similar ocorrerá quando se estiver diante de pretensão de pais de alunos de determinado estabelecimento particular de ensino, visando a redução das mensalidades escolares daquele estabelecimento especificamente. Aí, além de manterem vínculos jurídicos com a escola (pois são os responsáveis pela matrícula, etc.), está-se tutelando os interesses daqueles que compõem o corpo de pais de alunos daquele estabelecimento, independentemente de existir ou não associação de pais. A pretensão pode ser no sentido de se rever os critérios das mensalidades escolares de todos os estabelecimentos de ensino de determinado Município, de determinada região, de determinado Estado ou de todo o país."

27. Evidencia-se, quantum satis, que os interesses defendidos neste recurso são nitidamente homogêneos porquanto nascidos de uma mesma origem, ou seja, mensalidades escolares cobradas abusivamente, com um mesmo índice de aumento, aplicado a todos os usuários da escola; por conseguinte homogêneos, porque na verdade todos da mesma natureza; e como homogêneos são uma subespécie de interesses coletivos, como antes abordei, legítima é a capacidade postulatória do recorrente.
28. Ao mencionar a norma do artigo 129, III, da Constituição Federal, que o MP está credenciado para propor a ação civil pública, relacionada a "outros interesses difusos e coletivos", outorgou-se-lhe a prerrogativa para agir na defesa de um grupo lesado com a ilegalidade praticada. Não se trata de intromissão da iniciativa ministerial na área específica reservada à atuação de advogados, senão a de defender, em nome coletivo, pessoas vítimas de arbitrariedade praticada com aumento abusivo de mensalidades escolares. Dentre os atingidos, muitos dos pais não teriam condições de arcar com despesas judiciais e honorários, como é o caso daqueles que procuraram o MP indignados e revoltados com o aumento perpetrado; e por mal terem condições de pagar os estudos de seus filhos, não possuíam condições de suportar despesas extras. Ademais, estava o Parquet mais do que impelido a promover a ação, pelo dever de ofício, quanto mais quando se trata de interesses que se elevam à categoria de bens ligados à educação, amparados como se sabe, constitucionalmente, como dever do Estado e obrigação de todos (CF, art.205).
29. Hoje, bem organizadas as Escolas, através de seus entes sindicais, rara é a Medida Provisória ou outra norma qualquer, de tantas quantas já foram editadas, quando entendem serem elas prejudiciais aos seus propósitos, que não sejam alvo de irresignação por parte dessa categoria. O mesmo acontece no que diz respeito aos alunos, em que, fiscalizando ativamente esse setor, têm os Partidos Políticos, sobretudo o PC do B, agido, contra normas que entendem inconstitucionais ou ilegais.
30. Antes, contudo - a ação é datada de 20 de setembro de 1990 -, não havia o próprio Supremo Tribunal Federal consolidado os seus atuais precedentes sobre as entidades arroladas no artigo 103 da Constituição Federal que detêm legitimidade e pertinência generalizada para o ajuizamento da ação direta, circunstância que fazia mais vigilante, nesse campo, a iniciativa ministerial, hoje praticamente inexistente pelo controle concentrado que se perfaz perante esta Corte.
31. Tem-se que não é o Ministério Público que invade a área de atuação da reserva da clientela dos advogados, senão a própria natureza do bem protegido que o exige, e que se alça ao patamar daqueles impugnáveis por via de ação direta, por certos entes, e com muito mais razão pelo Ministério Público, neste caso concreto investido da capacidade postulatória para a ação civil pública, quando o bem que visa a resguardar se insere na órbita dos interesses coletivos, em segmento de extrema delicadeza e de conteúdo social tal que, acima de tudo, recomenda o abrigo estatal.
32. Assim, conheço do recurso extraordinário interposto e lhe dou provimento para, afastada a alegada ilegitimidade do Ministério Público, com vistas à defesa dos interesses de uma coletividade, determinar a remessa dos autos ao Tribunal de origem, para prosseguir no julgamento da ação.

* acórdão ainda não publicado


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